O projeto que prevê um reajuste salarial e um bônus de eficiência para os auditores-fiscais da Receita Federal tem potencial de gerar um efeito dominó de paralisações entre as carreiras do alto escalão da política econômica do país. Após a greve dos servidores do Tesouro Nacional, que já afetou uma série de atividades do órgão, a carreira de planejamento e orçamento do Ministério do Planejamento também ameaça cruzar os braços.
Nos últimos anos, as carreiras da cúpula político-econômica do país tiveram tratamento similar do ponto de vista de negociação salarial. Por isso, os servidores estão irritados com o benefício diferenciado para os funcionários da Receita. Para eles, a diferenciação foi um equívoco do governo. Além do reajuste parcelado até 2019, os auditores-fiscais conseguiram enviar ao Congresso um projeto de lei com valorização do plano de carreira da categoria e um bônus de eficiência que sairá de um fundo que reúne parte das multas aplicadas pelos profissionais. Os funcionários do Tesouro e do Planejamento, no entanto, só receberam o reajuste, sem bonificação.
O movimento do Tesouro Nacional já causou mudanças no horário de funcionamento do Tesouro Direto e o adiamento, sem nova data, da divulgação do relatório da dívida pública federal de julho, inicialmente prevista para esta quarta-feira. Os funcionários estão mobilizados e pressionam o ministro da Fazenda fisicamente, na sala contígua ao gabinete de Henrique Meirelles.
Os representantes da carreira de Orçamento chegaram a se reunir com o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira. Na reunião, no entanto, ele teria sinalizado negativamente em relação a um benefício extra para a categoria, uma vez que os servidores já tiveram um reajuste salarial este ano. Com a peça orçamentária de 2017 praticamente pronta desde o início do mês, a capacidade de pressão da categoria fica enfraquecida.
Em contrapartida, no entanto, o governo aceitou discutir uma outra demanda dos servidores: um decreto de regulamentação da carreira, que definirá em termos mais claros itens como carga horária e a contabilização de horas trabalhadas em casa. Com essa expectativa, os representantes da categoria devem segurar o início de uma possível paralisação por mais tempo.
Os secretários do Ministério do Planejamento tentam acalmar os servidores com o argumento de que o projeto que prevê o reajuste para os auditores da Receita ainda está em tramitação, sem data para aprovação. Na prática, no entanto, os parlamentares da Câmara dos Deputados dizem que o governo não interferiu para que a base postergue a aprovação dos aumentos.
No início do ano, o governo chegou a defender reajustes a 14 categorias do funcionalismo público, em um sinal controverso ao mercado num momento de ajuste fiscal. Diante das pressões das categorias, o ministro da secretaria de governo, Geddel Vieira Lima, afirmou ontem que os reajustes dos servidores não dividem a base do governo. Ele disse confiar na autonomia do Congresso Nacional para avaliar o melhor momento para aprovar aumentos, mas ponderou que essa é a hora de dar sinalizações claras à sociedade de que há uma preocupação do governo com a questão fiscal.
— Não vamos criar falsa polêmica de que reajuste divide ou não a base do governo. Na minha avaliação, o que está no Congresso vai ser votado e o que está para ser discutido o será à luz da realidade fiscal, depois que nós aprovarmos as medidas que forem necessários. Não tem polêmica, não tem divisão de base.
COMISSÃO ESPECIAL
Na Terça-feira, o projeto dos auditores-fiscais deu mais passo na Câmara e teve uma comissão especial instalada para análise do mérito. Agora, devem ser escolhidos o presidente e o relator do projeto. Mesmo assim, os servidores continuam mobilizados e têm retido, duas vezes na semana, todas as cargas que chegam nos portos, aeroportos e zonas de fronteira durante dois dias na semana. A intenção é prosseguir com o movimento até que a proposta seja votada.
Além do projeto que prevê o reajuste aos auditores fiscais, outras cinco categorias conseguiram pressionar o governo por um reajuste: polícia federal, polícia rodoviária federal, peritos federais agrários, servidores da carreira de políticas sociais e carreiras do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT). No total, os dois projetos devem ter um impacto estimado pelos técnicos da Câmara em R$ 11,5 bilhões (contando com o bônus dos servidores da Receita).
Crédito: O Globo – disponível na web 25/08/2016