Desde 2008,21 de setembro é comemorado o Dia Nacional de Conscientização da Doença de Alzheimerno Brasil.
Ainda não há clareza sobre o total de pessoas que vivem com a doença no País, mas estima-se que cerca de 2 milhões tenham demências – o Alzheimer corresponde à maior parcela. Para 2050, a projeção é de que esse número chegue a cerca de 6 milhões de pessoas – um aumento de 200%.
Em todo o mundo, a enfermidade que provoca a perda progressiva da memória afeta mais de 30 milhões de pessoas. Descrita pela primeira vez em 1906 pelo médico alemão Alois Alzheimer, a doença “neurodegenerativa” leva a uma deterioração progressiva da capacidade cognitiva do paciente até a perda total de autonomia.
Combater os fatores de risco conhecidos para a Doença de Alzheimer, que não tem cura, e fazer uma detecção precoce são as duas principais medidas para adiar ao máximo a evolução da enfermidade.
Em uma série de reportagens, o Estadão discutiu desde as atividades (mentais e físicas) e hábitos (de alimentação e sono) que devem ser inseridos no dia a dia das pessoas até as discussões sobre os caminhos da ciência para desvendar os mistérios do Alzheimer, passando pelo drama de quem convive de perto com alguém acometido pela doença. Veja abaixo:
Crédito: Redação de “O Estado de S.Paulo” – @ disponível na internet 22/09/2022
Alzheimer começa sem sintoma de demência; veja as 7 fases da doença
Pesquisa identificou região do cérebro onde ocorrem primeiras alterações; doença começa com acúmulo de proteínas que pode durar de 15 a 20 anos antes do aparecimento dos primeiros sintomas
A doença de Alzheimer desafia médicos e cientistas. Por um lado, há esforços para identificar as causas da doença – a fim de buscar um tratamento precoce. Na outra ponta, especialistas buscam descrever o que ocorre em cada um dos estágios do Alzheimer para entender o comportamento da doença no corpo humano e apoiar pacientes e seus familiares.
Nesta semana, uma pesquisa realizada pela Universidade de Coimbra, em Portugal, identificouuma região do cérebro humano como a área em que ocorrem as primeiras alterações causadas pelo Alzheimer. O estudo abre caminhos para novas pesquisas que podem indicar opções de tratamento. Especialistas apontam que o diagnóstico precoce e medidas preventivas, como atividades intelectuais e exercícios físicos, ajudam a retardar o avanço da doença.
Segundo os cientistas, no cíngulo posterior ocorrem três sintomas típicos de fases iniciais da doença: inflamação neural, acúmulo de proteínas amiloides (insolúveis no corpo humano) e atividade neuronal aparentemente compensatória, em que uma região do cérebro tenta agir para compensar o déficit de funcionamento apresentado por outra. Sabe-se que a doença só apresenta sintomas após anos de acúmulo de proteínas, o que traz o desafio de diagnosticá-la antes de se tornar visível.
Os estágios da Doença de Alzheimer foram definidos pelo médico Barry Reisberg, diretor do programa de pesquisa e educação sobre a doença da Escola de Medicina da Universidade de Nova York. Essa divisão é usada por especialistas em todo o mundo, algumas vezes simplificada para cinco ou mesmo três estágios.
As 7 fases do Alzheimer
Estágio 1 – Nenhum sintoma de demência
Independentemente da idade, qualquer pessoa pode ser mentalmente saudável. Eventuais lapsos de memória são considerados normais em todas as faixas etárias. À medida que envelhecemos é natural que esses lapsos aconteçam com mais frequência e não necessariamente indicam um problema mais grave.
Estágio 2 – Perda de memória subjetiva/Esquecimentos relacionados à idade
Muitas pessoas com mais de 65 anos reclamam de dificuldades cognitivas e/ou funcionais. Pessoas mais velhas com esses sintomas reclamam de não conseguir lembrar de nomes com a mesma facilidade com que faziam cinco ou dez anos antes. Eles também reclamam de frequentemente não conseguirem lembrar onde colocaram as coisas. Vários termos já foram sugeridos para definir essa condição, mas declínio cognitivo subjetivo é a terminologia mais aceita atualmente.
Em geral, parentes e amigos não notam imediatamente esse problema. Mas pessoas com esses sintomas apresentam declínio mais rápido do que outras da mesma idade que não têm reclamações semelhantes. Pesquisas mostram que essa fase pode durar até 15 anos em pessoas que não apresentam outros sintomas.
“A doença começa com o acúmulo de determinadas proteínas no cérebro e isso pode levar de 15 a 20 anos antes do aparecimento dos primeiros sintomas”, explica o médico Otelo Correa dos Santos Filho, da Universidade Estadual do Rio (Uerj), investigador principal da parte brasileira do estudo internacional Davos Alzheimer Collaborative. “Nesta fase pré-clínica não há sintomas, e a vida cotidiana não é afetada.”
Estágio 3 – Impacto cognitivo leve
Pessoas neste estágio manifestam déficits sutis, mas que já são notados por pessoas próximas. Elas tendem, por exemplo, a repetir a mesma pergunta várias vezes. Sua capacidade de executar algumas funções se torna comprometida. É comum entre os que ainda não se aposentaram apresentarem declínio da função profissional. Os que precisam aprender novas tarefas têm dificuldades evidentes. Para os que ocupam cargos estratégicos, pode ser o momento de começar a programar uma aposentadoria. Este já pode ser caracterizado como um estágio inicial de Alzheimer e pode durar cerca de sete anos. Ainda assim, é preciso buscar orientação médica e um diagnóstico especializado para entender até que ponto outras condições de saúde podem estar influenciando tais condições.
Estágio 4 – Declínio cognitivo moderado/demência leve
O diagnóstico de Alzheimer nesta fase pode ser feito com bastante acurácia. O déficit funcional mais comum nesta fase é o declínio na habilidade de executar tarefas mais complexas da vida cotidiana, com impacto em sua capacidade de viver de forma independente. Por exemplo, pode ser complicado lidar com contas mensais, pagar o aluguel, ir ao mercado fazer compras, escolher um prato num restaurante. Pessoas que costumavam cozinhar passam a ter dificuldades para preparar os alimentos.
Sintomas de perda de memória se tornam bem evidentes neste estágio. Eventos recentes importantes como uma festa ou a visita de um parente podem ser esquecidos. Em geral, essa fase tem duração de cerca de dois anos.
“As pessoas começam a ter alterações leves de memória, perdem um pouco a noção do tempo, apresentam dificuldades para manejar as finanças, fazer cálculos, mas o impacto nas atividades diárias ainda não é muito grande”, explica o especialista da Uerj.
Estágio 5 – Declínio cognitivo moderadamente severo/demência moderada
Neste estágio, as pessoas apresentam sintomas que as impedem de ter uma vida independente. A principal alteração funcional desta fase é a dificuldade de executar atividades básicas do dia-a-dia, como, por exemplo, escolher a roupa mais apropriada para as condições climáticas e a ocasião, se alimentar sozinho, pagar as contas, manter as condições de higiene da casa e das roupas. Elas podem apresentar ainda problemas comportamentais, como ataques de raiva e desconfiança.
Do ponto de vista cognitivo, elas frequentemente não conseguem lembrar de grandes eventos ou aspectos importantes de sua vida cotidiana, como o seu próprio endereço, o nome do presidente da República e as condições do tempo. Este estágio tende a durar um ano e meio.
“Nesta fase, o paciente começa a ter os chamados comportamentos atípicos, como sair na rua de pijama, colocar um paletó mas esquecer de vestir a camisa”, exemplifica o médico.
Estágio 6 – Declínio cognitivo grave/demência moderada
Nesta fase, os pacientes perdem a capacidade de se vestir, tomar banho, escovar os dentes ou ir ao banheiro sozinhos. Elas começam a confundir ou não identificar outras pessoas, mesmo as mais próximas. Não conseguem se lembrar do nome das escolas onde estudaram, dos principais líderes políticos do País. Em algum momento, elas começam a ter dificuldades para falar. Do ponto de vista comportamental, ataques de raiva podem ser frequentes. Esta fase pode durar de dois a três anos.
“O paciente já é incapaz de realizar as atividades cotidianas básicas, já tem um comprometimento motor considerável e dificuldade para reconhecer as pessoas”, disse Otelo Correa dos Santos Filho. “Alucinação não é muito comum no Alzheimer, mas pode ocorrer nesta fase.”
Estágio 7 – Declínio cognitivo muito grave/demência muito grave
Nesta fase, os pacientes demandam assistência para atividades cotidianas básicas e para a própria sobrevivência. A capacidade de fala é cada vez mais restrita até ser completamente perdida. O paciente perde também a capacidade de andar sozinho e até de se sentar. A rigidez nas juntas é cada vez mais frequente, impedindo os movimentos mais básicos e levando a deformidades físicas. Uma causa comum de morte é pneumonia, justamente por conta da dificuldade de deglutição cada vez mais acentuada. Esta fase costuma durar de um a três anos.
“É a fase mais grave e mais triste da doença, em que as pessoas apresentam demência grave, dependência completa para as atividades diárias e estão acamadas”, afirmou o especialista. “É a fase final da doença.”
Crédito: Roberta Jansen/O Estado de S.Paulo – @ disponível na internet 22/09/2022
Alzheimer: diagnóstico precoce ajuda o paciente a ter mais autonomia
Maria Cecília iniciou um tratamento multidisciplinar com fisioterapia, terapia ocupacional, acompanhamento neurológico e medicamentos. “O diagnóstico precoce é muito importante para que o paciente possa ser protagonista daquilo que ele vai viver dali para frente”, aponta a presidente da Abraz em São Paulo e médica geriatra, Celene Queiroz de Oliveira. A médica aponta que o estigma em relação à doença faz com que as pessoas demorem mais para serem diagnosticadas “Quando você traz o paciente já numa fase avançada, ele já não tem mais condições de dizer o que gostaria. E a família acaba se tornando responsável por tomar as decisões.”l
A filha de Maria Cecília percebeu que a mãe apresentava algumas falhas de memória e a levou a um neurologista. “Minha mãe estava esquecendo eventos que ela já havia contado, esquecia alguns caminhos”, comenta. No primeiro momento, Thayná achou que poderia ser cansaço, mas quando percebeu que os esquecimentos se tornaram recorrentes, acompanhou a mãe em exames para identificar a doença. Foi ela quem recebeu o diagnóstico por primeiro e deu a notícia à mãe. “A gente diagnosticou precocemente e isso facilitou muito o tratamento”, comenta.
Adaptar para viver bem
Hoje, aos 69 anos, Maria Cecília gosta de ter a própria rotina, com independência. Com o diagnóstico, a filha, Thayná, pensou em formas de garantir a segurança da mãe sem comprometer a autonomia. Agora, para ir ao shopping, uma das atividades que Maria Cecília mais gosta, a filha vai junto. “É até bom porque a gente convive mais juntas”, comenta.
Companhia para o dia a dia
Uma das formas que Thayná encontrou para estimular a liberdade da mãe foi adotar um cachorro. Hoje, Maria Cecília passeia pelo bairro todos os dias acompanhada do animal, conversa com vizinhos e conhece as ruas. “No começo eu ficava preocupada, mas agora eu vejo que ela conhece o bairro inteiro. Acho que isso faz ela se sentir mais viva”, diz.
Para evitar que a mãe se perca, Thayná fez uma pulseira com o telefone para contato e a indicação de que Maria Cecília é uma idosa com Alzheimer. “Não dá para deixar a vida para, ela ainda é lúcida. A gente vai fazer um pouco por vez para não acabar com a liberdade dela”, comenta Thayná.
Quais os sinais que podem indicar Alzheimer?
Esquecimentos frequentes são os primeiros sintomas que merecem atenção quando se pensa em Alzheimer. Repetição de uma fala ou de uma pergunta mostram que a memória pode estar comprometida. “Se fala bastante sobre as alterações das capacidades cognitivas. A pessoa não consegue reter a informação que você passou”, explica a geriatra Celene.
A médica destaca dois tipos de dificuldade de memória para ficar alerta. A queixa subjetiva de memória que acontece quando a pessoa percebe que tem dificuldades para lembrar de determinadas coisas, mas não afeta tanto a rotina e o comprometimento cognitivo leve, em que a pessoa tem esquecimento e precisa de auxílio para usar a memória, como o uso de anotações e agendas.
O senso de localização também também pode ser alterado pela doença e pode ficar difícil para fazer caminhos que a pessoa já conhecia. “A pessoa fica com dificuldade de se orientar no espaço”, comenta a médica.
Celene alerta ainda que o transtorno comportamental leve pode ser um dos primeiros indicativos de desenvolvimento de Alzheimer. O transtorno acontece quando uma pessoa tem um padrão de comportamento definido e muda de uma hora para outra. “Não necessariamente a pessoa começa com sintomas de cognição, às vezes ela começa com sintomas do comportamento”, explica.
Quais as formas de prevenção do Alzheimer?
Medidas para prevenir o Alzheimer são diferentes para cada faixa etária. Já na infância, a alfabetização é importante para afastar a possibilidade de desenvolver a doença no futuro. “Se você é alfabetizado na infância, é quando mais consegue prevenir demência”, diz Celene. Durante a vida adulta, é importante manter os níveis de pressão arterial e colesterol controlados e praticar ao menos 300 minutos de atividade física por semana.
A médica explica ainda que prevenir doenças que causam demência envolve diferentes aspectos da vida, como alimentação variada, rica em produtos naturais, socialização e educação. “Não é uma ação que vai te proteger, é uma questão de como você vive como um todo.”
Crédito: Redação de “O Estado de S.Paulo”- @ disponível na internet 22/09/2022