Petrobras: Demissão do presidente e a privatização da estatal

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Petrobras: Demissão de Coelho vai levar a mudanças no conselho e na política de preços da estatal

 A demissão de José Mauro Coelho do comando da Petrobras é a primeira de uma série de mudanças que o governo vai fazer na petroleira. Além de demitir Coelho, o ministro de Minas Energia, Adolfo Sachsida, vai fazer mudanças no conselho de administração da estatal.

O conselho foi montado pelo ex-ministro Bento Albuquerque, almirante de esquadra que foi demitido por Bolsonaro logo após o anúncio do reajuste do óleo diesel. A saída de Coelho abre caminho também para mudanças na diretoria da empresa. A Petrobras estava perto de anunciar novo reajuste de gasolina e Bolsonaro quer evitar novos aumentos neste momento de alta volatilidade do preço internacional.

Para isso, o presidente pretende alterar a forma de reajuste dos preços dos combustíveis da empresa. Uma fonte do governo disse que é uma questão de sequência até chegar às mudanças que o presidente pretende implementar.

A lógica é a seguinte: governo não pode mandar diretamente na decisão da empresa sobre os preços, mas pode mudar o conselho e o presidente, que mudam a diretoria. O passo seguinte é a mudança na política de preços, como quer Bolsonaro. Ele quer que os reajustes sejam mais esparsos e que haja uma trégua nos preços enquanto o mercado de petróleo estiver vivendo alta volatilidade por conta da crise de energia provocada pela guerra da Rússia com a Ucrânia.

Segundo apurou o Estadão, a demissão do terceiro presidente da Petrobras já era dada como certa no círculo mais fechado de auxiliares do presidente Bolsonaro desde sábado, embora investidores vissem o movimento como “loucura” pelo pouco tempo de Coelho à frente da petroleira.

O anúncio ocorreu depois do mercado fechado, quase 22 horas. Fontes da indústria de óleo e gás, que não apostavam na saída de Coelho em tão pouco tempo, avaliam que a troca é turbulência desnecessária mais uma vez, causada pelo governo.

A avaliação é de que, se o governo realmente quiser trocar os rumos da empresa, terá que nomear novos conselheiros de administração, dispostos a seguir as suas ordens e não a votar de acordo com “os melhores interesses da empresa”.

Sachsida ainda quer avançar nas privatizações da Petrobras e também da PPSA, a estatal responsável pela parte da União no pré-sal. 

Crédito: Adriana Fernandes, O Estado de S.Paulo – @ disponível na internet 24/05/2022


Privatização da Petrobras? Veja o que aconteceu com ex-estatais pelo mundo

A proposta de privatização da Petrobras, anunciada pelo ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, na última semana, reacendeu discussões sobre o impacto de medidas de desestatização na eficácia produtiva de empresas e no controle dos preços dos combustíveis.

Enquanto membros do governo de Jair Bolsonaro (PL) e defensores da redução da presença do Estado nas relações econômicas do país comemoraram o anúncio, representantes da Federação Única dos Petroleiros (FUP-CUT) afirmaram que o presidente verá “a maior greve da história da categoria” caso avance na intenção.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou que a privatização da estatal não está em seu “radar” neste momento — a proposta precisa ser aprovada pelo Congresso antes que o presidente possa assinar o decreto para incluir a Petrobras no Plano Nacional de Desestatização (PND).

Iniciativas de privatizações geram debates acalorados não só no Brasil, mas em diversos outros países que já colocaram ou cogitaram colocar medidas semelhantes em prática.

Não são incomuns casos de petrolíferas que decidiram seguir o caminho da capitalização como forma de obter mais recurso — como fez a própria Petrobras em 2010 — ou de governos que desinvestiram em determinados setores para ampliar a concorrência.

Mas quando se trata de grandes estatais produtoras de petróleo se tornando majoritariamente privadas, não há uma gama gigantesca de exemplos, de acordo com especialistas consultados pela BBC News Brasil.

A reportagem consultou estudiosos do mercado de gás e petróleo e da área de privatizações para identificar alguns dos mais notáveis casos e entender o que aconteceu com essas empresas.

Eles apontam que não há um único caminho a ser seguido por petrolíferas estatais no momento da privatização — mas que casos de sucesso costumam acontecer quando há ambiente regulatório forte e estável para atrair investimentos. Especialistas dizem, ainda, que a gestão privada costuma aumentar a eficiência operacional, mas argumentam que nem sempre a desestatização é a melhor escolha — a depender do momento político e econômico do país.

E quando se fala no assunto, os grandes exemplos citados são o da Rússia, que colocou em prática um grande projeto de privatizações após o fim da União Soviética (URSS); da YPF na Argentina, que voltou a ser estatizada após mudanças no governo; e da multinacional BP, no Reino Unido. Há ainda casos de petroleiras privatizadas no Canadá, França, Itália e Espanha, entre outros. Entenda:

Rússia e a formação da oligarquia

Após o colapso da URSS em 1991, o governo da Rússia — sob o comando do presidente Boris Yeltsin — colocou em prática um amplo projeto de privatizações.

O esforço foi iniciado em outubro de 1991 e concluído em julho de 1994, quando dois terços da indústria russa já era de propriedade privada.

Boris Yeltsin em discurso em 1989 em Moscou
Presidente Boris Yeltsin colocou em prática um amplo projeto de privatizações na Rússia @getty images

A desestatização do setor de gás e petróleo foi regulamentada por um decreto presidencial em 1992. Petroleiras e refinarias foram agrupadas,  transformando-se em empresas de capital aberto.

A Lukoil, considerada a maior companhia russa não-estatal do setor de petróleo, foi formada em 1991 quando três estatais sediadas na Sibéria se fundiram. Em 1993, ela foi privatizada e transformada em uma empresa de capital aberto.

A Gazprom também se tornou privada nesse contexto. A empresa, porém, retornou ao controle do governo no início dos anos 2000, e em 2021 foi responsável por 68% da produção de gás russa.

Especialistas afirmam, porém, que o modelo de privatização adotado pela Rússia ajudou a criar um poderoso grupo de magnatas, os oligarcas russos, e a aprofundar a desigualdade no país.

O economista Marshall Goldman, especialista em economia da URSS, afirma em seu livro “The Piratization of Russia: Russian Reform Goes Awry” que o movimento de desestatização russo apenas transformou o monopólio do Estado em um monopólio privado.

“Mas o monopólio privado não funciona de maneira muito diferente”, disse o autor em sua obra.

Logo da Gazprom
A Gazprom retornou ao controle do governo no início dos anos 2000 @getty images

O governo utilizou um sistema de privatização por meio de vouchers, previamente implementado na Checoslováquia.

Sob esse modelo, o governo distribuiu vouchers entre a população, que poderiam ser usados para comprar ações das cerca de 15.000 empresas que estavam sendo desestatizadas. Empresários bem relacionados, porém, adquiriram enormes blocos desses vouchers e garantiram grandes participação ou controle das companhias.

O movimento criou uma oligarquia russa que ainda está intimamente ligada a uma grande parcela da riqueza nacional. Eles controlam importante parte de setores como o de energia, mineração, mídia e transporte do país e possuem conexões no governo central.

Segundo Sérgio Lazzarini, professor do Insper e estudioso das privatizações, após o fracasso na Rússia, o sistema de vouchers deixou de ser considerado. “Esse modelo é bastante controverso e se provou que não funciona bem”.

“A passagem de ativos aconteceu também de uma forma não transparente na Rússia, o que contribuiu ainda mais para a concentração de renda dos oligarcas”, afirmou o especialista à BBC News Brasil.

Quando chegou ao governo em 1999, Vladimir Putin começou a controlar os oligarcas. Aqueles que seguiram alinhados politicamente com o atual presidente tornaram-se ainda mais bem-sucedidos. Mas alguns dos oligarcas originais que se recusaram a seguir essa linha foram forçados a fugir do país.

Talvez o oligarca mais conhecido fora da Rússia seja o empresário Roman Abramovich, proprietário do Chelsea Football Club. Com um patrimônio estimado em US$ 14,3 bilhões (R$ 73 bilhões), ele fez sua fortuna vendendo ativos após a queda da União Soviética.

Roman Abramovich
Roman Abramovich, que tem patrimônio estimado em US$ 14,3 bilhões (R$ 73 bilhões) @reuters

Em março deste ano, uma investigação da BBC revelou novas evidências sobre como Abramovich lucrou bilhões de dólares de forma indevida ao fazer negócios com o Estado russo na área do petróleo.

O russo teria comprado a estatal de petróleo Sibneft do governo russo em 1995, pela qual pagou cerca de US$ 250 milhões (R$ 1,2 trilhão). Contudo, ele revendeu a empresa ao Estado, em 2005, por US$ 13 bilhões (R$ 65 bilhões).

Abramovich e outros oligarcas russos foram sancionados pela União Europeia, Reino Unido e Estados Unidos após a invasão à Ucrânia. O magnata do futebol decidiu então se afastar de algumas de suas funções e vender o Chelsea.

O Instituto Ucraniano para o Futuro (UIF), uma organização independente com sede em Kiev, culpa a ampla influência dos oligarcas na sociedade, na indústria e na política ucranianas pela falta de desenvolvimento do país.

Reino Unido e BP

A multinacional britânica de capital aberto BP foi privatizada em fases, entre 1979 e 1987.

A desestatização aconteceu durante a onda de privatizações implementada pela ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher.

Margaret Thatcher em 1978 em Londres
Margaret Thatcher comandou o governo britânico entre 1979 e 1990 @getty images

Durante o governo da Dama de Ferro (1979-1990), muitas companhias e serviços que haviam sido estatizados no mandato do ex-primeiro-ministro Clement Attlee entre 1945 e 1951 foram transformados em empresas privadas: indústrias, siderúrgicas, ferroviárias, aeroviárias, aeroportos e companhias de gás, eletricidade, telecomunicações e água.

Em 1979, o governo de Thatcher vendeu pouco mais de 5% de suas ações da BP e reduziu sua participação na empresa para 46%, tornando-se minoritário pela primeira vez desde que a petroleira foi incorporada pela Inglaterra em 1909.

A participação estatal foi sendo reduzida ainda mais nos anos seguintes e, em 1987, a privatização foi concluída quando o governo vendeu suas últimas ações.

Inicialmente chamada de Anglo-Persian Oil Company Limited e depois de British Petroleum, a petroleira se fundiu com a americana Amoco em 1998 e adquiriu a também americana ARCO e a escocesa Burmah Castrol em 2000, tornando-se oficialmente BP plc em 2001.

Logo da BP
BP foi privatizada em fases, entre 1979 e 1987 @getty images

No livro “The Org: The Underlying Logic of the Office”, o economista Raymond Fisman e o historiador Tim Sullivan descrevem como nas primeiras décadas após a privatização, a BP se tornou um exemplo no setor energético de como uma estatal pouco lucrativa poderia ser transformada em um negócio frutífero com a privatização.

O comando da empresa foi todo substituído por funcionários empenhados em cortar custos e reduzir riscos e alguns empreendimentos que antes faziam parte da companhia — como os dedicados à produção de alimento e mineração de urânio, por exemplo — foram vendidos.

“A BP passou de perdas de quase US$ 1 bilhão [cerca de R$ 5 bilhões na cotação atual] em 1992 para lucros de quase US$ 5 bilhões [R$ 25 bilhões] até o final de 1997. A folha de pagamento foi reduzida para 53.000 [funcionários], bem abaixo das 129.000 pessoas que a BP empregava antes”, escreveram Fisman e Sullivan.

Em 2005, uma refinaria da BP no Texas explodiu, matando 15 e ferindo cerca de 170 pessoas. Em 2006, um vazamento em um oleoduto da BP derramou centenas de milhares de galões de petróleo em uma baía no Alasca.

E em 2010, a plataforma Deepwater Horizon, de propriedade da empresa suíça Transocean e operada pela BP no Golfo do México, explodiu e afundou, matando 11 funcionários.

Durante os meses seguintes, quase 5 milhões de barris de petróleo foram despejados no oceano, no que é considerado o maior vazamento acidental de petróleo da história. Cinco Estados (Flórida, Alabama, Mississippi, Louisiana e Texas) foram atingidos pela mancha de óleo, que encobriu aves marinhas, danificou praias e provocou enormes perdas para as indústrias de pesca e turismo.

O acidente de 2010, em especial, prejudicou a imagem da empresa, que teve sua avaliação rebaixada por agências de risco após o desastre.

Explosão na plataforma Deepwater Horizon
Em 2010, a plataforma Deepwater Horizon explodiu e afundou, deixando 11 mortos @reuters

A BP foi alvo de múltiplos processos judiciais, vários deles movidos pelo governo americano, tanto por violações criminais quanto por violações a regulações civis. Em um acordo considerado o maior do tipo na história americana, a BP concordou em pagar cerca de US$ 20 bilhões (aproximadamente R$ 100 bilhões) ao governo federal e aos cinco Estados afetados pela catástrofe ambiental.

No ano passado, os lucros da petroleira atingiram seu maior nível em oito anos, impulsionados pelo aumento dos preços do gás e do petróleo no mercado internacional. Após um ano de perdas em 2020, a BP fechou 2021 com ganho de US$ 12,85 bilhões (R$ 64 bilhões).

Os lucros continuaram a crescer no primeiro trimestre de 2022, alcançando um patamar de US$ 6,2 bilhões (R$ 31 bilhões) — mais do que o dobro dos US$ 2,6 bilhões (R$ 13 bilhões) que a empresa lucrou no mesmo período do ano passado.

O balanço provocou um movimento pela imposição de uma taxação especial, destinada a coletar parte do que é chamado de “lucro inesperado”. A ideia por trás desse tipo de imposto é taxar empresas que se beneficiaram de uma situação pela qual não são responsáveis, como é o caso da alta dos preços de gás e petróleo.

Segundo fontes ouvidas pela BBC, o Tesouro britânico está estudando a possibilidade de adotar tal imposto para o setor energético do país. A BP, porém, rejeita a ideia e afirmou que novas taxas poderiam significar menos investimentos em projetos de energia renovável.

Argentina e o caso YPF

Tanques da estatal argentina de energia YPF em Comodoro Rivadavia, na província patagônica de Chubut
Tanques da estatal argentina de energia YPF em Comodoro Rivadavia, na província patagônica de Chubut @getty images

A estatal e maior produtora de petróleo da Argentina, Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF), foi privatizada em 1999, mas reestatizada em 2012, durante o governo de Cristina Kirchner.

A YPF foi criada em 1922 como a primeira petroleira estatal integrada verticalmente em todo o mundo. Durante o período inicial da ditadura militar, que se estendeu de 1976 a 1983, houve um recuo na política de nacionalização no país.

O governo abriu ao setor privado a possibilidade de concessões e permitiu contratos da YPF com terceiros. Essas medidas foram parcialmente anuladas em 1974 e posteriormente reorganizadas em 1985 pelo governo de Raúl Alfonsín.

Mas a privatização só foi concretizada no fim do governo de Carlos Menem, em 1999.

O primeiro passo desse processo foi a transformação da YPF de uma empresa estatal para uma de sociedade anônima com capital aberto. A desestatização foi concluída quando o Estado argentino vendeu 14,99% de suas ações à empresa espanhola Repsol.

No fim de 2011, a Repsol já controlava 57% do capital da YPF.

Em abril de 2012, porém, a presidente Cristina Kirchner apresentou um projeto de lei ao Congresso que declara “de utilidade pública e sujeito à expropriação” 51% do capital da YPF. O texto foi aprovado com ampla maioria no Congresso e a repatriação efetivada.

O governo culpava a YPF pela queda na produção petrolífera, o que teria obrigado a Argentina a gastar muito com a importação de combustível, num momento em que o país sofria uma escassez de dólares devido a uma fuga de capitais.

Economistas que também apoiaram a medida afirmaram ainda que, desde que a Repsol assumiu o controle da YPF, houve fuga sistemática de divisas sem reinvestimento para a exploração, tornando o modelo insustentável.

Cristina Krichner em 2008
YPF foi privatizada em 1999, mas foi reestatizada em 2012, durante o governo de Cristina Kirchner @getty images

Uma pesquisa realizada na época do anúncio da reestatização pelo jornal portenho La Nación mostrou que seis em cada dez argentinos apoiavam a medida.

A YPF, por sua vez, afirmava que as próprias políticas econômicas intervencionistas do governo deram origem à crise energética no país.

Fora do país, a medida gerou grande desconforto com o governo da Espanha e outras potências. A decisão foi duramente criticada pela União Europeia, FMI e pelos centros econômicos mundiais.

A nacionalização desencadeou ainda uma intensa batalha jurídica entre o governo e a Repsol, que terminou em um acordo de US$ 5 bilhões (R$ 25 bilhões) de indenização pela expropriação das ações.

“A reestatização da YPF aconteceu sem nenhum amparo regulatório institucional”, diz Sérgio Lazzarini, do Insper.

“Ao mesmo tempo, é preciso um ambiente institucional e legal relativamente estável para que os investimentos privados prosperem, algo que faltou na Argentina após a privatização da petroleira”.

Antes de ser estatizada, a empresa tinha um valor de mercado de cerca de US$ 16 bilhões (R$ 80 bilhões). No momento do anúncio da expropriação, a empresa já havia perdido quase metade de seu valor, passando a US$ 8 bilhões (R$ 40 bilhões).

Dez anos depois, as ações da YPF valem 75% menos, segundo análise feita pelo jornal argentino El Clarín. O valor de mercado da companhia está hoje em torno de US$ 3,4 bilhões (R$ 17 bilhões).

As ações da YPF estão sendo negociadas a cerca de US$ 5 (R$ 25) desde a invasão russa na Ucrânia. Em 2012, elas chegavam a US$ 41 (R$ 204), segundo o Clarín.

Afinal, existe uma receita para o sucesso?

Segundo os especialistas consultados pela BBC, não há um único caminho a ser seguido por petrolíferas estatais no momento da privatização.

Da mesma forma, nem sempre a desestatização é a melhor escolha, a depender do momento político e econômico do país, de acordo com Sérgio Lazzarini.

“Às vezes pode ser indicado apenas melhorar a governança, blindar a empresa de interferência governamental, atrair mais investimentos e implementar estratégias para desinvestir setores estratégicos e ampliar a concorrência”, diz o professor do Insper.

“Mas experiência em geral, não só no setor do petróleo, mostra que a gestão privada, de fato, aumenta a eficiência operacional”.

Refinaria Presidente Bernardes da Petrobras em Cubatão, estado de São Paulo
Refinaria Presidente Bernardes da Petrobras em Cubatão, estado de São Paulo @getty images

Lazzarini lançou em março deste ano o livro “The Right Privatization – Why Private Firms in Public Initiatives Need Capable Governments” (A Privatização Certa – Porque Empresas Privadas em Iniciativas Públicas Precisam de Governos Capazes, em tradução livre).

Na obra, o especialista destaca justamente a importância de um governo bem-organizado e preparado no processo de privatização de estatais de diversos setores.

“E o que são governos capazes? Governos que levam o tema da privatização para o debate público adequadamente e criam um ambiente regulatório adequado para tratar do problema”, diz.

Ainda segundo Lazzarini, os casos de sucesso costumam acontecer quando há um ambiente regulatório forte e institucional estável que consiga atrair investimentos, além de competição no setor. “Os preços só começam a cair quando há mais atores e mais competição”, diz.

Patrick Heller, diretor Executivo do Natural Resource Governance Institute e pesquisador do Centro de Direito, Energia e Meio Ambiente da Universidade da Califórnia em Berkeley, lista ainda outros fatores que considera essenciais para uma boa transição.

“O primeiro deles é fazer uma boa avaliação dos preços das ações antes da privatização. Definir um bom mecanismo para encontrar um valor inicial de referência e a partir daí seguir com as negociações”, diz.

“Fazer isso sempre foi complexo, mas está ainda mais difícil neste momento, diante das incertezas reais em torno do futuro da indústria de petróleo e gás no mundo e da necessidade de se investir em energia limpa”.

Heller lembra ainda da importância da transparência em qualquer processo de privatização. “Todas as etapas precisam ser transparentes, seja no momento da avaliação dos ativos, da definição dos modelos de privatização ou de estabelecer os requisitos para que as partes tenham acesso aos recursos desestatizados”, afirma.

“Por fim, há um terceiro ponto importante e que se conecta ao anterior, que é a construção de um processo justo e objetivo”, diz. Segundo Heller, o princípio deve ser obedecido independentemente do modelo de privatização escolhido.

“É preciso se certificar de que as ações não sejam entregues a pessoas politicamente conectadas ou que um grupo específico de investidores seja privilegiado”.

Segundo os especialistas, os casos de fracasso na história acontecem justamente quando esses princípios não são respeitados.

“Pode haver falhas em três estágios da privatização: no desenho do modelo, na implementação e na fase pós-privatização”, diz Sérgio Lazzarini.

Para o professor do Insper, quando há falha no modelo, por vezes troca-se o monopólio estatal por um privado, como aconteceu na Rússia.

“Na implementação é preciso estar atento para falhas no momento de identificar compradores e licitar a venda. Já no pós os problemas estão na não regulamentação do setor ou definição dos padrões de qualidade e quantidade dos investimentos”, complementa Lazzarini.

Os estudiosos afirmam ainda que associar diretamente a queda dos preços dos combustíveis a um sucesso na privatização nem sempre é o melhor caminho, já que o preço no setor é ditado internacionalmente e muito influenciado por fatores externos.

“Em geral, empresas privadas do setor de gás e petróleo tendem a ser mais eficientes quando se trata de gerenciar recursos e custos de produção”, diz Patrick Heller. “Mas o petróleo é uma commodity global e, portanto, o que mais influencia os preços que chegam até os consumidores não é a eficiência de uma empresa de extração em particular, mas sim o mercado global de energia”.

Crédito: Julia Braun / BBC News Brasil – @disponível na internet 24/05/2022

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