Cinco perguntas sobre o corte das bolsas de pós-graduação

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O governo do presidente Jair Bolsonaro surpreendeu a comunidade acadêmica ao anunciar, na quarta-feira, 8, a suspensão da concessão de novas bolsas de mestrado e doutorado pela Coordenação de Pessoal de Nível Superior (Capes), uma das principais entidades de fomento a pesquisas em nível de pós-graduação no Brasil, ligada ao Ministério da Educação (MEC).

A medida veio uma semana depois de o MEC anunciar o contingenciamento de 30% das verbas das universidades federais, e despertou fortes críticas de universidades e institutos de pesquisa.

Entenda as mudanças e o impacto dos cortes.

Por que os cortes estão sendo realizados?

A medida vem no bojo do bloqueio de 30% das verbas previstas para as universidades federais em 2019, anunciado na semana passada pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub. Com os cortes, a Capes perdeu R$ 819 milhões do total de R$ 4,1 bilhões de verba não obrigatória, e anunciou que congelaria bolsas ociosas.

“A Capes esclarece que a economia racional de recursos, a melhoria do sistema de pós-graduação e a parceria com o setor empresarial são as diretrizes adotadas para superar os desafios apresentados pela necessidade de contingenciamento de recursos na administração pública federal”, informou, em nota, o órgão.

O texto acrescenta que o sistema de geração de bolsas, em geral “reaberto no início de cada mês”, permaneceu fechado no início de maio. Assim, houve o “recolhimento” das bolsas “ociosas” ou que ainda não estavam sendo utilizadas por instituições acadêmicas.

Na prática, são recursos que haviam sido disponibilizados a novos candidatos, após a conclusão de trabalhos de outros bolsistas. A Capes informa não ter ainda o número exato das bolsas recolhidas.

Na terça-feira, em audiência na Comissão de Educação no Senado, Weintraub afirmou que não se trata de “corte” no orçamento das universidades e instituições federais, e sim de “contingenciamento” – cuja duração será ditada pela retomada da economia e a aprovação da reforma da Previdência.

“Retomando a dinâmica, aumenta a arrecadação, se descontingencia. Não há corte. E isso não foi imposto, a gente tem que cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal”, afirmou o ministro da Educação no Congresso.

O que acontece com as bolsas ativas?

De acordo com a Capes, as bolsas de pós-graduação que já estão ativas não serão afetadas, e “nenhum bolsista já cadastrado nos sistemas” foi retirado.

A Capes tem ainda 107 mil bolsas ativas para formação de professores do ensino básico. Estas tampouco serão comprometidas pelos cortes. Já as bolsas do programa Idiomas sem Fronteiras foram todas suspensas.

Qual é o impacto da medida?

A Capes ainda não informou o número de bolsas que serão cortadas, em que áreas de pesquisa e por quanto tempo a suspensão vai vigorar.

O órgão tem atualmente 92 mil bolsas ativas de pós-graduação, nos valores de R$ 1.500 para mestrado e R$ 2.200 para doutorado.

O Brasil está entre os 15 países com maior número de estudos científicos no mundo, e 95% da pesquisa é realizada em universidades públicas. Há temor de que os cortes possam inviabilizar essa produção, já que bolsistas de pós-graduação são tidos como motores da pesquisa científica nas universidades, com forte impacto em todas as áreas.

Qual foi a reação?

Na quarta-feira, após o envio de um comunicado interno da Capes a reitores e coordenadores de pós-graduação informando sobre o “congelamento”, diversas instituições divulgaram notas de esclarecimento.

A Universidade de São Paulo (USP) afirmou as bolsas que não estavam ocupadas “deixaram de constar no sistema” da Capes, mas buscou tranquilizar bolsistas que já estão recebendo seus benefícios, reiterando que não houve suspensão de bolsas vigentes.

Segundo Carlos Gilberto Carlotti Junior, Pró-reitor de Pós-Graduação da USP, o momento é de “preocupação”, mas é preciso aguardar novas informações e seguir com as atividades acadêmicas para ter “uma pós-graduação de excelência”.

Em nota, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) criticou a “insensatez da medida”, destacando que a atividade de pesquisa recai fortemente sobre as universidades públicas no Brasil e não conta ainda com grande engajamento de empresas e do setor privado.

“Esse é um problema que o país tem que enfrentar, mas não vai conseguir com cortes horizontais no orçamento das universidades e nas bolsas de pós-graduação e pós-doutoramento.”

Em nota, a Capes afirma que vai realizar chamadas públicas para que que setores empresariais invistam em bolsas e fomento a pesquisa em troca de isenção fiscal.

Qual é o pano de fundo para essa medida no governo?

O temor de cortes nas bolsas da Capes é algo que ronda os pesquisadores desde o ano passado. À época, ainda sob o governo Michel Temer, o Conselho Superior da Capes alertou sobre o risco de paralisação nas atividades após uma ameaça de redução de R$ 580 milhões no orçamento do setor.

A instituição afirmou que a redução interromperia 200 mil bolsas de pesquisa científica, projetos de formação e programas de cooperação internacional – prejudicando a imagem do Brasil no exterior.

O conselho pediu ao governo federal que impedisse a redução nas verbas. Mas o contingeciamento anunciado por Weintraub acabou sendo ainda maior, de R$ 819 milhões.

O aperto de cintos se soma a visões e iniciativas polêmicas do governo Bolsonaro e do novo ministro da Educação.

Após uma série de polêmicas envolvendo o ex-ministro Ricardo Vélez Rodríguez, Weintraub assumiu o posto no início de abril. Duas semanas depois, anunciou um corte de 30% no orçamento de três universidades federais: de Brasília (UnB), da Bahia (UFBA) e a Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói, no Estado do Rio, acusando-as de promover “balbúrdia” e permitir a realização de “eventos políticos, manifestações partidárias ou festas inadequadas”. As instituições ocupam, respectivamente, o 9º, 14º e 16º lugares no Ranking Universitário Folha (RUF).

“Universidades que, em vez de procurar melhorar o desempenho acadêmico, estiverem fazendo balbúrdia, terão verbas reduzidas”, ameaçou o ministro.

O anúncio e o teor das críticas do ministro despertaram apreensão entre universidades, deteriorando uma situação que já era grave. “Não há como ter pesquisa de alto nível se não tenho luz e água no laboratório”, disse o reitor da UFF, Antonio Claudio Lucas da Nóbrega, em entrevista ao UOL.

Weintraub também se alinhou ao presidente Bolsonaro ao prometer cortar recursos para cursos de filosofia e ciências sociais. Em transmissão ao vivo pelo Facebook ao lado do presidente, disse que “a função do governo é respeitar o dinheiro do pagador de imposto”, e que é importante investir em um ofício que “gere renda para a pessoa, bem-estar para a família, que melhore a sociedade em volta dela”.

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