8 gráficos que mostram como a vida das brasileiras mudou na última década, segundo o IBGE

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@getty images / BBC

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou nesta sexta-feira (08/03), Dia Internacional da Mulher, uma série de dados sobre a diferença que ser mulher ou homem no Brasil faz em temas como acesso à educação e ao mercado de trabalho.

Os dados revelam que faz diferença também ser, por exemplo, mulher branca ou preta, ou mulher vivendo no Sul ou Norte do país.

“A interseccionalidade é um método de análise que permite combinar diversas características dos indivíduos ou dos grupos sociais: sexo, gênero, cor ou raça, que região reside, se é urbano ou rural”, aponta Barbara Cobo, coordenadora-geral do estudo do IBGE.

“Você pode ter mulheres mais sujeitas a sofrer mais com as desigualdades, que é o caso das mulheres pretas ou pardas”, acrescenta a pesquisadora, doutora em economia e professora da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE) do IBGE.

As informações divulgadas confirmam algumas tendências já conhecidas, como a diminuição do número de filhos por mulher, e traz também alguns dados surpreendentes — e positivos —, como a grande diminuição do casamento precoce de meninas.

“O estudo permite que se olhe para a desigualdade de gênero como ela deve ser vista: impactando todas as dimensões da vida das mulheres, seja na educação, na saúde, no trabalho, na violência ou nos direitos humanos”, diz Cobo.

Confira alguns dados divulgados pelo IBGE e selecionados pela BBC News Brasil.

Mulheres mais escolarizadas…

Considerando a faixa de 18 a 24 anos de idade, as mulheres já tinham, em 2016, um percentual de frequência escolar maior do que os homens: 32,5% delas estavam estudando, enquanto os homens nessa situação eram 30,5%.

Mas essa distância mais que dobrou em 2022, chegando a uma frequência de 32,6% entre elas e de 28,1% entre eles.

A frequência escolar inclui todos os níveis de ensino, da educação básica à pós-graduação, além do ensino técnico, educação especial e Educação de Jovens e Adultos (EJA).

Só que, no ano mais recente, uma maior parcela de mulheres brancas (39,7%) do que pretas ou pardas (27,9%) estava estudando.

Quando se considera tanto raça quanto gênero, a maior distância na frequência escolar foi detectada entre mulheres brancas (39,7%) e homens pretos ou pardos (24,6%).

A constatação de que as mulheres, e especialmente as mulheres brancas, recebem maior educação é reforçada por outro dado: o nível de instrução de pessoas com 25 anos ou mais.

Estão na categoria mais “educada”, a que tem ensino superior completo, 16,8% dos homens e 21,3% das mulheres.

Entre as mulheres brancas, esse percentual chega a 29%. Para as mulheres pretas ou pardas, o percentual cai para quase metade, 14,7%.

Mas mesmo que, em 2022, as mulheres fossem 60,3% dos estudantes que estavam concluindo cursos presenciais de graduação, há grandes variações dependendo do tipo de curso.

Elas eram minoria (22%) entre os estudantes concluindo graduações em ciências físicas, engenharias, matemática e cursos tecnológicos; e a grande maioria (91%) nos cursos de bem-estar, que incluem serviço social, gerontologia e assistência a idosos e deficientes.

“Mesmo quando a mulher vai para o mercado de trabalho, ela acaba por buscar ocupações de cuidado”, diz Barbara Cobo, apontando que as mulheres são historicamente ensinadas desde cedo a cuidar do outro, ao contrário dos homens.

… mas com menor valorização no trabalho

Já no mercado de trabalho, são os homens que predominam quando se considera a taxa de participação na força de trabalho para pessoas com 15 anos ou mais (a taxa relaciona o percentual de pessoas na força de trabalho, ocupadas ou desocupadas buscando trabalho, ao universo de pessoas em idade de trabalhar).

Em 2022, a taxa de participação dos homens foi de 73,2% e de mulheres, 53,3%, uma distância de quase 20 pontos percentuais.

Apesar de pequenas mudanças ano a ano, essa desigualdade é no geral observada ao longo da série histórica independente da raça de homens e mulheres.

Mas são as mulheres pretas ou pardas que têm a menor participação na força de trabalho: a taxa delas foi de 52,2% em 2022, enquanto para mulheres brancas foi ligeiramente maior, 54,7%.

“Estando [a mulher] mais escolarizada, mais educada, mais especializada, ela teria melhores oportunidades no mercado de trabalho. Mas a gente vê que, na verdade, na média, não é isso que tá ocorrendo”, aponta a Cobo.

“Mesmo quando as mulheres estão muito mais escolarizadas do que os homens, você ainda vê que tem diferenças de rendimento em praticamente todas as atividades econômicas”, diz a pesquisadora, acrescentando que as mulheres em média recebem menos que os homens em vários graus de hierarquia, inclusive nos postos mais altos.

Já quando se olha apenas para o trabalho parcial (jornada inferior a 30h semanais), as mulheres predominam.

Em 2022, o percentual de mulheres em trabalhos parciais (28%) era praticamente o dobro dos homens (14,4%).

Entre as mulheres, o percentual chegou a ficar acima de 30% nas regiões Norte e Nordeste e entre as pretas ou pardas.

Apesar de os homens terem uma maior taxa de participação na força de trabalho, em 2022 foram as mulheres que tiveram uma carga total de trabalho maior. Como pode isso?

Nesse caso, são somados o trabalho remunerado com o cuidado da casa e/ou de outras pessoas. Em uma semana, mulheres trabalharam em média 54,4 horas, e os homens, 52,1.

Barbara Cobo diz que, mesmo que atualmente possa haver mais homens “engajados” nas tarefas domésticas, “na média”, essa ainda é uma responsabilidade que recai na mulher.

“Quando o cuidado é normalizado como vocação da mulher, como amor, como afeto, ele não é remunerado ou não é bem remunerado.”

Considerando apenas os afazeres domésticos e o cuidado de outras pessoas, as mulheres dedicaram em 2022 quase o dobro do tempo que os homens: 21,3 horas semanais para elas versus 11,7 para eles.

A desigualdade de gênero piora no Nordeste, chegando a 23,5 horas para mulheres contra 11,8 para homens.

A raça também distancia as mulheres na quantidade de horas dedicadas ao lar: para mulheres brancas, o tempo gasto foi de 20,4 horas por semana; para as pretas ou pardas, 22 horas.

Menos filhos e mais tarde

A queda da fecundidade (numero médio de filhos por mulher) é um fenômeno já relativamente antigo no país: ele começou a ser observado nos anos 1960 nas regiões mais industrializadas, e a base da pirâmide etária brasileira começou a diminuir no final da década de 1980.

Os dados divulgados pelo IBGE nesta sexta-feira reforçam essa tendência, observada mesmo em um intervalo curto de tempo, como entre 2018 e 2022.

Entre esses anos, o número total de nascimentos (considera-se bebês nascidos vivos) diminuiu 13%, passando de 2,94 milhões em 2018 para 2,56 milhões em 2022.

A redução ocorreu em todas as faixas etárias abaixo dos 40 anos. Por outro lado, a faixa de mães entre 40-49 anos foi a única em que o número de nascimentos aumentou (16,8%).

Barbara Cobo afirma que isso reforça a constatação de que as mulheres estão tendo filhos mais tarde e destaca os avanços na medicina reprodutiva — que oferece tratamentos como congelamento de óvulos e fertilização in vitro, os quais permitem o adiamento da maternidade.

“E as mulheres estão buscando ser mais escolarizadas, investir mais na carreira. As mulheres estão mais no mercado de trabalho hoje do que estavam nos anos 1970, 1980”, diz a pesquisadora.

Os dados do IBGE também mostram o impacto que ter uma criança de até 6 anos vivendo no domicílio tem na inserção no mercado de trabalho de adultos com 25 a 54 anos de idade, tendo como referência o ano de 2022.

Para mulheres com crianças no domicílio, o nível de ocupação foi 9,6 pontos percentuais menor do que daquelas que não tinham crianças em casa.

O nível de ocupação é o percentual de pessoas ocupadas em relação às pessoas em idade de trabalhar.

Para os homens, a presença de uma criança na residência aumentou o percentual de ocupação, tanto para brancos quanto para pretos e pardos.

O nível de ocupação de homens sem crianças de até 6 anos no domicílio foi de 82,8%; já entre aqueles com crianças em casa, o percentual subiu para 89%.

Casamento e gravidez precoce diminuem, mas ainda preocupam

Em 2022, houve 315,6 mil bebês nascidos de mães com 10 a 19 anos no Brasil. São muitos, mas em 2010 eram ainda mais: 552,6 mil, uma redução de 42,9%.

O percentual de nascimentos nessa faixa etária em relação ao total de mulheres entre 10-49 anos também diminuiu entre 2010 e 2022 (de 19,3% para 12,3%).

Essa relação muda bastante de região para região. No Norte, nascimentos de bebês gestados por meninas de 10 a 19 anos foram 19,7% do total de nascimentos entre mulheres de 10 a 49 anos.

Já o percentual mais baixo foi no Sul, 9,2%.

Enquanto isso, os casamentos precoces são classificados como aqueles envolvendo cônjuges de até 17 anos de idade e que são registrados formalmente.

Em 2021, eles afetaram mais as meninas (1,8% do total de casamentos) que os meninos (0,2% do total).

Entretanto, em comparação com 2011, o número de casamentos precoces de meninas em 2021 diminuiu 65,1% — cerca de 17 mil contra 48,6 mil.

Para Barbara Cobo, essa redução pode ser atribuída à maior escolarização das meninas e ao acesso à informação.

“Mas ele [o número de casamentos precoces] é para ser nada”, diz.

“Se a gente já está vendo que mulheres escolarizadas, com filhos pequenos, com rendimentos até mais altos ainda continuam tendo grandes obstáculos para a equidade de gênero, imagina essas meninas muito novas casando.”

A violência está próxima

Já é sabido, a partir de evidências científicas, que pessoas próximas às mulheres são frequentemente de quem parte a violência contra elas.

Por isso, o IBGE se debruçou sobre alguns dados que detectam quando a violência é acontece no círculo íntimo delas.

Um dado de 2019 revelou que 6% das mulheres com 18 anos ou mais haviam sofrido, nos 12 meses anteriores, violência psicológica, física ou sexual por parte de um ex-parceiro ou parceiro atual.

Esse percentual abarca atos de violência apontados pelas entrevistas como a forma de violência mais grave sofrida no período de um ano.

Cobo aponta que provavelmente há subnotificação nesses dados — entre outros motivos, porque a mulher pode se sentir inibida para registrar essa violência.

A partir de dados do Ministério da Saúde, o IBGE calculou também a taxa de homicídios intencionais contra elas a cada 100 mil mulheres. De 2017 a 2021, essa taxa diminuiu 25,5% (de 4,7 para 3,5).

O instituto destaca que a Lei do Feminícidio passou a valer em 2015. Portanto, essa diminuição pode estar, ao menos em parte, relacionada à lei.

Entretanto, vale destacar que nos últimos três anos registrados (2019, 2020 e 2021), a taxa de homicídios permaneceu a mesma.

Também foram analisadas as taxas para mortes intencionais ocorridas dentro e fora do domicílio.

A diminuição de mortes foi maior fora da residência das vítimas, com uma redução de 27,3% entre 2017 e 2021 (contra redução de 21,4% de mortes dentro do domicílio).

Em ambos tipos de ambiente e em todos os anos, as taxas de mortes de mulheres pardas ou pretas foi sempre maior do que das mulheres brancas.

Crédito: Mariana Alvim e Camilla Costa / BBC News Brasil, equipe de Jornalismo Visual da BBC – @ disponível na internet 11/03/2024

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