A Confederação Nacional da Indústria (CNI) criticou a intenção de juntar o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) ao Ministério da Economia, pasta proposta pelo candidato à Presidência da República pelo PSL, Jair Bolsonaro. Segundo a entidade, o MDIC precisa ser forte e independente.
“Para a indústria brasileira, o próximo governo tem o desafio de colocar o Brasil de volta no caminho do desenvolvimento econômico e social. Precisamos avançar nas reformas, garantir investimentos em infraestrutura e desburocratizar a economia de modo geral”, afirmou o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, em comunicado à imprensa.
De acordo com ele, a indústria não pode estar ligada a uma área que tem como prioridades “o aumento de receitas e a redução de despesas”. “Os ministérios da Fazenda e do Planejamento desempenham papéis específicos. Quem vai defender as políticas industriais?”, questiona o presidente da CNI. A intenção de Bolsonaro é juntar o MDIC, o Ministério da Fazenda e do Planejamento num grande “Ministério da Economia”. Ele pretende reduzir para 15 o número de pastas na Esplanada dos Ministérios.
Andrade destacou que a indústria tem papel fundamental para o desenvolvimento econômico e social do país. “Na indústria, cada R$ 1,00 produzido gera outros R$ 2,32 para a economia. Na agricultura, esse um real gera R$ 1,67 e, no setor de serviços, R$ 1,51”, comunicou a nota.
Não é a primeira vez que a CNI se opôs às propostas do militar reformado. Paulo Guedes, assessor econômico de Bolsonaro, defende que é preciso uma ampla abertura econômica nos primeiros 100 dias de governo. Em nota à imprensa, a entidade apontou que a medida precisa ser feita por meio de acordos e não de forma unilateral, pois é preciso dar condições de competição para as empresas brasileiras, que poderiam vir à falência com a concorrência e gerar desempregos no país.
Crédito: Hamilton Ferrari/Blog do Vicente/Correio Braziliense – disponível na internet 24/10/2018
Indústria quer manter benefício fiscal e ministério para o setor
Bolsonaro tem afirmado que quer acordos comerciais com países ricos e defende em seu programa de governo que estimulará a economia reduzindo alíquotas de importação e barreiras não tarifárias, além de promover a abertura imediata para entrada de equipamentos necessários à migração das fábricas para a chamada Indústria 4.0. Executivos argumentam que esse tipo de mudança deve ser acompanhado por alterações na estrutura tributária.
Para algumas das principais entidades da indústria nacional, porém, qualquer mudança precisa ser feita de forma gradativa, responsável e de modo a compensar eventuais mudanças em alíquotas com negociações favoráveis à indústria nacional.
— A abertura comercial precisa ter acordos bilaterais. Tem que ser feita de forma responsável, negociada com todos os parceiros e com base na realidade de cada setor — disse Fernando Figueiredo, presidente da Abiquim, associação da indústria química.
Os industriais admitem que não há como fugir dessa abertura, mas não abrem mão de vantagens.
— A abertura precisa ser negociada, e não concedida unilateralmente. Não vamos conquistar mercados, ter ganhos de exportação e competitividade, se não pedirmos nada em troca — disse o presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso Dias Cardoso.
Pauta corporativista
Humberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Eletroeletrônicos (Abinee), destacou que boa parte dos componentes usados pelo setor é importada e, por isso, o índice de abertura do segmento, de 44%, é maior do que o da indústria em geral, de 17% em média. Ele sugere que a abertura da economia seja feita de forma gradual.
Outro ponto da agenda de Bolsonaro que causa temor aos industriais é a extinção do ministério que representa o setor. Para eles, a fusão com a Fazenda, como vem sendo ventilado, reduziria a interlocução da indústria.
— Exatamente num momento em que o mundo vem discutindo a transição para a Indústria 4.0, a fusão do Mdic com outro ministério não é interessante — disse Fernando Pimentel, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), que também integrou a comitiva que visitou o candidato do PSL na segunda-feira.
Para José Márcio Camargo, economista sócio da gestora de recursos Opus, parte da agenda do setor industrial ainda reflete a tentativa de manter benefícios concedidos em outro cenário:
— Parte da pauta dessas associações é claramente corporativista, uma tentativa de se proteger de possíveis mudanças legislativas. Tudo o que é subsídio terá que ser rediscutido. Quando você dá subsídio para um, tira de outro. Quanto à abertura comercial, parte dela terá de ser unilateral, sem contrapartida de acesso a mercados. O Brasil é um país muito fechado. Mas não pode mudar de uma hora para outra, tem que ser algo planejado.
Paulo Feldmann, professor da Faculdade de Economia da USP, avalia que a preocupação da indústria às vésperas do segundo turno reflete uma campanha na qual não foram apresentadas propostas concretas para o setor. Ele cita a questão do crédito para empresas como um dos pontos cruciais do empresariado que passou ao largo dos debates centrais da eleição.
— Não houve uma proposta de política industrial nas campanhas, como acontece em outros países, onde se sabe o que será oferecido a cada setor — diz, acrescentando ser a favor de um ministério específico para a indústria, mas contra a manutenção de benefícios fiscais, diante da gravidade da situação das contas públicas.
Os representantes da indústria defendem a ressurreição do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras, o Reintegra. O governo do presidente Michel Temer praticamente acabou com o programa de incentivo fiscal para os exportadores ao reduzir a alíquota do regime de 2% para 0,1%, um dos caminhos para atender ao pleito dos caminhoneiros, durante a greve de maio, e subsidiar o diesel.
— O Reintegra é importante para o Brasil conquistar o mercado internacional. O candidato disse que é preciso observar o equilíbrio fiscal das contas do governo, mas prometeu estudar o assunto — afirmou Figueiredo, da Abiquim.
Mais obra, menos imposto
A lista de reivindicações, porém, é ainda mais extensa e contempla aspectos específicos de cada setor. Na construção civil, o pedido é que o presidente eleito retome obras públicas paradas, dê andamento ao Programa de Parcerias Público-Privadas (PPPs) e às concessões, que podem atrair capital estrangeiro.
— Também é preciso acelerar o programa Minha Casa Minha Vida, que funciona com recursos do FGTS — disse José Romeu Ferraz, vice-presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) e presidente do Sinduscon/SP.
No setor têxtil, as demandas incluem redução da carga tributária, condições para melhorar a competitividade, incentivo à inovação e redução da burocracia. O Sindusfarma, que representa as indústrias farmacêuticas, enviou dez propostas aos dois candidatos, como a redução ou eliminação de impostos incidentes sobre medicamentos.
Apesar da pauta extensa de pedidos, a indústria não teve diálogo semelhante com o adversário de Bolsonaro, o candidato do PT, Fernando Haddad.
Crédito: João Sorima Neto, Eliane Oliveira e Danielle Nogueira/O Globo – disponível na internet 24/10/2018