Um dia depois de a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspender a regra que fixa um limite de 40% para exames e consultas em planos de coparticipação e franquia, o diretor de Desenvolvimento Setorial da ANS afirma que o percentual é adequado e que só será alterado em razão da decisão de outros órgãos. Em sua decisão, a ministra argumentou que o tema deveria ser discutido no Congresso. A decisão atendeu a um pedido do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A norma entraria em vigor no fim de dezembro. Agora, depende da análise do plenário do STF.
A ANS tem competência para editar essa resolução?
– Essa análise não é feita por nós, é feita pela Advocacia-Geral da União (AGU). E a AGU teve oportunidade de se manifestar nesse processo que resultou na Resolução Normativa 433 em, ao menos, três vezes, e em nenhum momento se aventou a possibilidade de ilegalidade ou inconstitucionalidade da norma.
– Nossa opinião sobre a norma se mantém, a gente entende que essa norma foi a que observou, na história da ANS, as melhores práticas regulatórias possíveis. Ela observou o rito de participação popular. Essa crítica é infundada.
A que o senhor atribui a reação da sociedade e do Judiciário?
– O Judiciário ainda não apreciou a norma, fez uma análise quanto à possibilidade de a ANS editar ou não a norma. Ainda não analisou a resolução. Quanto à sociedade, em geral, houve um desentendimento geral e irrestrito sobre a norma. Ela propõe que o consumidor que tem um contrato de coparticipação e franquia, tendo de pagar três, quatro, cinco vez a sua mensalidade porque tem um percentual a arcar do procedimento, estará protegido ao saber que isso não pode mais acontecer. Um dos limites é o valor da mensalidade. E, quanto ao percentual, é uma inverdade que a ANS orientava as operadoras a praticar percentuais de 30%.
Mas há um documento da ANS que falava que percentuais acima dos 30% representavam restrição severa ao uso…
– Os 30% nunca foram balizador para o mercado. Temos aqui processos sancionadores analisados pela ANS com percentuais diversos, que partem de 10% e chegam a 60%, 70% de coparticipação do valor do procedimento. Era, no máximo, uma sugestão de aplicação. Se não tinha sido deliberado pela diretoria colegiada, mesmo que o contrato tivesse percentual superior, aquele documento não era suficiente para aplicar uma penalidade à operadora.
A reação é desproporcional?
– Mais que isso: irreal. As pessoas estão dizendo que é um absurdo a ANS ampliar o percentual de coparticipação, mas isso não é verdade. ANS não ampliou, pelo contrário, pela primeira vez limitou: não pode cobrar acima de 40%. O que fizemos foi limitar, e muito, a atuação das operadoras. Caso a ação (da OAB) no STF, no fim, seja julgada improcedente, espero que a gente possa prosseguir com a aplicação da normativa, que a gente consiga fazer essa apresentação mais ampla, mais verdadeira à sociedade.
Em sua decisão, a ministra Cármen Lúcia diz que “saúde não é mercadoria. Vida não é negócio”. Faltou sensibilidade para determinar o percentual-limite de 40%?
– A gente está bastante seguro quanto aos critérios utilizados. Esse percentual não onera excessivamente o consumidor, e permite que os produtos sejam formados de acordo com o seu perfil. Aquele que entender que prefere pagar uma mensalidade menor e um percentual maior de coparticipação contrata esse produto. E o que preferir o contrário paga uma mensalidade maior para ter um percentual menor de coparticipação. O nosso objetivo foi ampliar a escolha do consumidor. Quanto mais enrijecermos as regras, menos opções teremos. A maior parte da população brasileira tem um nível de rendimento mais baixo, se não tivermos mecanismos que nos possibilitem a prática de mensalidades menores, essa população nunca vai conseguir contratar um plano de saúde. A partir do momento em que a gente tem uma saúde universal e gratuita que atende a todos, é uma escolha muito individual contratar um plano de saúde.
Há possibilidade de a ANS rever este percentual?
– Não tem razão de ordem técnica para isso. Aconteceria apenas em caso de sermos determinados por alguém, pelo Judiciário, por exemplo. Vamos sempre cumprir determinações de órgãos ou poderes que tenham essa competência para determinar essa ação. Mas as decisões tomadas foram as mais adequadas para a regulamentação do setor da saúde suplementar, para a proteção dos consumidores e para a ampliação do poder de escolha do consumidor.
Apesar dos cuidados, críticos afirmam que a ANS atua a favor das empresas. A que o senhor atribui essa imagem?
– É uma fala apenas repetida. Alegam que a ANS está composta de diretores que observam o interesse das operadoras. Todos os atuais diretores são servidores públicos, então, essa é uma fala que não faz sentido, não corresponde à realidade. Não significa uma crítica efetiva, mas uma retórica de falar mal de agências reguladoras.
De fato, uma das críticas recorrentes à ANS é que ela não trabalha para regular o mercado e proteger o consumidor…
– A gente não trabalha para nenhuma das partes. A gente recebe críticas dos prestadores de serviços, das operadoras, cada qual falando que a gente atua em prol do outro. Isso demonstra que a gente não é em prol de ninguém, mas do sistema de saúde suplementar. A ANS foi criada para proteger o sistema de saúde suplementar. Obviamente, na nossa regulação, a gente considera a vulnerabilidade do consumidor, mas a gente não é um órgão de defesa do consumidor. Nossa atuação tem que ser equilibrada, observar os interesses de todos os envolvidos. Mas considerando a necessidade da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro das empresas, de uma remuneração adequada aos prestadores de serviços. O nosso trabalho é equilibrar todos esses esses interesses.
A decisão do STF cria insegurança jurídica na atuação da ANS?
– Não. A norma não está em vigor, então é melhor que seja tomada uma decisão neste momento. E, sendo submetida à instância máxima do Judiciário, a decisão que for proferida vai gerar segurança jurídica absoluta.
Crédito: Luciana Casemiro/O Globo – disponível na internet 18/07/2018
A ANS trata do assunto de forma comercial. Roberto Aguiar, diretor da Agência, usa o termo “produto” em vez de “plano de saúde”.
Não, Sr. Roberto! Plano de saúde não é um eletrodoméstico que se decida comprar ou não. Quem não tem plano de saúde morre, porque o atendimento prestado pelo governo está totalmente deteriorado.
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