Amostras de vírus e células estão em risco após roubo a laboratório da UFRJ.
Roubo a laboratório da UFRJ impacta diretamente saúde da população do Rio
Amostras de vírus e células estão em risco após roubo a laboratório da UFRJ
O Laboratório de Virologia Molecular da UFRJ , responsável pela descoberta de casos de mayaro no Rio, foi roubado neste fim de semana por bandidos que levaram cabo de gerador, cinco aparelhos compressores de ar-condicionado e ferramentas da casa de máquinas. Os equipamentos garantem a segurança de amostras de vírus e células usadas para pesquisas como de zika, febre amarela, chicungunha e HIV, que agora estão sob risco.
O laboratório fica no Centro de Ciências da Saúde da UFRJ e é protagonista em diversas pesquisas estratégicas em estudos de arbovírus (dengue, zika, febre amarela, chicungunha) e HIV.
Esta é a segunda vez que o laboratório é invadido. Em março, o local sofreu o mesmo tipo de roubo. Bandidos furtaram os cabos do gerador de cobre, de alto custo. Além dos prejuízos científicos, após os furtos, o laboratório sofre, em tempos de contingenciamento do MEC, duro golpe financeiro — ainda não estimado — ao ter que comprar novos equiipamentos para seguir as pesquisas.
O coordenador do laboratório, Amilcar Tanuri, explica que, como o centro de pesquisa é considerado “de segurança máxima”, não pode funcionar sem gerador. O aparelho entra em funcionamento dez segundos depois que a luz acaba para garantir que a pressão dentro do ambiente continue negativa, o que certifica que nada saia dele, nenhum vírus.
Além disso, o gerador mantém a temperatura dos freezers que guardam amostras congeladas quando há queda de energia. Já os aparelhos de ar-condicionado levados no roubo estavam no almoxarifado, onde são guardados os reagentes utilizados para as pesquisas. Sem a climatização adequada, estes produtos podem se perder, inviablizando os trabalhos.
— Não há a menor condição de segurança aqui. Teremos que reavaliar todas as amostras de vírus e células, que estão sob risco. Os freezers já estavam com temperaturas instáveis (quando os pesquisadores chegaram ao local, na manhã da segunda-feira), o que diminui a viabilidade das células e dos vírus — afirma Tanuri. — Isso é um caos porque perde-se a confiança da amostra. A continuidade dos trabalhos também está em risco
O cientista afirmou que, sem um gerador, um plano de contingência terá de ser traçado hoje. Os trabalhos ficarão paralisados pelo menos durante toda a segunda-feira.
A segurança do laboratório é feita por uma empresa terceirizada contratada pela UFRJ. E as imagens capturadas pelas câmeras serão analisadas detalhadamente, segundo a instituição de ensino. A energia no local já foi restabelecida.
Em nota, a UFRJ afirma que “repudia veementemente a violência contra o patrimônio público, principalmente aquela que prejudica o desenvolvimento dos saberes estratégicos para o país e a humanidade”. A instituição informou que buscará a Polícia Federal para “esclarecimento dos fatos”. A nota informa ainda que a Prefeitura Universitária “está dando suporte ao laboratório e acompanha o caso”.
Crédito: Ana Paula Blower/O Globo – disponível na internet 30/07/2019
Roubo a laboratório da UFRJ impacta diretamente saúde da população do Rio
O ataque foi ao precário prédio do Centro de Ciências da Saúde da UFRJ, há tempos assolado por roubos e deterioração das instalações. Mas terá impacto muito mais amplo sobre a saúde da população. Laboratórios como o de Virologia Molecular da UFRJ produzem ciência que salva vidas. Por trás do nome incompreensível para muita gente está o desenvolvimento de conhecimento contra doenças letais como HIV e zika.
Liderado há cerca de 30 anos pelo geneticista Amilcar Tanuri, o laboratório realizou pesquisas pioneiras no Brasil sobre o HIV, na década de 1990. Estudos desenvolvidos lá ajudaram a compreender o perfil da Aids no Brasil, por meio da análise dos subtipos do HIV. Informações assim são essenciais para planejar o tratamento.
Quando a zika emergiu, em 2015, o laboratório trabalhou em parceria com a médica Adriana Melo, da Paraíba, e outros pesquisadores e foi o primeiro a sequenciar todo o genoma do zika extraído do líquido amniótico de gestantes que tiveram bebês com microcefalia. O trabalho foi um marco da ciência brasileira porque demonstrou que o zika era de fato transmitido de mãe para filho.
O desdobramento da pesquisa foi essencial para que se descobrisse que a microcefalia era a ponta do iceberg da devastação causada pelo zika no corpo em formação do feto. O estudo levou à caracterização da síndrome da zika congênita, que reúne uma série de distúrbios provocados pelo vírus, de defeitos ósseos à cegueira e uma série de problemas neurológicos.
O laboratório continuava a investigar o zika, pois o vírus permanece uma ameaça letal no país.
Neste ano, um estudo desenvolvido no laboratório levou à descoberta de que o vírus mayaro, um primo até então silvestre do chicungunha, estava no estado do Rio de Janeiro. Isso foi possível graças a estudos de genética do vírus.
O laboratório analisava amostras de pacientes com arboviroses no Rio (zika, dengue, chicungunha e febre amarela) e investigava casos de febre do oeste do Nilo (doença transmitida pelo pernilongo e causadora de encefalite) em outros estados.
O roubo levou com os aparelhos de ar condicionado décadas de pesquisa, amostras preciosas, coleções de vírus imprescindíveis e benefícios para a saúde da população.
Quando a ciência perde, perdemos todos
Crédito: Ana Lucia Azevedo/O Globo – disponível na internet 30/07/2019