Penduricalhos inflam salários de juízes e remunerações acima do teto somam R$ 10,5 bilhões em 2024

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Vista da Estátua da Justiça, no Supremo Tribunal Federal, na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Foto: Dida Sampaio/Estadão
Os pagamentos acima do teto constitucional a juízes somaram R$ 10,5 bilhões em 2024 no Brasil, de acordo com estudo do Movimento Pessoas à Frente. O crescimento foi puxado por verbas indenizatórias conhecidas como “penduricalhos”, que entram no contracheque dos magistrados sem respeitar o limite e sem pagar Imposto de Renda.

Os valores pagos em 2024 representam um aumento de 49% em relação ao ano anterior (R$ 7 bilhões). A expansão é dez vezes a inflação no mesmo período, que foi de 4,83% (IPCA). Segundo o estudo, houve uma “corrida” do Judiciário para aumentar privilégios justamente no momento em que o governo e o Congresso discutiam um projeto de lei para limitar os supersalários no funcionalismo público. Os números foram calculados pelo pesquisador Bruno Carazza a partir de dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Procurado, o CNJ não se manifestou.

A Constituição determina que nenhum servidor público pode ganhar mais que um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2024, o salário máximo permitido foi de R$ 44.008,52 mensais. Em 2025, o valor subiu para R$ 46.366,19. Juízes, porém, acabam “furando” o teto com verbas que são classificadas como indenizatórias por decisões administrativas a todos os integrantes da categorias e pagas de forma permanente, quando deveriam ser eventuais e transitórias, como remuneração por acúmulo de serviço e auxílio saúde.

Com essa classificação, os magistrados também escapam de pagar Imposto de Renda sobre as verbas. “O pagamento dos supersalários é muito danoso dentro do funcionalismo público. Os servidores devem ser remunerados de acordo com a responsabilidade de suas funções, mas isso deve ser feito pelo valor que é entregue à sociedade”, diz a diretora executivo do movimento, Jessika Moreira. Para ela, o crescimento dos valores repassados não tem conexão com o desempenho dos juízes no serviço. “É puramente privilégio.”

O contracheque ajuda a explicar o crescimento. Em 2023, os magistrados brasileiros recebiam em média R$ 45 mil por mês. O valor subiu para R$ 54,9 mil em 2024 e chegou a R$ 66,4 mil em 2025. Os juízes passaram a ganhar em média mais que os ministros do STF em setembro de 2022. A diferença está justamente no que é pago acima do teto com os “penduricalhos”. Não há clareza sobre o que é indenizatório e o que é remuneratório e as verbas são classificadas de forma diferente em cada tribunal, o que dificulta a transparência e análise, destaca o estudo.

“As verbas indenizatórias estão muito presentes nessa corrida porque, se não estivessem, os rendimentos não ultrapassariam o limite do STF que é o teto constitucional”, diz Eduardo Couto, líder da área de Conhecimento do movimento que elaborou o estudo. Para ele, as verbas indenizatórias precisam ressarcir despesas eventuais e transitórias e devem ser expressamente autorizadas por lei, e não por medidas administrativas, como acontece hoje. “Não podemos pegar uma verba e pagar mês a mês para um servidor público. É preciso explicar por que ela aconteceu.”

Em maio, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou uma resolução que proíbe todos os tribunais do País de criarem e pagarem novos penduricalhos com efeito retroativo por meio de decisões administrativas. Para os especialistas, porém, o quadro ainda é negativo e é necessário uma lei mais rígida, pois 93% dos juízes ganham acima dos ministros do STF com mais de 3 mil tipos diferentes de verbas pagas no País inteiro.

No ano passado, o governo enviou ao Congresso uma proposta para limitar os supersalários, estabelecendo que os benefícios deveriam ser autorizados por lei complementar. Os parlamentares flexibilizaram a medida, definindo que uma lei ordinária (mais fácil de ser aprovada) vai dizer quais tipos de “penduricalhos” poderão ser excluídos do teto remuneratório.

O Ministério da Fazenda estuda enviar um novo projeto com a definição das verbas para limitar os pagamentos acima do teto. No Senado, há outra proposta em tramitação, mas o texto acaba criando exceções e fixando uma série de verbas indenizatórias fora do limite, como o pagamento em dobro do adicional de de férias e a gratificação por acúmulo de ofícios.

A Câmara criou um grupo de trabalho para elaborar uma proposta própria de reforma administrativa e colocou os supersalários na discussão. “Qualquer reforma sem tocar nisso vai gerar um sentimento de frustração”, afirmou o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), coordenador do grupo de trabalho, ao Estadão. O relatório deve ser apresentado até o dia 14 de julho.

Crédito: Daniel Weterman / O Estado de São Paulo – @ disponível na internet 1/7/2025

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