Brumadinho: PF indicia 13 funcionários da Vale e da TÜV SÜD por falsidade ideológica e uso de documentos falsos

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A mina do Feijão na região de Córrego do Feijão, em Brumadinho, dois dias depois do rompimento da barragem da Vale. — Foto: Douglas Magno/AFP

A Polícia Federal (PF) indiciou, na noite desta quinta-feira (19), sete funcionários da mineradora Vale e seis membros da consultora TÜV SÜD pelos crimes de falsidade ideológica e uso de documentos falsos envolvendo a tragédia de Brumadinho. As duas empresas também foram indiciadas. Nenhum dos funcionários da Vale indiciados pertence à cúpula da mineradora.

O rompimento da barragem I da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, na Grande BH, ocorreu em 25 de janeiro deste ano. Quase oito meses após a tragédia, 21 pessoas continuam desaparecidas e o total de mortos identificados chega a 249 

O relatório também pede medida cautelar contra os indiciados, proibindo os 13 funcionários de prestarem consultorias ou novos trabalhos nessa área.

 
PF indicia 13 pessoas pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG)
PF indicia 13 pessoas pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG)

Veja os indiciados

Da Vale

  • Alexandre Campanha (gerente-executivo de Governança de Geotecnia Corporativa)
  • Marilene Lopes (gerente de Gestão de Estruturas Geotécnicas)
  • Felipe Rocha (engenheiro ligado à Gestão de Riscos Geotécnicos)
  • Washington Pirete (engenheiro)
  • César Grandchamp (geólogo)
  • Cristina Malheiros (engenheira)
  • Andréa Dornas (engenheira)

Da TÜV SÜD

  • Chris-Peter Meier (Diretor de Desenvolvimento de Negócios e gerente de Negócios de Infraestrutura da Tüv Süd, na Alemanha)
  • Makoto Namba (coordenador de Projetos)
  • André Yassuda (consultor de geotecnia)
  • Arsenio Negro Jr. (consultor e dirigente da empresa)
  • Marlísio Cecílio (engenheiro geotécnico sênior)
  • Ana Paula Ruiz Toledo (engenheira geotécnica sênior)

A TÜV SÜD disse que a empresa não comentará sobre os indiciamentos.

Por nota, a Vale informa que tomou conhecimento dos resultados do primeiro inquérito policial nesta sexta-feira (20). A mineradora disse que “detalhadamente o inteiro teor do relatório policial antes de qualquer manifestação de mérito, ressaltando apenas que a empresa e seus executivos continuarão contribuindo com as autoridades e responderão às acusações no momento e ambiente oportunos”.

PF explica investigação

O indiciamento dos funcionários da Vale e da TÜV SÜD resultam da primeira parte das investigações da Polícia Federal sobre o caso, que também é investigado pela Polícia Civil do estado.

A PF ainda deverá fazer novos indiciamentos, mas, no momento, aguarda a conclusão de perícias criminais sobre os crimes ambientais e os de homicídio.

A expectativa é que os estudos indiquem um possível “gatilho” do rompimento da estrutura da barragem e, assim, fique possível determinar a responsabilidade individualizada nessas tipificações criminais.

De acordo com o delegado Luiz Augusto Pessoa Nogueira, dois estudos indicaram que a barragem tinha problemas e que os indiciados tinham conhecimento sobre isso.

Falsificação de documentos

Nesta primeira etapa das investigações, a PF focou nos crimes que envolvem de falsificação de documentos.

crime de falsidade ideológica ocorreu, segundo a PF, quando funcionários das duas empresas celebraram contratos utilizando informações falsas contidas nos documentos de Declaração de Condição de Estabilidade (DCE), feitos em três momentos de 2018: a primeira em junho e as outras duas em setembro.

Esses documentos permitiram que a barragem seguisse funcionando normalmente mesmo com critérios de segurança abaixo dos recomendados pela própria mineradora e por padrões internacionais.

Já a imputação por documentos falsos se dá por dois registros de declarações de estabilidade — documentos que indicavam que a barragem estava em boas condições de funcionamento — junto a entidades governamentais, em 2017. Ao todo, a pena pode chegar a 18 anos de cadeia para os indiciados.

Entenda os motivos dos indiciamentos

TÜV SÜD

  • Makoto Namba – analista sênior da empresa e o técnico que assinou as duas declarações de estabilidade da barragem B1 de setembro de 2018.
  • Marlísio Cecílio – analista técnico que liderou os estudos e trabalhos que resultaram no relatório de revisão de segurança de barragem. É o documento mais importante, assinado em junho de 2018. Atualmente, está na Austrália fazendo um doutorado.
  • Arsênio Negro Jr. – era um consultor contratado pela TüV SÜD mas a PF verificou que ele era mais do que um simples consultor. Ele estava sempre nas mensagens da empresa e participava de todas as conversações, dava sugestões importantes e foi ele que conversou com Cris-Peter Meier (diretor na Alemanha) para que a empresa decidisse emitir o laudo de estabilidade.
  • Ana Paula Ruiz – consultora especializada em liquefação de barragens. Ajudou o Marlísio e foi ela, em setembro, que liderou a inspeção regular de barragem.
  • André Yassuda – analista sênior e o técnico que assinou e atestou a primeira declaração de estabilidade para a B1 em junho de 2018. Ele participava das discussões e do resultado final dos estudos que foram feitos pelo Makoto, pelo Marlísio, pela Ana Paula e pelo Arsênio.
  • Chris-Peter Meier – executivo da sede da empresa na Alemanha e foi a pessoa que foi consultada pelo Arsênio para autorizar que eles emitissem a declaração de estabilidade. A confirmação da participação dele foi feita baseada em depoimentos de funcionários da TÜV SÜD e em documentação. Ele não foi ouvido pela PF. Ele mora da Alemanha e, intimado, não quis vir ao Brasil.

Vale

  • Alexandre Campanha – foi citado por funcionários da TÜV SÜD durante oitivas na PF por supostamente pressionar a consultora a liberar a estabilidade da barragem. Ele participou de painéis internacionais de especialista para atestamento de segurança da barragem e tinha todo o conhecimento de qual o fator de risco adequado mínimo para barragens. Mesmo assim, aceitou o fato de 1,09 de segurança, quando o índice mínimo é de 1,3.
  • Marilene Lopes – era um dos principais nomes do setor de Gestão de Riscos Geotécnicos (GRG), sistema responsável por gerir dados de barragens; ela também fazia contatos com a TÜV SÜD sobre a situação de barragem I. Respondia diretamente à Alexandre Campanha.
  • Felipe Rocha – trabalhava com Marilene Lopes e foi responsável pela apresentação dos dados do GRG sobre a situação das barragens em mais de um painel realizado pela Vale nos anos de 2017 e 2018.
  • Washington Pirete – participou de debates internos da Vale onde eram discutidas as situações das barragens e também atuava junto às empresas auditoras.
  • César Grandchamp – funcionário da mineradora há décadas, era o responsável por assinar pela Vale as documentações que atestavam a qualidade e estabilidade da barragem I de Brumadinho.
  • Cristina Malheiros – atuava no monitoramento da barragem I de Córrego do Feijão e assinava a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) da estrutura.
  • Andréa Dornas – trabalhava desde a década de 90 na Vale e também tinha conhecimento sobre a situação da segurança de B1. Manteve conversas com Cristina Malheiros sobre os índices da barragem abaixo dos recomendados internacionalmente.
CPI também pediu 13 indiciamentos

Nesta terça-feira (17), a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) entregou relatório que também pede o indiciamento de 13 pessoas das duas empresas.

Entre os nomes estão o então diretor-presidente da Vale, Fábio Schvartsman, diretores, gerentes, uma engenheira e um geólogo da mineradora, além de dois engenheiros da TÜV SÜD. (veja lista)

A PF não informou se entre os nomes que a corporação indiciou há pessoas que a CPI pediu indiciamento.

Indenização de R$ 12 milhões

A Vale já foi condenada a pagar indenização de quase R$ 12 milhões a duas famílias de São Paulo que perderam os filhos e o neto no rompimento da barragem de Brumadinho. Da decisão cabe recurso.

A sentença foi dada em favor das famílias dos irmãos Luiz Taliberti Ribeiro da Silva, de 31 anos, e Camila Taliberti da Silva, de 33 anos, e ainda de Fernanda Damian de Almeida, de 30 anos, que era casada com Luiz e esperava o primeiro filho do casal.

Luiz, Fernanda e Camila passeavam em Brumadinho de férias em companhia do pai, Adriano Ribeiro da Silva, de 61 anos, e da mulher dele, Maria de Lourdes da Costa Bueno, de 59 anos. Os dois também morreram na tragédia. O processo sobre as duas mortes corre em separado e não há sentença ainda. Por nota, a Vale informou que ainda não foi intimada da decisão.

Crédito: Fernando Zuba, Lucas Ragazzi e Naiana Andrade, TV Globo/Belo Horizonte – disponível na internet 20/09/2019

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