Depois da refeição, muitos consideram normal sentir aquela sensação de azia e queimação no peito. Conhecida como refluxo, essa condição afeta 25 milhões de brasileiros e, se não tratada, pode trazer inúmeras complicações, incluindo o câncer de esôfago
Os sintomas de câncer no esôfago que não devemos ignorar – (crédito: Getty Images)
Aquela sensação de queimação no peito e na garganta, sobretudo após uma refeição, é um sinal de que, talvez, seja necessário se preocupar com a saúde. Isso porque essa condição tem um nome conhecido, mas sempre deixado de lado pela população.
O refluxo gastroesofágico (DRGE), tão presente na sociedade, traz sintomas como azia e regurgitação de alimentos ou líquidos. O que você provavelmente não sabe é que, se não tratado, ele pode trazer complicações ao corpo, incluindo, até mesmo, o câncer de esôfago.
O refluxo gastroesofágico é uma condição crônica, em que o conteúdo do estômago, incluindo ácido e bile, flui de volta para o esôfago, causando dores no peito ou garganta, dificuldade para engolir, além de tosse seca ou rouquidão.
De acordo com Marcela Crosara, oncologista da Oncologia D’Or, o refluxo não tratado causa complicações como esofagite, úlceras, estreitamento e pode ser um dos fatores responsáveis por desenvolver o câncer de esôfago.
“Como o refluxo é capaz de causar essas complicações, é importante combatê-lo com mudanças de estilo de vida, alimentação e perda de peso. Uso de medicamentos recomendados pelo médico e, em alguns casos mais graves, até procedimentos cirúrgicos são indicados para esse tratamento”, explicou a especialista. Por isso, tratar esse quadro é primordial para que novas complexidades não apareçam.
Em entrevista realizada no X Congresso de Oncologia D’or, no começo de abril, no Rio de Janeiro, o médico cirurgião do aparelho digestivo Flavio Takeda destacou a importância de hábitos saudáveis para a prevenção, tanto do refluxo quanto do câncer de esôfago. “O The New England Journal of Medicine (NEJM) publicou, em 2019, que 20% da população americana possui refluxo. Isso, claro, está relacionado à má alimentação que existe nos Estados Unidos. Temos uma visão estigmatizada dessa doença e, também, do esôfago”, afirmou.
Segundo informações do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva (CBCD), cerca de 25 milhões de brasileiros têm refluxo.
Casos
No Brasil, o câncer de esôfago é o sexto mais frequente entre os homens e o 15º entre as mulheres, excetuando-se o câncer de pele não melanoma. No mundo, ele é o oitavo mais frequente, sendo que sua incidência em homens é quase duas vezes maior do que em mulheres.
Famosos
No Brasil, um dos casos mais conhecidos é o do ex-prefeito de São Paulo Bruno Covas, que faleceu em 2021 acometido pelo câncer de esôfago, aos 40 anos. O ator e diretor Marcos Paulo também veio a óbito, em 2011, em razão da doença.
Causas
De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), os principais fatores para o surgimento do câncer de esôfago são tabagismo, abuso de bebidas alcoólicas, ingestão de alimentos e bebidas quentes, obesidade e feridas na parede do esôfago, causadas pelo refluxo.
Sinais
O principal sintoma de câncer de esôfago é a dificuldade para engolir. No início, essa dificuldade aparece na ingestão de alimentos sólidos e, em seguida, com os pastosos. Por fim, surgem os líquidos. Por isso, grande parte das pessoas acometidas pela doença perdem peso e apresentam anemia e desidratação.
Identificação
O diagnóstico do câncer de esôfago, segundo o Inca, é feito por meio da endoscopia digestiva, um exame que investiga o interior do tubo digestivo e que permite a realização de biópsias para confirmação do diagnóstico. Quando o tumor é detectado precocemente, as chances de cura aumentam muito.
Evolução
O médico Flavio Takeda esclarece que o diagnóstico tardio sempre foi um dos maiores empecilhos para a identificação precoce do câncer de esôfago. Mas, com o avanço da medicina e de todo um arsenal oncológico, essa premissa tem se dissipado aos poucos, dando lugar à nova era de cuidados com os pacientes.
Palavra do especialista
Qual a correlação entre o refluxo e o câncer de esôfago?
É importante lembrar que o câncer de esôfago que vem do refluxo é o adenocarcinoma de transição esofagogástrica. Então, existem algumas alterações no paciente que são marcadores da doença de refluxo crônico. Uma delas é o esôfago de Barrett, que é uma alteração celular adaptativa ao refluxo crônico. Quando isso acontece, existe um risco de meio 0,5% a 1% ao ano de se desenvolver câncer de disfunção esofagogástrica e adenocarcinoma, se não controlado bem o refluxo.
Quais as medidas que são adotadas para conter o refluxo?
O passo primordial são medidas de mudanças de comportamento, como perder peso, fazer atividade física, evitar bebida alcoólica, evitar comidas que são refluxo gênicas, como pimenta, molho de tomate, muito condimento, pimenta-do-reino e frituras. Tudo isso são medidas para tentar, realmente, melhorar e conter a adoção do refluxo. A segunda medida é medicamentosa, pois hoje existem os inibidores de bombas protônicas, e o chamado IBPS, que promovem a supressão de volume de secreção ácida de 40% do estômago, ou seja, quem toma essas medicações diminui o volume de ácido produzido do estômago, portanto você diminui a chance de ter refluxo. Por fim, quando o refluxo é muito intenso, a última opção é o tratamento cirúrgico, em que é colocada uma válvula antirrefluxo. Essas são as principais modalidades do tratamento do refluxo.
*O repórter viajou ao Rio de Janeiro a convite do X Congresso de Oncologia D’or
Fonte: Médico cirurgião do aparelho digestivo do Barra D’Or, Flavio Takeda/ Correio Braziliense – @ disponível na internet 14/4/2025