Decisão do TCU pode obrigar governo Lula a congelar até R$ 34 bi a mais em gastos em ano eleitoral

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@reprodução internet /Zero Hora

Equipe econômica, que vai recorrer da decisão, teme que medida possa reacender debates dentro do Planalto por alteração na meta fiscal

A decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de obrigar o governo federal a perseguir o centro da meta fiscal, e não mais o limite inferior da banda, pode levar a um efeito colateral indesejado pelo mercado financeiro e pela equipe econômica: a pressão da ala política do Palácio do Planalto por uma redução da própria meta de resultado primário no ano que vem.

Isso porque o entendimento do TCU pode obrigar o governo a ter de fazer um congelamento adicional de gastos de até R$ 34,3 bilhões em pleno ano eleitoral. Em 2026, o governo se comprometeu a entregar um superávit primário de 0,25% do PIB, ou R$ 34,3 bilhões no azul, mas o arcabouço fiscal permite uma margem de tolerância, que seria déficit zero.

 

Na última quarta-feira, o plenário do TCU decidiu que o governo não pode mais ter o limite da banda (o piso da meta) como referência nas divulgações dos relatórios bimestrais de Receitas e Despesas – quando são tomadas as decisões de contingenciamentos de gastos (entenda mais abaixo).

Dessa forma, ou o governo terá de estimar um aumento de arrecadação ou será obrigado a congelar despesas para cumprir o resultado.

A decisão do TCU, no entanto, ainda não está valendo, porque o governo não foi notificado oficialmente e, além disso, a equipe econômica já indicou que vai recorrer ao próprio tribunal. Isso levará a um efeito suspensivo da medida, até que TCU faça a análise desse recurso.

Na visão do economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, a decisão do TCU é correta, mas pode reforçar um cenário que já era previsto pela corretora como o mais provável – o de alteração da meta fiscal.

“Minha avaliação é que a decisão do TCU está correta. Mas isso vai levar a uma necessidade de cortes ainda maior no ano que vem. Pelas nossas contas, o governo já terá que cortar R$ 30,8 bilhões para atingir o piso da meta. Com o TCU, esse número sobe mais R$ 34,3 bilhões e chega a R$ 65,1 bilhões no total”, diz.

Salto entende que o intervalo da meta fiscal tem o objetivo de acomodar choques e, por isso, a decisão do TCU faz sentido, porque obriga o governo a perseguir o centro em seus relatórios bimestrais.

“Na elaboração da Proposta de Lei Orçamentária Anual (PLOA), o governo propôs atingir a meta de R$ 34,3 bilhões. Mas uma coisa é colocar no papel, a outra é a etapa da execução. Por isso, nosso cenário mais provável é de mudança da meta”, explicou.

Procurados, os Ministérios da Fazenda e do Planejamento reforçaram o tom da nota divulgada horas após a decisão do TCU, na última quarta-feira. Na visão das pastas, o governo vem seguindo um entendimento firmado pelo próprio Congresso Nacional, que obriga o governo a executar os gastos que são previstos no Orçamento.

Dessa forma, buscar o piso da meta é uma forma de conseguir conciliar essas duas obrigações: executar o Orçamento e cumprir a meta fiscal.

“Os ministérios esclarecem que o contingenciamento é instrumento utilizado, nos termos da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e do Regime Fiscal Sustentável, quando houver risco de descumprimento da meta que, segundo a LC 200/2023 (lei do arcabouço fiscal), é uma meta em banda e não em ponto”, diz a nota conjunta. “Assim, a meta de primário é descumprida quando o resultado primário não alcançar o limite inferior da banda. Trata-se, portanto, de mecanismo jurídico obrigatório e vinculado, aplicado ao orçamento de todos os Poderes.”

A equipe econômica também alega que tentou mirar o centro da meta, reforçando esse entendimento por meio da Proposta de Emenda à Constituição 45, de 2024, mas que a ideia foi rejeitada pelo Congresso.

“Cabe rememorar que foi rejeitada pelo Congresso Nacional a alteração constitucional proposta pelo Poder Executivo por ocasião da apresentação da PEC 45, de 2024, que franqueava maior flexibilidade à execução orçamentária para reforçar o cumprimento das metas fiscais”, diz a nota.

O TCU informou que o governo ainda não foi notificado da decisão e que poderá recorrer. Após a análise dos recursos, com o caso transito em julgado, a decisão passará a valer, desde que não haja alterações do que foi decidido.

Com esse recurso e o efeito suspensivo, o risco de contingenciamento este ano é visto como baixo pela equipe econômica. Para 2026, contudo, a chance aumenta, caso seja mantido o entendimento do Tribunal.

Tiago Sbardelotto, analista da XP Investimentos, ainda tem como cenário base a hipótese de o governo conseguir reverter a decisão do TCU, por meio de recurso. Ele aposta que o governo manterá a meta do ano que vem, por entender que há medidas de arrecadação que vão elevar receitas, mesmo com a queda divulgada pela Receita Federal no mês de agosto.

“No nosso cenário base, o governo mantém a meta. Primeiro porque a desaceleração da arrecadação já era esperada. Segundo, porque as medidas incluídas no Orçamento do ano que vem mais relevantes não são diretamente afetadas por atividade (leilão de petróleo, dividendos, transações tributárias). Terceiro, porque acreditamos que o governo pode reverter o alerta do TCU”, disse.

Ele admite, contudo, que, se a decisão do TCU se mantiver, uma das opções será a revisão para baixo da meta.

“Nesse caso restariam duas opções: rever a meta ou tentar levantar receitas adicionais. Nossa visão é de que o governo tentará a segunda opção até o limite, mas se for obrigado a fazer um contingenciamento muito elevado, optará pela primeira”, afirmou.

Atualmente, o governo não está congelando nenhuma despesa do Orçamento com base no cumprimento da meta fiscal – ou seja, não está adotando o chamado contingenciamento, mas apenas bloqueando recursos (no momento, R$ 12,1 bilhões)com base no teto de gastos do arcabouço fiscal. Se mirasse no centro, a contenção total teria de ser maior.

Qual a diferença entre bloqueio e contingenciamento?

No contingenciamento, o governo congela despesas quando há frustração de receitas, a fim de cumprir a meta fiscal (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida). Para 2025, a meta é de zerar o déficit das contas públicas.

Já o bloqueio é realizado para cumprir o limite de despesas do arcabouço fiscal. Assim, quando há aumento de gastos obrigatórios (como aposentarias, por exemplo), o governo bloqueia despesas não obrigatórias (como custeio da máquina e investimentos) para compensar a diferença.

Crédito: Alvaro Gribel / O estrado de São Paulo – @ disponível na internet 27/9/2025

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