Governo quer mudanças para conter ‘meteoro’ de até R$ 90 bilhões em precatórios em 2022

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Discussão sobre as mudanças voltou depois de governo identificar um crescimento expressivo dessa despesa na elaboração da proposta de Orçamento do ano que vemO governo Jair Bolsonaro voltou a discutir mudanças nas regras de pagamento de precatórios(valores devidos a empresas e pessoas físicas após sentença definitiva na Justiça) depois de identificar um crescimento expressivo dessa despesa na elaboração da proposta de Orçamentopara 2022.

A elevação nos gastos com precatórios é o que o ministro da Economia, Paulo Guedes, chamou nesta sexta-feira, 30, de “meteoro” que vem de “outros poderes”, segundo apurou o Estadão/Broadcast. De acordo com fontes ouvidas pela reportagem, o valor dessas sentenças é calculado entre R$ 80 bilhões e R$ 90 bilhões para 2022 – um valor bem maior que os R$ 54,75 bilhões previstos no Orçamento deste ano.

Na mesma entrevista, o ministro da Economia disse que o governo precisa disparar um míssil para impedir que o “meteoro” acerte a Terra – neste caso, as finanças da União. O pagamento dos precatórios fica sob o guarda-chuva doteto de gastos, a regra que limita o avanço das despesas à inflação, e o governo já tem outras pretensões para o espaço disponível, como a reformulação do Bolsa Família.

Guedes usou a figura de linguagem sem entrar em detalhes porque o desenho de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) ainda está em elaboração. Uma das alternativas pode ser a extensão do prazo para o pagamento de sentenças de maior valor, um mecanismo que já existe hoje na Constituição e poderia ser ampliado para abarcar volume maior de precatórios. As discussões, porém, estão em andamento e devem seguir em reuniões ao longo deste final de semana.

Uma tentativa semelhante para atacar a conta elevada dos precatórios foi feita no ano passado, durante a tramitação do Orçamento de 2021, na tentativa de liberar espaço para lançar o Renda Cidadã, programa social turbinado do governo. Na época, discutiu-se limitar o pagamento dessas sentenças a um porcentual da receita corrente líquida (RCL). Mas não houve sucesso.

A proposta, apresentada no Palácio do Alvorada na presença de todos os líderes da base do governo, foi classificada de “pedalada” por adiar o pagamento de uma dívida da União, repercutiu mal no mercado financeiro e sofreu críticas porque prejudicaria pessoas e empresas – parte significativa dos precatórios está relacionada a aposentadorias e pensões.

O problema, segundo fontes do governo, é que esse gasto continua subindo em escala explosiva e precisa ser contido com um “freio de arrumação para o seu pagamento”. A preocupação agora é construir uma proposta tecnicamente robusta, que afaste a avaliação de que se trata de uma pedalada fiscal para postergar pagamentos e abrir espaço no teto de gastos.

A escalada do governo preocupa tanto o governo que o Guedes se reuniu na semana passada com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, para negociar uma “conciliação” no pagamento das dívidas reconhecidas pela Justiça para “não prejudicar os cofres públicos”.  “A partir de agosto, os moldes dessa negociação serão definidos e informados à sociedade”, informou a assessoria de comunicação do STF.

Uma das preocupações da área técnica é mostrar que essa mudança no pagamento dos precatórios é necessária independente da reformulação do Bolsa Família, embora integrantes da equipe econômica reconheçam, reservadamente, que antes do meteoro “tinha” espaço para o programa social dentro do teto. O próprio presidente Jair Bolsonaro, em tom misterioso, em entrevista no início dessa semana, pediu apoio dos congressistas para aprovar uma PEC para resolver o problema do Bolsa Família. Como mostrou o Estadão/Broadcast, na ala política do governo há defensores de uma mudança no próprio teto de gastos, o que levou tensão ao mercado financeiro e contribuiu para a alta do dólar nesta sexta-feira, que fechou a R$ 5,2009 na cotação à vista.

Após o Estadão/Broadcast noticiar a discussão da PEC sobre precatórios, o mercado deu sinais de estresse adicional, e a cotação do dólar futuro acelerou ainda mais. A negociações da moeda para setembro saltaram a R$ 5,2330.

Nos últimos dois dias, a reportagem ouviu sete integrantes do governo que confirmaram os estudos. Dois deles ponderaram que a questão central não é o espaço do teto, mas o pagamento dos precatórios, que neste ano já representa mais da metade das despesas discricionárias – aquelas que o governo tem maior liberdade para destinar a investimentos e custeio da máquina.

“Às vezes acende sinal amarelo, que passa rapidamente para o vermelho. E percebemos crescimento atípico, que estamos monitorando. Não vamos furar o teto. Mas às vezes vem coisas de outros poderes”, disse Guedes, preparando o terreno para o anúncio.

Há uma avaliação no governo e nos líderes governistas que a proposta do ano passado foi mal comunicada e elaborada. O ponto que se quer reforçar é que a aceleração desse gasto é insustentável, sem que o governo tenha controle sobre sua evolução. Há pouco tempo, a parcela de precatórios no Orçamento não representava nem 10% das despesas discricionárias.

É o Poder Judiciário que passa todos os anos os valores a serem pagos, e o Executivo apenas tem a missão que pagar os compromissos. Os Estados e municípios, que atrasam o pagamento, ganharam mais tempo para acertar a conta. Antes, o prazo acabaria em 2024, e agora foi estendido até 2029 com a aprovação da PEC emergencial. 

Vice-presidente da Câmara diz que PEC para mudar regras de precatórios é ‘calote’ e será rejeitada

Marcelo Ramos (PL-AM) disse que o governo quer ‘impor’ um parcelamento aos seus credores, mesmo após o trânsito em julgado do processo na Justiça e que a PEC não tem chances de aprovação no Congresso
 O vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), classificou de “calote” a apresentação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para mudar as regras de pagamento de precatórios (valores devidos a pessoas e empresas após sentença definitiva na Justiça) e criticou o ministro da Economia, Paulo Guedes, por comparar a fatura dessas dívidas a um “meteoro” que atingiria a Terra – neste caso, as finanças da União.O Estadão/Broadcast mostrou que o governo discute uma PEC para alterar o fluxo de pagamento de precatórios devidos pela União, após identificar que esses gastos chegarão a quase R$ 90 bilhões em 2022, bem acima dos já expressivos R$ 54,75 bilhões programados para este ano. Nesta sexta-feira, 30, em evento no Rio, Guedes referiu-se à despesa como um “meteoro” que vem de “outros poderes”. A pressão vinda desse gasto ameaça o espaço reservado no Orçamento para a reformulação do Bolsa Família e tem encorajado integrantes da ala política a defender mudanças no próprio teto de gastos.

“A fala (de Guedes) tem conotação autoritária, pouco informada, com claro objetivo populista, quando o Brasil, os credores, o Congresso e o Judiciário não toleram mais calotes – PECs para parcelar os débitos unilateralmente”, disse Ramos em nota divulgada à imprensa.

Ao Estadão/Broadcast, o vice-presidente da Câmara disse que o governo quer “impor” um parcelamento aos seus credores, mesmo após o trânsito em julgado do processo na Justiça. “Isso não tem cabimento, contraria a ordem jurídica do País”, afirmou. Na avaliação dele, a PEC não tem chances de aprovação no Congresso.

Na nota, Ramos destaca que uma lei aprovada e sancionada em 2020 já dá instrumentos ao governo para negociar essas dívidas com os credores e gerir melhor o custo dessas sentenças. Qualquer abatimento no valor ou parcelamento, porém, depende da anuência do beneficiário do crédito.

A Lei 14.057/2020 prevê que os acordos podem ser firmados mesmo após o trânsito em julgado, desde que o precatório não tenha já sido integralmente pago. O desconto pode chegar a 40%, e o parcelamento a até oito prestações anuais (ou 12, no caso de ações ainda em andamento na Justiça).

O vice-presidente ressalta ainda que a lei prevê expressamente que os acordos se estendem aos precatórios do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), pelos quais a União tem dívidas bilionárias com os governos regionais.

“É impressionante que o Ministro da Economia se mostre surpreendido com tema antigo, cotidiano e devido constitucionalmente, e que não tenha atentado para as possibilidades de negociação a partir da lei”, disse Ramos na nota.

Segundo ele, a fala de Guedes é “inadequada” porque chama de meteoro o valor devido a cidadãos que buscaram no Judiciário a reparação de danos causados no passado. “Esses cidadãos aguardaram por anos, muitas vezes décadas, o direito de ver reparado um dano sofrido. O reparo é pago por meio dos precatórios”, afirmou.

“São dívidas constituídas e que devem ser pagas. O direito ao recebimento dos precatórios está previsto na Constituição da República, em seu artigo 100. O Judiciário não criou ‘meteoros’. Apenas protege a Constituição e garante o direito dos cidadãos”, acrescentou.

Ramos se tornou uma das vozes de oposição ao governo após ter sido atacado pelo presidente Jair Bolsonaro durante o processo de votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022. O deputado presidiu a sessão do Congresso que aprovou, na LDO, um fundo eleitoral de R$ 5,7 bilhões – valor acordado entre os líderes da base do governo em uma reunião na residência oficial do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).

Após as investidas de Bolsonaro, Ramos abandonou a neutralidade e passou cobrar reação do Congresso aos ataques cada vez mais frequentes do presidente. O deputado também já disse que está analisando o superpedido de impeachment contra Bolsonaro, que reuniu diversos partidos de oposição e de centro. Em uma leitura preliminar, ele indica haver indícios de crime de responsabilidade – em razão da ameaça que Bolsonaro fez ao processo eleitoral caso o voto impresso não seja aprovado pelos deputados.

Número dois no comando da Câmara, Marcelo Ramos tem boa relação com os partidos de oposição e já foi do PC do B e do PSB. Seu apoio a Lira deu início à desidratação da candidatura de Baleia Rossi (MDB-SP), apoiado pelo ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (sem partido-RJ).

Crédito: Adriana Fernandes e Idiana Tomazelli com a colaboração de Weslley Galzo/ O Estado de S.Paulo – @internet 31/07/2021

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