Risco de recessão global ganha força com tarifaço americano

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Bolsas de valores dos EUA, Ásia e Europa perderam trilhões de dólares nos últimos diasFoto: Brendan McDermid/REUTERS

 

Recessão à vista? Entenda como o ‘tarifaço’ de Trump afeta o mundo e quais os efeitos para o Brasil

Tamanho do estrago ainda é difícil de ser mensurado pelos economistas, mas já é possível dizer que há uma piora na perspectiva de médio e longo prazos da economia global
O choque tarifário provocado por Donald Trump abalou o comércio mundial e aumentou a incerteza na economia global.
 
Na leitura dos analistas, a confusão criada pelo presidente dos Estados Unidos aumenta o risco de a economia norte-americana enfrentar uma recessão, um cenário que certamente afetaria o desempenho econômico de todo o mundo.
 

O tamanho do estrago ainda é difícil de ser mensurado pelos economistas, mas já é possível dizer que os investimentos e a cadeia global de negócios estão abalados e há uma piora na perspectiva de médio e longo prazos da economia global.

Num relatório publicado pelo Goldman Sachs na noite de domingo, 6, por exemplo, os economistas do banco aumentaram a probabilidade de recessão nos Estados Unidos de 35% para 45% nos próximos 12 meses.

Tarifaço de Donald Trump abala economia global
Tarifaço de Donald Trump abala economia global  Foto: Saul Loeb/AFP

“Estamos (…) elevando a probabilidade de recessão nos próximos 12 meses de 35% para 45%, após um forte aperto nas condições financeiras, boicotes de consumidores estrangeiros e um aumento contínuo na incerteza em relação à política econômica, fatores que devem reduzir os investimentos de capital mais do que havíamos assumido anteriormente”, escreveram os economistas do banco.

A sacudida de Trump na economia global já era esperada desde a eleição presidencial do ano passado e se consolidou na última quarta-feira, 2, quando ele anunciou uma taxa mínima de 10% a todos os parceiros comerciais, bem como tarifas “recíprocas” de até 49% a 60 outros parceiros comerciais.

No desenho apresentado por Trump, o Brasil entrou na tarifa mínima de 10% que entrou em vigor no sábado. As tarifas recíprocas para a China serão de 34% (além dos 20% já anunciados anteriormente), enquanto os produtos da União Europeia serão taxados em 20%. Para o Japão, Coreia do Sul e Índia, as sobretaxas serão de 24%, 25% e 26%, respectivamente. Essas taxas passam a vigorar na quarta-feira, 9.

“É um cenário agressivo de tarifação, e o mundo está com pouca boa vontade com os Estados Unidos, tendo essa ideia de retaliação”, diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. “O aumento de incerteza acaba afetando a percepção de consumidores e investidores. Quem vai consumir com intensidade? Quem investir com intensidade?”, questiona.

Na sexta-feira, 4, a China anunciou medidas retaliatórias contra os EUA e uma tarifa de 34% sobre todos os produtos importados do território americano. Nesta segunda-feira, 7, Trump ameaçou o país asiático de com tarifa adicional de 50%, caso essa medida não seja derrubada.

“Os impactos mudam todo o dia porque começamos a ver respostas de outros países”, diz Marcela Rocha, economista-chefe na Principal Asset Management no Brasil. “Quando analisamos as direções das tarifas anunciadas e a retaliações, especialmente da China, o que vemos é que o impacto para os Estados Unidos pode ser de uma combinação de estagflação.”

Com a escalada da guerra comercial, as Bolsas de valores de todo o mundo passaram a desabar. No Brasil, o dólarvoltou a superar o patamar de R$ 5,90. Nesta segunda-feira, 7, a moeda norte-americana subiu 1,30%, cotada a R$ 5,9106.

A guerra comercial detonada por Trump em seu primeiro mandato ajuda a dimensionar qual pode ser o tamanho do atual choque tarifário para a economia global e o Brasil. De 2018 a 2019, as tarifas impostas por Trump levaram o PIB global a desacelerar de 3,6% para 2,9% de 2018 para 2019, lembra Alessandra Ribeiro, sócia e diretora de macroeconomia e análise setorial da Tendências Consultoria.

“Houve uma queda importante de 0,7 (ponto porcentual), e isso tirou 0,2 ponto de porcentagem do PIB brasileiro”, afirma Alessandra. “Nos momentos em que a economia global desacelera, o Brasil desacelera junto. É muito correlato.”

Se essa magnitude de redução do PIB se repetir agora, o crescimento econômico global deve cair dos 3,2% para algo próximo de 2,5%, segundo Alessandra. “Já estávamos num cenário de crescimento mais baixo. Um crescimento de 2,5% para a economia é bem ruim.”

Para a economia brasileira, por ora, os analistas ainda trabalham com um avanço do PIB próximo de 2% em 2025 — depois de um crescimento de 3,4% no ano passado. A leitura é que a tarifas de Trump devem prejudicar mais a indústria, mas podem, eventualmente, beneficiar o agronegócio se o País reforçar os seus laços ainda mais com a China ou se aproximar de outros países.

“A tarifa que o Trump impôs (ao Brasil) foi a menor de toda a lista. Devemos ter como efeito uma aproximação com mais intensidade dos chineses, tanto do ponto de vista de exportação como de importação. Num primeiro momento, o País tende a ter uma exportação maior, especialmente de soja e carnes neste ano, por causa desse efeito da guerra comercial aumentada entre China e Estados Unidos”, afirma Vale.

Em 2017, ano em que Trump, assumiu a presidência norte-americana pela primeira vez, a corrente de comércio (soma de importação e exportação) com os Estados Unidos era de US$ 54,6 bilhões. Em 2024, subiu a US$ 81 bilhões. Com a China, a corrente saltou de US$ 75 bilhões para US$ 158 bilhões.

Tendência de o comércio com a China crescer

“No longo prazo, a tendência é o Brasil se aproximar cada vez mais da China”, diz Vale. “A corrente de comércio do Brasil com a China é o dobro da dos Estados Unidos e tende a ficar o triplo em cinco anos.”

Há também sempre a dúvida se o governo brasileiro não vai lançar mão de novas medidas para estimular a economia num eventual cenário de desaceleração global. Como em anos anteriores, o governo voltou a antecipar o pagamento de 13.º salário de aposentados e pensionistas.

Também anunciou um novo programa de consignado privado e liberou o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para os trabalhadores que foram demitidos e não puderam acessar o saldo retido na conta por terem aderido à modalidade de saque-aniversário.

“Temos de ter no radar outras coisas que possam vir”, afirma Alessandra. “Estamos vendo ações para sustentar o consumo doméstico. No curto prazo, você segura o impacto negativo, mas a conta vem, porque tudo isso se dá às custas de um fiscal mais complicado.”

Crédito:  Luiz Guilherme Gerbelli / O Estado de São Paulo – @ disponível na internet 8/4/2024


Risco de recessão global ganha força com tarifaço americano

A derrocada dos mercados financeiros globais se manteve pelo terceiro dia nesta segunda-feira (07/04) em reação às tarifas impostas pelo presidente dos EUA, Donald Trump, à maioria dos parceiros comerciais do país. A perspectiva de uma guerra comercial generalizada tende a provocar uma recessão global, com impactos previstos no crescimento, inflação e desemprego de diversos países.

Novas quedas de ações na Ásia, Europa e EUA no início desta semana foram impulsionadas pela recusa de Trump de rever a medida. “Às vezes, é preciso tomar remédios para consertar alguma coisa”, disse Trump a repórteres na noite deste domingo.

A expectativa é de que as novas tarifas resultem em maiores custos de produção e volatilidade nos mercados, queda da confiança empresarial e interrupções nas cadeias globais de suprimentos.

A economia global pode mesmo entrar em recessão?

A J.P. Morgan, uma das maiores instituições financeiras do mundo, avalia que há 60% de chances do mundo enfrentar recessão generalizada, em comparação com os 40% previstos antes do anúncio das novas barreiras tarifárias. 

A recessão é uma contração da economia, muitas vezes medida pelo tamanho do Produto Interno Bruto (PIB) de um país. Na ponta, a crise pode ocasionar um aumento no preço de itens básicos e redução na renda nas familias. A pandemia de covid-19 é um dos exemplos de uma depressão que exigiu intervenção de governos com programas de ajuda estatal para combater, por exemplo, o aumento da pobreza. 

Na segunda-feira, o Deutsche Bank alertou que, à medida em que Trump dobra a aposta em taxas recíprocas, suas políticas terão “imensas implicações globais para 2025 e para os próximos anos e décadas”.

Até o momento, os países mais atingidos estão na Ásia. Vietnã, Taiwan e Indonésia, por exemplo, tentam estabelecer novos acordos comerciais com Washington para evitar o colapso de setores-chave da indústria. Essa também foi a decisão da Índia, que enfrenta a partir de quarta-feira (09/04) uma sobretaxa de 26% sobre os seus produtos. Segundo informou a agência de notícias Reuters, o país não pretende retaliar a Casa Branca, mas estabelecer um novo consenso comercial com os EUA.

A China, que foi atingida por Trump com uma tarifa adicional de 34%, é, até o momento, a única grande economia a impor sanções retaliatórias sobre as importações dos EUA.

Na sexta-feira, Pequim também impôs taxas extras de 34% sobre os produtos americanos e restringiu a exportação de terras raras – matérias-primas essenciais para a produção de novos produtos de tecnologia e energia limpa. Em reação, Trump respondeu nesta segunda-feira ameaçando impor tarifas adicionais de mais 50% caso a China siga adiante com a medida.

Já a União Europeia, que deve ter suas importações taxadas em 20%, concordou nesta segunda-feira em impor 26 bilhões de euros em tarifas a produtos americanos em retaliação à sobretaxa de 25% imposta anteriormente sobre aço e alumínio.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse no domingo que o bloco estava preparado para “defender seus interesses com contramedidas proporcionais”, mas também sinalizou disposição de negociar com os EUA.

O ABN Amro, um dos maiores bancos da Holanda, cortou pela metade sua previsão de crescimento para os países da UE, projetando “em torno de zero” crescimento no primeiro trimestre, “com grande chance” de um resultado negativo.

Nos EUA, “catástrofe econômica autoprovocada”

A economia dos EUA teve um crescimento médio de quase 3% desde o fim da pandemia da covid-19, mas agora enfrenta o que a empresa de pesquisa Morningstar chamou de “catástrofe econômica autoprovocada”.

A empresa de análises financeiras S&P Global aumentou a probabilidade de uma recessão nos EUA para entre 30% e 35%, ante os 25% que havia previsto em março. O Goldman Sachs, por sua vez, aumentou as chances de uma estagnação da economia americana no próximo ano para 45%, enquanto o Barclays calcula que a contração terá efeito já nos próximos meses.

Steve Cochrane, economista-chefe da Moody’s Analytics para a região Ásia-Pacífico, alertou na segunda-feira que os EUA poderiam entrar em recessão “muito rapidamente” e que ela pode ser “bastante longa”.

Enquanto isso, a Capital Economics afirmou que, se Trump não estiver disposto a fazer novos acordos com os parceiros comerciais, a queda no mercado de ações será seguida por um “colapso na confiança das famílias e das empresas”.

A empresa de pesquisa econômica sediada no Reino Unido entende que a inflação dos EUA poderia subir acima de 5% e que a recessão pioraria se o Congresso dos EUA “não conseguir aprovar um estímulo fiscal oportuno”.

O chefe do Federal Reserve dos EUA (FED), Jerome Powell, alertou na semana passada que as tarifas provavelmente causariam o aumento da inflação e a desaceleração do crescimento no país. Ele também mencionou um risco “elevado” de aumento do desemprego.

Os mercados agora estão apostando que Powell anunciará em breve cortes nas taxas de juros dos EUA mais cedo do que o esperado anteriormente.

Jerome Powell, presidente do Banco Central americano
Jerome Powell, do Banco Central dos EUA, prevê inflação e desemprego no paísFoto: Kyodo/picture alliance

O que as tarifas significam para o crescimento da China?

As tarifas de Trump podem prejudicar a economia chinesa, interrompendo as atividades de exportação e causando uma volatilidade substancial no mercado.

Espera-se que Pequim implemente medidas monetárias e fiscais internas para compensar as barreiras tarifárias. Em uma publicação, o jornal porta-voz do Partido Comunista buscou assegurar os leitores chineses de que “o céu não cairá […] mesmo que as tarifas dos EUA tenham impacto”.

Na segunda-feira, o Ministério das Relações Exteriores da China chamou a política americana de “bullying econômico” e diz ser “inconsistente com as regras do comércio internacional”. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do país, Lin Jian, se recusou a dizer se o presidente chinês, Xi Jinping, buscaria negociar bilateralmente com a Casa Branca para resolver a guerra comercial.

Trump descartou a possibilidade de um acordo com a China até que o déficit comercial dos EUA seja equalizado.

O Goldman Sachs disse em um relatório publicado neste domingo que havia planejado atualizar sua previsão de crescimento para a China antes do anúncio das tarifas de Trump, mas que agora prevê uma redução do crescimento do PIB chinês em pelo menos 0,7% este ano.

A Kaiyuan Securities acredita que as tarifas devem reduzir as exportações chinesas para os EUA em quase um terço, cortar as exportações totais em mais de 4,5% e diminuir o crescimento econômico em 1,3 %.

Cochrane, da Moody’s Analytics, alertou que a China certamente sentirá dor econômica “porque a demanda por seus produtos será atingida com ainda mais força [do que a dos EUA]”.

Segundo o Deutsche Bank, a China passou da fabricação de 5% dos bens globais para 32% em trinta anos, enquanto os bens produzidos nos EUA caíram mais de um terço, para 15%. Os EUA exportaram 144,6 bilhões de dólares (R$ 835,3 milhões) em mercadorias para a China em 2024, muito menos do que os 439,7 bilhões de dólares (R$ 2,5 trilhões) que importaram, segundo dados do Departamento de Comércio da China.

Crédito: Nik Martin com AFP, AP, dpa e Reuters / Deutsche Welle – Disponível na internet 8/4/2025

 

 

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