A possibilidade de o presidente Jair Bolsonaro pedir ao Congresso Nacional para decretar o estado de calamidade pública a poucos meses da eleição passou a ser defendida por uma ala do governo, que busca criar mecanismos para derrubar o preço dos combustívies e da energia por meio de subsídios. Esse decreto, porém, esbarra no desejo de Bolsonaro de reajustar os salários dos servidores públicos.
A calamidade libera uma gastança irrestrita pelo governo. Não apenas medidas para reduzir combustíveis, mas também, por exemplo, ampliação do Auxílio Brasil. O decreto precisa ser votado previamente pelo Congresso Nacional.
O instrumento é previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal e na Constituição. Mas uma alteração feita na regra por sugestão do governo Bolsonaro estabelece que, durante a vigência do estado de calamidade pública, fica proibido a concessão de reajuste de salários e de benefícios como o vale-alimentação. Esse reajuste, porém, poderia ser feito antes do decreto.
Também proíbe a criação de cargos, contratação de pessoal, realização de concurso público, criação e ajuste de despesa obrigatória, criação ou expansão de programas e linhas de financiamento e concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária.
A calamidade suspende uma série de regras das contas públicas, abrindo caminho para o governo gastar em ano eleitoral sem qualquer restrição. Como mostrou a Folha de S.Paulo, isso passou a ser defendido por uma ala do governo Bolsonaro a apenas quatro meses da eleição. O mecanismo foi adotado durante o primeiro ano da Covid-19, em 2020.
O objetivo é criar programas de subsídio ao diesel fora do teto de gastos (a regra que trava as despesas federais) e demais normas fiscais.
É um desejo de Bolsonaro, porém, também conceder reajuste para servidores públicos. Inicialmente, ele decidiu por uma alta linear de 5%, mas agora já analisa a possibilidade de reajustar apenas o vale-alimentação dos servidores ativos.
O decreto de calamidade está longe de ser unanimidade no governo. Entre as justificativas usadas por quem defende o uso do instrumento, estão a guerra na Ucrânia e um eventual risco de desabastecimento de diesel. Para técnicos do governo, porém, é difícil justificar como a guerra na Ucrânia gerou um estado de calamidade no Brasil. Além disso, pode gerar mais inflação, com alta do dólar e aquecimento da demanda.
O governo, porém, busca outras formas de dar um subsídio amplo para reduzir o preço do óleo diesel, como mostrou o GLOBO nesta semana. A ideia é que isso seja pago por crédito extraordinário, fora do teto de gastos.
Inicialmente reticente à concessão de subsídios, a equipe econômica avalia agora que há espaço no Orçamento federal para criar um benefício apenas para o diesel. Para isso, o governo entende que é necessário montar uma justificativa legal robusta para que o benefício não seja questionado por conta da proximidade das eleições.
A legislação eleitoral proíbe a “distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior”.
É essa proibição que vem travando a criação de um benefício específico para caminhoneiros, base eleitoral de Bolsonaro, e motoristas de táxis e aplicativos de transporte — algo que a equipe econômica também já sinalizou que apoiaria.
Agora, os técnicos da área jurídica do governo buscam uma forma de justificar a edição de um crédito extraordinário para criar um amplo subsídio para o diesel.