Pacto entre Mercado e Congresso

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Essa aceitação, no entanto, está condicionada ao papel do Congresso como aliado na aprovação de pautas econômicas de interesse do mercado — e, sobretudo, como barreira a propostas do Executivo que impliquem maior alocação de recursos orçamentários para a população.

Trata-se de uma aliança pautada na conveniência mútua, não em princípios ou em um projeto estruturante de país.

Embora defenda publicamente a austeridade fiscal e a contenção dos gastos públicos — quando se trata da parcela mais vulnerável da sociedade —, o mercado compreende que o fortalecimento do Parlamento serve, até certo ponto, como instrumento funcional para garantir estabilidade política e previsibilidade institucional.

Em outras palavras, aceita-se o custo político das emendas parlamentares desde que estas não comprometam o equilíbrio fiscal — ou, mais precisamente, os fundamentos que sustentam a preservação dos seus próprios privilégios.

Essa tolerância está atrelada a uma expectativa clara: que o Congresso contenha o avanço de políticas redistributivas do governo Lula e atue como defensor dos interesses da elite econômica.

Entre esses interesses, destacam-se: a manutenção da desoneração da folha de pagamentos; a isenção do Imposto de Renda para os super-ricos e sobre dividendos; regimes especiais de tributação; e renúncias fiscais para setores estratégicos. O custo desse pacto é elevado: limita a capacidade do Estado de formular políticas para redução das desigualdades e compromete o orçamento com benefícios que perpetuam a concentração de renda.

Dessa forma, o Congresso se torna peça-chave na sustentação do atual arcabouço fiscal e na condução do orçamento federal, funcionando frequentemente de maneira mais alinhada ao mercado do que o próprio Executivo — mesmo quando parlamentares fazem parte da base governista. O Legislativo atua como fiador institucional dos interesses da elite, blindando-a contra eventuais reformas que busquem reequilibrar o sistema tributário ou redefinir as prioridades orçamentárias do país.

Exemplos recentes dessa aliança incluem a derrubada do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em operações de crédito para empresas, o que contribui para o agravamento da crise fiscal. Soma-se a isso a rejeição de imposto sobre grandes fortunas na regulamentação da reforma tributária, e a derrubadas de vetos presidenciais, como os que barravam a prorrogação da desoneração da folha, as isenções de Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) para Fundos Imobiliários e Fiagros, e o adiamento da votação da reforma do Imposto de Renda que previa tributação sobre lucros e dividendos que tramita no Senado.

Não por acaso, volta à cena um discurso retórico sobre os supostos excessos nos gastos com programas sociais, como o Bolsa Família, o Benefício de Prestação Continuada (BPC), benefícios previdenciários e aposentadorias. Ao mesmo tempo, defende-se o fim da vinculação de receitas para saúde e educação, o congelamento do salário-mínimo e a retomada de reformas como a administrativa e a previdenciária — que afetam principalmente os mais pobres. Em contrapartida, mantém-se o silêncio absoluto sobre os mais de 53% do orçamento federal destinados ao pagamento de juros e amortizações da dívida pública e sobre os mais de R$ 800 bilhões em renúncias tributárias, que favorecem majoritariamente os mais ricos.

Jornalista, analista político e diretor de Documentação licenciado do Diap. É sócio-diretor da Contatos Assessoria Política

Esse arranjo revela um jogo de interesses pragmáticos. O Congresso assegura previsibilidade ao mercado, e este, por sua vez, aceita um Legislativo empoderado desde que ele atue como guardião das regras fiscais e dos privilégios já estabelecidos. Trata-se, contudo, de um pacto instável, sujeito a rupturas diante de movimentos internos ou externos abruptos — como o expansionismo fiscal congressual, que frequentemente escapa a qualquer responsabilidade orçamentária. Enquanto esse equilíbrio se mantiver, o jogo continua: caro, desigual e politicamente voltado à manutenção de privilégios, com a permanente ameaça de crise fiscal para emparedar o governo.

Crédito: Neuriberg Dias / Agência DIAP de Notícias – @ disponivel na internet 27/6/2025

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