Relator do projeto que prevê uma nova regulamentação para planos de saúde, o deputado Duarte Jr. (PSB-MA) tem demonstrado resistência a incluir no texto a autorização para que operadores vendam o chamado “plano segmentado”. O formato daria aos usuários o direito apenas a consultas, exames e terapias, sem contemplar internações.
Por outro lado, o parlamentar defende uma nova fórmula de reajuste de planos coletivos que preserve a margem de lucro das empresas.
— Isso (a criação de um plano segmentado) parece interessante a um primeiro olhar, mas tenho medo de que seja pior para o consumidor. Tenho medo de que as pessoas façam essa contratação pensando que estão tendo acesso pleno a tratamentos de saúde. Minha desconfiança é em relação à forma com que será vendido — afirmou Duarte Jr. ao GLOBO.
Ele, contudo, diz que o tema ainda está em debate:
— Os planos querem a criação desse serviço, alguns órgãos de defesa do consumidor também são simpáticos a esta ideia, pois isso aumentaria o acesso à atenção básica. O presidente Arthur Lira tem debatido este ponto, mas ainda não está no texto, de forma pacificada.
Duarte Jr. afirma que, para que esse formato possa ser adotado, seria necessário delimitar como as operadoras poderiam oferecer o serviço. De acordo com ele, a modalidade não poderia chegar aos consumidores com ressalvas previstas em lei.
— Precisaríamos delimitar bem a forma como isso funcionaria. O consumidor terá direito a consultas, terapias e exames ilimitados? Uma mãe de um filho autista ou com deficiência, por exemplo, poderá pagar R$ 50 por consultas ilimitadas de fisioterapia para o seu filho, fazendo a contratação do plano segmentado? Se for assim, eu sou favorável, é claro. Mas não se pode criar um plano segmentado com inúmeras exceções — ressaltou.
Para o relator, contudo, o único “ponto inegociável” do nova lei será a proibição das rescisões unilaterais por parte dos planos.
— Qualquer rescisão unilateral é um pecado por parte dessas empresas. A contratação de um plano de saúde é uma das poucas aquisições que o consumidor faz pensando em nunca usar. Como eles podem se eximir de atendimentos quando as pessoas mais precisam? Vamos deixar clara a proibição das rescisões unilaterais de qualquer contrato, exceto quando o consumidor atrasar o pagamento a partir de 60 dias. Os planos vivem dizendo que vão quebrar, mas não vão. É mais fácil trocarem o relator do que eu tirar a proibição da rescisão unilateral, de qualquer tipo de contrato, do texto — afirmou Duarte Jr.
Planos coletivos
De acordo com o relator, o principal foco da nova lei é contemplar os direitos de quem contrata os serviços de um plano de saúde por meio da modalidade coletiva. Uma das mudanças nas regras previstas por ele é a criação de uma fórmula de cálculo que contemple todos os contratos das seguradoras, e não mais sobre uma única empresa. Dessa forma, afirma, os planos manteriam a margem de lucro, mas evitando o que ele chama de reajustes abusivos.
Para o advogado Wendell do Carmo Sant’Ana, presidente da comissão de direito médico da Ordem dos advogados do Brasil – Distrito Federal (OAB/DF), a proposta de reajuste encontra problemas. Ele argumenta que empresas com realidades diferentes não podem ser colocadas sob um mesmo cálculo que as equipare:
— Acho muito difícil que se faça um cálculo desses baseado em todos os contratos de uma seguradora. Cada empresa tem o seu plano, com realidades diferentes e volumes de uso distintos. Como fazer uma média? Os planos tinham que fazer o cálculo de reajustes com base em um limite inflacionário. Vejo com bons olhos uma regulamentação, como existe para os planos individuais. Muito mais importante do que fazer um cálculo que dilua esse percentual de reajuste é haver uma lógica que dê previsibilidade de aumento de gastos às pessoas, respeitando a inflação do período vigente.
Consórcio para compra de medicamentos
Outros pedidos das operadoras, como a criação de um consórcio para compras de medicamentos para os planos, com preços equiparáveis àqueles aplicados pelo SUS, e a criação de um prontuário único, têm opinião favorável do relator.
O consórcio, porém, é alvo de críticas de especialistas. Professora de medicina da UFRJ e especialista no setor, Lígia Bahia diz que o ente público não pode ser envolvido na questão:
— Isto é inviável do ponto de vista legal e incorreto pela confusão entre o público e o privado. Os planos podem criar uma central de compras para o setor privado, mas nunca se mobilizaram para criar um fundo. O setor público não pode ser exigido para operar com os planos. A contrapartida que pode ser dada aos planos pela proibição das rescisões unilaterais pode ocorrer através da diminuição de carências, por exemplo. O preço de medicamentos para os planos é um problema desses empresários, não é o governo que deve intermediar — afirmou.
Crédito: Gabriel Sabóia / O Globo – @ disponível na internet 22/06/2024