Dos 623 estudantes do ensino médio de 112 países que participam da 58ª Olimpíada Internacional de Matemática (IMO, do nome em inglês), que ocorre pela primeira vez no Brasil, apenas 65 são representantes do sexo feminino. A equipe que representa o Brasil na IMO 2017 é integrada somente por rapazes: André Yuji Hisatsuga, 17 anos, e Pedro Henrique Sacramento de Oliveira, 18 anos, de São Paulo; Bruno Brasil Meinhart, 16 anos, e George Lucas Alencar, 18 anos, do Ceará; João César Campos Vargas, 19 anos, de Minas Gerais; e Davi Cavalcanti Sena, 17 anos, de Pernambuco. O Brasil teve uma medalhista na IMO, a cearense Larissa Lima, em 2002.
De acordo com o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), que organiza o evento no país, a proporção baixa de mulheres tem se mantido nos últimos anos. Para estimular o aumento da participação feminina, o Impa sugeriu à IMO a criação do troféu IMPA Meninas Olímpicas, que será incorporado à olimpíada já neste ano e entregue às cinco participantes do sexo feminino que mais contribuírem para a pontuação de suas equipes no certame.
A IMO 2017 foi aberta na última segunda-feira (17), no Rio de Janeiro, e será encerrada no próximo sábado (22), quando os vencedores serão conhecidos e haverá a cerimônia de premiação. No domingo (23), as delegações deixarão o país. Ontem (18) e hoje (19) foram dias de prova, realizadas em ambiente fechado, a fim de garantir a concentração das equipes. São ao todo seis questões. Cada uma pode ter, no máximo, sete pontos. Segundo informou o diretor-geral do Impa, Marcelo Viana, a pontuação perfeita é 42, “para quem gabarita”.
Diversidade de gênero
Única pesquisadora do quadro permanente do Impa, em meio a 50 homens, Carolina Araújo avaliou que a criação do troféu para as melhores participantes mulheres da IMO é muito importante, não só para dar visibilidade às meninas medalhistas na olimpíada, mas também para trazer para a discussão da sociedade por que são poucas mulheres na matemática e nas ciências exatas, de modo geral.
“Para a ciência, é muito importante que a gente tenha uma maior diversidade de pessoas. Quanto mais pontos de vistas, melhor, porque mais soluções e ideias diferentes podem surgir”, disse Carolina. Ainda são poucas as mulheres fazendo pesquisas em matemática, admitiu. “Essa disparidade de gênero é reconhecida como um problema por diversas instituições”. A própria União Internacional de Matemática (IMU) tem um comitê de gênero que pensa como incentivar as mulheres a seguir carreiras exatas e, mais especificamente, matemática.
Carolina Araújo indicou que em várias países, como Estados Unidos e Europa, existem programas de estímulo para a presença feminina nas ciências. O troféu proposto pelo Impa “vem dentro desse escopo, desse esforço de trazer a questão à tona, a gente entender quais são as dificuldades, os desafios, e pensar em formas de como melhorar essa situação”.
Congresso de matemáticos
A realização da IMO faz parte do Biênio da Matemática 2017-2018, evento que tem apoio do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) que traz para o país, até 2018, os principais eventos mundiais da área. Este ano já foram promovidas a Bienal da Matemática e o Festival da Matemática. Em 2018, o Brasil recebe o Congresso Internacional de Matemáticos, que tem, entre os coordenadores, a pesquisadora Carolina Araújo.
De novo o problema ocorre, disse ela, em relação à reduzida participação feminina. Dos 203 palestrantes de todo o mundo, entre 15% e 17% são mulheres. O congresso ocorre entre 1º e 10 de agosto do próximo ano. Trata-se do mais importante evento matemático do mundo, que acontece a cada quatro anos e pela primeira vez será realizado no Brasil, no Rio de Janeiro.
Medalha Fields
Durante o congresso, são anunciados os ganhadores da Medalha Fields, que é o Prêmio Nobel de Matemática, área que não é agraciada pelo concurso da Fundação Nobel. Na última edição do evento, em Seul, Coreia do Sul, em 2014, o matemático Artur Ávila tornou-se o primeiro brasileiro e latino-americano a ganhar a Medalha Fields, pelas contribuições à teoria da área de sistemas dinâmicos. Na mesma ocasião, a iraniana Maryam Mirzakhani foi a primeira mulher a receber essa distinção.
“É uma super-honra para a gente e uma forma de trazer a matemática mais próxima da comunidade”, indicou Carolina Araújo, referindo-se à realização do congresso no Brasil. Segundo ela, não é uma equação fácil responder por que há poucas mulheres pesquisadoras na área matemática, que tem, historicamente, predominância masculina. Uma questão, apontou, é o modelo social de gênero, no qual, muitas vezes, as mulheres são criadas com um papel pré-definido, no qual a prioridade é ser dona de casa e cuidar dos filhos.
Estímulo às meninas
Com mãe e pai engenheiros, Carolina não sentiu esse problema. Para ela, foi natural escolher a área de ciências exatas. “Infelizmente, em muitos lares, os próprios pais desencorajam as meninas a estudar e gostar de matemática”, afirmou. A pesquisadora destacou que a separação entre meninos e meninas ocorre, inclusive, nos brinquedos destinados aos dois gêneros, com os mais intelectualizados sendo direcionados aos garotos. “E esse tipo de recado vai sendo passado e as pessoas vão absorvendo, mesmo inconscientemente”, analisou.
Disse que depois, quando mulheres decidem seguir a carreira de exatas, enfrentam o desafio de trabalhar, algumas vezes, em ambientes onde é minoria e podem existir situações de preconceito e, até, de assédio, o que leva muitas delas a desistir da profissão.
Agência Brasil de Notícias 20/07/2017