Nota técnica defende cobrança de contribuição de todos os trabalhadores após assembleia
A Secretaria de Relações do Trabalho, do Ministério do Trabalho, defende a cobrança do imposto sindical de todos os trabalhadores de uma categoria após a aprovação em assembleia.
A contribuição passou a ser voluntária com a reforma trabalhista, em vigor desde novembro. Pelo entendimento da nova lei, o imposto só pode ser cobrado do trabalhador que der autorização individual por escrito.
A nota técnica nº 2/2018, assinada pelo secretário Carlos Cavalcante Lacerda, devolve aos sindicatos um direito que é interpretado como uma decisão do trabalhador.
“Sem a contribuição, pequenos sindicatos não vão sobreviver. A nota pode ser usada para os sindicatos embasarem o entendimento de que a assembleia é soberana”, afirmou Lacerda.
Advogados trabalhistas e o setor patronal criticam o parecer. Sindicalistas comemoram a nota do secretário do governo Michel Temer.
“O Ministério do Trabalho adotou uma posição de equilíbrio”, disse Ricardo Patah, presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores).
Sindicatos como o dos comércios de São Paulo, base de Patah, têm realizado assembleias gerais com a participação de uma parcela da categoria para impor a taxa a todos os trabalhadores.
Reportagem da Folha mostrou que as empresas só vão descontar contribuição autorizada individualmente.
“A posição da Fecomercio se mantém [contrária ao recolhimento] até que o STF [Supremo Tribunal Federal] se posicione”, disse Ivo Dall’Acqua Junior, vice-presidente da FecomercioSP (federação do setor patronal do comércio no estado de São Paulo).
Tanto o Supremo como a Justiça do Trabalho têm sido bombardeados com ações pela volta da obrigatoriedade da contribuição sindical.
Para Dall’Acqua, o documento do ministério é inepto. “Notas técnicas são orientadoras de fiscalização, mas o texto não foi feito pela área competente, de auditores fiscais. A secretaria ultrapassou sua competência.”
O documento, porém, diz que a secretaria tem autoridade para emitir parecer técnico sobre legislação sindical.
A nota ainda recorre a uma argumentação jurídica: “Não se desconhece que a Constituição Federal de 1988 deu brilho às entidades sindicais. Reconheceu, inclusive, a força da instrumentalidade coletiva advinda da negociação coletiva (art. 7º)”.
OPORTUNISMO
O professor de Direito do Trabalho da FGV Direito SP e da PUC-SP Paulo Sergio João disse que a nota é uma orientação oportunista.
“Só satisfaz entidades que questionam o fim da obrigatoriedade. Não tem valor técnico nem jurídico”, afirmou.
De acordo com João, com o parecer, o ministério só atende a um pedido de socorro dos sindicatos dos trabalhadores. “O efeito político é lamentável e revela um sindicalismo atrelado ao Estado”, disse o professor.
Lacerda, secretário de Relações do Trabalho, é ligado à Força Sindical e filiado ao Solidariedade, do deputado Paulinho da Força (SD-SP).
O secretário, apesar da repercussão da nota no meio sindical, ainda vai submeter o entendimento à assessoria jurídica do órgão.
PRESIDENTE DO TST SUSPENDE COBRANÇA OBRIGATÓRIA
O presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho), ministro João Batista Brito Pereira, proibiu o recolhimento obrigatório do imposto sindical de trabalhadores de empresas que operam no porto de Santos (SP). A decisão é liminar (provisória).
A sentença beneficiou a Aliança Navegação e Logística e a HamburgSüd Brasil.
O Settaport (sindicato dos trabalhadores) entrou na Justiça do Trabalho para receber o imposto, referente a um dia de trabalho de março.
O pedido foi acatado em primeira instância e mantido pela desembargadora Ivete Ribeiro do TRT-2 (Tribunal Regional do Trabalho).
As empresas recorreram à Corregedoria-Geral, com uma correição parcial. Elas alegaram que o recolhimento do imposto, antes do julgamento final, geraria prejuízos.
A decisão de 26 de março diz “que o imediato cumprimento da determinação de recolhimento de contribuição sindical de todos os empregados em decisão antecipatória de tutela consubstancia lesão de difícil reparação”.
Brito Pereira suspendeu a cobrança “até que ocorra o exame da matéria pelo órgão jurisdicional competente”.
Em nota, as empresas informaram que recorreram ao TST após queixas dos empregados contra a taxa. “Após a aprovação da reforma trabalhista, o recolhimento passou a ser uma opção.”
O advogado do Settaport, Douglas de Souza, alega que a contribuição tem natureza tributária. “Há uma inconstitucionalidade formal na reforma trabalhista, porque só se pode acabar com tributo por lei complementar.”
Crédito: Anaïs Fernandes e Willian Castanho/Folha de São Paulo 02/04/2018
O que muda com a nova lei trabalhista, e o que os tribunais ainda podem rever ( publicado em 11/11/2017 e atualizado em 15/11/2017)
Na terça (13), o governo baixou medida provisória que altera alguns artigos da nova lei. Ela vale por 120 dias e perderá seus efeitos se não for aprovada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado até lá. O Congresso também poderá fazer novas alterações na lei ao analisar a medida provisória.
Acordos coletivos podem prevalecer sobre a legislação em vários casos. Os juízes trabalhistas já adotam esse princípio há algum tempo nos casos em que os acordos são mais benéficos. A nova lei define situações em que isso pode ocorrer e garante proteção a direitos trabalhistas assegurados pela Constituição
O que pode ser negociado
- Jornada de trabalho
- Banco de horas
- Intervalo para almoço
- Plano de cargos e salários
- Representação dos trabalhadores no local de trabalho
- Teletrabalho, trabalho intermitente e regime de sobreaviso
- Remuneração por produtividade, incluindo gorjetas e prêmios
- Participação nos lucros ou resultados
- Trabalho em ambientes insalubres
O que não pode ser negociado
- Salário mínimo
- FGTS
- Valor do 13º salário
- Remuneração do trabalho noturno superior à do diurno
- Horas extras, no mínimo de 50%
- Repouso semanal remunerado
- Férias anuais, com adicional de um terço
- Salário-família
- Licença-maternidade e licença-paternidade
- Aviso prévio
- Seguro-desemprego
- Normas de saúde, higiene e segurança do trabalho
- Adicional para atividades penosas, insalubres ou perigosas
- Seguro contra acidentes de trabalho
- Prazo de prescrição para ações trabalhistas
- Proibição de discriminação de deficientes
- Proibição do trabalho de menores de 16 e restrições para menores de 18
- Liberdade de associação sindical
- Direito de greve
Juízes afirmam que a Constituição proíbe acordos que reduzam ou suprimam direitos e garante que a norma mais benéfica seja aplicada sempre que houver dúvidas
–
JORNADA DE TRABALHO
Patrões e empregados podem negociar de várias maneiras a jornada de trabalho a ser cumprida, desde que os limites previstos pela Constituição e pela legislação sejam respeitados. Esses arranjos dão mais flexibilidade aos trabalhadores e às empresas e podem regularizar situações que atualmente ocorrem na informalidade
Banco de horas
Trabalhadores poderão negociar individualmente com as empresas seu banco de horas, desde que a compensação das horas ocorra em no máximo seis meses
Vantagem Flexibilidade nas negociações do sistema, ao qual muitos sindicatos se opõem
Juízes dizem que a Constituição exige acordo coletivo nesses casos
Jornada 12 x 36
Trabalhadores poderão negociar jornadas de até 12 horas se forem seguidas de 36 horas de descanso, modelo que já é comum em áreas como saúde e segurança
Vantagem A lei permite negociação individual desses contratos, sem participação de sindicatos, mas a medida provisória elimina essa possibilidade
Juízes dizem que a Constituição exige acordo coletivo nesses casos
Jornada parcial
Contratados para cumprir jornada parcial podem trabalhar até 30 horas por semana, ou 26 horas mais 6 horas extras. Antes, o limite para esses contratos era de 25 horas
Vantagens Horários mais flexíveis para estudantes e quem tem filhos pequenos, e redução de custos para empresas
LIMITES MANTIDOS
Jornada
Novos contratos devem respeitar os limites que já eram previstos pela legislação antiga
- 8 horas por dia
- 44 horas por semana
- 220 horas por mês
- 2 horas extras por dia
Horas extras
Quanto a lei manda pagar, além do valor da hora normal
- 50% no mínimo
- 100% em domingos e feriados
- 20% adicionais para horas extras cumpridas entre 22h e 5h
–
CONDIÇÕES DE TRABALHO
A negociação do tempo de descanso e do tempo gasto no trajeto da casa para o trabalho fica mais fácil. Com isso, a reforma abre caminho para redução de custos nas empresas. O artigo da nova lei que permite o trabalho de mulheres grávidas em ambientes insalubres pode criar controvérsia mesmo após ajustes feitos pela medida provisória
Descanso
O intervalo para descanso e alimentação durante a jornada de trabalho pode ser de no mínimo 30 minutos. Antes, a lei exigia no mínimo uma hora
Vantagens Trabalhadores podem encerrar o expediente e voltar para casa mais cedo, e empresas podem evitar horas extras
Juízes acham que o intervalo é uma das normas sobre saúde e segurança que não podem ser negociadas sem violar a Constituição
Horas de trajeto
O tempo gasto até o trabalho e na volta para casa não deve ser contado como parte da jornada quando a empresa fornece transporte aos empregado
Vantagem Garantia de transporte a empregados com custo menor para empresas
Juízes dizem que o tempo gasto no trajeto deve ser remunerado como parte da jornada de trabalho
Férias
Poderão ser parceladas em até três vezes, desde que um dos períodos seja de pelo menos 14 dias corridos e os outros de pelo menos 5
Vantagem Maior flexibilidade para trabalhadores e empresas
Grávidas e lactantes
Mulheres grávidas ou lactantes poderão trabalhar em ambientes insalubres se o risco para a mãe e o bebê for considerado baixo por um médico
Vantagem O trabalho nesses ambientes só será permitido para uma mulher grávida se ela apresentar atestado médico apontando risco médio ou mínimo, e as lactantes poderão ser afastadas se apresentarem atestado em qualquer situação
Juízes acham que condições de trabalho em ambientes insalubres fazem parte de normas sobre saúde e segurança que não podem ser negociadas sem desrespeitar a Constituição
Trabalhadores hiperssuficientes
Profissionais com ensino superior e salário maior do que R$ 11 mil poderão negociar individualmente com as empresas
Vantagem Maior flexibilidade para trabalhadores e empresas
Juízes afirmam que a Constituição proíbe acordos que reduzam direitos e garante que a norma mais benéfica seja aplicada sempre que houver dúvidas
–
SALÁRIOS E BENEFÍCIOS
A nova lei procura dar maior segurança jurídica às empresas ao definir limites para pedidos de equiparação salarial dos trabalhadores e isentar de encargos verbas pagas eventualmente como incentivo à produtividade dos empregados, mas pode haver polêmica nos tribunais mesmo assim
Planos de cargos e salários
Planos de carreira poderão ser negociados sem registro em contrato de trabalho nem homologação pelo Ministério do Trabalho, uma exigência da legislação antiga
Vantagem Maior flexibilidade para trabalhadores e empresas
Isonomia salarial
Para pedir equiparação com colegas que ganham mais na mesma função, trabalhadores precisarão ter pelo menos quatro anos na empresa e dois anos na função
Vantagem Maior segurança jurídica para empresas
Comissões, gratificações e prêmios
Verbas de caráter eventual como comissões, gratificações e prêmios por produtividade, auxílio-alimentação e ajudas de custo limitadas a 50% da remuneração total não devem ser consideradas parte do salário
Vantagem Custos menores para empresas, com redução de encargos
Juízes acham que as empresas devem recolher contribuição previdenciária sobre essas verbas também
–
DEMISSÃO
A reforma cria um novo tipo de demissão, que poderá ser negociada por patrões e empregados, e estabelece normas que podem reduzir a interferência dos sindicatos. O objetivo é facilitar o desligamento de trabalhadores em algumas situações e torná-lo mais barato para as empresas
Demissão em comum acordo
Patrões e empregados poderão rescindir o contrato de trabalho em comum acordo. Nesse caso, trabalhadores têm direito a 50% do aviso prévio e da multa do FGTS e podem sacar 80% do saldo do FGTS, mas não podem receber seguro desemprego
Vantagens Trabalhadores ganham mais com novo modelo do que se pedissem demissão, e empresas pagam menos do que se demitissem sem justa causa
Homologação da rescisão
Em caso de demissão, a rescisão do contrato de trabalho não precisa mais ser homologada pelos sindicatos
Vantagens Menos burocracia para patrões e empregados, que podem receber a indenização mais rapidamente.
Sem o pente-fino que os sindicatos fazem na homologação, trabalhadores podem processar empresas se erros forem descobertos depois
Demissão coletiva
Demissões coletivas poderão ser feitas sem negociação com sindicatos, que não precisam mais ser comunicados da decisão da empresa
Vantagens Flexibilidade e redução de custos para empresas
Juízes dizem que demissões coletivas sem negociação com os sindicatos ferem vários princípios da Constituição
–
NOVOS TIPOS DE CONTRATO DE TRABALHO
São regulados o teletrabalho, à distância da empresa, e as jornadas intermitentes. A reforma também cria garantias para funcionários que prestam serviços terceirizados
Teletrabalho
A nova lei cria regras para o teletrabalho, regime em que o empregado trabalha fora da empresa, em casa ou na rua, e se conecta com o empregador pela internet ou por telefone
Vantagens Flexibilidade para patrões e empregados e economia para empresas, que devem custear equipamentos, mas não precisam pagar horas extras
Juízes acham que empresas devem se responsabilizar por acidentes e pagar horas extras
Trabalho intermitente
Prestação de serviços por horas, dias ou meses, sem continuidade, em que o empregado é convocado para trabalhar com pelo menos três dias de antecedência. Uma regra válida até 2020 estabelece que trabalhadores demitidos só podem ser recontratados como intermitentes 18 meses após o desligamento
Vantagens Flexibilidade para patrões e empregados, com regularização de bicos e outras situações que já ocorrem na informalidade
Juízes dizem que o novo regime desrespeita direitos garantidos pela Constituição
Autônomos
Contratos de trabalho autônomo não podem incluir cláusulas de exclusividade, permitindo que os trabalhadores prestem serviços a mais de uma empresa e se recusem a realizar atividades exigidas pela contratante, ao contrário dos funcionários da empresa
Vantagem Custos menores para empresas, com redução de encargos, e menor risco de ações trabalhistas
Empresas continuarão sujeitas a ações trabalhistas se outras circunstâncias da relação de trabalho indicarem vínculo empregatício
Benefícios a terceirizados
Empresas são obrigadas a oferecer a terceirizados os mesmos benefícios de alimentação, transporte e atendimento médico oferecidos a contratados diretamente
Vantagem Garantia para trabalhadores terceirizados
Juízes acham que trabalhadores terceirizados também têm direito a isonomia salarial com os funcionários da empresa
Pejotização
Trabalhadores demitidos só podem ser recontratados como prestadores de serviços terceirizados 18 meses após o desligamento
Vantagem Evitar a perda de arrecadação que o governo sofre quando empresas demitem empregados para recontratá-los como pessoas jurídicas, que recolhem menos imposto sobre a renda, e evitar que trabalhadores sejam pejotizados com redução de seus ganhos
–
REPRESENTAÇÃO SINDICAL
Sindicatos de trabalhadores podem ficar enfraquecidos com o fim de sua principal fonte de financiamento, o imposto sindical obrigatório, mas a necessidade de convencer os trabalhadores a financiá-los pode levá-los a atuar de forma mais efetiva
Imposto sindical
Com a reforma, o imposto passa a ser recolhido apenas de quem autorizar o desconto no salário
Vantagem Liberdade de escolha para trabalhadores e empresas, que poderão deixar de recolher contribuições não autorizadas
Juízes acham que trabalhadores terão que se submeter à maioria se assembleias da categoria aprovarem o desconto do imposto
Comissões de empregados
Empregados poderão eleger comissões de representantes sem vínculo com o sindicato em empresas com mais de 200 funcionários
Vantagens As comissões não têm poder para negociar acordos como os sindicatos, mas podem resolver conflitos no local de trabalho e apresentar demandas
Acordos de empresas com comissões podem ser questionados na Justiça
–
JUSTIÇA DO TRABALHO
Vários dispositivos da reforma têm como objetivo reduzir a pressão nos tribunais, limitando o acesso gratuito de trabalhadores à Justiça, restringindo o potencial de ganho com ações de dano moral e protegendo ex-sócios e empresas do alcance de ações trabalhistas. As vantagens vão depender da interpretação das novas normas pelos tribunais
Acesso gratuito
Trabalhadores com renda inferior a 40% do teto do INSS (R$ 2.212) terão acesso gratuito à Justiça do Trabalho, mas os demais precisarão comprovar incapacidade de pagar os custos do processo
Vantagem Para empresas, menos ações trabalhistas
Dano moral
Indenizações por dano moral, em casos de ofensa à honra ou assédio no trabalho, são tabeladas de acordo com o grau da ofensa e limitadas a 50 vezes o teto dos benefícios da Previdência, o que significaria R$ 276 mil hoje
Vantagens Custos menores e menos incerteza para empresas
Juízes acham que o limite é inconstitucional, por ferir a dignidade humana
Súmulas do TST e jurisprudência
Para que uma turma do TST adote súmulas e uniformize a jurisprudência, a nova lei exige o voto de pelo menos dois terços da turma e um histórico de decisões por unanimidade sobre o assunto
Vantagem Segurança jurídica para trabalhadores e empresas
Juízes acham que a norma é inconstitucional, por restringir a independência do Judiciário
Responsabilidade de ex-sócios
Ex-sócios de uma empresa processada na Justiça só respondem por suas dívidas trabalhistas na ausência dos atuais donos do negócio e por até dois anos após saída
Vantagem Proteção para sócios que se afastaram de empresas com dívidas trabalhistas
Responsabilidade de grupo econômico
Uma empresa só será tratada como parte do mesmo grupo econômico na Justiça do Trabalho se forem demonstrados o interesse comum e a atuação conjunta das empresas do grupo
Vantagem Proteção para empresas na Justiça
Matéria de RICARDO BALTHAZAR e NATÁLIA PORTINARI/ Folha de São Paulo