Por reeleição, Bolsonaro flerta com reforço no salário de servidores

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Por lei, os aumentos de salários estão proibidos até o fim de 2021. Mas, de olho na reeleição, o presidente Jair Bolsonaro flerta com o funcionalismo público e deixa no ar o reforço nos contracheques para 2022. 

Após várias declarações da equipe econômica do governo federal sobre o impacto negativo dos salários dos servidores no orçamento da União, o presidente Jair Bolsonaro resolveu flertar com o funcionalismo e mandar recado de que pretende reforçar os contracheques em 2022. Para auxiliares mais íntimos, teria dito: “Eu queria dar um aumento salarial para os servidores antes de terminar meu mandato. No meu mandato, eles não tiveram nenhum aumento”. A repercussão, no entanto, não foi a que ele esperava. Tanto analistas de mercado quanto os próprios servidores desconfiam da intenção.

A informação sobre o possível reajuste foi confirmada pelo ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner Rosário, e reforçada por Wagner Lenhart, secretário de Desenvolvimento e Gestão de Pessoas do Ministério da Economia, em entrevista ao programa CB.Poder na terça-feira.

Isso desde que o desembolso não ultrapasse o teto de gastos. No momento, a maior demanda de reajuste é no “Carreirão”, que engloba mais de 80% do funcionalismo federal, e que está sem correção salarial desde 2017, depois de ganhar 10,8%, em duas parcelas. Carreiras de Estado ganharam 27,9%, em quatro prestações, a última em 2019.

O economista Raul Velloso, especialista em contas públicas e ex-secretário de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento, afirma que “essa não é a hora de dar dinheiro para o servidor”. Primeiro, segundo ele, o governo deve equacionar o rombo na Previdência (no total de R$ 318,4 bilhões, sendo R$ 213,3 bilhões do setor privado e R$ 53,3 bilhões, dos servidores), diz. Qualquer aumento — seja de salário, seja do quantitativo — “não apenas cria uma despesa futura, como retira dinheiro de investimentos”, afirma.

Para Gil Castello Branco, especialista em contas públicas e secretário-geral da Associação Contas Abertas, “ o governo entrou, definitivamente, no ‘modo’ reeleição”. Ele lembra que o país já estava rachado antes da pandemia e, nesse ritmo, após, sequer juntará os cacos. “Alas do governo propõem, abertamente, o rompimento do teto de gastos, o prolongamento do auxílio emergencial, a criação do Renda Brasil (o Bolsa Família de Bolsonaro), o Pró-Brasil (o PAC desta gestão) e o reajuste dos servidores militares e civis. Com qual dinheiro?”

Na análise de Castello Branco, o Brasil sairá da crise com um endividamento de aproximadamente 100% do Produto Interno Bruto (PIB) e um deficit de quase R$ 1 trilhão. “A irresponsabilidade fiscal no ‘vale tudo eleitoral’ poderá até reeleger o presidente, mas terá consequências econômicas extremamente graves”, reforça. Além disso, neste ano, a previsão de desembolso com folha de pagamento do funcionalismo federal é de R$ 323 bilhões.

@correio braziliense (foto: Editoria de ilustração)

Desconfiança

César Bergo, economista-chefe da Corretora OpenInvest, destaca que “uma coisa é o discurso político de Bolsonaro, outra é a realidade”. Para ele, o Ministério da Economia tem feitos um trabalho sério. “Os dados econômicos são claros. O reajuste não vai acontecer porque não existe espaço para fabricar dinheiro. E não adianta Bolsonaro insistir. O Congresso está ciente das consequências de romper o teto dos gastos. O presidente tem que ficar atento, se é que vai ser reeleito”, diz Bergo.

Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), entidade que alcança 80% do funcionalismo público, o chamado “Carreirão”, colocou um pé atrás diante dos comentários de Jair Bolsonaro. Ele entende que os “recados” do mandatário da nação são mais uma demonstração de como esse governo age. “O modelo morde e assopra. Não vamos nos enganar com essa tentativa de afago de um governo que já congelou os salários este ano e quer ganhar dividendos políticos”.

Ele garante que os servidores continuarão lutando para derrubar os vetos de Bolsonaro aos dispositivos da Lei Complementar nº 173/2020, que impediu reajustes durante o estado de calamidade pública pelo coronavírus. “Não precisamos de caridade, precisamos que se cumpra a lei. Se a lei fosse cumprida, o funcionalismo, conforme detalha o artigo 37 da Constituição, teria reajuste anual de acordo com a inflação. E as contas públicas aguentam, sim, a correção. Tem margem.”

Secretário executivo do Unacon Sindical, Bráulio Santiago Cerqueira garante que o número apresentado pelo governo sobre o impacto na folha de pagamento, de R$ 323 bilhões, é inflado, porque inclui militares e aposentados, grupos que não têm reflexo na correção de salários civis. “A folha de ativos civis em 2019 alcançou R$ 136 bilhões. E a deterioração dos resultados fiscais não é explicada por ela. A última recomposição salarial para 80% dos servidores civis ocorreu em 2017. Sem reajuste em 2022, correção, por lei, somente em 2024. Ou seja, sete anos de perdas para a inflação”, afirma.

Sobre a questão fiscal, a dívida pública e o teto dos gastos, Cerqueira destaca que nenhum desses argumentos pode ser considerado válido. “Por que há espaço este ano para injetar R$ 1,2 trilhão no sistema financeiro, mas não se pode prorrogar o auxílio emergencial à população, em torno de R$ 50 bilhões mensais? Orçamento público é diferente do doméstico.

Crédito:Vera Batista/Correio Braziliense – disponível na internet 10/08/2020

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