Reajustes abusivos de mensalidades dos planos de saúde demonstram que as decisões regulatórias da agência privilegiam a preservação das receitas das operadoras
Há 28 anos o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) defende os consumidores de planos e seguros saúde na busca por uma regulação mais justa e no combate aos abusos praticados, antes mesmo da aprovação da Lei 9656, em 1998. A partir do ano 2000, passou a monitorar a atuação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que tem demonstrado ser, institucional e politicamente, desinteressada em promover o equilíbrio no mercado de saúde suplementar.
As evidências das suas falhas em relação ao dever de atender o interesse público e proteger interesses sociais e econômicos dos consumidores são inúmeras, corroboradas pela imensa quantidade de ações judiciais de consumidores lesados e pelo volume de reclamações nos órgãos e entidades de defesa do consumidor.
Os reajustes abusivos aplicados às mensalidades dos planos de saúde demonstram que as decisões regulatórias da ANS privilegiam a preservação das receitas das operadoras e ignoram a unânime insatisfação da população. Por 16 anos, o Idec vem questionando a metodologia utilizada pela ANS para reajustar os planos de saúde individuais e familiares e sua omissão em regular concretamente os planos coletivos. Pediu revisão da fórmula adotada, mas foi ignorado pela ANS. Relatório da auditoria do Tribunal de Contas da União desvendou, em parte, o que a ANS escondia do consumidor, reforçando as preocupações do Idec e confirmando a falta de transparência e distorções no controle dos reajustes. A partir do relatório do TCU, o Idec postulou contra a ANS no Judiciário, para exigir a correção da metodologia, o reconhecimento da ilegalidade dos reajustes aplicados desde 2009 e o ressarcimento à coletividade de consumidores, bem como a obrigação de transparência dessa atuação.
No campo da ética e da moralidade, o Idec enviou pedido à Procuradoria-Geral da República para que seja apurada eventual improbidade administrativa de diretores da ANS a partir das informações do TCU. Essa prática lesiva, com falhas graves, mesmo após tantas cobranças e denúncias, vem causando prejuízo a milhões de consumidores. Além disso, formalizou junto à Comissão de Ética Pública da Presidência da República a suspeita de violação da moralidade e da ética na indicação pelo governo de dois nomes para a diretoria da ANS, com flagrante conflito de interesse e envolvimento com notícias de investigação de corrupção.
Como se não bastasse, a diretoria da agência acaba de aprovar a RN 433/2018, permitindo a adoção franquia e coparticipação num modelo perigoso, que potencializa o risco de endividamento e a negativa de atendimento de consumidores, conforme apontam as evidências apresentadas, inclusive pelo Ministério Público Federal. É total a decepção e descrédito do Idec em relação ao compromisso da ANS para com os consumidores, o que levou ao seu desligamento da Câmara de Saúde Suplementar da agência e à decisão de redobrar sua vigilância e atuação na luta pelos direitos de consumidores-cidadãos, missão da qual não se afastará.
Artigo publicado na página do Jornal O Globo – disponível na internet 10/07/2018
Nota: O presente artigo não traduz a opinião do ASMETRO-SN. Sua publicação tem o propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.