Tribunal de Contas da União condenou ex-dirigentes e banco a multas milionárias por investimentos errados
O caso é tão tormentoso que nada menos que 62 advogados chegaram a atuar
formalmente para evitar que o Tribunal de Contas da União (TCU), em
Brasília, punisse o Postalis, o fundo de pensão dos funcionários dos Correios,
por uma sucessão de decisões desastrosas em investimentos que levaram
pensionistas ligados à estatal a amargar centenas de milhões de reais em
prejuízo.
No fim de julho, em apenas um dos mais de dez casos que tramitam no TCU
sobre possíveis irregularidades nos Correios e na caixa de previdência dos
funcionários, a Corte de Contas condenou o banco BNY Mellon, que
administrava um fundo de investimentos, a um débito de cerca de 1 bilhão de
reais por aplicações consideradas imprudentes feitas na época em que Antônio
Carlos Conquista, indicado pelo governo de Dilma Rousseff, comandava o Postalis
VEJA teve acesso aos detalhes da auditoria que não só apontou o caos no trato do
dinheiro dos pensionistas como às conclusões da Corte, que impôs multa
adicional de 90 milhões de reais para o ex-dirigente, mais 37 milhões um ex auxiliar seu que atuava na Diretoria Financeira e outros 180 milhões de reais para o BNY Mellon.
O caso envolve especificamente aportes em um fundo de investimentos
multimercado chamado Serengeti e trata de identificar a parcela de
responsabilidade dos dirigentes do Postalis na aplicação dos recursos.
É apenas mais um no cenário de grave crise financeira que atingiu o fundo de pensão, que
viu o resultado do Plano de Benefício Definido (PBD) saltar de um déficit de 1,34
bilhão de reais em 2010 para mais de 6,77 bilhões de reais em 2015.
O desequilíbrio financeiro é tamanho que o Postalis acionou sucessivos planos de
equacionamento do déficit, que preveem contribuições adicionais dos
pensionistas até 2039 para tapar o rombo.
O fundo Serengeti foi constituído em 2008 para alocar valores do Plano de
Benefício Definido. Tempos depois, a gestão e operacionalização do fundo foram
terceirizadas para o BNY Mellon.
O Serengeti adquiria cotas de um segundo fundo, que, por sua vez, investia em
outros, chegando até um quarto nível de alocação na carteira. Com decisões
erradas na aplicação dos valores e, nas palavras do TCU, “uma carteira de
investimentos que violava frontalmente o pilar que deveria reger toda a sua
atividade”, a caixa de previdência amargou um prejuízo milionário.
De acordo com o Tribunal de Contas, o Serengeti apresentava um retorno médio
anual inferior a 5%, com um risco próximo a 6%. Também se constatou que o
fundo rendia menos do que títulos públicos.
Para tentar medir em números o tamanho do prejuízo, o TCU adotou uma
metodologia conhecida como “carteira ótima”, que a partir de algoritmos analisa
dados históricos de risco e retorno públicos disponíveis na época da potencial
irregularidade e os compara com um universo de mais de dez mil fundos de
investimento.
O resultado foi um débito de mais de 450 milhões de reais em valores históricos.
Corrigidos, foi o que levou o tribunal a penalizar o BNY Mellon em cerca de 1
bilhão de reais.
Para o tribunal, não só o BNY, mas também Conquista e Ricardo Oliveira
Azevedo, que ocupou o cargo de Diretor Financeiro do Postalis entre 2012 e 2013,
devem ser responsabilizados.
“O que os autos revelam, em última análise, não é um mero insucesso de investimento, mas a crônica de um prejuízo anunciado, fruto de uma falha sistêmica e inescusável de governança. A gestão temerária dos ativos, perpetrada por quem tinha o dever contratual de zelar por eles, floresceu em um ambiente de supervisão omissa por parte daqueles a quem os participantes do plano confiaram a guarda final de seus recursos”, escreveu o
relator do caso no TCU, ministro Bruno Dantas.
“O que se viu foi que a terceirização, que deveria ser um instrumento para agregar especialização e segurança, converteu-se em um véu para diluir responsabilidades e permitir o descalabro”, completou.
Em defesa apresentada ao tribunal, todos negaram responsabilidades pelos
prejuízos. Uma ação em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF) questiona a
competência do TCU para julgar casos que envolvem entidades fechadas de
previdência complementar.
Embora sucessivas decisões monocráticas do STF garantam aval à Corte de Contas, em boa parte é neste aspecto que fundos de pensão se apegam para evitar condenações como a do caso Postalis.
Crédito: Larissa Borges / VEJA – @ disponível na internet 12/8/2025
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