STF é acusado injustificadamente de fazer política.

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Para o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, a existência do foro privilegiado para políticos levou o Supremo Tribunal Federal a decidir recentemente questões que estão na fronteira “entre fazer política e proteger as instituições”.

Sem dar nomes, ele citou como exemplos o impeachment de Dilma Rousseff (PT), o afastamento de Eduardo Cunha (PMDB) e a manutenção do mandato do senador Aécio Neves (PSDB), acusado em junho de quebra de decoro parlamentar por causa da delação da JBS.

Em palestra em Washington, nos Estados Unidos, o ministro disse que a principal corte do país tem sido acusada injustificadamente de fazer política e defendeu que os ministros têm cumprido seu papel corretamente.

“Não seria possível imaginar que a Suprema Corte pudesse atuar numa área tão delicada sem ser, acho que injustificadamente, acusada de fazer política”, afirmou Barroso.

“A corte não é homogênea, mas acho que fomos capazes até agora de desenhar a linha entre a lei e política. E acho que estamos servindo bem o país, mesmo em momentos muito duros. Acho somos uma instituição na qual a sociedade pode confiar.”

Os comentários respondiam questionamento feito pela BBC Brasil sobre acusações de diferentes setores sobre a atuação do ministro Gilmar Mendes, que concedeu habeas corpus a suspeitos com os quais supostamente teria relações pessoais.

A reportagem também citou declarações recentes da ministra Cármen Lúcia, presidente da corte, que afirmou que a menção a ministros do Supremo em novos áudios gravados por executivos da JBS “agride, de maneira inédita no país, a dignidade institucional deste Supremo Tribunal e a honorabilidade de seus integrantes”.

‘Vergonha’

Durante sua fala no Brazil Institute do Wilson Center, na capital americana, Barroso também afirmou que “é impossível não sentir vergonha do que acontece no Brasil”, em referência aos escândalos de corrupção revelados pela operação Lava Jato nos últimos três anos.

“Para onde quer que se olhe no Brasil, onde há dinheiro público, há algo de errado. Petrobras, Eletrobras, BNDES, Caixa Econômica, fundos de pensão. Não é algo localizado”, declarou o ministro, classificando episódios de corrupção envolvendo as estatais como “constrangedores”.

Apesar de citar acusações de corrupção passiva contra Michel Temer e a condenação recente do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo mesmo crime, Barroso reiterou durante toda sua uma hora e meia de fala seu otimismo com o país.

“O otimismo não funciona, não faz a vida melhor. Mas o pessimismo funciona, ele de fato faz a vida pior”, brincou.

“Poucos países no mundo foram capazes de expor suas entranhas e de desmascarar erros e transgressões como fizemos”, afirmou, em referência a grandes investigações, como o mensalão e a operação Lava Jato.

“Apesar de termos vergonha, devemos ter orgulho de termos sido capazes de reagir e começar talvez a maior atuação anti-corrupção que o mundo já viu.”

JBS e Geddel

Geddel Vieira Lima
Direito de imagem REUTERS Image caption Ex-ministro do governo Temer foi preso nesta sexta-feira pela PF

A visita do ministro aos Estados Unidos ocorre em meio a uma semana intensa em Brasília, que incluiu a descoberta de R$ 51 milhões em um apartamento atribuído pela Polícia Federal ao ex-ministro Geddel Vieira Lima, preso nesta sexta-feira, e a revelação de possíveis ilegalidades nas negociações do acordo de delação premiada firmado entre o Ministério Público Federal e o grupo JBS – o mesmo que resultou na primeira denúncia contra Temer por corrupção.

Sobre uma possível nova denúncia contra o presidente, em discussão na Procuradoria-Geral da República, Barroso disse que isso mostraria que o “sistema opera de forma muito ruim”.

“Porque é um sistema no qual todos os atores relevantes enfrentam problemas. Provavelmente todos os ex-presidentes, menos um, enfrentam problemas”, afirmou.

Durante toda a fala, o ministro evitou comentar casos em andamento ou citar nomes de políticos e investigados. Na última quarta-feira, o ministro Luiz Fux, seu colega no STF, defendeu a prisão dos irmãos Batista, donos da JBS.

“Eles ludibriaram a Procuradoria, degradaram a imagem internacional do Brasil e atentaram contra a dignidade da Justiça”, afirmou Fux, em referência a novos áudios que levantaram suspeitas sobre a participação do ex-procurador da República Marcello Miller e da possível omissão de informações sobre crimes no acordo de delação premiada assinado pelos executivos da companhia.

“Os jornalistas escrevem durante a investigação. Os juízes só falam no fim, depois de decidir”, limitou-se a dizer Barroso. “Quando o caso estiver em minhas mãos, terei uma opinião. Por ora, apenas acompanho.”

‘Pacto oligárquico’

Segundo Barroso, a Justiça brasileira tem que enfrentar um “pacto oligárquico firmado no Brasil entre políticos, empresários e a burocracia estatal”.

“Há vários movimentos para parar a mudança em progresso no país”, afirmou, em referência às investigações da operação Lava Jato. “Há uma ‘operação abafa’, ou operação para obstruir (a Justiça), um movimento indecente contra o avanço das investigações.”

O ministro disse que nota uma resistência contra investigações em diversos setores, incluindo os três Poderes, o empresariado e a imprensa.

“As condenações estão atingindo pessoas que sempre acharam que fossem inatingíveis, é claro que elas reagiram a isso. Ninguém quer ser indiciado ou condenado.”

O ministro prosseguiu, dizendo que muitas práticas de corrupção continuam acontecendo, mesmo depois das prisões do mensalão e da Lava Jato: “Eles querem manter as coisas como sempre foram nos últimos 500 anos.”

“Eles não têm medo de nada e continuaram fazendo o que faziam. Bom, essas pessoas têm aliados por toda parte, em posições-chave na República, na imprensa, em diferentes áreas do governo, e mesmo onde isso poderia ser menos esperado.”

Durante sua fala, Barroso elogiou a atuação do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, e o trabalho conduzido pelo juiz Sergio Moro e a Procuradoria em Curitiba, à frente da operação Lava Jato na primeira instância.

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