Empresas recorrem a reajustes para equilibrar o salto no total de despesas assistenciais
Os planos de saúde coletivos terão reajuste de dois dígitos pelo terceiro ano seguido, segundo relatório da XP. Entre dezembro e fevereiro, o aumento médio foi de 15%. Na lista de maiores grupos, o levantamento cita SulAmérica, Bradesco Saúde e Amil, que vêm aplicando taxas superiores a 20%. Hapvida e NotreDame Intermédica, juntas, seguem o patamar de mercado.
Em 2023, a alta média nos preços de planos coletivos foi de 14,38%, tendo acelerado dos 11,54% de 2022, segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
— A sinistralidade está muito elevada, e as margens financeiras das operadoras seguem apertadas. Amil, Bradesco Saúde e SulAmérica permanecem com sinistralidade superior a 90% (até dezembro). Avaliamos que virá outro ciclo de reajuste alto este ano — diz Rafael Barros, head das áreas de Saúde e Educação na XP.
88,6% em planos coletivos
O mercado tem 50,9 milhões de beneficiários, com 88,6% deles nos planos coletivos, entre empresariais e por adesão (vinculados a uma entidade de classe ou administradora de benefícios), segundo dados da ANS de fevereiro. Planos individuais e familiares têm reajuste limitado pela agência.
— Não dá para ajustar a conta só pelo controle de preço. Já estão acontecendo soluções, como adoção de novos modelos de remuneração de prestadores. O mais pesado em custos está na parte hospitalar. Tem de ser feita melhoria em prevenção — diz Barros.
Marcio Tosi, diretor da It’sSeg, de gestão de seguros e benefícios, reforça que há pouca mudança este ano:
— No primeiro trimestre de 2023, a média do percentual pedido de reajuste na nossa carteira em contratos com mais de 500 usuários foi de 34,3%. Agora está em 20,20% — diz. — O reajuste médio aplicado acabou ficando em 11,67% e 8,83%, respectivamente.
Estratégias para mitigar o aumento
A disparada das despesas vem da retomada de atendimentos represados na pandemia, inflação de custos e incorporação de tecnologias. Para mitigar a proposta de aumento, têm sido feitas revisões de contrato e usadas estratégias como adotar ou ampliar a cobrança de coparticipação e reduzir a rede de prestadores. As companhias optam por rebaixar o plano contratado para manter o benefício.
As estratégias usadas pelos planos, porém, estão alcançando o limite, incluindo o uso de coparticipação e a redução de reembolsos, diz Tosi.
À mesa, há outros fatores, dizem as empresas: perdas por fraudes e desperdício. Para conter abusos, o mercado arrochou protocolos para conceder reembolso. Marcelo Borges, diretor executivo da consultoria Mercer Marsh Benefícios, diz que o esforço é para acertar a operação.
E é preciso cuidado para evitar que o beneficiário tenha a percepção de “não ter acesso” ao plano. Um alento, diz, está no maior investimento em gestão de saúde pelas companhias que contratam planos:
— Uma empresa da indústria pesada registrava aumento em cirurgia ortopédica de alto custo. E decidiu criar um espaço com profissionais de fisioterapia para acompanhar os funcionários. Mitigou R$ 8 milhões em gastos em um ano.
Mais transparência
Para Marina Magalhães, pesquisadora do programa de Saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), falta transparência na definição de reajustes:
— É preciso aprimoramento regulatório, desde mais transparência até a padronização da fórmula de reajuste para contratos coletivos.
A ANS planeja implementar, até 2025, mudanças na regulação para melhorar a transparência do reajuste dos planos coletivos, diz Daniele Campos, gerente econômico, financeira e atuarial de Produtos da agência. Entre elas a padronização da memória de cálculo do reajuste, com itens mínimos a serem listados para explicar o percentual proposto à empresa-cliente. Uma fórmula única de cálculo de reajuste não está em discussão.
— Outra sugestão é a operadora enviar a memória de cálculo à empresa contratante mais vezes ao ano, a cada três a seis meses, para evitar surpresas — diz Daniele.
Marcos Novais, superintendente executivo da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), afirma que as empresas buscam equilíbrio. Ele lembra que o setor teve resultado operacional negativo em 2023, de R$ 5,9 bilhões, e em 2022, de R$ 11 bilhões:
— As despesas estão subindo no nível mais rápido da História. Operamos no prejuízo. A mensalidade não está pagando o custo do produto. Somos o país de maior desperdício do setor no mundo.
Novais destaca que é preciso equilibrar e frear custos, fraude e desperdício, o que inclui discutir a regulação. Mas reconhece que é preciso melhorar gestão, adotar protocolos em atendimento e uso da rede, e trazer mais embasamento técnico e científico ao debate.
“Para diminuir os reajustes é preciso racionalizar e reduzir os custos”, informou a Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenasaúde), citando o combate a fraudes e desperdícios. A entidade diz que as operadoras lançam produtos com cobertura regional mais acessíveis e ressalta que o reajuste reflete a variação das despesas e é “indispensável” para manter os planos.
Procurados, Bradesco Seguros, Porto Seguro, Unimed e Assim afirmaram que se manifestariam através da Fenasaúde, enquanto Hapvida/NotreDame Intermédica, via Abramge. A SulAmérica preferiu não se manifestar.
O GLOBO não conseguiu contato com Athena e Care Plus.
A Amil afirmou que o reajuste anual considera “a correção necessária para manter o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos levando em conta a sinistralidade do período”.
Crédito: Glauce Cavalcanti e Letícia Lopes / O Globo – @ disponível na internet 29/4/2024