Do assédio ao controle de jornada: como questões do mundo real do trabalho serão tratadas no metaverso?
Especialistas consultados defendem criação de legislação específica para disciplinar as questões trabalhistas no novo ambiente virtual
Advogados alertam que as empresas devem ficar atentas e precisarão adotar medidas preventivas para evitar questionamentos na Justiça relacionados ao metaverso. “Muitas pessoas acham que o mundo virtual não tem conexão com o mundo real e isso não é uma verdade”, alerta o advogado Alberto Nemer, do escritório Luz, Rizk & Nemer Advogados. Apesar de não ter uma legislação específica para disciplinar o que ocorre dentro deste mundo virtual que tenta replicar a realidade por meio de dispositivos digitais, as normas atuais podem ser aplicadas dentro deste ambiente.
Com a expectativa de aumento da utilização deste novo ambiente, especialistas consideram fundamental a criação de uma legislação específica para disciplinar, especialmente, as relações de trabalho. “A criação de uma nova legislação para regulamentar esse novo cenário é urgente. Nos próximos dois anos vamos ver muitas empresas e pessoas físicas usando essa tecnologia para diversas situações e é fundamental que esteja regulamentado”, considera o advogado Renê Koerner Urbano Vitalino Advogados. A estimativa, conforme pesquisa realizada pela Gartner e divulgada no Fórum Econômico Mundial, é que um quarto da população mundial passará pelo menos uma hora por dia no metaverso em 2026.
“Ainda não há nenhuma legislação específica que trate sobre o caso. O esperado é que, havendo o aumento de relações de trabalho no metaverso, que surjam demandas judiciais e, consequentemente, posicionamento a respeito de como se dará a aplicação da lei nestes casos”, afirma a advogada Bianca Dias de Andrade, do escritório Andrade Silva Advogados. Ela explica que se não há legislação nova, a atual, especialmente a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), continua regulando as relações de trabalho, mesmo no metaverso.
Este mundo virtual também pode contribuir para que provas de desrespeito à legislação sejam mais facilmente apuradas, já que boa parte dos contatos ficam gravados. Do ponto de vista da empresa, é possível controlar a jornada e a produtividade, por exemplo. “Não existe nada que restrinja isso do ponto de vista da legislação. E isso pode ser também um ponto positivo tanto para o empregador quanto para o empregado”, avalia Nemer.
Direito de imagem
Além das questões trabalhistas, o direito de uso de imagem também é outro ponto que levanta debates no metaverso. “Em relação ao uso do avatar, direito de imagem e questões relativas aos dados do empregado, a empresa deverá criar mecanismos para evitar ações judiciais, seguindo estritamente as regras referentes à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), como também regras básicas aplicáveis ao direito do trabalho, como a autorização para uso de imagem do funcionário mediante termo escrito”, comenta Bianca.
Kone Cesário, professora de propriedade intelectual e vice-diretora da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, comenta que o Código Civil diz que a imagem é um bem inviolável, portanto, sempre será necessário a autorização de uso de imagem do retratado no metaverso, por meio de um contrato escrito.
“A existência do universo paralelo de realidade propicia aos profissionais e aos usuários criarem, modificarem, editarem e utilizarem avatares, contudo estar na plataforma por si só não confere a ninguém nem autoriza o uso desleal ou ilegal de qualquer aplicativo. O direito de imagem e o direito autoral continuam existindo, tanto que já se vê a atuação de forma bem mais proativa na preservação do patrimônio intelectual criado e construído por qualquer ente participante”, diz a advogada Keila Freitas, do escritório Ferrareze e Freitas Advogados.
Crédito: Gilmara Santos / InfoMoney – @ disponível na internet 13/09/2022
Metaverso não pode mais ser ignorado e bancos e seguradoras
Atualmente, o metaverso pode englobar uma série de tecnologias. Blockchain, NFTs, criptomoedas e realidade virtual são algumas delas. A última, foi apontada pela Capco como uma das facilitadoras para a adoção do universo virtual, já que promove experiências imersivas.
No entanto, é o conjunto da obra que propicia atividades como jogos, estudos, trabalho e investimentos, afirma a pesquisa.
“Empresas e consumidores já estão atentos esperando as novidades e soluções prometidas”, diz Aline Lemos.
Para os bancos e seguradoras que pretendem entrar no setor, a Capco recomenda testes e planejamentos internos antes de disponibilizar novas funcionalidades para o cliente, que precisará de um atendimento especializado para entender a nova tecnologia.
“Apesar das tecnologias que compõem o metaverso terem evoluído a ponto de bancos e seguradoras não poderem mais ignorá-las, é preciso iniciar essa jornada de forma planejada e internamente. Assim, as instituições financeiras poderão usar a riqueza de parâmetros das experiências existentes para o uso nos negócios de forma efetiva”, diz um trecho da pesquisa.
Dessa forma, um grupo de funcionários pode iniciar testes da tecnologia com reuniões em realidade virtual, por exemplo. Vivenciando a configuração de avatares, acessibilidade de movimentos, áudio e traduções em tempo real.
“Para entender o metaverso e a realidade virtual é preciso colocar um equipamento com esse propósito e experimentar por si mesmo. No começo, é importante convencer seus stakeholders de que a tecnologia está evoluindo para algo que melhora a interação e a produtividade”, destacou Aline.
Segundo a Capco, as seguradoras podem se beneficiar da simulação de acidentes ou desastres climáticos para testar seus seguros e demonstrar os serviços de forma mais eficiente para seus clientes. A educação sobre a tecnologia, é essencial para o sucesso de sua aplicação.
“Será preciso educar o cliente sobre o que constitui um ativo digital do metaverso. Assim como o que significa a propriedade de um ativo digital, como essa propriedade pode ser protegida ou transferida e se é possível segurá-lo e como avaliar seu valor”, diz um trecho da pesquisa.
“O que tudo isso significa é que as instituições financeiras passarão a ter um conhecimento de metaverso e de suas tecnologias num nível que não apenas vão transformar a experiência do consumidor e o relacionamento desse com o banco e a seguradora. Mas vão também criar novas vias de negócios, novas receitas e tudo em meio a um ambiente que tornará as empresas mais produtivas e eficientes”, concluiu Aline Lemos.
Crédito: Mariana Maria Silva/Exame – @ diponível na internet 13/09/2022