Em 6 pontos, o que acontecerá com Lula após o julgamento desta quarta-feira?

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Quando os três desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) se reunirem na manhã desta quarta-feira para decidir se mantém ou não a sentença do juiz Sérgio Moro contra o ex-presidente Lula (PT), o ex-metalúrgico já terá completado mais de seis meses em campanha aberta, vestindo o figurino de candidato presidencial para 2018.

Lula lidera as pesquisas de intenção de voto até o momento, o que faz com que o julgamento em Porto Alegre extrapole o aspecto jurídico e tenha implicações políticas consideráveis. No último levantamento do Instituto Datafolha, divulgado no começo de dezembro, Lula tinha entre 34% e 37% das intenções de voto, a depender dos opositores testados.

Uma eventual condenação no TRF-4 pode tirar o petista da disputa. Se condenado, Lula pode sofrer os efeitos da Lei da Ficha Limpa e, em tese, ficar inelegível.

O julgamento na segunda instância acontece oito meses depois da decisão do juiz federal Sérgio Moro, que condenou o petista a nove anos e meio de prisão, pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. O MPF acusa Lula de receber propina da construtora OAS por meio de um apartamento tríplex no Guarujá (SP). O ex-presidente nega ter cometido qualquer crime.

Lula em Itinga (MG)
Image caption Em caravanas pelo Brasil, Lula se comportou como candidato presidencial | foto: André Shalders / BBC Brasil

1. Quais recursos Lula pode apresentar e quem os julgará?

Depois de proferida a decisão dos desembargadores, Lula e o MPF serão oficialmente notificados do resultado – o que pode levar alguns dias para acontecer. Apenas a partir daí, os dois lados poderão recorrer.

No próprio tribunal de Porto Alegre, Lula pode ter duas opções diferentes de recursos:

Embargos de declaração: visa apenas esclarecer qualquer omissão ou trecho confuso da decisão dos três desembargadores. Este tipo de embargo não pode mudar a decisão final, mas atrasa a tramitação do processo para outras instâncias. Embargos de declaração do MPF ou de Lula deverão ser julgados pelos mesmos desembargadores: João Pedro Gebran Neto (relator do caso de Lula), Leandro Paulsen (presidente da 8ª Turma) e Victor dos Santos Laus.

Embargos de divergência (ou infringentes): Só poderão ser apresentados se houver divergência de votos entre os três desembargadores, ou seja, se o placar for de 2 a 1 pela condenação ou pela absolvição. Mesmo se os três mantiverem a sentença de Moro, mas aplicarem penas diferentes a Lula, o ex-presidente também poderá questionar essas diferenças, diz a criminalista Fernanda de Almeida Carneiro. Além dos três desembargadores responsáveis pelo caso Lula, outros três participam de um eventual julgamento de embargos de divergência. São eles: Márcio Antônio Rocha, Salise Sanchotene e Claudia Cristofani.

Os dois recursos podem se estender por meses, especialmente porque dois dos três desembargadores do caso Lula sairão de férias, em sequência, a partir de segunda-feira (29). O último deles, Victor Laus, só volta ao trabalho em 22 de março.

Lula e Chico Buarque
Image caption Lula e o compositor Chico Buarque jogando futebol em evento do MST | foto: Ricardo Stuckert / Instituto Lula
O advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, disse à BBC Brasil que acredita em uma decisão favorável no TRF-4. Mas, se a condenação for mantida, a defesa vai esgotar as possibilidades de recursos, tanto no TRF quanto nos tribunais superiores (STJ e STF), em Brasília.

“Entendemos que a defesa demonstrou de forma clara a fragilidade da sentença. E o único resultado possível, se houver um julgamento técnico, é a absolvição”, diz Cristiano Zanin Martins, advogado de Lula, à BBC Brasil.

Para Zanin, há dois problemas principais com a sentença de Moro: o MPF não conseguiu traçar o “caminho do dinheiro”, dos contratos supostamente fraudados da Petrobras até o triplex do Guarujá; e a acusação também não teria mostrado qual foi o ato específico de Lula em retribuição à suposta propina, o que é necessário para caracterizar o crime de corrupção.

2. O ex-presidente vai ser preso?

É muito improvável que Lula seja preso logo após o julgamento, mesmo em caso de condenação.

Lula em ato político em Mariana (MG)
Image caption O ex-presidente participa de protesto em Mariana (MG) onde houve desastre ambiental | foto: Ricardo Stuckert / Instituto Lula
O TRF-4 disse, por meio da assessoria de imprensa, que um eventual mandado de prisão só será emitido depois que todos os recursos possíveis no próprio tribunal forem julgados, o que demoraria pelo menos um mês. E mesmo depois de decididos os recursos, a prisão não é certa.

Pessoas ligadas à força-tarefa da Lava Jato no MPF disseram à BBC Brasil, sob anonimato, que não há razão para antecipar a prisão do ex-presidente. Na última quinta-feira, o MPF divulgou uma nota à imprensa com o mesmo teor.

Hoje, o Supremo Tribunal Federal entende que o réu pode começar a cumprir a sentença após ser condenado pela 2ª Instância, e não que a prisão é obrigatória, diz a criminalista Fernanda de Almeida Carneiro, professora do Instituto de Direito Público, o IDP.

“O que o STF disse foi que a execução provisória da pena não fere o princípio da presunção de inocência (todos são inocentes até a prova em contrário). O tribunal não mandou que prendesse depois da 2ª Instância. Isso caberá aos três desembargadores decidir. Podem deixar o Lula esgotar os recursos possíveis, até o trânsito em julgado (quando não dá mais para recorrer)”, diz ela.

Ainda segundo a criminalista, caberia a um juiz de execução penal, e não aos desembargadores do TRF-4, definir onde Lula seria preso, fosse esse o caso. A princípio, diz Fernanda Carneiro, o local de cumprimento da pena deve ser o mais próximo possível da casa do condenado. Ou seja, é improvável que Lula, se condenado, cumpra pena em Curitiba (PR).

3. Lula tem chances de concorrer à eleição após o julgamento?

Se for inocentado no TRF-4, Lula poderá concorrer. Se for condenado, em tese estará impedido de ser candidato, pela Lei da Ficha Limpa. Ironicamente, foi o próprio Lula quem sancionou a lei em 2010.

Sérgio Moro
Image caption O juiz Sérgio Moro é alvo frequente de críticas do PT | foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Um advogado eleitoral ouvido sob anonimato pela BBC Brasil disse que é pouco provável que o TRF-4 não tenha terminado de analisar os recursos até o dia 17 de setembro, fim do prazo para o TSE julgar os registros de candidatura. Para o advogado, é improvável que o Tribunal deixe Lula concorrer em caso de condenação.

“Na condenação criminal, não é comum o TSE liberar a candidatura”, diz o advogado, que participou do julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE em junho passado.

Já o advogado de Lula, Cristiano Zanin, pensa de forma diferente. “Qualquer que seja o resultado, isso não inviabiliza uma eventual candidatura do ex-presidente. A candidatura terá que ser discutida na Justiça Eleitoral, a partir do registro”, diz ele, mencionando a possibilidade de recursos ao próprio TSE, ao STJ e ao STF.

4. Lula poderá continuar agindo como pré-candidato do PT à eleição depois do dia 24 de janeiro?

Sim. Se o tribunal inocentar Lula, as atividades do ex-presidente seguem normalmente. Mas mesmo que a condenação seja mantida, o petista igualmente poderá continuar fazendo suas caravanas pelo Brasil, ao menos pelos próximos meses.

A defesa do ex-presidente já disse que vai recorrer em caso de decisão negativa. E quem decide se Lula pode ou não ser candidato não é o TRF-4, mas o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília. Mesmo com uma condenação, o PT poderá pedir o registro da candidatura de Lula a partir do dia 20 de julho, e o prazo acaba em 15 de agosto.

Sede do TSE em Brasília
Image caption É o TSE, em Brasília, que julgará o pedido de candidatura de Lula | foto TSE / Divulgação
Depois disso, há um prazo de alguns dias para que outros partidos, o Ministério Público ou mesmo cidadãos questionem as candidaturas apresentadas, inclusive a de Lula.

O julgamento da chamada “impugnação de candidatura” tem diversas etapas, e pode se estender até 17 de setembro, prazo limite para que o TSE decida se concede ou não o registro. A data também marca o limite para o PT trocar de candidato presidencial, se for o caso.

Depois de uma eventual decisão negativa do TSE, a defesa ainda poderá recorrer no próprio tribunal eleitoral, e, posteriormente, no STF.

No TSE, Lula pode usar os chamados “embargos de declaração”, cujo objetivo é esclarecer qualquer omissão ou ponto obscuro da sentença dos ministros. Há dúvidas, porém, sobre se o TSE precisa aguardar o julgamento deste recurso ou de eventual apelação ao STF para só então cassar o registro da candidatura.

5. Se for condenado, Lula ainda poderá viajar para a África como planejou?

Provavelmente, sim. Qualquer que seja o resultado do julgamento, o ex-presidente tem como primeiro compromisso marcado logo depois do julgamento uma viagem para a capital da Etiópia, Addis Abeba. Lula deve participar de um debate sobre o combate à fome no continente, organizado pela União Africana, no dia 27 de fevereiro. Questionada sobre quem está custeando a viagem, a assessoria de imprensa do ex-presidente se limitou a informar que “ele foi convidado” pela União Africana.

Geraldo Alckmin durante entrevista
Image caption O governador de SP, Geraldo Alckmin, é um dos que pode se beneficiar da saída de Lula | foto: Wilson Dias/Agência Brasil
A dúvida é se Lula teria o passaporte apreendido após uma eventual condenação, o que inviabilizaria a viagem. Segundo a advogada criminalista Fernanda de Almeida Carneiro, a apreensão do passaporte é pouco provável. “Só poderia ocorrer se o MPF entender que Lula tem a intenção de fugir do país. Um pedido teria de ser feito ao TRF-4, a quem caberia decidir a questão”, diz ela.

A assessoria do ex-presidente Lula disse à BBC Brasil que ele foi convidado para o evento há mais de um ano, muito antes da definição da data do julgamento pelo TRF-4. A assessoria diz ainda que ele voltará ao Brasil no dia seguinte ao debate.

6.Como o julgamento de Lula afeta seus adversários políticos?

A decisão do TRF-4 não afetará só o petista: todos os demais candidatos e partidos estão atentos ao resultado do julgamento em Porto Alegre nesta quarta-feira. Para o mundo político, embora uma condenação não tire o petista da corrida imediatamente, ela abriria essa possibilidade e abriria oportunidades para outros candidatos.

“O impacto é aritmético. O PT tem de 18 a 20% do eleitorado como público cativo. Já o Lula tem 33%. Ele sempre foi muito maior que o PT. E um possível candidato petista, seja o (Fernando) Haddad (ex-prefeito de SP) ou o (ex-ministro) Jaques Wagner, começa patinando ali nos 8%”, diz o deputado federal Marcus Pestana (PSDB-MG), considerado um dos principais estrategistas tucanos. “Uma coisa é a eleição com o Lula, e outra sem o Lula”, resume ele.

Pestana rechaça o discurso de que Lula é vítima de “perseguição” de juízes e procuradores. “Não há atuação política de Moro, nem da 2ª Instância, nem do STF. Ocorreram excessos? Sim. Mas não perseguição. A investigação atingiu a todos, principalmente os maiores partidos. E o PT está no centro da crise, porque comandou o esquema criminoso”, diz o deputado.

Marina Silva discursa
Image caption Miro Teixeira diz que candidatura de Marina é sólida por si mesma, independentemente de Lula | foto: Elza Fiúza/Agência Brasil
Para o deputado federal Miro Teixeira (Rede-RJ) admite que seria “estranho” uma eleição sem Lula. “Esse é um julgamento incomum. A decisão não trará implicações exclusivamente para o réu, terá repercussão na vida eleitoral do país”, diz ele, que defende a candidatura de Marina Silva (Rede).

Para Miro, é impossível saber exatamente como se dará a transferência de votos de Lula, caso ele seja impedido de concorrer. Além disso, “pesquisa é a fotografia de um momento. O filme continua, e eleições podem ter resultados totalmente diversos do que foi detectado nesses levantamentos até agora”, diz.

Em público, os principais líderes políticos do país dizem preferir uma eleição com Lula: foi o que fizeram Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Rodrigo Maia (DEM-RJ) e até o atual ministro da Fazenda e presidenciável, Henrique Meirelles (PSD).

Mas o que acontece depois do julgamento? A resposta da política pode ser ainda mais complicada do que parece ser o imbróglio jurídico.

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