Tudo o que pode dar errado na sua apresentação de trabalho gira na sua mente. A conversa tensa com seu chefe se repete várias vezes. O medo da demissão, um problema com seus pais e um primeiro encontro constrangedor também ocupam lugares cativos na sua cabeça. Soa familiar? Embora pareça que você esteja só comendo seu macarrão, indo para o escritório ou socializando tranquilamente, seu cérebro está cheio de ruídos.
Toda essa preocupação fica fazendo a mesma pergunta de um milhão de maneiras diferentes: Será que tudo vai dar tudo certo?
“Ruído no cérebro é uma expressão que meus pacientes usam para descrever um fluxo constante de pensamentos, na maioria das vezes negativos, que se tornam avassaladores e geralmente são inúteis”, define Nina Vasan, psiquiatra, fundadora e diretora executiva do Brainstorm – Laboratório de Stanford para Inovação em Saúde Mental.
Enquanto cada pensamento luta por atenção, você se vê jogando aquele tipo de jogo em que precisamos acertar as toupeiras que vão aparecendo. E quem já jogou sabe que não é fácil chegar à vitória.
Por que tenho esse ruído constante na cabeça?
O ruído cerebral pode afetar qualquer pessoa, até mesmo pessoas bem-sucedidas e altamente realizadas.
Embora a autorreflexão seja um processo importante, o ruído cerebral, muitas vezes chamado de preocupação ou ruminação de pensamentos, ocorre quando os pensamentos ficam “repetitivos ou angustiantes”, diz Sara Kuburic, psicoterapeuta existencial, conhecida como The Millennial Therapist por seus 1,7 milhão de seguidores no Instagram e autora do livro, It’s On Me. É quando o cérebro fica biologicamente hiperestimulado – muitas vezes entra em pane.
“Esses pensamentos geralmente surgem de questões que enfrentamos a respeito de nossa responsabilidade, liberdade, sentido, isolamento e até mesmo mortalidade”, descreve Sara.
“É difícil acalmar o ruído porque o cérebro é programado para buscar soluções, muitas vezes tentando ‘consertar’ as coisas pensando demais”, informa Sara.
As pessoas com problemas comportamentais e de saúde mental, como ansiedade, depressão e TDAH, também são mais propensas a ter cérebros hiperativos que procuram problemas, se preparam e ficam pensando no futuro. “Para alguns, pensamentos repetitivos podem desencadear uma sensação de familiaridade à qual o cérebro se apega, mesmo que seja desconfortável”, diz Sara.
Mas não precisamos conviver com esse tipo de familiaridade. Arianna Huffington, CEO da Thrive Global, costuma dizer que está na hora de expulsarmos essa colega de quarto detestável que mora na nossa cabeça.
“Passei muitos anos tentando expulsar minha colega de quarto e agora consegui relegá-la a aparições ocasionais na minha cabeça”, escreveu ela em 2016.
Aqui estão cinco maneiras de acalmar o ruído do cérebro, não importa onde você esteja.
1- Pergunte: Meus pensamentos oferecem ações concretas ou surgem apenas do medo?
Se você estiver com dificuldade de permanecer no momento presente, reserve um tempo para se perguntar se os pensamentos se abrem para ações claras.
“Quando um pensamento fica ressurgindo e tem a ver com algo importante que está acontecendo na sua vida no momento, ele provavelmente merece sua atenção”, diz Julie Bjelland, psicoterapeuta e apresentadora do The HSP & Neurodivergent Podcast. “Por exemplo, se você fica pensando numa conversa difícil com um amigo, isso pode ser sinal de que sentimentos não resolvidos precisam ser abordados ou de que é necessária mais uma conversa”.
Ela acrescenta: “Se você está com medo da aproximação do prazo final de um projeto e seus pensamentos estão lembrando que é preciso priorizar algumas tarefas, você pode dividir o projeto em tarefas menores e tomar medidas concretas”.
Mas, se os pensamentos forem sobre um medo intangível ou uma possibilidade rebuscada e não for possível tomar uma decisão, você pode ficar emocionalmente paralisado. Pode ser útil dizer a si mesmo que, nesse caso, não há nada a ser feito – e estabelecer uma distinção clara entre algo realista e algo enraizado no medo. Visualize o pensamento como uma nuvem e deixe que ele passe por você.
Preocupar-se com o que os outros pensam de você ou pensar demais em algum evento que ainda não aconteceu (como: “E se ninguém gostar de mim na festa?”) não lhe dá a chance de tomar uma ação imediata. “Esses pensamentos ficam em loop sem solução”, diz Julie.
Também vale a pena perguntar se o pensamento está empurrando você para uma direção autêntica.
“Pergunte a si mesmo: ‘Esse pensamento está me ajudando a viver de forma mais plena e significativa?’”, orienta Julie. “Se estiver enraizado na evitação, é provável que seja motivado pela ansiedade, e não por uma preocupação autêntica. Considere se o pensamento aproxima ou afasta você da vida que você quer levar”.
2- Pratique a atenção plena
Praticar a atenção plena é o antídoto mais eficaz contra o ruído mental, dizem os especialistas à Fortune. Experimente um exercício simples de respiração de 60 segundos: inspire por quatro contagens, segure por quatro contagens e expire por quatro contagens. A meditação de varredura corporal, em que você fecha os olhos e se concentra em cada parte do corpo, envolvendo lentamente diferentes músculos, é outra excelente técnica de atenção plena.
“Você se concentra mentalmente em cada parte do seu corpo, da cabeça aos pés, (o que) pode ajudar você a sair da mente e entrar no corpo, acalmando a tagarelice mental”, descreve Julie.
Mesmo que o alívio mental não aconteça de imediato, priorizar a respiração e a atenção plena todos os dias treinará o cérebro para regular o sistema nervoso, da mesma forma que se treina um músculo na academia.
3- Limite os estímulos
Vivemos em um mundo repleto de estímulos. O fluxo constante de informações na ponta dos dedos pode intensificar a tagarelice mental.
“Reduza a exposição à sobrecarga de informações, como tempo excessivo nas telas e nas redes sociais ou em contextos estressantes. Os estímulos externos geralmente amplificam o ruído interno, portanto, limitar as distrações pode criar mais espaço mental”, diz Julie. Por exemplo, estabeleça um limite diário para as redes sociais no seu celular e tenha horas de tolerância zero para não ficar de olho nas notificações.
Quando você estabelece um tempo para ter quietude e descansar sem estímulos, os pensamentos podem passar naturalmente como sussurros, em vez de se acumularem como gritos, acrescenta Julie, que se deita no tapete de ioga em silêncio todos os dias. “O verdadeiro descanso significa quietude silenciosa, sem trazer nenhuma informação nova – e nada de redes sociais, nada de listas de tarefas, nada de ficar pesquisando na internet”, diz ela, ressaltando que a quietude melhorou sua qualidade de sono, o que fortalece sua resistência a fatores estressantes e a ajuda a trabalhar melhor os pensamentos antes que eles se tornem aquele colega de quarto detestável.
4- Faça uma reinicialização rápida
Se não há nenhuma ação a ser tomada em relação aos seus pensamentos turbulentos, a reinicialização para o momento presente é essencial para liberar o ruído e acalmar o sistema nervoso.
Mel Robbins, palestrante motivacional conhecida por sua palestra TedTalk, Como parar de se boicotar, tem uma regra de cinco segundos para se reiniciar em momentos de estresse ou pavor. Ela faz uma contagem regressiva a partir de cinco, levanta-se e volta sua atenção para outra coisa.
Se a contagem regressiva não ajudar, tente passar de 10 a 15 minutos escrevendo um diário, conversando com um amigo, caminhando ou simplesmente observando o ambiente ao seu redor.
“Mude sua atenção para algo no presente que lhe traga alegria – uma bela árvore, um pássaro ou o rostinho adorável de seu animal de estimação”, exemplifica Julie.
5- Aceite a incerteza com autocompaixão
Arianna diz que devemos nos dirigir à voz na nossa cabeça como faríamos com um amigo. “Nem mesmo nossos piores inimigos falam de nós da mesma forma que falamos de nós mesmos”, escreveu ela. “Gostaria que alguém inventasse um gravador que pudesse ser conectado ao nosso cérebro para registrar tudo o que dizemos a nós mesmos. Perceberíamos como é importante parar com essa conversa negativa sobre nós mesmos”.
Em vez de ser duro com você por causa de seus pensamentos, aborde-os com aceitação e autocompaixão, aconselha a especialista. Primeiro, acolha os pensamentos. “Estou ansioso com isso, e isso é compreensível”, Julie sugere dizer a si mesmo.
Em seguida, desafie o pensamento com uma verificação da realidade. “Do que estou realmente com medo? Esse medo é baseado em fatos ou em um cenário de ‘e se’?”, ela pergunta. “Quando somos severos com nós mesmos, isso tende a alimentar o ciclo de ruído mental, deixando mais difícil abandonar esses pensamentos ou parar de se preocupar. No entanto, ao praticarmos a autocompaixão – falando conosco com gentileza, normalizando nossas emoções e reconhecendo que tudo bem ter dificuldades – podemos amenizar o impacto dos pensamentos avassaladores”.
Embora o objetivo do jogo das toupeiras seja forçá-las a voltar para dentro de seus buracos, este não é o objetivo quando se trata dos pensamentos, frisa Julie. É impossível eliminar todos os pensamentos indesejados, porque a incerteza estará lá onde quer que formos.
“Reconheça a imprevisibilidade da vida e o fato de que não podemos controlar tudo”, diz ela. “Quando você se sentir sobrecarregado por pensamentos, lembre-se gentilmente de que a incerteza faz parte da vida e que a liberdade está em como você escolhe reagir a ela. O silêncio, no sentido mais existencial, talvez não seja o objetivo”.
Embora essas intervenções sejam um primeiro passo, pensamentos persistentes, prejudiciais e perigosos podem exigir a ajuda de um profissional.
Crédito: Alexa Mikhail (Fortune) com tradução de Renato Prelorentzou / O Estado de São Paulo – @ disponível na internet 2/11/2024