Governo Temer recebeu uma ajudinha externa na chantagem pela previdência. Leonardo Sakamoto

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Leonardo Moretti Sakamoto é um jornalista brasileiro. Além da graduação em jornalismo, possui mestrado e doutorado em ciência política pela USP. Cobriu conflitos armados e o desrespeito aos direitos humanos em Timor Leste, Angola e no Paquistão

Cansado de ameaçar sozinho a população brasileira pela aprovação da Reforma da
Previdência, o governo chamou um ”amigo que mora na rua de cima” para fazer
bullying junto com ele. Confesso que ri alto quando li uma declaração de Moreira Franco, ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República – que, aliás, estaria sendo julgado por obstrução de Justiça e participação em organização criminosa ao invés de
estar escondido atrás de um foro privilegiado. Se vivéssemos em uma democracia,
claro. Ele afirmou que o rebaixamento da nota de crédito da dívida brasileira pela
agência de avaliação de risco Standard & Poor’s, nesta quinta (11), é ”um  alerta sobre as consequências econômicas e sociais que a não aprovação da [Reforma da] Previdência trará”. A agência elencou entre as justificativas a insegurança com a eleição presidencial e
o ”fraco apoio da classe política” para a aprovação de leis, como a mudança na
regra das aposentadorias. Vale sempre lembrar que a Standard & Poor’s foi aquela acusada pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos de ter mascarado o risco dos investimentos que foram os vilões da crise financeira global de 2008. Em um acordo, aceitou pagar quase 1,4 bilhão de dólares. Isso reacendeu o debate sobre a credibilidade e os interesses dessas empresas – cujas avaliações são importantes para investidores.
13/01/2018 Governo Temer recebeu uma ajudinha externa na chantagem pela Previdência – Notícias – UOL Notícias  https://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2018/01/11/governo-temer-recebeu-uma-ajudinha-externa-na-chantagem-pela-previdencia/ 2/3
Considerando o peso dessas agências, uma avaliação como a de hoje certamente
seria usada pelo governo internamente para pressionar o país pela aprovação da reforma. Pela declaração do ministro, efetivamente foi. Com isso, o maior legado político do governo Temer continua sendo a chantagem como instrumento de negociação. A cada dia, um método novo para a gente aprender. Em dezembro passado, o ministro Carlos Marun, responsável pela articulação do governo com o Congresso Nacional, admitiu que o Palácio do Planalto estava condicionando a liberação de financiamentos
(http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/12/1946131-ministro-diz-que-liberarverba-por-voto-nao-e-chantagem-e-acao-de-governo.shtml) da Caixa Econômica Federal a Estados à pressão de governadores sobre deputados federais para que aprovassem a Reforma da Previdência. ”Financiamentos da Caixa Econômica Federal são ações de governo, o governador poderia tomar esse financiamento no Bradesco, não sei aonde. Obviamente, se são na Caixa, no Banco do Brasil ou no BNDES são ações de governo. Nesse sentido,
entendemos que deve sim ser discutido com esses governantes alguma reciprocidade no sentido de que seja aprovada a reforma da Previdência, que é uma questão que entendemos hoje de vida ou morte para o Brasil”, disse Marun, que nem corou as bochechas ao tentar convencer que isso não era chantagem. Pouco tempo depois, com a repercussão negativa, desdisse o que havia dito. Mas taí a fala dele, interpretem como quiserem. De campanhas na TV com ameaças explícitas, passando por declarações de sua
cúpula de que as próximas gerações vão ranger os dentes e que não haverá recursos para as pensões ou de aliados afirmando que o país mergulhará num inferno sombrio de dor, o governo federal tem usado da chantagem para passar à força uma polêmica Reforma da Previdência que não estava em nenhum programa eleito pelo voto popular. E que é questionada pela maioria da população, de acordo com pesquisas de opinião.
Abaixo, uma coleção de chantagens reunida por este blog: ”Já chegou no osso.” O ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, usou essa expressão para dizer que, em sua opinião, não é possível mais alterar a proposta de Reforma da Previdência. Em entrevista à Folha de S.Paulo
(http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/11/1935512-trabalhador-teria-decontribuir-44-anos-para-ter-teto-da-aposentadoria.shtml), em novembro, também disse que ”o governo cumpriu seu papel quando aceitou fazer flexibilizações, agora é hora do Congresso votar”. ”Eu digo que o Congresso é soberano. No entanto, estamos dialogando e fornecendo cálculos. Não é uma questão de opinião política ou desejo. É uma necessidade matemática, fiscal”, afirmou, também em novembro, o ministro da Fazenda Henrique Meirelles. (https://oglobo.globo.com/economia/previdenciagoverno-espera-economizar-ao-menos-50-do-previsto-diz-meirelles-22048510) ”A gravidade da situação é essa: estamos prestes a não poder pagar a Previdência.” A frase é de Dyogo Oliveira, ministro do Planejamento (https://economia.uol.com.br/noticias/valor-online/2017/09/11/governo-esta-prestesa-parar-de-pagar-previdencia-diz-ministro.htm), em evento, no dia 11 de setembro, em São Paulo. ”Não há possibilidade de estabelecer equilíbrio fiscal sem a Reforma da Previdência.”
13/01/2018 Governo Temer recebeu uma ajudinha externa na chantagem pela Previdência – Notícias – UOL Notícias
https://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2018/01/11/governo-temer-recebeu-uma-ajudinha-externa-na-chantagem-pela-previdencia/ 3/3
”Se não se fizer essa reforma agora, daqui a três anos teremos que fazer, senão daqui a sete paralisamos o país”, afirmou, em março do ano passado, Michel Temer durante uma conferência empresarial de São Paulo,  (http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/03/1870754-sem-reforma-daprevidencia-brasil-paralisa-em-7-anos-diz-temer.shtml)segundo a conta de Twitter do Palácio do Planalto. E, em junho de 2016,  (https://noticias.uol.com.br/politica/ultimasnoticias/2016/06/02/temer-admite-recorrer-a-cpmf-e-estabelecer-idade-minima-emaposentadorias.htm)Temer afirmou que ”ou a Previdência Social tem de ser reformulada ou então todos os pensionistas sofrerão”.
”Se a Reforma da Previdência não sair: Tchau, Bolsa Família; adeus, FIES; Sem
Novas Estradas; Acabam os Programas Sociais”, diz uma ilustração que tem, no
fundo, uma imagem de cidade em ruínas – parte de uma peça de propaganda
veiculada pelo MDB, partido do governo, nas redes sociais em 2017. Como já defendi mais de uma vez neste espaço, a beleza de uma democracia é que, nela, os caminhos deveriam ser discutidos abertamente e as decisões tomadas coletivamente. A Presidência da República deveria convocar um grande debate nacional sobre o tema, buscando ouvir diferentes pontos de vista para desenhar uma Previdência que não mantenha distorções e nem beneficie apenas alguns grupos em detrimento ao restante da população. E proteja os mais vulneráveis e quem ganha menos. Ao final, que as propostas sejam discutidas e escolhidas nas eleições de outubro. O problema é que governo federal e o Congresso Nacional já romperam todas as ligações possíveis com a vontade da maioria de seus eleitores. Representam a si mesmos (afinal, a maior bancada é dos deputados-empresários), seus patrocinadores e investidores internacionais. Além das forças políticas que prometeram salvá-los da guilhotina das punições por corrupção.
Talvez a melhor solução seja mesmo, como disse o saudoso Raul Seixas, alugar o
Brasil.

Artigo publicado no Blog do Sakamoto / UOL Notícias – disponível na internet 13/01/2018

Nota: O presente artigo não traduz necessariamente a opinião do ASMETRO-SN. Sua publicação tem o propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

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