De Bem com a Vida: Afinal, é perigoso esquentar comida no microondas?

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Apesar de ser um aparelho essencial da cozinha há décadas, poucos itens domésticos provocam mais discussão que o microondas.

Ele é aclamado como um salva-vidas para aqueles que não sabem cozinhar e retratado por alguns chefs como se fosse o responsável por arrastar a arte da cozinha para a sarjeta.

Mas há outro debate além das disputas culinárias – o microondas pode fazer mal?

Quando usado corretamente, não há nada com o que se preocupar em termos de radiação de um microondas, de acordo com a Organização Mundial da Saúde.

Mas outras preocupações são menos claras – incluindo se os alimentos sofrem perda de nutrientes ou se o aquecimento dos alimentos em plástico pode provocar problemas.

A perda de nutrientes

Algumas pesquisas mostraram que os legumes perdem parte de seu valor nutricional no microondas.

Por exemplo, descobriu-se que o microondas remove 97% dos flavonoides – compostos com benefícios anti-inflamatórios – do brócolis. Isso é um terço a mais do que a perda causada pela fervura.

No entanto, um estudo de 2019 que analisou a perda de nutrientes do brócolis no microondas apontou que estudos anteriores variavam o tempo de cozimento, a temperatura e se o brócolis estava ou não na água.

Ele descobriu que tempos de cozimento mais curtos (eles deixavam o brócolis por um minuto no microondas) não comprometiam o conteúdo nutricional.

Vapor e microondas podem até aumentar o conteúdo da maioria dos flavonoides, que são compostos ligados à redução do risco de doenças cardíacas.

“Sob as condições de cozimento usadas neste estudo, o microondas parecia ser uma maneira melhor de preservar os flavonoides do que o vapor”, escreveram os pesquisadores.

Mas eles também descobriram que microondas com muita água (como a quantidade que você usaria para ferver) causava uma queda nos flavonoides.

O pesquisador Xianli Wu, cientista do Centro de Pesquisa em Nutrição Humana de Beltsville, no Departamento de Agricultura dos EUA, diz que não há consenso para explicar por que o microondas poderia aumentar o conteúdo de flavonoides.

Pode ser que ele facilite a medição dos flavonoides – talvez amolecendo o tecido da planta, facilitando sua extração – em vez de aumentar sua quantidade.

Mas não há uma resposta direta sobre se os vegetais reterão mais nutrientes no microondas do que qualquer outro método. Isso ocorre porque cada alimento é diferente em termos de textura e nutrientes que eles contêm, de acordo com Wu.

“Embora em geral o microondas seja o método preferido, o tempo ideal será diferente para diferentes vegetais”, diz Wu. “Ao considerar métodos de cozimento domésticos comumente usados, o microondas é o melhor método de cozinhar, pelo menos para muitos alimentos vegetais, mas provavelmente não para todos.”

Em outro estudo, os pesquisadores compararam o conteúdo de fenólicos (compostos associados a vários benefícios à saúde) de vários vegetais após serem fervidos, cozidos no vapor e cozidos no microondas.

Microondas e vapor causaram uma perda no conteúdo fenólico de abóbora, ervilha e alho-poró, mas não de espinafre, pimentão, brócolis ou feijão verde. Os pesquisadores também testaram a atividade antioxidante.

Em ambas as medidas, os vegetais tiveram um desempenho melhor no microondas, em comparação com o cozimento.

“O tratamento térmico moderado pode ter sido uma ferramenta útil para melhorar as propriedades de alguns vegetais”, escrevem os pesquisadores.

Recipiente de plástico com comida.
Muitos recipientes de plástico soltam químicos quando esquentados no microondas. Direito de imagem GETTY IMAGES

Esquentando plástico

Frequentemente, colocamos no microondas alimentos em embalagens plásticas, mas alguns cientistas alertam para o risco de ingestão de ftalatos. Quando expostos ao calor, esses aditivos plásticos podem se decompor e se dissolver em alimentos.

“Alguns tipos de plástico não são projetados para microondas, porque têm polímeros no interior para torná-los macios e flexíveis, que derretem a uma temperatura não tão alta e podem se soltar durante o processo se a temperatura ultrapassar os 100° C”, diz Juming Tang, professor de engenharia de alimentos na Universidade Estadual de Washington.

Em um estudo de 2011, os pesquisadores compraram mais de 400 recipientes de plástico projetados para conter alimentos e descobriram que a maioria vazava substâncias químicas que afetam os hormônios.

Os ftalatos são um dos plastificantes mais usados, adicionados para tornar o plástico mais flexível e frequentemente encontrado em recipientes para viagem, embalagens plásticas e garrafas de água.

Sabe-se que eles afetam hormônios e nosso sistema metabólico. Nas crianças, os ftalatos podem aumentar a pressão sanguínea e a resistência à insulina, o que pode aumentar o risco de distúrbios metabólicos, como diabetes e hipertensão.

A exposição a ele também tem sido associada a problemas de fertilidade, asma e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).

Os ftalatos também são potenciais desreguladores dos hormônios da tireoide, diz Leonardo Trasande, professor de medicina ambiental e saúde da população na NYU School of Medicine, em Nova York. Entre outras coisas, esses hormônios são cruciais para o desenvolvimento do cérebro dos bebês durante a gravidez.

O bisfenol (BPA) também é comumente usado em produtos plásticos, e estudos sugeriram que ele também pode afetar os hormônios. Mas a pesquisa é limitada, comparada à quantidade de estudos que analisam os ftalatos.

Os ftalatos estão por toda parte – mesmo em brinquedos e loções para o corpo – e ainda não está claro quanto dano eles causam. Mas a maioria dos especialistas concorda que o aquecimento de plástico com ftalatos pode aumentar a exposição a eles.

 

“O microondas mobiliza contaminantes”, diz Rolf Halden, professor e diretor do Centro de Biodesign de Engenharia de Saúde Ambiental da Arizona State University. “Esse processo é usado em laboratórios para extrair poluentes das amostras, antes de uma análise química.”

E os riscos potenciais não aumentam de acordo com a frequência com que alguém esquenta algo no microondas, argumenta Trasande – já que a relação entre a quantidade de exposição química e o risco de interrupção hormonal não é linear.

“Achava-se que a dose definia o veneno. Agora entendemos a partir de vários estudos que as exposições de baixo nível são onde o grosso dos efeitos acontece, então não há um nível seguro de exposição”, diz Trasande.

É importante lembrar que, ao aquecer alimentos em um recipiente de plástico, a exposição também pode ocorrer com plásticos que não tocam nos alimentos, como uma tampa.

“A água sobe como vapor dos alimentos e, em seguida, condensa na parte inferior da tampa, e os produtos químicos extraídos da tampa caem sobre os alimentos, contidos nas gotículas de condensação”, diz Halden.

As melhores maneiras de minimizar o risco são usar outros materiais que não sejam plásticos, como cerâmica. Se você usar recipientes de plástico, evite os que estejam perdendo sua forma, pois os recipientes velhos e danificados têm maior probabilidade de soltar produtos químicos.

Você também pode verificar o símbolo de reciclagem universal do seu recipiente, geralmente na parte inferior de um produto – aqueles com o número 3 e as letras “V” ou “PVC” incluem ftalatos.

Riscos para a saúde

Mesmo se você evitar plásticos, existem outros riscos potenciais de aquecer alimentos no microondas – incluindo aquecimento irregular e as altas temperaturas usadas.

Primeiro, pense em usar o microondas para reaquecer, em vez de cozinhar, alimentos, pois eles podem cozinhar de maneira desigual. “Dependendo da porção de alimento que é aquecida, haverá algumas partes mais quentes que outras”, diz Francisco Diez-Gonzalez, professor de segurança alimentar da Universidade da Geórgia.

“As temperaturas ficarão diferentes em partes distintas da comida. É difícil atingir uma temperatura completamente uniforme, principalmente quando se fala de alimentos crus.”

Mas é importante observar que o reaquecimento de alimentos também apresenta riscos. Os alimentos devem ser aquecidos até os 82° C (176° F) para matar bactérias nocivas, mas como as bactérias ainda podem crescer quando os alimentos esfriam, você não deve reaquecer uma refeição mais de uma vez.

As altas temperaturas do microondas também podem representar algum risco. De um modo geral, temperaturas mais altas não são um problema, mas existem pesquisas indicando um risco associado ao cozimento de alguns alimentos ricos em amido no microondas, incluindo cereais e vegetais de raiz.

Quando Betty Schwartz, professora de ciências nutricionais da Universidade Hebraica de Jerusalém, viu seus alunos esquentando batatas no microondas durante o almoço, ela notou pequenos cristais dentro das batatas.

Quando os analisou, descobriu que eles eram ricos em acrilamida química, que pode ser um subproduto natural da culinária. Schwartz pediu a seus alunos que fervessem suas batatas e descobriu que esse processo não criava acrilamida, que, segundo ela, se forma em temperaturas mais altas no microondas.

Essa é uma preocupação, porque estudos em animais mostraram que a acrilamida atua como cancerígena porque interfere no DNA das células, mas as evidências em humanos são limitadas. Há pesquisas que sugerem que as microondas são mais favoráveis ao desenvolvimento da acrilamida do que outros métodos de cozimento.

“A 100 graus centigrados, há energia suficiente para alterar as articulações automáticas entre as moléculas de modo a produzir uma molécula com muito mais energia, que pode provocar uma reação com o DNA, o que induz mutações”, diz Schwartz. “Quando há muitas mutações, pode acontecer um câncer.” Estudos em animais mostraram que esse é o caso das acrilamidas.

Uma maneira de contornar isso é mergulhar as batatas na água antes de colocá-las no microondas.

Radiação segura

Quanto à radiação do microondas, ela é completamente inofensiva. Eles usam radiação eletromagnética de baixa frequência – o mesmo tipo usado em lâmpadas e rádios. Quando você coloca comida dentro de um microondas, ele absorve essa radição, o que faz com que as moléculas de água na comida vibrem, causando a fricção que aquece a comida.

Os seres humanos absorvem ondas eletromagnéticas também. Mas os fornos de microondas produzem ondas de frequência relativamente baixa e que ficam contidas no forno. Mesmo que não fosse o caso, as ondas são inofensivas, diz Tang. (É claro que o calor no microondas não é inofensivo – portanto, você nunca deve colocar, por exemplo, uma criatura viva dentro dele).

“Essas microondas fazem parte das ondas eletromagnéticas às quais somos expostos diariamente. Quando você assa pão, é exposto a ondas eletromagnéticas e energia infravermelha dos elementos de aquecimento do forno. Até as pessoas trocam ondas radioativas entre si”, diz Tang.

“Se você come coisas cultivadas com a luz do sol, não deve se preocupar com comida de microondas.”

Diferentemente dos aparelhos de raios-X, os microondas não usam radiação ionizante, o que significa que eles não carregam energia suficiente para separar elétrons dos átomos.

“Você precisa quebrar as ligações químicas para danificar o DNA. Esta é a principal maneira pela qual a radiação mata – transforma células e causa câncer”, diz Timothy Jorgensen, professor associado de medicina de radiação no centro médico da Universidade de Georgetown.

As preocupações com a radiação de microondas foram amplamente esclarecidas nos anos após a invenção do forno de microondas, diz Jorgenson.

Muitas pesquisas foram realizadas por cientistas dos Laboratórios de Pesquisa e Desenvolvimento Army Natick, em Massachusetts, EUA, sobre a segurança de microondas, o que contribuiu bastante para amenizar as preocupações.

Quando se trata de cozinhar alimentos no microondas, há muito a considerar. Eles têm sido vistos como um aparelho de cozinha seguro – mas isso vem com ressalvas, de acordo com pesquisas.

E, em particular, os especialistas ainda estão levantando preocupações sobre como as embalagens de plástico que usamos no microondas podem afetar nossos hormônios e, consequentemente, nossa saúde.

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