“Chamamos isso de trabalhar no trabalho na quarta-feira”, disse Keryn Koch, que dirige os recursos humanos da empresa, que tem 1.400 metros quadrados em um imóvel ensolarado no bairro do SoHo, na cidade de Nova York.
Em um determinado momento, o outono foi anunciado em toda a América corporativa como a volta ao trabalho no escritório. A variante Delta interveio e a presença obrigatória no escritório tornou-se opcional. Não obstante, muitas pessoas optaram por voltar para seus postos de trabalho. A proporção de pessoas empregadas que trabalharam remotamente em algum momento durante o mês por causa da covid, que havia atingido o pico em maio de 2020, em 35%, caiu em outubro para 11%, o nível mais baixo desde o início da pandemia, de acordo com a Secretaria de Estatísticas do Trabalho dos Estados Unidos.
Um olhar mais atento sobre a força de trabalho de Nova York, a partir de uma pesquisa de novembro, realizada com 188 grandes empregadores, mostrou que 8% dos funcionários de escritório de Manhattan estão de volta ao escritório em tempo integral, 54% estão totalmente remotos e todos os outros – quase 40% – fazem as duas coisas.
Poucos acham que esse é um suave período de transição. Algumas empresas usaram suas tentativas de datas de volta ao trabalho como uma desculpa involuntária para evitar perguntas sobre como equilibrar as necessidades de seus funcionários remotos e presenciais, de acordo com Edward Sullivan, coach executivo.
Isso resultou em um meio-termo esquisito: videochamadas em que os funcionários remotos apresentam problemas para ouvir, uma sensação de que as pessoas em casa estão perdendo vantagens (de estar com os colegas de trabalho), enquanto as do escritório também perdem (trabalhar de pijama em casa). E o que está em jogo não é apenas de quem está se falando nas reuniões. É se a flexibilidade é sustentável, mesmo com todos os benefícios que ela traz.
“Vamos ver muitas empresas cometerem erros”, disse Chris Herd, empresário e especialista em trabalho híbrido.
Adaptação difícil
Recentemente, Brett Hautop, chefe de uma unidade de trabalho no LinkedIn, precisou participar de uma reunião e ouvir o discurso de vendas de um fornecedor global. A empresa queria vender seus serviços para o LinkedIn para ajudar a facilitar o trabalho híbrido eficaz. Mas as pessoas que estavam fazendo esse discurso viraram as costas para a câmera, de modo que os funcionários do LinkedIn que participavam da videoconferência não conseguiram vê-los.
“Ao mesmo tempo em que apregoam como é difícil para as pessoas que estão remotas acompanharem as conversas, eles mesmos se esquivam da câmera”, disse Hautop. “As pessoas da minha equipe estavam me questionando, dizendo: ‘Não acredito que eles estão fazendo isso’. E eu me desculpando e dizendo: ‘Ei, pessoal, sinto muito por isso e aparentemente eles não têm noção de que isso esteja acontecendo’”.
No verão passado, o LinkedIn disse a seus 16.000 funcionários em todo o mundo que seu plano de retorno ao escritório anunciado em outubro de 2020 havia sido descartado e que cada departamento decidiria onde seu pessoal poderia trabalhar, tornando-se uma das mais de 60 grandes empresas que prometeram alguma forma permanente de flexibilidade.
Hautop e sua equipe avaliaram as dificuldades geradas por essa abordagem. Atualizaram os equipamentos audiovisuais nas salas de conferência e consideraram a distribuição de luzes para funcionários em suas mesas, para que seus rostos não ficassem incomodamente iluminados nas chamadas. Eles planejaram “ambientes externos”, para que os funcionários pudessem lembrar do que gostavam no escritório.
“Trabalho híbrido é definitivamente mais difícil do que completamente presencial ou completamente remoto”, disse Hautop. “É preciso muito mais planejamento, e nem nós, ou qualquer outra pessoa em qualquer empresa, descobriu exatamente como isso vai funcionar.”
Se o trabalho híbrido é um desafio até mesmo para as pessoas do LinkedIn – os gurus da conectividade, os maestros das redes profissionais – o que os demais funcionários podem esperar?
CEO a distância
A Asana, fabricante de softwares colaborativos, reuniu recentemente seus executivos para um planejamento e discussão sobre a reabertura oficial do escritório. Metade dos participantes estava na sede, em São Francisco, e a outra metade participou por videoconferência. Os funcionários remotos, incluindo o CEO da empresa, começaram a perder a paciência enquanto as pessoas na sala conversavam e faziam comentários paralelos.
“Estávamos brincando que, se não gostássemos daquilo que alguém estava dizendo na tela, poderíamos simplesmente silenciá-lo”, disse Anna Binder, chefe de pessoal da empresa.
“Todos nós passamos por uma experiência tão terrível que decidimos no final da reunião que todas as reuniões executivas daqui em diante serão presenciais”, disse ela. “Ou serão totalmente remotas. Não adotaremos o meio termo.”
Binder se preocupa com quais colegas de equipe têm mais probabilidade de sofrer com as dores de cabeça dos empregos híbridos. Muitos executivos disseram que funcionários com responsabilidades de cuidados com crianças ou idosos têm maior probabilidade de trabalhar remotamente sempre que a opção lhes é oferecida. Uma pesquisa da plataforma de empregos FlexJobs descobriu que 68% das mulheres preferiam que seus empregos permanecessem remotos por muito tempo, em comparação com 57% dos homens. Outro estudo, da Qualtrics e da Boardlist, apontou que 34% dos homens com filhos havia recebido promoções enquanto trabalhavam remotamente, em comparação com apenas 9% das mulheres com filhos.
“Se você der às pessoas liberdade de escolha sobre o que fazer e onde trabalhar”, disse Binder, “as mulheres têm maior probabilidade de tirar proveito da flexibilidade do trabalho em casa. O que significa que elas, por sua vez, estarão menos presentes no contexto onde isso acontece.”
Não é difícil imaginar todas as maneiras pelas quais trabalhadores remotos podem ser prejudicados: silenciados em uma discussão acalorada, excluídos da ligação na hora do almoço. Mas Nicholas Bloom, professor de Stanford que pesquisou centenas de empresas híbridas, disse que em muitos locais de trabalho os funcionários presenciais se sentiam igualmente negligenciados.
“É a regra do americano na Europa”, disse Bloom. “Quando um americano está viajando para o exterior, ao se olhar em volta percebe-se que todos estão falando em inglês para facilitar a vida dele. Se houver uma pessoa trabalhando em casa, todos no escritório ligam para a reunião.”
‘Um no Zoom, Todos no Zoom’
Esse é o caso da Zillow, site de imóveis que enfrenta atualmente uma onda de perdas e demissões, onde um quarto das pessoas trabalha no modelo híbrido e quase dois terços estão trabalhando totalmente remotos. A regra “Um no Zoom, Todos no Zoom” da empresa estipula que, mesmo que uma pessoa esteja participando de uma reunião virtualmente, todos no escritório devem participar em laptops separados. A Zillow chegou a tirar o equipamento audiovisual das paredes da sala de conferências.
A regra do Zoom está de acordo com a atitude aberta da Zillow em relação ao trabalho remoto, que incluiu um anúncio de que sua sede mudou de Seattle para a nuvem.
“Vou ao escritório todos os dias”, disse Meghan Reibstein, vice-presidente de gerenciamento de produto e trabalho flexível, que se mudou para Asheville, Carolina do Norte, durante a pandemia. “Acontece que o escritório fica no sótão da minha casa.”
Mas quando o sótão se torna o escritório, e o escritório se torna um local para lanchinhos e brincadeiras semanais, os executivos precisam reagir: qual é o sentido de pagar aluguel? Para muitos empregadores, os luxuosos espaços ocupados por apenas algumas estações de trabalho passaram a ser lembretes dos reais custos associados à ambiguidade do trabalho híbrido.
Court Cunningham teve aquela sensação de mal-estar recentemente ao visitar os edifícios de Nova York para alugar um novo escritório para sua empresa de compras online, a Orchard: se apenas 15% de seus funcionários estivessem trabalhando no escritório, o aluguel valeria 2% da receita? Ele ia e voltava. Em seguida, assinou um novo contrato de locação em outubro, apostando que em algum momento futuro as pessoas desejarão estar no escritório.
“Em dois anos, isso ou será um movimento genial, onde teremos deixado para trás um longo período de exílio por conta da covid, ou o mundo ficará completamente remoto e teremos esse pesadelo a nos assombrar”, disse Cunningham.
Enquanto isso, os especialistas que ajudam empresas a navegar nesse período têm esperança de que os males do trabalho híbrido não sejam permanentes. Ou, pelo menos, que possam ser administráveis: alguns aconselham seus clientes a serem explícitos com sua equipe sobre se devem priorizar as necessidades de funcionários de escritório ou remotos, especialmente quando se trata de intermediar reuniões.
“No Vietnã, os prisioneiros de guerra que aceitaram o fato de não saberem quando seriam salvos foram os que sobreviveram”, disse Sullivan, CEO da firma de coaching Velocity Group, buscando uma referência – o que é conhecido como Paradoxo de Stockdale – muito distante dos problemas com o bebedouro do escritório. “As empresas que aceitaram que isso vai ser difícil e se comunicaram claramente com suas equipes vão prosperar. Não há mais ilusões a respeito do Natal ou Páscoa. Vamos apenas aceitar que essa fase será difícil.”
E depois da aceitação, vem a tomada de decisões. Portanto, a Asana escolheu se rotular como “híbrida centrada no escritório”, com os chefes articulando que, em algum momento, a maioria das pessoas será esperada de volta às suas mesas. A financeira CommonBond se autodenomina “primeira empresa remota”, estando seu CEO mais distante do escritório de Manhattan do que os funcionários juniores que vêm às quartas-feiras. (“Nosso centro de gravidade é a Zoomsfera”, disse o CEO David Klein.) As duas empresas rejeitaram a abordagem do “escolha-sua-própria-aventura”, em que as pessoas não têm noção de onde seus gerentes desejam que elas estejam.
“Imagine que as pessoas pudessem escolher se dirigem do lado esquerdo ou direito da estrada”, disse Bloom. “Haveria acidentes o tempo todo. Para isso, é preciso muita coordenação.”
Crédito: Emma Goldberg, The New York Times – tradução de Anna Maria Dalle Luche @ disponível na internet 19/11/2021