Retroatividade da nova LIA em casos culposos resultará em segurança jurídica

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Após cinco sessões plenárias marcadas por divergências, enfim o Supremo Tribunal Federal concluiu nesta quinta-feira (18/8) a análise das inovações da nova Lei de Improbidade Administrativa (Lei 14.230/2021). Durante o julgamento de uma ação de repercussão geral, os ministros discutiram a possibilidade de retroatividade das mudanças, principalmente nos pontos que tratam da eliminação da modalidade culposa e das regras de prescrição (geral e intercorrente).

Ao fim, ficou decidido que é necessária a comprovação de dolo para a tipificação da improbidade administrativa; que a norma mais benéfica não retroage, exceto nas ações relativas a atos culposos que ainda estejam em curso; e que os prazos de prescrição previstos na Lei 14.230/2021 são irretroativos.

ConJur consultou especialistas em improbidade para entender os efeitos da decisão do Supremo. A conclusão: o resultado do julgamento deverá garantir mais segurança jurídica para servidores, administradores e para quem firmar contratos com o Estado. E deverá acabar com o “apagão das canetas” observado no país nos últimos anos, com chefes de Executivo deixando de tomar decisões importantes por medo de serem condenados em uma ação de improbidade na modalidade culposa.

Segundo Camillo Giamundo, especialista em Direito Público e estudioso da improbidade administrativa, a retroatividade para os casos abertos era esperada e vai deixar os administradores mais seguros para tomar decisões.

“Se a lei muda e entende que a modalidade culposa não é mais punível, não seria justo com quem responde por processos ainda em curso ser condenado por uma situação que nosso ordenamento jurídico não mais entende como sendo improbidade administrativa. É resguardar e valorizar a segurança jurídica não só aos administradores, como às empresas que respondem a processos desse tipo”, opinou ele.

Isabela Pompilio, especialista em Direito Contencioso e sócia do escritório Tozzini Freire Advogados, vai pelo mesmo caminho. Para ela, a extinção da modalidade culposa da improbidade administrativa afastará a insegurança que os administradores tinham para praticar determinados atos públicos, “já que, na vigência da lei anterior, mesmo que o ato em análise pelo Judiciário se tratasse de mera conduta irregular, ensejava grande temor quanto à eventual condenação pela prática de suposto ato ímprobo”.

A decisão do STF também deve reduzir o número de ações de improbidade sem a devida prova. É o que acredita a advogada associada na área de resolução de conflitos do escritório Piquet, Magaldi e Guedes Advogados Juliana Litaiff. Segundo ela, a extinção da modalidade culposa foi “uma resposta necessária às inúmeras ações em curso cujas imputações decorriam de meros atos falhos praticados pelos agentes públicos, muitas vezes dispostos ao longo da exordial de maneira genérica, que poderiam ser tratados em ações de regresso menos custosas”. Assim, na opinião da advogada, será exigida do órgão persecutório fundamentação robusta que justifique a inclusão do sujeito na ação de improbidade.

Embora deva provocar a queda no número de ações contra agentes públicos que possam ter lesado o erário, a decisão dos ministros do STF não significa um salvo-conduto, segundo o advogado criminalista Bernardo Fenelon.

“Necessário esclarecer que a extinção da modalidade culposa da improbidade administrativa e a possibilidade da aplicação retroativa da nova lei não favoreceram a impunidade, dado que tais fatos continuam sendo puníveis em outras esferas, a exemplo da seara cível, nas ações de ressarcimento ao erário, bem como na esfera administrativa, nos procedimentos administrativos disciplinares destinados aos agentes públicos”.

Incentivo às empresas
Uma outra consequência possível da decisão tomada pelo STF na quinta-feira é um reforço nos cofres da Administração Pública. Afinal de contas, com maior segurança jurídica as empresas terão um incentivo para firmar contratos com o poder público.

“Agora o particular que contrata com a Administração Pública tem maior previsibilidade das consequências de seus atos quando de sua participação em procedimentos licitatórios, relacionamento com os agentes públicos e prestação de serviços ou compra e venda de bens ao ente público. A médio prazo, pode trazer maior conforto a empresas que antes não participavam de licitações, podendo resultar em maior competividade entre os licitantes”, opinou Maysa Abrahão Tavares Verzola, sócia da área de Contencioso, Arbitragem e Direito Público do escritório Gasparini, Nogueira de Lima e Barbosa Advogados.

No entanto, ainda que as ações por improbidade culposa devam ser extintas, há casos em que o processo foi ajuizado sem que fosse indicado se a modalidade era culposa ou dolosa. Nessas situações, segundo o especialista da área penal e sócio do Finocchio & Ustra Advogados Guilherme Cremonesi, há margem para a imputação de improbidade dolosa ao réu.

“Conforme asseverou o relator, ministro Alexandre de Moraes, cada caso deverá ser analisado individualmente e, havendo casos em que o Ministério Público não especificou na inicial da ação de improbidade se a conduta foi culposa ou dolosa, já que antes não era necessário, deverá ser feita uma análise da conduta descrita. Nesse caso, entendemos que esta deverá ser uma interpretação feita pelo magistrado, não podendo o Ministério Público aditar a inicial da ação de improbidade, sob o risco de abrir margem para eventual tentativa de burlar a nova lei a fim de imputar o dolo”.

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