Autor da Lei da Transparência celebra outros dois mecanismos de cidadania – a Lei de Acesso à Informação e a Lei de Responsabilidade Fiscal – e cita caso de fiscalização do dinheiro público via Facebook, em tempo real. “Nossa expectativa é que essa experiência viralize”
Em poucas linhas pretendo lhes mostrar que a tecnologia digital pode ampliar a democracia. Isso mesmo: o “zap zap”, o Facebook e tantas outras ferramentas digitais, com as quais a maioria de nós tem intimidade, podem mudar o mundo tal qual o conhecemos hoje.
Reza a lenda que no tempo da ditadura não havia corrupção. A verdade é que desse assunto pouco se falava, e não se falava por uma simples razão: era proibido. Também não havia informação sobre quanto, como e em que o dinheiro dos impostos eram gastos. Em síntese, não havia transparência e nem informação disponível, porque não havia democracia.
A transparência das contas públicas e o acesso à informação enquanto direito foram conquistas democráticas que estabeleceram as bases para o exercício do controle social e, passo seguinte, rumo à democracia direta.
Sonegar informação à sociedade parecia cláusula pétrea no código particular de nossa elite política. Custaram a entender o jogo democrático, mas a pressão das ruas e a avidez da imprensa por informação os acuou. Terminaram cedendo e, no alvorecer do milênio, entra em cena a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000). Sofisticada, voltada para especialistas em finanças públicas, fauna pouco abundante no país. Essa Lei abriu caminho, permitiu que mais gente acessasse informação e passasse a acompanhar a execução dos orçamentos públicos.
Beirando uma década depois, no bojo de um tremendo escândalo denominado de Farra das Passagens Aéreas, a Câmara Federal aprovou a Lei da Transparência (Lei Complementar 131/2009), de nossa autoria. Sintonizada com a era digital, colocou as informações sobre gastos públicos diante dos nossos olhos. Ela foi inteiramente pensada para que qualquer cidadão, munido de um computador ou celular, possa acompanhar as despesas públicas, detalhadas em tempo real pela web. A partir daí, todos os entes públicos se viram obrigados a criar seus portais de transparência.
Para completar o tripé da cidadania, chega-nos em boa hora a Lei de Acesso à Informação (Lei No 12.527/2011), logo apelidada de LAI, que permite ao cidadão demandar informação de seu interesse aos órgãos públicos, por escrito, sem ter que justificar seu pedido. Também lhe garante o direito a receber resposta no prazo de vinte dias prorrogáveis por mais dez, e pune os recalcitrantes.
Essas três leis, frutos do avanço da democracia e da tecnologia digital, que evoluiu séculos nesse mesmo período, deram-se as mãos. Juntas, inundaram o Brasil de informação pública como jamais se imaginou um dia. Informação do nosso interesse, do tipo que mexe com nosso dia a dia. Para não sermos acometidos do fenômeno contemporâneo da “infobesidade”, ou seja, do excesso de informações, resta-nos agora aprender a usá-las em plenitude. Claro, isso é uma outra longa caminhada, que já começou por meio das redes sócias.
Por exemplo, no Facebook, já existem várias páginas voltadas para o acompanhamento e o controle social dos gastos públicos. Entre outras, destaco FiscalizaBr e Fiscaliza Agora. No entanto, o exemplo mais completo, que contempla a participação popular, pode ser encontrado nas páginas De Olho na Emenda, que surgiram a partir de exemplos concretos da aplicação do dinheiro público.
Na página do Facebook “De Olho na Emenda/Conjunto Embrapa”, o cidadão pode acompanhar ao vivo a realização de licitações referentes ao projeto, as transferências de recursos, ou as opiniões de moradores a respeito do andamento das obras. O que permite um controle multidimensionado do processo, ou seja, de vários ângulos.
O processo começou com uma emenda de quase um milhão de reais que inscrevi no Orçamento da União de 2014 para pavimentar uma parte do bairro Conjunto Embrapa. Quando o dinheiro foi depositado na conta da Prefeitura de Macapá, minha assessoria se reuniu com os moradores interessados no benefício. Consultados se gostariam de acompanhar e fiscalizar a execução física e financeira da obra, disseram que sim e tomaram a iniciativa de formar um grupo de WhatsApp por meio do qual informações relativas ao projeto passaram a circular em tempo real. Hoje, participam 58 pessoas, entre comunitários, técnicos da prefeitura e assessores dos meus gabinetes em Macapá e em Brasília.
E assim, diante dos olhos de todos, o projeto avança célere, sem risco de corrupção e na certeza de que a obra será de qualidade. Nossa expectativa é que essa experiência viralize. E que surjam em todo Brasil grupos de acompanhamento e fiscalização das emendas parlamentares.
Crédito: Artigo publicado dia 21/07 no Congresso em Foco – disponível na web 22/07/2016
Nota: O presente artigo não traduz a opinião do ASMETRO-SN. Sua publicação tem o propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.