Terras raras impulsionam a nova economia

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PRI-1008-OPINI - (crédito: Maurenilson Freire)
Existe um diferencial ambiental que o Brasil pode explorar: produzir terras raras com rastreabilidade socioambiental, respeitando os biomas, as comunidades locais e promovendo práticas de mineração de baixo impacto

Pouca gente sabe exatamente o que são as terras raras, mas quase todos dependem delas no seu dia a dia. Trata-se de um grupo de 17 elementos químicos com nomes difíceis — como neodímio, disprósio e lantânio — que possuem propriedades físicas únicas: produzem superímãs potentes, suportam altas temperaturas, emitem luz e aumentam a eficiência de baterias.

Esses elementos são invisíveis aos olhos do consumidor, mas indispensáveis para tecnologias modernas como celulares, veículos elétricos, turbinas eólicas, painéis solares e equipamentos médicos de alta precisão. À medida que o mundo avança para abandonar os combustíveis fósseis, a demanda por terras raras cresce rapidamente.

Sem elas, a transição energética seria inviável. Turbinas eólicas seriam menos eficientes, baterias perderiam autonomia, carros elétricos seriam mais pesados. A nova economia verde, digital e eletrificada depende fortemente desses minérios estratégicos.  Essa dependência trouxe as terras raras para o centro da geopolítica global, tornando-as variável crítica de segurança nacional e de soberania tecnológica.

Atualmente, mais de 85% do refino desses minerais está sob o controle da China, o que acende um alerta para países que buscam reduzir vulnerabilidades em suas cadeias de suprimento. Estados Unidos, União Europeia e Japão já declararam programas de emergência para diversificar suas fontes, incluindo incentivos bilionários para novas explorações, tecnologias de reciclagem e parcerias com países fornecedores estratégicos.

O Brasil, por sua vez, possui algumas das maiores reservas do mundo, mas a exploração ainda é tímida, marcada por entraves regulatórios, carência de uma política industrial estratégica e baixa articulação entre pesquisa científica e indústria de transformação. Mais do que extrair, o grande desafio está em dominar as etapas de separação e refino de terras raras, processos tecnologicamente complexos e ainda ausentes na cadeia produtiva brasileira.

Mas o potencial mineral do Brasil se faz cada vez mais presente em mesas de negociações comerciais delicadas. Recentemente, proposta de cooperação em terras raras surgiu como contrapartida em discussões sobre tarifas com os Estados Unidos. Indicação de que nossos recursos subterrâneos são percebidos internacionalmente como ativos de negociação geopolítica, mesmo que ainda não sejam tratados assim por nós mesmos.

Se nada for feito, corremos o risco de repetir um velho erro histórico: exportar matéria-prima bruta e importar produtos de alto valor agregado, financiando a inovação dos outros com os nossos recursos. Mas essa trajetória pode — e deve — ser diferente. O Brasil pode se posicionar como ator estratégico na nova economia dos minerais críticos, unindo indústria, inovação e sustentabilidade.

Essa visão exige uma estratégia de longo prazo, capaz de integrar exploração mineral com pesquisa, desenvolvimento de tecnologias de separação e purificação, fortalecimento da indústria local e criação de cadeias de valor que gerem empregos e renda no país. Além disso, existe um diferencial ambiental que o Brasil pode explorar: produzir terras raras com rastreabilidade socioambiental, respeitando os biomas, as comunidades locais e promovendo práticas de mineração de baixo impacto.

Entre as inovações promissoras, destaca-se a fitomineração — ou agromineração — tecnologia que utiliza plantas para absorver terras raras do solo ou de rejeitos. Embora ainda em fase inicial de desenvolvimento, essa abordagem poderá oferecer uma alternativa de extração mais limpa, com potencial para reabilitar áreas degradadas e recuperar elementos dispersos em solos de baixo teor.

MAURÍCIO ANTÔNIO LOPES, pesquisador da Embrapa Agroenergia

Outra inovação promissora é a biolixiviação, um processo que utiliza microrganismos, como bactérias e fungos, para dissolver minerais e liberar terras raras de forma controlada e ambientalmente mais amigável.

Essa abordagem permite recuperar elementos dispersos em rejeitos ou minérios de baixo teor, com menor uso de reagentes químicos agressivos.

No entanto, para que essas tecnologias alcancem escala industrial e se tornem economicamente viáveis, ainda são necessários avanços em diversas frentes.

No caso da fitomineração, é fundamental o desenvolvimento de cultivares hiperacumuladoras mais eficientes e adaptadas a diferentes condições edafoclimáticas.

Para a biolixiviação, a seleção de microrganismos altamente eficazes e a otimização das condições de processo são desafios centrais.

A nova economia não será possível sem avanços científicos e acesso seguro e sustentável a insumos estratégicos. E, entre eles, poucos são tão decisivos quanto as terras raras. Reconhecer essa realidade é o primeiro passo. O segundo é agir com visão de futuro, competência e sólido conhecimento científico. Os minerais do século 21 estão sob o solo brasileiro. Resta-nos decidir, com visão e agilidade, como transformar essa riqueza em vantagem estratégica antes que a janela de oportunidade se feche.

Crédito: Maurício Antônio Lopes / Correio Braziliense – @ disponível na internet 11/8/2025

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