Brasileiro lidera revolução: O Computador Quântico da Amazon e seu Impacto na Sociedade

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Chip quântico da Amazon será até 10 vezes mais eficiente que esperado (Imagem: Amazon Web Services/Reprodução)

‘O computador quântico vai transformar a sociedade’, diz brasileiro que criou chip da Amazon

Fernando Brandão liderou equipe que construiu o primeiro chip com propriedades quânticas na Amazon; trabalho é fruto de cinco anos de pesquisas

Um novo gigante entrou na corrida da computação quântica.

Depois de Google, IBM e Microsoft, a Amazon apresentou no final de fevereiro o Ocelot, o seu primeiro chip quântico. Por trás do passo que deve ajudar a definir o futuro da gigante está um brasileiro, Fernando Brandão, diretor de ciência aplicada na AWS.

Natural de Belo Horizonte, o pesquisador é uma estrela da área. Em 2019, o Estadão mostrou como ele fez parte da equipe que desenvolveu a primeira máquina do mundo a obter a supremacia quântica, quando uma máquina do tipo é capaz de executar um problema impossível para supercomputadores clássicos. Foi seu último trabalho no Google, antes de ingressar na Amazon.

Na empresa fundada por Jeff Bezos, o objetivo era criar um chip capaz de diminuir as taxas de erros. Na computação quântica, a informação é processada por meio de qubits, que, ao contrário dos bits da computação clássica (como a dos smartphones), exibe diversos estados entre 0 e 1. É como se os bits fossem uma lâmpada se só é capaz de ficar acesa ou apagada, enquanto os qubits são uma lâmpada dimerizada, exibindo diferentes estados de iluminação entre a ausência e a presença total de luz. No entanto, os qubits são bastante instáveis e o Santo Graal da indústria é conseguir torná-los estáveis ao ponto em que as máquinas se tornem úteis fora dos laboratórios.

Ocelot é o novo chip quântico desenvolvido pelo AWS Center for Quantum Computing
Ocelot é o novo chip quântico desenvolvido pelo AWS Center for Quantum Computing Foto: AWS/Reprodução

Desenvolvido durante cinco anos, o Ocelot usa um método de oscilação de qubits para diminuir a taxa de erro desses componentes, facilitando a construção de um chip com capacidade de processar fórmulas longas e complexas para os computadores comuns.

Fernando Brandão @reprodução

É a missão perfeita para Brandão. Há nove anos, ele ocupa a cadeira máxima da Divisão de Teoria Física, Física, Matemática e Astronomia do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech). A escolha não é à toa: professor do Caltech e prêmio Nobel de Física de 1965, o americano Richard Feynman, foi quem deu os primeiros passos na computação quântica.  Filho do meio de um casal de professores universitários – o pai é professor de literatura e língua grega; a mãe, de filosofia – Brandão apresentou o Ocelot em um momento crucial para a área. É hora dessas máquinas mostrarem que são capazes de levar a descobertas que transformarão o mundo.

Ele conversou com o Estadão sobre o tema em videochamada de sua casa na região de Los Angeles, EUA.

“As pessoas comentam que é uma competição entre os Big Techs e, claro, tem um pouco disso. Todo mundo quer progredir. Mas acho que, no caso da computação quântica, realmente não é uma maneira de pensar nisso. É muito gratificante ser parte desse time e ser parte da comunidade de computação quântica em geral, que pode contribuir para avançar a humanidade de alguma maneira, tentando construir esse novo tipo de computador”. Veja abaixo os melhores momentos da conversa.

A computação quântica já faz parte da sua rotina há muito tempo. Como é ver um chip desse tipo, como o Ocelot, em funcionamento?

É um momento muito bom. A gente começou esse projeto na Amazon há uns cinco anos e o objetivo de longo prazo é construir um computador quântico que traz benefício pra sociedade. E, claro, não somos os únicos tentando fazer isso e, como todo mundo trabalhando na área sabe muito bem, isso é um desafio tecnológico incrível.

Por que investir em computação quântica?

As leis da física quântica são muito diferentes da física que a gente observa no nosso dia a dia. E essa diferença pode ser usada para fazer uma computação de uma maneira muito mais eficiente para algumas aplicações importantes para sociedade, como criptografia ou ciências materiais, por exemplo. Algumas delas são muito, muito difíceis para os nossos melhores computadores. Algumas delas são, na verdade, impossíveis para os computadores que a gente tem hoje em dia, mas o computador quântico conseguiria resolvê-las. Então, todo esse esforço para construir um computador quântico, uma vez alcançado, vai se transformar em uma tecnologia transformadora para sociedade.

A Amazon anunciou que a tecnologia usada nesse chip quântico é a de correção de erros. O que isso significa?

Desde o começo desse projeto, a Amazon já entendia que sem correção de erro, computadores quânticos não vão trazer benefício para sociedade. Depois de muitas tentativas, muita ciência junto com engenharia, a gente conseguiu implementar uma correção de erros sem a necessidade de tantos qubits, e isso é o que o Ocelot demonstra. Correção de erro é uma ideia que já existe em tecnologia normal, mas a gente quer a versão quântica disso. E a gente sabe como fazer isso em princípio, mas tem um preço que você paga. E o preço que você paga é que para cada qubit que você quer ter no seu computador, você precisa construir vários qubits no laboratório para que ele “absorva” os ruídos. O Ocelot implementa um novo tipo de correção de erro que chama correção de erro quântica bosônica. A ideia é que, inventando uma nova maneira de fazer correção de erro quântica, a gente consiga reduzir em 10 vezes o excesso de qubits necessários para fazer correção de erro numa escala de utilidade prática. Então, no momento, é um protótipo, é um chip com correção de erro funcionando, mas pequeno ainda. E o que a gente tem que fazer agora é escalonar esse chip. Mas essa nova estratégia que a gente achou vai permitir que a gente faça isso de maneira muito mais eficiente do que antes.

Como isso foi possível de ser feito?

Nesse chip temos fótons que se posicionam como se tivessem entre dois espelhos, em que eles batem várias vezes. Isso é o ‘oscilator’, eles oscilam entre essas cavidades, entre esses dois espelhos. O que a gente consegue ver é que quando a gente coloca mais fótons lá, ele se torna mais robusto para erros, para um tipo de erro pelo menos. O que a gente conseguiu fazer, usando esse tipo de qubit, foi corrigir um desses tipos de erro diretamente no nível do qubit. Então, a gente consegue construir um qubit que só tem o mesmo erro que os bits clássicos. E aí a gente pode usar só um código de correção de erro tradicional para resolver esse tipo de ruído. Resumindo, a gente desenvolveu um novo tipo de qubit que só é suscetível a um dos dois tipos de erros que normalmente a gente tem no computador quântico.

Qual foi o maior desafio que vocês encontraram nesse projeto?

O maior desafio foi esse tipo de qubit especial, chamado “qubit gato”. Já se sabia que eles poderiam ser úteis para correção de erro quântico, eles são mais robustos que outros tipos de qubits, mas era muito difícil fazê-los de uma maneira escalável, colocar vários deles num chip e implementar o código de correção de erro. E acho que isso foi a maior inovação que a gente conseguiu fazer. A gente conseguiu fazer esses “qubits gato” mas de uma maneira escalável, onde a gente pode colocar vários num chip, conectá-los, fazer eles funcionarem e aí ter essa correção de erro mais eficiente.

Estamos em um momento em que temos visto com mais frequência descobertas no mundo da computação quântica. Esses anúncios ficarão mais comuns?

Sim. Tem bastante interesse na área e a gente chama de “moonshots” todos os projetos, porque o objetivo final ainda está bem no futuro para todo mundo, ainda precisa de muito desenvolvimento, não importa qual é a plataforma que você está considerando. Também tem todos esses grupos e empresas diferentes porque tem muitas ideias de como construir o computador quântico. E qual dessas ideias vai ser realmente a melhor e vai construir o primeiro computador quântico? Isso só a história vai falar para a gente. Na Amazon, a gente se sentiu muito bem trabalhando com versões futuras do Ocelot. Mas eu acho muito bom que tenham outras pessoas tentando outras abordagens e isso faz a área de computação quântica ser interessante, com muita coisa acontecendo e muitas vezes a gente vê também uma plataforma ou uma abordagem para construir um computador quântico influenciando a outra. Então, eu acho que é um momento realmente de muito aprendizado, de muita construção e que bom que há todo esse investimento, porque sem isso não tem como progredir em uma área de tecnologia igual essa.

Qual o cenário futuro da computação quântica para os próximos anos?

Todo esse trabalho, todo esse esforço é para atingir um objetivo final que é construir um computador quântico que, um dia, vai trazer benefícios para a sociedade – e isso significa resolver alguns problemas de interesse da sociedade que são totalmente impossíveis para os computadores que a gente tem hoje em dia. Com certeza é um objetivo muito valioso, que vale a pena investir, mas vai demorar muito tempo ainda, não é uma questão de alguns poucos anos. Ao mesmo tempo, por causa de todo esse investimento e todo o interesse, estamos em uma curva exponencial de desenvolvimento. É muito difícil prever, mas eu vejo todos os passos necessários para chegar lá acontecendo, e talvez isso comece a acontecer mais rapidamente no futuro.

Crédito: Bruna Arimathea/O Estado de São Paiulo – @ disponível na internet 10/3/2025

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