CGU alertou INSS sobre fraude bilionária em descontos de aposentados 7 meses antes de operação da PF

0
205
Imagem disponível na internet

Entidade reportou que 7 em cada 10 aposentados sequer sabiam das perdas por não receberem extrato físico dos benefícios

 A auditoria realizada pela Controladoria-Geral da União (CGU) sobre desvios bilionários de benefícios de aposentados e pensionistas do País durou pelo menos três meses e chegou à cúpula do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em setembro de 2024 – sete meses antes da Operação Sem Desconto, da Polícia Federal, que derrubou o então presidente do órgão Alessandro Stefanutto.

O foco da auditoria foi ouvir 1.242 beneficiários de todos os Estados para entender se eles haviam autorizado os descontos por parte de associações privadas. Elas ofereciam, em troca, serviços dos mais diversos tipos, como assistência funerária, consultas médicas e “maridos de aluguel” (reparos em residências).

A auditoria aconteceu após o órgão constatar “súbito aumento” nos descontos, a partir de 2023, além de fragilidades nos controles do INSS, histórico de irregularidades nessa prática e elevado número de pedidos de cancelamentos dos descontos por parte dos aposentados.

“Este trabalho foi realizado devido ao súbito aumento no montante dos descontos de mensalidades associativas realizados na folha de pagamento de beneficiários do INSS (de R$ 536,3 milhões em 2021 a R$ 1,3 bilhão em 2023, podendo alcançar R$ 2,6 bilhões em 2024), aliado à fragilidade dos controles mantidos pelo INSS para a realização desses descontos, ao histórico de irregularidades reportadas, e ao elevado número de requerimentos, ao INSS, de cancelamento de descontos (192 mil em abril de 2024)”, diz o documento da CGU.

O valor final de 2024, de acordo com a Operação Sem Desconto, foi de R$ 2,8 bilhões – acima do projetado pela CGU.

7 em cada 10 desconheciam descontos

Nas conversas com beneficiários, os auditores descobriram que 97,6% dos entrevistados não haviam autorizado os descontos dos seus benefícios. É esse número que indica, segundo a CGU, que grande parte dos R$ 7,99 bilhões descontados desde 2016 tenham acontecido de forma irregular.

Além disso, a auditoria apontou que 72% sequer sabiam que estavam sendo descontados pelo INSS, que então repassava os recursos às associações. Isso porque o INSS parou de enviar o extrato físico com o detalhamento dos proventos e muitos dos aposentados e pensionistas não tinham acesso ao extrato pelo formato digital ou não iam a agências físicas.

“Verificou-se que 72,4% dos entrevistados desconheciam a existência do desconto associativo em seu benefício. Destaca-se que para conhecimento do desconto é necessário acessar o extrato, o qual não é mais enviado ao beneficiário, podendo ser requerido em uma Agência da Previdência Social ou pelo aplicativo Meu INSS”, disse o órgão.

 

Indícios de documentações fraudadas

A CGU separou os entrevistados em dois grupos. Para um primeiro, de 90 aposentados, fichas com autorização dos descontos foram encaminhadas ao órgão pelas associações. Quando confrontados com o documento, 81% dos aposentados negaram que haviam dado consentimento para os descontos, o que sugeriu fortes indícios de fraude.

“Este resultado, por sua vez, revela que as assinaturas podem estar sendo recolhidas sem o conhecimento do beneficiário sobre a finalidade ou inclusive que as documentações podem estar sendo fraudadas”, diz a CGU.

O órgão também descobriu que havia descontos de aposentados em Estados diferentes de onde as associações ofereciam serviços.

“Em que pese a possibilidade de as entidades celebrarem parcerias com outras entidades, correspondentes bancários ou representantes, o acesso aos serviços ofertados seria difícil, a menos que ocorresse de forma remota, o que seria improvável, dada a falta de familiaridade dos beneficiários com recursos digitais”.

Além disso, o órgão apurou que havia assinaturas de pessoas com deficiência, “o que os impede dessa manifestação de vontade”, além de indígenas que não sabiam ler nem escrever e “residentes no exterior e que não tiveram contato com associações quando estiveram no Brasil”.

Digitalização jogou contra aposentados

A digitalização do processo, segundo a CGU, tornou mais fácil para as associações se cadastrarem no INSS e aplicarem o golpe, ao mesmo tempo que atrapalharam a vida de aposentados que queriam cancelar os descontos irregulares.

“Ante as fragilidades de controle identificadas, os resultados sinalizam que os beneficiários encontram mais dificuldades para bloquear os descontos do que as entidades para implementá-los, indicando fragilidade na proteção dos direitos dos beneficiários”.

O órgão aponta que os descontos poderiam ocorrer sem nenhuma análise por parte de servidores do INSS.

“Verifica-se que a transformação digital ocorrida no INSS sem o devido aperfeiçoamento dos controles internos elevou os riscos relacionados à realização de descontos associativos indevidos. Além de os descontos poderem ser realizados pelas entidades sem qualquer tipo de análise por um servidor do INSS”.

Com isso, o número de entidades saltou de 15 em 2021 para 22 em 2022, chegando a 33 em 2024 – sendo que 11 delas foram alvo de medidas judiciais da Operação Sem Desconto.

Recomendação de ‘bloqueio imediato’

Diante dos fortes indícios de irregularidades, entre as recomendações feitas pela CGU ao INSS estavam o “bloqueio imediato” dos descontos, além do aprimoramento da formalização dos convênios entre as associações e o INSS.

“Recomendou-se ao INSS o bloqueio cautelar e imediato de descontos de novas mensalidades associativas; o aprimoramento de procedimentos de formalização, acompanhamento da execução, suspensão e cancelamento de ACT (Acordos de Cooperação Técnica)”, diz o órgão.

A CGU diz que, ao contrário, que o INSS ignorou os alertas e seguiu dando autorizando o desconto dos benefícios dos aposentados.

“Mesmo conhecendo essa situação, a existência de denúncias recorrentes acerca da realização de descontos associativos não autorizados pelos beneficiários, e a falta de capacidade operacional necessária para acompanhamento dos ACT, o INSS não implementou controles suficientes para mitigar os riscos de descontos indevidos”, disse a CGU.

O bloqueio dos descontos só foi anunciado nesta quinta-feira, 24, após a deflagração da Operação Sem Desconto. O ministro da CGU, Vinicius Carvalho, anunciou a suspensão dos convênios do INSS com sindicatos e associações e afirmou que os valores descontados de forma indevida serão restituídos aos beneficiários, mas ainda não há prazo para o ressarcimento integral.

Crédito: Alvaro Gribel  / O Estado de São Paulo – @ disponível na internet 25/4/2025


— O governo vai ressarcir integralmente o que foi descontado ilegalmente — afirmou Débora Floriano. — Esses descontos ocorreram antes do governo atual também — ressaltou.

O governo não deu quantidade de devolução ou prazo e disse que nos próximos dias vai apresentar esse plano.

Débora pediu para não haver uma corrida às agências.

— Mas vamos frisar que os descontos estão suspensos, e pedimos para que os beneficiários não vão massivamente para as agências nesse momento.

O ministro da CGU, por sua vez, disse que vai entender o que foi descontado indevidamente e o que foi descontado legalmente.

— É uma determinação do presidente Lula que os aposentados que tiverem sido ilegalmente descontados, vamos por um trabalho do governo, responsabilizando aqueles que são responsáveis por isso, e garantir uma restituição.

Revisão

Carvalho reforçou que todos os acordos atuais vigentes para descontos estão suspensos para um processo de revisão nesse modelo. Ainda haverá desconto em abril, mas o dinheiro será devolvido em maio, afirmou.

— Essa suspensão que está sendo decidida vai viabilizar, em primeiro lugar, que os recursos que iriam para as associações neste mês de maio já não vão para as associações. Esses recursos serão retidos e na próxima folha de pagamento serão restituídos aos aposentados — disse.

O chefe da CGU disse que, a partir de agora, nenhum aposentado será descontado de sua folha de pagamento.

Segundo ele, são cerca de 6 milhões de brasileiros que tinham descontos em sua folha dentre os 40 milhões aposentados e pensionistas do Brasil. Uma parte deles havia autorizado o desconto de maneira consciente, outra parte não, afirmou.

— Nós estamos tratando de uma oportunidade de reorganizar esse sistema como um todo, mas para tornar essa sistema seguro e necessário que se faça a suspensão de todos esses acordos de cooperação técnica, de todas entidades, que foram celebrados com o INSS nos últimos anos — disse Carvalho.

O ministro da CGU disse que esses descontos vinham sendo feitos há anos e que passou a analisar o caso no segundo semestre de 2023.

A operação

O chefe do INSS, Alessandro Stefanutto, foi afastado do cargo por decisão judicial e depois demitido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que soube da ação no início da manhã.

A operação, que envolveu centenas de policiais e auditores, foi autorizada pela Justiça do Distrito Federal para combater um esquema nacional de descontos associativos não autorizados em aposentadorias e pensões. As investigações apontam que a soma dos valores descontados chega a R$ 6,3 bilhões, entre 2019 e 2024, mas ainda será apurado qual porcentagem foi feita de forma ilegal.

Além de Stefanutto, um policial federal e quatro servidores que integram a cúpula do INSS foram afastados de suas funções.

As investigações apontaram que havia descontos sobre valores pagos mensalmente pelo INSS como se os beneficiários tivessem se tornado membros de associações de aposentados, quando, na verdade, não haviam se associado nem autorizado os descontos.

A operação ocorreu em 13 estados e no Distrito Federal, com 211 buscas e apreensões em 34 municípios — incluindo a sede do INSS.

Com um único alvo, foram apreendidos vários carros, avaliados em mais de R$ 15 milhões, segundo a PF. Com outro, US$ 200 mil e, um segundo, US$ 150 mil. Também foram determinadas as prisões de seis pessoas, das quais cinco foram presas.

Os descontos nas folhas do INSS têm sido alvos de apuração, reportagens e processos judiciais porque os números de recolhimento dispararam. Foram de R$ 413 milhões em 2016 para 15 entidades para R$ 2,6 bilhões no ano passado a 33 associações.— O governo vai ressarcir integralmente o que foi descontado ilegalmente — afirmou Débora Floriano. — Esses descontos ocorreram antes do governo atual também — ressaltou.

Crédito:  Bernardo Lima / EXTRA – @ disponível na internet 25/4/2025

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui