Corregedor do CNJ autoriza pagamento de penduricalho de quase R$ 1 bilhão aprovado no TJ do Paraná

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@reprodução internet
Tribunal paranaense aprovou pedido feito por associação para converter em dinheiro licenças compensatórias que somam R$ 931 milhões a juízes, desembargadores, aposentados e exonerados;procurados, o corregedor do CNJ e o TJPR não se manifestaram

O corregedor Nacional de Justiça, ministro Mauro Campbell, aprovou na última sexta-feira, 12, em um expediente sigiloso, o pagamento retroativo de um penduricalho que se aproxima de R$ 1 bilhão aos magistrados, incluindo aposentados e exonerados, do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR). A decisão de Campbell valida a decisão da Corte paranaense de converter em dinheiro a licença compensatória dos juízes e magistrados da instituição.

A licença compensatória é o penduricalho que vem sendo adotado por diversos tribunais do Brasil, conforme mostrou o Estadão. O benefício garante um dia de folga a cada três trabalhados em regime de acúmulo de função ou jurisdição. Como não é possível gozar das folgas sem desfalcar a Justiça por longos períodos, os juízes convertem os dias de descanso em recursos financeiros com autorização da cúpula do tribunal. Procurados, TJPR e o corregedor do CNJ não se manifestaram.

Em maio deste ano, o CNJ aprovou um resolução que proibiu a criação ou o pagamento de penduricalhos com efeito retroativo por meio de decisões administrativas, ou seja, quando as Cortes deslocam os seus recursos para esses fins, sem lei ou decisão judicial prévia. O Conselho fixou que as verbas retroativas só poderiam ser desembolsadas após decisão judicial transitada em julgado ou por meio de precedentes qualificados de tribunais superiores. Apesar dessas exigências, a regra deu a palavra final para o corregedor nacional de Justiça, a quem cabe autorizar eventuais pedidos formulados pelos tribunais.

Campbell validou um procedimento que foi aprovado pela Presidência da Corte reconhecendo R$ 931 milhões devidos aos seus membros. A presidente do tribunal paranaense, Lidia Maejima, acatou um pedido da Associação dos Magistrados do Paraná (AMAPAR) para que os juízes e desembargadores tivessem direito ao recebimento de licenças compensatórias não pagas desde 2015, quando foram aprovadas duas leis federais que instituíram esse tipo de benefício.

O caso tramitou sob sigilo tanto no TJPR como no CNJ. O Estadão teve acesso ao documentos que mostram a decisão da presidente da Corte, após pareceres favoráveis de seus subordinados, e a decisão do corregedor de Justiça. O impacto financeiro estimado em R$ 931 milhões foi feito pela Secretaria de Finanças do próprio tribunal, que prevê gastos de R$ 615 milhões com juízes ativos de primeiro grau, R$ 257 milhões com membros ativos do 2º grau, R$ 636 mil com exonerados e R$ 57 milhões com inativos.

Segundo apurou o Estadão com fontes no tribunal, o TJPR conta atualmente com 131 desembargadores ativos, que integram o segundo grau, 47 juízes substitutos, 78 juízes na entrância inicial, 111 na intermediária e e 592 na entrância final, que compõe o 1º grau. Não foi possível identificar o número de aposentados e exonerados que serão beneficiados pela medida.

Isso significa que cada desembargador poderia embolsar, em média, cerca de R$ 1,9 milhão. Esses valores, porém, não serão divididos igualmente, pois a distribuição é feita com base na quantidade de licenças compensatórias a que têm direito. Já os membros do primeiro grau ganhariam em média R$ 742 mil cada. Conforme a decisão de Campbell, os pagamentos “não podem ser processados de forma automática, generalizada ou indistinta para todos os membros da magistratura paranaense”.

Trata-se de um penduricalho porque os valores foram reconhecidos como verba indenizatória, portanto podem exceder o teto remuneratório do Poder Judiciário. O pagamento será feito mediante disponibilidade orçamentária, mas o corregedor de Justiça autorizou que sejam pagos até R$ 46 mil por mês, o que equivale ao dobro do salário de ministro do Supremo Tribunal Tribunal Federal (STF) que estabelece o teto.

Campbell validou a decisão do TJPR sob o argumento de manter o “caráter unitário do Poder Judiciário” já que o Tribunal de Justiça de Goiás foi autorizado a pagar a licença compensatória devida aos seus membros entre 2015 e 2018. O corregedor justificou considerar o ato do tribunal paranaense válido diante da “necessidade de tratamento isonômico entre os diversos Tribunais pertencentes ao Sistema de Justiça Nacional”.

Campbell citou decisão prévia do CNJ que autorizava este tipo de pagamento. O próprio corregedor já havia decidido em procedimento anterior que “o eventual pagamento de valores retroativos, caso devidamente autorizados por decisão específica do TJPR, deve ser submetido à apreciação desta Corregedoria Nacional, sob a autuação de um novo Pedido de Providências”. Esse precedente foi citado pela Amapar para pedir o pagamento do penduricalho ao TJPR.

O juiz auxiliar da Presidência do TJPR, Ricardo Jentzsch, apresentou parecer favorável ao pagamento antes de a presidente decidir sobre o caso. Ele argumentou que o direito subjetivo dos magistrados ao pagamento retroativo decorre da “mora da Administração em reconhecer e implementar o direito ao mesmo passo das Leis Federais de 2015″.

 

Para Fernanda de Melo, especialista de advocacy da ONG República.org, esse tipo de verba indenizatória paga à elite do funcionalismo escancara “as disparidades e injustiças” que existem hoje dentro do serviço público brasileiro.

“Nas últimas semanas, o Brasil viu a ampliação casos de penduricalhos como a licença compensatória para o TCU (Tribunal de Contas da União) e possivelmente para o Senado. Agora, vemos esse mecanismo gerar ganhos muito acima do teto constitucional no Paraná. Há uma corrida por privilégios justificada por um falso argumento de isonomia entre carreiras e tribunais, que gera elevado impacto orçamentário e só aumenta as distorções dentro do serviço público brasileiro. Afinal, 70% dos servidores no país recebem até R$ 6 mil por mês”, avaliou

Já Cristiano Pavini, coordenador de projetos da Transparência Brasil, destaca a anuência do CNJ aos penduricalhos criados pelos tribunais.

“O CNJ é extremamente complacente na liberação de penduricalhos, atuando muito mais para impulsioná-los do que controlá-los. O aval para pagamento de licença-compensatória em caráter retroativo, para diversos tribunais, visa enriquecer ainda mais uma elite do funcionalismo público, à revelia do teto constitucional. Com isso, os tribunais acumulam passivos bilionários para serem pagos aos magistrados nos exercícios seguintes, drenando recursos públicos que deveriam ser investidos na eficiência da Justiça”, afirmou.

Crédito: Weslley Galzo/ O Estado de São Paulo – @ disponível na internet 17/12/2025

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