“Se nada for feito, Brasil caminha para se tornar um narcoestado”, diz promotor que investiga o PCC
A execução do ex-delegado-geral de São Paulo, Ruy Ferraz Fontes, é mais um capítulo da força do crime organizado no País. Se não frear a escalada das facções, o Brasil corre o risco e se tornar um país dominado pelo tráfico de drogas, alerta o promotor Lincoln Gakiya, que investiga o Primeiro Comando da Capital (PCC) há cerca de 20 anos.
A polícia ainda investiga o atentado contra Ferraz Fontes, mas já identificou dois dos seis suspeitos – um deles têm ligação com o PCC. A vítima foi fuzilada na segunda-feira, 15, em uma emboscada na segunda-feira, 15, em Praia Grande (SP), onde era secretário-municipal.
Com cerca de 40 anos de carreira na Polícia Civil, o ex-delegado-geral foi o responsável pelo indiciamento de Marcola, líder máximo do PCC, nos anos 2000. Ele havia se aposentado da corporação havia dois anos.
“Isso é a falência do Estado. O Brasil caminha a passos largos para se tornar um narcoestado, se nada for feito. Não quero ser um profeta do apocalipse, mas não dá para ser muito otimista”, disse ao Estadão Gakiya, membro do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo (Gaeco) do Ministério Público Estadual.
Um narcoestado é um país onde as instituições são infiltradas pelo poder e pela riqueza de organizações de tráfico de drogas, resultando na corrupção de agentes públicos e na influência do crime organizado em políticas governamentais.
Gakiya compara a execução do ex-policial ao ataque do PCC contra o delator Vinícius Gritzbach, em novembro de 2024, no Aeroporto de Guarulhos.
“Embora os executores fossem policiais militares cooptados, tinha o envolvimento do PCC no crime de mando, porque ele era jurado pelo PCC”, afirmou o promotor.
“O que precisa entender é que o PCC escalou, é uma organização criminosa que já saiu dos muros do sistema prisional. Não é mais uma facção de prisão, já ganhou as ruas”, acrescentou.
Segundo Gakiya, que acompanha a investigação sobre o caso, um dos suspeitos já esteve no sistema prisional e é vinculado ao PCC. Ele ressalva que o envolvimento da facção na execução ainda precisa ser confirmado pela investigação.
“Que é de uma organização criminosa, não tenho dúvida. Os executores são criminosos profissionais e o suspeito é ligado ao PCC. Não quer dizer que necessariamente tenha sido obra do PCC, mas há essa ligação.”
As cenas do crime mostram que os assassinos tinham treinamento. O grupo fez um tocaia à espera de Ferraz Fontes e o perseguiu de carro. Depois, três bandidos desceram do automóvel, armados com fuzis, para executá-lo enquanto outro ficou à espera, na retaguarda.
Segundo ele, a infiltração da facção – como na economia informal e em alguns setores no mercado financeiro – mostra o avanço do crime organizado. “Essa associação do PCC, que já é uma máfia, com esses outros tipos de criminosos, como os do mercado financeiro, de empresas, aumenta a periculosidade do PCC e fazem com que a gente precise ter realmente uma legislação nova no País”, destaca o membro do MP paulista.
“Por isso, defendo uma legislação antimáfia para que preveja um tipo penal mafioso. É um fenômeno que não existia quando foi criada a Lei das Organizações Criminosas que tem hoje”, continua.
Ele diz não ter receio nenhum de apontar a facção como organização mafiosa. “Não digo que o PCC é uma organização terrorista porque perante nossa legislação, não são considerados terroristas, já que precisa ter ali motivação de raça, religião ou política. Se eles explodirem o Metro da Sé às 7 horas da manhã numa segunda feira, não será considerado ato terrorista, mesmo sendo assinado pelo PCC. O que costumo dizer é que os atos que praticam são de natureza eminentemente terrorista.”
Ministério prevê projeto para fortalecer combate a facções
O Ministério da Justiça e Segurança Pública diz que está em discussão na pasta um projeto para fortalecer o combate às facções criminosas. Além de endurecer a legislação com o objetivo de estancar a atuação desses grupos, o projeto prevê proteção a agentes do Estado que atuam no enfrentamento a esses grupos.
Crédito: José Maria Tomazela / O estado de São Paulo – @ disponível na internet 18/9/2025