“Greve foi menor que organizadores esperavam, mas maior que governo gostaria”.

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Não houve um balanço oficial sobre a quantidade de pessoas que aderiram à greve ou sobre os protestos espalhados nas principais capitais brasileiras. No entanto, para alguns analistas ouvidos pela BBC Brasil, o impacto delas só poderá ser medido efetivamente na semana que vem, quando parlamentares voltarem ao Congresso para debater as reformas criticadas pelo movimento.

Marco Antonio Teixeira, cientista político e professor do Departamento de Gestão Pública da FGV, resumiu: “Acho que as manifestações, apesar de grandes, não foram do tamanho que os manifestantes esperavam. “Por outro lado, elas também não foram tão pequenas quanto o governo gostaria.”

“O efeito nós vamos sentir na semana que vem, com o retorno das atividades do Congresso vai dar para medir quais serão os desdobramentos”, afirmou.

Manifestantes em São Paulo, dia 28 de abril de 2017Direito de imagemAFP
Image captionMilhares se reuniram no Largo da Batata, em São Paulo, e foram em direção a residência de Temer na cidade


A cientista política e pesquisadora do Cetesp-FGV, Lara Teixeira, também pontuou que ainda está cedo para entender os reflexos das mobilizações desta sexta.

“A gente não consegue mensurar quantas pessoas não foram trabalhar porque aderiram à greve e quantas não foram porque não conseguiram chegar ao trabalho. Mas o comércio, por exemplo, sentiu. O dia teve um movimento pior que de feriado, alguns comerciantes disseram. O transporte público parou o dia todo em São Paulo. Então é possível dizer que a greve foi sentida.”

“O impacto poderá ser sentido na decisão dos parlamentares quanto às reformas. Mas ainda é preciso esperar que eles comecem a se manifestar para saber se essa greve terá um efeito.”

No entanto, para Antonio Lavareda, cientista político da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), as manifestações “falharam”. Ele acredita que, por causa da baixa quantidade de pessoas na rua e dos incidentes de confronto, “os opositores às reformas fizeram um gol contra”.

A sexta-feira começou e terminou com greves e manifestações por todo o país. Convocadas pelas principais centrais sindicais brasileiras, elas tinham como alvo duas das principais medidas defendidas pelo governo de Michel Temer: a reforma trabalhista e a reforma da previdência.

Sinal de greve em Porto Alegre, Brasil, dia 28 de abril de 2017Direito de imagemREUTERS
Image captionNão há números oficiais de trabalhadores que aderiram à paralisação, mas sindicatos dizem que pode ter sido a maior da história do país

“O cidadão comum assistiu a um espetáculo de fogueiras acesas nas rodovias, barricadas no centro, o transporte público interrompido, aeroportos fechados. São manifestações com teor de violência muito elevado que não servem para esse trabalho que a oposição quer fazer, de mobilizar os cidadãos contra as reformas”, disse.

Questionado pela reportagem sobre qual seria o impacto dessa greve geral para o governo, Lavareda rejeitou a nomenclatura dada pelos organizadores do movimento. “Qual foi greve geral? A nomenclatura está equivocada. Para ser geral, precisa ao menos ser substancial. A greve só aconteceu nos transportes.”

Para ele, nem governo, nem Congresso sentirão qualquer impacto com a mobilização desta sexta-feira.

“Se fosse uma manifestação com adesão maciça da sociedade, isso intimidaria os congressistas. Mas ficou claro que eram setores específicos, então os parlamentares vão se sentir mais à vontade para votar as reformas sem pressão.”

Futuro das reformas

As principais reivindicações dos manifestantes são relacionadas às reformas que estão em pauta no Congresso. A trabalhista já passou na Câmara dos Deputados e agora tramitará no Senado, enquanto a da Previdência já foi rejeitada uma vez e deverá ser posta em pauta novamente em breve.

Marco Antonio Teixeira, da FGV, considera que a greve e as manifestações convocadas foram resultado da falta de diálogo do governo ao propô-las.

Manifestação na PaulistaDireito de imagemCESAR ITIBERÊ/ FOTOSPUBLICAS

“O governo está fechado para o diálogo porque não quer fazer concessão, ele está fechado com a planilha. E quando negociou, abriu diálogo para setores que já são privilegiados, o que deixou o povo mais insatisfeito”, disse.

Ele pontua que, diante das manifestações e da impopularidade da medida, parlamentares irão colocar na balança o possível “custo eleitoral” de um apoio à reforma.

“O que está em jogo pra muitos não é só apoiar ou não a reforma, mas é a eleição de 2018. Aí tem um paradoxo grande, porque o governo Temer já está devastado na avaliação da população. E o apoio parlamentar explícito na reforma da previdência pode ter um alto custo eleitoral.”

Antonio Lavareda, porém, acredita que as manifestações ficaram muito “radicalizadas e localizadas em setores sindicalistas, com penetração de black blocs” e que, por conta disso, acabarão “ajudando o governo” nas negociações para aprovar a reforma da previdência.

Policiais detém manifestante no Rio de Janeiro, dia 28 de abril de 2017Direito de imagemREUTERS
Image captionAtos contra as reformas do governo Temer no Rio tiveram confrontos entre manifestantes e policiais em diversos pontos do centro

Destaque

Ao longo do dia de manifestações, Michel Temer preferiu não se pronunciar publicamente, mas soltou uma nota oficial do governo ao final da tarde se posicionando sobre os atos.

Ele afirma que “houve a mais ampla garantia ao direito de expressão, mesmo nas menores aglomerações” de manifestantes.

“Infelizmente, pequenos grupos bloquearam rodovias e avenidas para impedir o direito de ir e vir do cidadão, que acabou impossibilitado de chegar ao seu local de trabalho ou de transitar livremente. Fatos isolados de violência também foram registrados, como os lamentáveis e graves incidentes ocorridos no Rio de Janeiro”, diz o comunicado, que termina sinalizando a continuidade das reformas.

“O trabalho em prol da modernização da legislação nacional continuará, com debate amplo e franco, realizado na arena adequada para essa discussão, que é o Congresso Nacional”.

Ainda na manhã de sexta, no entanto, o ministro da Justiça, Osmar Serraglio, disse à Rádio CBN que a greve se limitaria a sindicalistas e que “inexiste”.

“Você pega milhares de pessoas obstruídas por 15, 20, 50 pessoas. As pessoas estão querendo ir trabalhar e estão sendo obstruídas”, afirmou.

Para cientistas políticos ouvidos pela BBC Brasil, porém, quem se destacou mais diante de toda a situação foi principalmente o prefeito de São Paulo, João Doria.

“É curioso que o Doria falou mais sobre uma greve do que o próprio Temer, que era o alvo dela. O Doria está chamando a todo momento o debate nacional pra ele, na perspectiva de enfrentamento. Hoje, ele chamou o pessoal que participa da greve de ‘vagabundo’. Está mais agressivo do que o próprio alvo dos grevistas, que é o governo federal”, pontuou Marco Antonio Teixeira, que aposta na candidatura do tucano para a Presidência em 2018.

“O Doria não saiu de campanha até agora. A questão é se ele vai ter fôlego pra continuar em campanha até outubro de 2018. Está muito claro que ele continua em campanha, mas não sei nem se ele tem clareza pra quê”, observou Lara Mesquita.

Ônibus queimado em manifestação no Rio de Janeiro, em 28 de abrilDireito de imagemREUTERS
Image captionPelo menos cinco ônibus foram incendiados por manifestantes no Rio de Janeiro

Dia de greve

Mais de 150 cidades em todos os Estados registraram paralisações e protestos contra as reformas Trabalhista e da Previdência nesta sexta-feira, quando movimentos sociais e sindicatos convocaram uma greve geral.

Desde o início da manhã, categorias de trabalhadores bloquearam vias em Vitória, Florianópolis, Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Brasília, Recife, São Luís, Boa Vista e outras cidades. Na maioria dos casos, a Polícia Militar dispersou manifestantes com bombas de gás lacrimogêneo.

Nas capitais, lojas e bancos ficaram fechados, além de escolas municipais e estaduais. Em São Paulo, colégios particulares também aderiram.

Em São Paulo, a Polícia Militar dispersou o bloqueio do acesso ao aeroporto de Guarulhos e impediu uma manifestação dentro do aeroporto de Congonhas.

À noite, cerca de dezenas de milhares de pessoas se reuniram no Largo da Batata, na zona Oeste da cidade. Manifestantes cantavam “essa reforma não vai passar, o povo na rua vai barrar”. Eles seguiram para a casa do presidente Michel Temer, no bairro do Alto de Pinheiros, onde houve confronto com a polícia, que dispersou manifestantes com bombas de gás e balas de borracha. Ao todo, a PM divulgou ter prendido 36 pessoas em todo o Estado nas manifestações.

Em capitais como Salvador e Recife as linhas de ônibus deixaram de funcionar completamente por 24 horas. Em São Paulo, no Rio e em Belo Horizonte, a paralisação foi parcial. Metrôs e trens funcionaram parcialmente na maioria das cidades.

Manifestantes em Recife, dia 28 de abril de 2017Direito de imagemMARINA L’AMOUR
Image captionEm Recife e Salvador, paralisação de ônibus foi total; mais de 150 cidades tiveram manifestações

Em Manaus, a Polícia Civil também se manifestou contra as reformas e suspendeu o abastecimento dos carros.

Em Teresina, agentes penitenciários anunciaram paralisação por 24 horas e dizem que não vão receber presos nos presídios.

O centro do Rio de Janeiro teve confronto em militares e manifestantes em diversos pontos. Desde a madrugada da sexta-feira, ao menos cinco ônibus foram incendiados. No início da noite, ainda havia cenas de violência na cidade.

Até o momento, não há estimativas finais da Polícia Militar para manifestações pelo país, nem números oficiais de quantos trabalhadores pararam as atividades, mas centrais sindicais dizem que paralisação é a maior da história do Brasil – teria ultrapassado a adesão de 35 milhões de pessoas conseguida em 1989.

A greve foi convocada pelas principais entidades sindicais do Brasil: CUT (Central Única dos Trabalhadores), CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), Intersindical, CSP-Conlutas (Central Sindical e Popular), UGT (União Geral dos Trabalhadores), Força Sindical, Nova Central, CSB (Central dos Sindicatos Brasileiros) e CGTB (Central Geral dos Trabalhadores do Brasil).

Crédito: Camilla Costa e Renata Mendonça da BBC Brasil em São Paulo – disponível na internet 29/04/2017

Protestos fecham vias e transporte é afetado em dia de paralisação contra reformas no país.

Bloqueio na Dutra, nas primeiras horas do dia, em São José dos Campos
28/4/2017 REUTERS/Roosevelt Cassio

A greve geral realizada nesta sexta-feira para protestar contra as reformas trabalhista e da Previdência teve como ponto principal a adesão dos trabalhadores dos transportes públicos e manifestações e bloqueios em importantes vias de diversas cidades do país.

Segundo as centrais sindicais, além dos funcionários dos transportes públicos, também aderiram à paralisação portuários, aeroviários, professores, petroleiros, metalúrgicos e bancários, entre outros trabalhadores.

Ao menos 16 pessoas foram detidas em São Paulo por participação em conflitos com a polícia durante os protestos, e um policial militar ficou ferido, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública do Estado. Também houve confrontos entre manifestantes e a polícia perto da rodoviária do Rio de Janeiro, com uso de gás lacrimogêneo.

“Acho que essa greve tinha que ter parado tudo e ninguém vir. A reforma trabalhista não tem que ser como eles estão querendo fazer e a reforma da Previdência também, a gente morre e não aposenta”, disse Lurdes da Silva, auxiliar de limpeza em São Paulo, de 51 anos, que teve problemas para pegar o trem a caminho do trabalho.

Mas a paralisação não foi unanimidade. Várias pessoas que tentavam chegar a seus locais de trabalho reclamavam da falta de transporte.

Mulher passa por faixa sobre greve geral no Rio de Janeiro
28/4/2017 REUTERS/Sergio Moraes

“Greve? Eu preciso trabalhar. O pessoal está com medo é de perder o emprego, a gente que tem trabalho tem mais é que agradecer todo dia”, disse Michelle Barbosa, funcionária de uma padaria que abriu normalmente no centro do Rio.

Os serviços de metrô, trem e ônibus de São Paulo estavam paralisados no início da manhã, apesar de decisões judiciais obtidas pela prefeitura e o governo do Estado que determinam o funcionamento de ao menos um percentual do sistema de transporte coletivo, sob pena de multa em casos de descumprimento.

O metrô voltou a funcionar parcialmente ao longo da manhã, assim como os trens urbanos. Entre as seis linhas de metrô de São Paulo, duas estavam paralisadas, duas tinham funcionamento parcial e duas estavam operando normalmente, segundo balanço da operadora às 16h03.

Os ônibus não estavam circulando, com exceção dos micro-ônibus que prestam serviços locais.

Houve protesto no saguão de embarque do aeroporto de Brasília, atrasando procedimentos de viagens, assim como em outros aeroportos, mas 77 por cento dos voos do país estavam no horário, enquanto 5 por cento foram cancelados e 16,4 por cento sofreram atraso, segundo balanço da estatal Infraero divulgado às 17h.

Em São Paulo, a avenida 23 de Maio, uma das principais artérias de ligação da cidade, foi uma das diversas vias fechadas com barricadas em chamas, e manifestantes também bloquearam temporariamente uma rodovia de acesso ao porto de Santos, o maior do país, em Cubatão. Policiais foram acionados para tentar liberar as vias.

No final da tarde, uma grande manifestação acontecia no Largo da Batata, na zona oeste da cidade.

No Rio de Janeiro, houve protestos no acesso ao aeroporto Santos Dumont e alguns passageiros tiveram que descer de carros e táxis e seguir a pé para tentar chegar a tempo ao terminal no centro da cidade. Manifestantes também bloquearam a Ponte Rio-Niterói logo cedo nos dois sentidos, assim como diversas outras vias importantes.

No final da tarde, grupos mascarados se misturaram a manifestantes diante da Assembleia Legislativa do Estado, gerando reação de homens da Força de Segurança Nacional. [nL1N1I0229]

REFORMAS

O dia de paralisações ocorre na mesma semana em que a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de reforma trabalhista que tem como eixo principal a prevalência dos acordos e negociações sobre a legislação vigente, e em meio à tramitação da reforma da Previdência.

A reforma trabalhista também retira a obrigatoriedade da contribuição sindical, o que tem sido apontado como um enfraquecimento das centrais sindicais.[nL1N1HZ0FE]

A greve geral foi convocado como protesto contra ambos os projetos, alegando que vão tirar direitos e prejudicar os trabalhadores, enquanto o governo defende que as duas reformas são fundamentais para a recuperação econômica do país, que enfrenta a pior recessão da história.

“É um movimento legítimo, apesar de muitas pessoas tentarem esvaziar esses movimentos por uma questão ideológica”, disse a advogada Eduarda Bolso, que foi trabalhar normalmente no centro do Rio. “No fundo acho que o panorama não tem outro jeito. Chegou a um extremo, acho que é a única maneira de realmente enxergarem o quão grave é a situação política atual do país.”

Sindicalistas comemoraram os resultados da greve, com o presidente da Força Sindical, o deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), o Paulinho da Força, estimando a adesão em 40 milhões de trabalhadores.

“O recado foi dado. O governo agora terá oportunidade de abrir negociações para fazer uma reforma justa e civilizada”, disse Paulinho a jornalistas. A CUT não fez uma estimativa com números, dizendo que todos aderiram à paralisação.

Já o governo considerou o movimento “pífio”.

“Não há nem direito o que avaliar. Há uma tranquilidade no país”, disse à Reuters o ministro da Justiça, Osmar Serraglio. “Houve o chamado para uma ‘greve geral’, que é uma coisa para impressionar, mas foi um movimento pífio. Está tudo funcionando, os serviços, a indústria.”

Crédito: Pedro Fonseca  com reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier e Maria Clara Pestre, no Rio de Janeiro; Anthony Boadle, em Brasília; e Laís Martins e Thais Freitas, em São Paulo/Reuters Brasil – disponível na internet 29/04/2017

 

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