Conta aos pobres: A PEC do teto dos gastos

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Pense na economia brasileira como uma embarcação que está afundando lentamente. A dívida pública é como a água que passa pelas rachaduras e inunda os compartimentos. Esse barco precisa ser salvo. Afinal, a vida de mais de 200 milhões de cidadãos depende dele. E como fazer isso?

O governo acredita que a PEC do teto de gastos seja a solução. A proposta institui limite financeiro em todas as áreas, possibilitando, segundo o Planalto, equilibrar as contas a partir de 2017 e pagar a dívida pública, esta que tem crescido ao longo dos anos. Pelos próximos 20 anos, o valor gasto anualmente pela União estará congelado e será reajustado apenas de acordo com a variação da inflação. Para isso, será considerado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encerrado sempre em junho do ano anterior, quando a proposta de orçamento costuma ser elaborada.

Ninguém nega que o déficit público precisa ser equacionado, e economizar é uma ação mais que bem-vinda, principalmente quando se trata de dinheiro público, mas de que adianta salvar a embarcação e deixar parte da tripulação morrer afogada?

Ao congelar os gastos durante 20 anos, serão limitados os investimentos em Saúde, Educação, Previdência e Assistência Social. Até faria sentido se a educação e saúde públicas fossem exemplares, mas a verdade é que falta muito para serem consideradas aceitáveis. Aqueles que dependem do governo para ter acesso a elas serão os mais prejudicados. Trata-se do maior retrocesso dos últimos anos em relação ao acesso da população mais pobre a serviços públicos básicos.

Saúde e Educação são atividades-fim do governo. Atividades-fim devem ser incentivadas e preservadas, não congeladas. O que fazer para arranjar dinheiro e equilibrar as contas dos cofres públicos? Eu sugiro começar pela melhoria na fiscalização do imposto de renda. O Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz) estima que quase R$ 340 bilhões tenham sido sonegados em 2016. Com esse valor seria possível pagar o déficit de R$ 170 bilhões que o próprio governo espera para 2016.

A PEC prevê, ainda, punições pelo descumprimento do teto, mas se engana quem pensa que o punido será o gestor do cofre. O prejudicado é o servidor público. Quando o teto de gastos for ultrapassado, os servidores não receberão reajuste salarial e não terão reposição de inflação no ano seguinte. Também serão vetadas aberturas de novos cargos, mudanças em planos de carreira e realização de concursos públicos.

Há quem diga que ir contra a PEC é o mesmo que estar contra o Brasil. Isso enfraquece o debate. Uma proposta como essa, divisora de águas do governo Temer, deve ser discutida amplamente. Não sentiremos de imediato os efeitos da PEC — atrelar gastos com educação e saúde à inflação gera efeitos de longo prazo —, mas é certo que as próximas gerações não sairão ilesas.

 
Crédito: Artigo publicado dia 12/12/2016 na coluna Opinião ( outra opinião) do Jornal O Globo – disponível na web 13/12/2016

 Nota: O presente artigo não traduz a opinião do ASMETRO-SN. Sua publicação tem o propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo

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