O movimento se autodefine como apartidário, plural e sem fins lucrativos. Formado em grande parte por profissionais técnicos e acadêmicos – são 90 membros no total, sendo 50 cofundadores – um dos seus objetivos é “renovar a política”, termo que já não tão novo assim no desgastado cenário político brasileiro.
Ganhou maior visibilidade nas últimas semanas, quando o apresentador global Luciano Huck anunciou no programa Domingão do Faustão, da Globo, que era membro do movimento. Só isso já seria suficiente para que os holofotes se voltassem ao Agora. Mas junta-se a este anúncio o fato de o apresentador ter sido fortemente cotado como pré-candidato à presidência no ano passado. Embora tenha anunciado sua desistência da candidatura no dia 27 de novembro, no programa dominical ele aparece com ares de candidato ainda, dizendo querer “um Brasil melhor” e “o que o destino e o que Deus esperam para mim, eu vou deixar rolar”. O programa foi ao ar no dia 7 de janeiro, mas fora gravado em 11 de novembro, antes, portanto, do anúncio da desistência de Huck.
De qualquer forma, Ilona Szabó rejeita o carimbo de movimento do Luciano Huckpara o Agora. “Luciano é um membro como outro qualquer”, diz. “Todos os membros trazem alguma coisa para o Agora.” No caso do apresentador, ela afirma que ele é um “membro chave” para a estratégia de comunicação. “A gente sabia que para o movimento ganhar as ruas a gente precisava ter tradutores, pessoas que tenham mais capacidade e experiência de conversar com a população, e o Luciano tem muita capacidade e experiência para isso”, diz. “Se não tivesse uma figura pública como ele, certamente demoraria mais para a gente ser compreendido, mas a gente não vai decepcionar”, diz.
Por outro lado, ela reconhece que o movimento restringiu a ampliação do leque de figuras públicas porque Luciano Huck ganhou muita visibilidade. O apresentador foi anunciado como membro do movimento em outubro do ano passado, após “um namoro longo”, segundo Ilona. “Ele viu a nossa agenda e disse “nossa, mas eu concordo com isso tudo”.
A entrada de Huck levou à primeira crise pública do Agora, na época com pouco mais de um ano de vida. Alexandre Youssef, que participou da criação da Rede, de Marina Silva e era um dos fundadores do movimento, anunciou sua saída assim que o apresentador chegou oficialmente ao grupo. “A escolha do Alê tem a ver com a escolha de vida dele e cada membro vai ter que fazer essa pesagem. Cada um tem o direito de entrar e sair, mas o grupo tem uma essência muito clara”, explica Ilona.
Os demais membros do Agora embora não sejam apresentadores, podem ser perfilados com características muito comuns às do global. Estão na faixa entre os 30 a 40 anos, são em sua grande maioria brancos, que fazem parte da elite intelectual e econômica do país. Tiveram acesso à educação e oportunidades, como estudar no exterior. Todos já eram engajados em outras frentes antes de entrar para o Agora. Talvez a maior exceção a essas regras seja Anapuaka Tupinambá, líder indígena.
Ilona Szabó, por exemplo, é presidenta do Instituto Igarapé, que atua na área de segurança pública e drogas. É próxima ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e foi uma das roteiristas do filme Quebrando o Tabu. Leandro Machado é cientista político, criador do Cause, consultoria que apoia marcas e organizações na gestão de causas, e foi assessor da campanha de Marina Silva (Rede) em 2010. Fechando o trio de Medellín, Patrícia Ellen liderou a Prática de Setor Público e Social da McKinsey. Além do engajamento, os três têm um título em comum. “Fazemos parte de uma rede, cujo nome é bastante esnobe, que é a rede de jovens líderes globais [Young Global Leader, do Fórum Econômico Mundial], seja lá o que isso signifique”, diz Ilona, rindo. “Mas para nós é um espaço interessante de troca”.
Foco no Legislativo
Ilona explica que inicialmente a ideia era que os membros do Agora entrassem em cargos do Executivo, como assessores ou consultores, por exemplo, e contribuíssem por meio das propostas tiradas em conjunto no grupo. Mas, com o longa duração da crise política, “percebemos que o buraco era mais embaixo e que teríamos que entrar também em cargos eletivos”.
Por não ter configuração jurídica de partido, o Agora não pode lançar candidatos oficialmente. “Não somos partido e não queremos perder essa característica de movimento”, diz Ilona. Como a legislação brasileira não permite candidaturas independentes, o movimento pretende então “explorar parcerias com partidos que nos deixassem manter a nossa identidade”. Na prática, os membros do Agora que queiram disputar a eleição estão livres para escolher em qual partido querem se filiar. “Mas eles devem saber que uma vez sendo do Agora, o compromisso é com a nossa agenda”, diz Ilona. “Com um partido com uma agenda antagônica à nossa, o militante vai ter que se desligar”.
Apesar da liberdade de escolha, Ilona afirma que realizou conversas com partidos que “tinham interesse em nos oferecer um espaço legítimo de autonomia, de independência e de troca”. São eles a Rede, de Marina, e o PPS. “Queremos ter voz e voto em decisões do partido, porque queremos de alguma maneira influenciar o programa do partido, mas queremos ser livres enquanto movimento”, diz. “Se houver divergências de agenda, por exemplo, somos livres para votar conforme a nossa agenda”.
Ela diz que, por enquanto, o foco é no Legislativo. “Não vamos lançar candidatos porque não somos partido”, diz Ilona. “Mas estamos apoiando e é óbvio que vai ficar claro que são os candidatos do Agora porque eles estarão usando a bandeira do movimento”. A expectativa é apoiar de 15 a 20 pessoas, concorrendo entre seis e dez estados. Ela e os três demais fundadores não estão nesta conta, por enquanto.
Sobre a presidência, a grande polêmica que envolve o movimento, Ilona é categórica: “Não temos cacife para disputar a presidência”, diz. “No primeiro turno vamos oferecer as nossas propostas, no que estamos chamando de carta de mandato, para todo mundo. Será de domínio público, não importa o partido, se você é candidato vinculado ao Agora! ou não”, explica. Já no segundo turno, ela diz que não descarta apoiar alguém, “se tivermos um candidato que tiver muitas afinidades com nossas propostas. Mas isso será discutido com o grupo a cada passo”.
Posicionamentos
Por enquanto, o movimento é sustentado com a contribuição dos seus próprios membros. As contas ainda não estão abertas, mas estarão em breve, segundo Ilona. A forma organizacional se constitui em onze grupos de trabalho com temáticas como sustentabilidade, cultura e reforma do Estado. Já organizaram algumas reuniões com simpatizantes para ouvir o que a população tem a dizer sobre temas sensíveis ao país.
As boas intenções do grupo, porém, ficarão à deriva se não se posicionarem diante de questões fundamentais para o país em ano eleitoral. Questionados sobre o que pensam em relação a temas como descriminalização do aborto, regulamentação das drogas, redução da maioridade penal, reforma da Previdência e reforma trabalhista, informam que o movimento é “um grupo muito plural e reúne pessoas com visões variadas. Embora os membros individualmente tenham suas posições, o movimento ainda está debatendo esses temas e vai lançar suas diretrizes de políticas públicas a partir do segundo trimestre”.
Entre se posicionar como liberal ou progressista no campo econômico, o movimento parece ficar no meio do caminho também. “Queremos um Estado mais eficiente, menos burocrático, mais próximo das pessoas e responsável”, diz Ilona. “Os serviços públicos essenciais tem que ter muita qualidade para quem não pode pagar”.
Outro ponto muito debatido em todo o mundo e que pode ser sensível para um grupo situado tão no topo da pirâmide é a questão tributária. A taxação das grandes fortunas é uma proposta defendida até mesmo pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). “A redução da desigualdade é a principal causa do grupo. E quando falamos em redução de desigualdade não tem como não falar na questão tributária”, diz Ilona. “Isso não é um tabu para o grupo. Pelo contrário, é um tema que certamente estará na nossa agenda. Não é a única proposta que teremos, mas é uma delas”.
Ao encerrar a entrevista, Ilona, que não se esquiva das perguntas embora não deixe clara todas as respostas, pede para falar um pouco da história dos membros do Agora!: “Óbvio que a gente faz parte de uma elite, mas a maior parte dos nossos membros vem de famílias de classe média ou baixa. Tem gente que vem de comunidade. São pessoas que batalharam muito, tiveram acesso à educação, mas por conta desse desnível (de oportunidades) se encontram na classe A e B”, diz. “Temos poucos membros com perfil de famílias ricas, mas mesmos fizeram a sua própria história”.
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Crédito: Marina Rossi – El País Brasil/disponível na internet 22/01/2018