Só quando o dia terminar é que se saberá o resultado do julgamento de Lula no TRF-4. 3 a 0? 2 a 1? Passarão alguns meses para que se chegue ao desfecho de todos os recursos que a lei permite, e aí fica embutida outra pergunta: o retrato de Lula estará na urna eletrônica no dia 7 de outubro?
Hoje fecha-se um ciclo da vida política brasileira, o da ideia de um partido de trabalhadores, que resultou na criação do PT. Fecha-se um ciclo, e começa outro, pois nem Lula nem o PT acabarão.
Exatamente no dia 24 de janeiro de 1979, no Colégio Salesiano da cidade paulista de Lins, um congresso de metalúrgicos aprovou uma tese “chamando todos os trabalhadores brasileiros a se unificarem na construção de seu partido, o Partido dos Trabalhadores”. Criou-se uma comissão para cuidar do assunto, e nela estava Jacó Bittar, do Sindicato dos Petroleiros de Paulínia.
Lula, a estrela desse renascimento do sindicalismo, explicou a essência da iniciativa: “Pouca gente está mais preparada que a classe trabalhadora para assumir uma responsabilidade política deste nível. Não podemos ficar esperando a democracia das elites. Os trabalhadores não devem confundir o Partido dos Trabalhadores com o PTB, MDB ou Arena.” (A Arena era o partido do regime agonizante, virou PDS, PFL e, mais tarde, DEM.)
No poder, o Partido dos Trabalhadores foi o partido de alguns trabalhadores. A primeira proposta do Congresso de Lins era a “total desvinculação dos órgãos sindicais do aparelho estatal, ponto fundamental para o desenvolvimento da vida sindical”. O imposto sindical, que sustenta cartórios de patrões e empregados, foi preservado nos 14 anos de poder petista. Extinguiu-o a reforma trabalhista de Michel Temer.
Do grupo de Lins, Jacó Bittar, o “Turcão”, elegeu-se prefeito de Campinas em 1988 e dois anos depois deixou o PT. Foi condenado em duas instâncias por atos de improbidade administrativa.
Depois da vitória petista de 2002, Lula colocou Bittar no conselho do fundo de pensão da Petrobras. Dois anos depois, ele ganhou uma Bolsa Ditadura de R$ 7 mil mensais por conta de sua demissão da Petrobras. Seus dois filhos, Fernando e Kalil, associaram-se a Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, em empresas de entretenimento e tecnologia digital mimadas com contratos de operadoras de telefonia. Nelas, Lulinha teve um rendimento de R$ 5,2 milhões entre 2004 e 2014.
Fernando Bittar é um dos donos da propriedade onde está o sítio Santa Bárbara, em Atibaia. Lá, a Odebrecht gastou R$ 700 mil em obras, e a OAS pagou a cozinha. Nos armários de uma das quatro suítes da casa havia roupas com as iniciais de Lula. Isso e mais uma agenda com seu nome achada numa sala.
Veículos a serviço de Lula estiveram no sítio 270 vezes. Entre 2012 e 2016, sete servidores que trabalham com ele receberam 1.090 diárias por terem ido a Atibaia. Cerca de 50 e-mails de funcionários do sítio e do Instituto Lula relacionam o ex-presidente com a propriedade. Num deles, cuidava-se de identificar o bicho que comera os marrecos do lago. Teria sido uma jaguatirica.
Lula assegura que a propriedade não é dele. Esse sítio nada tem a ver com o apartamento do Guarujá que, segundo Lula, também não é dele. O processo de Atibaia ainda está com o juiz Sergio Moro.
Há dois anos ladrões entraram no sítio, levando vinhos e charutos. Foram presos dois suspeitos, mas a queixa foi retirada.
Artigo publicado na Folha de São Paulo – disponível na internet 24/01/2018
Nota: O presente artigo não traduz necessariamente a opinião do ASMETRO-SN. Sua publicação tem o propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.