A pressão de Moraes em favor do Master não é grave. É gravíssima

0
86
@reprodução internet
Se essa história de Moraes vier a morrer sem consequência drástica, a democracia brasileira assinará o seu próprio atestado de óbito

Depois de quatro décadas de profissão, aprendi a reconhecer situações graves. A história do ministro Alexandre de Moraes com o Banco Master não é grave. É gravíssima.

Gravíssima a ponto de ser escandalosa. Reiteradamente, o ministro procurou o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, para pressionar em favor da venda do Banco Master para o BRB, de acordo com a jornalista Malu Gaspar.

Foram, pelo menos, quatro contatos: três telefônicos e um presencial. Moraes convocou Galípolo para conversar sobre o tema que não lhe deveria dizer respeito. Na reunião, o ministro afirmou que gostava de Daniel Vorcaro e repetiu o argumento do “banqueiro” de que o Master incomodava por estar ocupando espaço dos grandes bancos.

Já seria suficientemente grave um ministro do STF pressionar o presidente do BC em favor de qualquer banco. Mas o Master não é qualquer banco. É cliente do escritório de advocacia da mulher de Moraes.

Lei Magnitsky, dos EUA, atinge Alexandre de Moraes e Viviane Barci de Moraes -- Metrópoles
Alexandre de Moraes e Viviane Barci de Moraes @ Beto Barata/Presidência da República

A recapitulação é forçosa porque esclarecedora.

A doutora Viviane Barci de Moraes é um fenômeno da advocacia nacional. No início de 2024, ela assinou um contrato fabuloso com o Banco Master, no valor de cerca de R$ 130 milhões de reais, a ser pago em mensalidades de R$ 3,6 milhões.

Honorários dessa magnitude são inéditos para escopo bastante genérico: acompanhar o que fosse do interesse do cliente em todas as instâncias de poder em Brasília, inclusive no BC.

Apesar do valor do contrato, não há notícia de que as instituições citadas no documento tenham recebido pedidos de reunião ou petições da parte do escritório da doutora Barci de Moraes, como publicou Malu Gaspar. Até prova em contrário, o dinheiro embolsado foi ganho sem maior esforço.

Estranhamente, a ausência de trabalho não incomodava Daniel Vorcaro. Pelo contrário, ele priorizava os pagamentos mensais à advogada que contratou a peso de muito ouro. Para se ter ideia da dimensão do pote no final do arco-íris, o patrimônio pessoal da doutora pulou de R$ 24 milhões, em 2023, para R$ 79,7 milhões, em 2024, graças aos dividendos proporcionados pelo Barco Master, segundo o jornalista Lauro Jardim.

Agora se sabe, porém, que durante a vigência do contrato, com as mensalidades caindo pontualmente na conta do escritório da doutora Barci de Moraes, o ministro Alexandre pressionou o presidente do BC em favor do cliente da sua mulher.

Nem a advogada milionária, nem o ministro do STF se dignaram até o momento a explicar a invulgar ligação contratual dela com Daniel Vorcaro e a deferência especialíssima que Moraes demonstrou ter pelo “banqueiro”.

 

A única manifestação pública foi uma nota divulgada hoje pelo ministro, que não explica nada, apenas sai pela tangente. A nota diz que ele se reuniu com o presidente do Banco Central e outros dirigentes de bancos para tratar da Lei Magnitsky, da qual Moraes deixou de ser alvo há poucos dias. Nenhuma palavra sobre o Master.

O máximo que se tem é um advérbio: o ministro teria tratado “exclusivamente” sobre as consequências da lei americana com os seus interlocutores. A nota do BC, por sua vez, não traz o advérbio ao confirmar que o banco manteve reuniões com o ministro para discutir os efeitos da Magnitsky. Os telefonemas citados por Malu Gaspar foram ignorados por ambos os lados.

Compreende-se a dificuldade do casal Moraes: é mesmo difícil encontrar explicação a respeito do que já veio à tona, afora aquela que se encontra no campo do inadmissível.

A doutora Viviane Barci de Moraes vai dizer o quê? Que o marido Alexandre não sabia do contrato espetacular firmado com o Banco Master?

O ministro será capaz de afirmar que, ao pressionar o presidente do Banco Central, ignorava que estava servindo aos interesses de um cliente que vinha pagando uma fortuna à sua mulher?

Não há justificativa que possa cancelar a gravidade da conduta de Alexandre de Moraes. Todo mundo está consciente disso, principalmente os seus pares no STF. Se a história vier a morrer sem consequência drástica, a democracia brasileira assinará o seu próprio atestado de óbito.

Crédito: Mario Sabino / Metrópoles – @ disponível na internet 24/12/2025


Moraes chegou a ligar seis vezes para Galípolo num dia para tratar da venda do Banco Master ao BRB

Ofensiva telefônica do ministro visava salvar instituição financeira de Daniel Vorcaro; versão oficial, divulgada nesta terça-feira, alega que conversas foram apenas sobre sanções dos EUA

 O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes chegou a telefonar seis vezes no mesmo dia para o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, para saber sobre o andamento da operação de compra do Banco Master pelo Banco de Brasília (BRB). A série de telefonemas faz parte de uma das, ao menos, cinco conversas de Moraes com Galípolo sobre o assunto, sendo uma delas presencial.

A informação, obtida com pessoas do meio jurídico e do mercado financeiro que ouviram relatos, inclusive, de um dos envolvidos, detalha a intensidade da pressão exercida pelo ministro sobre a autoridade monetária em meio à análise do negócio que salvaria a instituição de Daniel Vorcaro, liquidada pelo BC em 18 de novembro sob suspeita de fraudes de R$ 12,2 bilhões. A mulher de Moraes, Viviane Moraes, fechou um contrato de R$ 129 milhões para representar o Master em Brasília, inclusive no BC.

O teor e a frequência dessas ligações contradizem as explicações dadas publicamente pelas autoridades nesta terça-feira, 23.

Em notas oficiais divulgadas pela manhã, Moraes afirmou que as reuniões e contatos tiveram como “exclusivo” objetivo tratar dos efeitos da Lei Magnitsky. Já o BC também disse que o assunto era sobre as sanções econômicas impostas pelos EUA ao ministro, mas não usou o termo “exclusivamente”.

A existência de conversas entre Moraes e Galípolo fora da agenda foi revelada originalmente pela colunista Malu Gaspar, do jornal O Globo. Segundo a jornalista, foram ao menos quatro encontros, sendo um presencial. O Estadão confirmou a existência de ao menos cinco conversas, sendo uma presencial, com pessoas que ouviram relatos, inclusive, de um dos envolvidos.

A pressão de Moraes no presidente do BC se deu no momento em que havia uma divisão dentro da própria autarquia sobre a aprovação ou rejeição do negócio, conforme publicado pelo próprio Estadão. Moraes repetiu a Galípolo os argumentos usados por Vorcaro de que os grandes bancos não viam com bons olhos sua atuação no mercado financeiro porque temiam a concorrência.

A compra do Master pelo BRB foi anunciada no fim de março e só foi rejeitada pelo BC no dia 3 de setembro. Moraes foi sancionado pela Lei Magnitsky no dia 30 de julho e a mulher dele, no dia 22 de setembro.

A versão oficial

Pressionado pela repercussão do caso, Moraes divulgou nota afirmando que procurou Galípolo apenas para mitigar os danos das sanções aplicadas a ele em julho pelo então presidente americano Donald Trump.

“Em todas as reuniões, foram tratados exclusivamente assuntos específicos sobre as graves consequências da aplicação da referida lei, em especial a possibilidade de manutenção de movimentação bancária, contas correntes, cartões de crédito e débito”, diz o texto do ministro.

O magistrado alegou ainda que, pelo mesmo motivo, conversou com a presidente do Banco do Brasil, Tarciana Medeiros, o presidente da Febraban, Isaac Sidney, e executivos do BTG, Santander e Itaú. O Banco Central confirmou essa versão em comunicado próprio. Nenhuma das notas cita o Banco Master.

O contexto: milhões em jogo

A revelação das seis ligações focadas no negócio BRB-Master lança suspeitas sobre o real motivo da urgência de Moraes. O banco liquidado possui laços financeiros com a família do ministro. Conforme revelado pelo jornal O Globo, o escritório da advogada Viviani Barci, esposa de Moraes, firmou um contrato com o Banco Master que prevê o pagamento de R$ 3,6 milhões mensais entre 2024 e 2027.

Se cumprido integralmente, o acordo renderia R$ 129 milhões ao escritório da família Moraes. O contrato estava vigente enquanto Moraes abordava Galípolo e foi encerrado na liquidação do banco pelo BC em 18 de novembro.

O cenário político já reage às denúncias. Nesta segunda-feira, 22, o senador Alessandro Vieira anunciou que está colhendo assinaturas para uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o contrato do escritório de Viviani Barci e a suposta advocacia administrativa de Moraes junto ao Banco Central.

Sanções e retaliações

Oficialmente, o ministro sustenta que sua preocupação era apenas com a Lei Magnitsky. Moraes foi alvo da Casa Branca em julho, em meio a pressões sobre o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro. Em setembro, Viviani Barci também foi incluída na lista de sanções, após a condenação de Bolsonaro a 27 anos de prisão.

No último dia 12 de dezembro, Trump retirou o ministro e sua esposa da lista de alvos, num gesto de reaproximação diplomática com o governo Lula.

Crédito: David Friedlander e Eliane Cantanhêde / O Estado de São Paulo – @ disponível na internet 24/12/2025

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui