Há recursos para a ciência? Sim e não.

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Corremos o risco de chegar ao fim do ano com laboratórios paralisados por falta de manutenção de seus equipamentos e de reagentes para realização dos experimentos

Apesar do esforço das autoridades ligadas ao Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT) no sentido de ampliar os recursos públicos para este importante setor, atravessamos uma grave crise. Este esforço é endossado pela Academia Brasileira de Ciências, Academia Nacional de Medicina e pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, com apoio da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições de Ensino Superior, Conselho Nacional de Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa e Conselho Nacional de Secretarias Estaduais de Ciência e Tecnologia. Mas o resultado da movimentação é ainda pífio e corremos o risco de finalizarmos o ano apenas mantendo os pesquisadores e estudantes envolvidos no sistema — graças às bolsas de apoio — mas com laboratórios paralisados por falta de manutenção de seus equipamentos e de reagentes para realização dos experimentos.

A que se deve este estado crítico? Seria a falta de recursos financeiros no Orçamento federal? Como explicitado no título deste artigo, a resposta pode ser sim ou não. Antes de responder, cabe uma explicação simples e objetiva sobre as fontes financeiras do SNCT.

Em países comprometidos com o avanço do conhecimento científico e sua transformação em riqueza, os recursos necessários para o apoio à ciência são previstos no Orçamento com recursos da União. Já foi assim no Brasil, inclusive durante momentos de acelerado crescimento, quando o montante alocado no Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), principal fonte de apoio ao desenvolvimento científico do país, chegou a R$ 800 milhões. Depois, o valor minguou e, entre 1990 e 1999, veio o fundo do poço e um orçamento variando entre R$ 50 milhões a 200 milhões por ano. Com sinal vermelho aceso, entre 1998 e 2002, o governo federal criou os fundos setoriais: recursos da atividade privada em áreas como petróleo, energia, saúde, entre outros, que deveriam manter e ampliar o SNCT.

Em 2010, o fundo arrecadou R$ 4,2 bilhões, estes quase integralmente utilizados para apoiar projetos científicos e a inovação tecnológica. Porém, nos anos seguintes, a área deixou de ser prioritária e, em 2016, apesar da arrecadação ter sido de R$ 4 bilhões, apenas R$ 2,8 bilhões foram utilizados. O restante ficou armazenado no Tesouro Nacional como “reserva de contingência”, praticamente não acessível. A proposta para 2018 é de arrecadação de R$ 4,5 bilhões, utilização de R$ 2,2 bilhões e reserva de contingência de R$ 2,3 bilhões.

Com o exposto, é fácil responder à questão do título. Se a arrecadação do FNDCT for disponibilizada, teremos condições de, em poucos anos, recuperar o prejuízo sofrido pela ciência brasileira. Logo, afirmamos que sim, há recursos para apoio. No entanto, se continuar prevalecendo a atitude já condenada pelo Tribunal de Contas da União, bem como pela Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado, com a manutenção da reserva de contingência, podemos afirmar que não há recursos para a ciência. A opção a ser tomada sinalizará para onde queremos levar o país. Vamos continuar como exportadores de grãos e minerais in natura ou entrar na era da indústria 4.0, internet das coisas, novos fármacos, dentre outros produtos que envolvem alta tecnologia?

Artigo publicado dia 04/12/2017 no O Globo – disponível na internet 05/12/2017

Nota: O presente artigo não traduz necessariamente a opinião do ASMETRO-SN. Sua publicação tem o propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

 

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