Notadamente, o governo federal vem utilizando seu espaço de propagandas para demonstrar que a reforma da Previdência está obstinadamente focada em retirar ditos privilégios pagos, especificamente, aos servidores públicos, como se esta fosse a única fonte de solução para cobrir o déficit da Previdência Social brasileira. Primeiramente, é preciso ser dito que não há qualquer privilégio, uma vez que os servidores públicos contribuem com um percentual sobre o seu salário bruto, e não sobre o teto do RGPS, gerando uma diferença grande de valores recolhidos. Diante de tudo que foi exposto até o momento, a Associação dos Advogados Públicos Federais (ANAFE) considera que a proposta traz uma visão bastante limitada e monotemática, que tem como principal foco retirar direitos constitucionais assegurados aos cidadãos brasileiros.
Assim, propõe um diálogo aberto para tratar das muitas outras frentes que precisam ser contempladas, no lugar de unicamente desmobilizar e enfraquecer o corpo de servidores públicos que são justamente aqueles que defendem os interesses mais prementes do Estado. Nesse sentido, é de se espantar que a proposta atual não busque alternativas para sanar a economia, a exemplo da cobrança dos débitos previdenciários que, hoje, somam mais de R$ 490 bilhões de reais. Caso sejam dadas as condições necessárias, a Advocacia Pública Federal irá imediatamente cumprir o seu mister de cobrar tais débitos, fazer esta roda girar e, assim, auxiliar de forma fundamental nesse grave momento de crise fiscal.
O momento demanda que se lance mão de outras tantas medidas, como o combate ao devedor contumaz e a proibição de parcelamentos especiais conhecidos como os Refis, que incentivam a cultura do não pagamento e impactam diretamente na dívida ativa da União. De acordo com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, menos de 15% das empresas e 7% das pessoas físicas devem tributos para a União. Apenas 0,5% das empresas devedoras responde por mais de 62% dos débitos. Para pessoas físicas, a relação é ainda maior. Apenas 0,1% responde por 34% da dívida. Os dados deixam claro o equívoco de tais programas pois, longe de serem fundamentais para os pequenos contribuintes, têm como principais beneficiários os 0,5% dos devedores que acumulam os maiores passivos – entre eles, grandes empresas envolvidas na Lava-Jato, por exemplo.
Outros pontos importantes que podem impactar na redução do déficit da Previdência:
1) Que o governo dê prioridade de andamento e julgamento em processos que discutem a cobrança de dívidas superiores a um milhão de reais; 2) Que eleve a Contribuição Social Sobre Lucro Líquido (CSLL) dos bancos em 5% por 15 anos; 3) Que reduza a DRU (Desvinculação das Receitas da União) em 1% por ano ao longo de 15 anos; 3) Que promova o fim de isenções para grandes empresas por 15 anos; 4) Que regulamente o Imposto Sobre Grandes Fortunas para pagamento exclusivo dos benefícios assistenciais ao portador de deficiência e ao idoso.
Além disso, a Previdência não pode ser vista apenas do ponto de vista econômico, mas, também, no seu aspecto social, já que milhares de pessoas, com justas expectativas, se organizaram para ter uma aposentadoria digna, amparada nos preceitos que a Constituição Federal previu para a Previdência Social. São grandes os riscos implicados na mudança proposta, sendo os principais, expostos a seguir:
1) A proposta atual atinge diretamente o caráter público das fundações de previdência complementar dos servidores públicos e faculta que os respectivos fundos sejam integralmente geridos por entidades abertas, mediante simples licitação, o que significa privatizar fundos, gestão e meios, sem garantias para o servidor. Mesmo aqueles que migraram para o sistema de previdência pública, confiando nas balizas predispostas anteriormente;
2) A minuta não prevê regras de transição aos que ingressaram antes de 2004, exigindo 65 anos de idade para o acesso ao benefício integral tanto para homens e quanto para mulheres. Impõe, ademais, perda de até 50% no valor da aposentadoria dos que ingressaram entre 2003 e 2013, assim como passa a exigir 40 anos de contribuição daqueles que aderiram à previdência complementar, caso queiram se aposentar com o benefício integral;
3) As regras previstas nos artigos 40 e 201 da Constituição Federal de 1988 são desconstitucionalizadas. Mantém-se somente parâmetros gerais que devem ser disciplinados em matéria previdenciária.
4) Além disso – e não menos relevante –, depreende-se que será completamente extinto, para o futuro, o sistema de repartição, suprimindo-se contribuições de governos e empresas para a constituição dos fundos de aposentadorias, em eventual regime de capitalização. A despeito dos riscos e das mazelas próprias do regime de capitalização, a inexistência de financiamento patronal é a senha para aposentadorias e pensões ruinosas a médio e longo prazos, como também o seria a desvinculação do Benefício de Prestação Continuada do salário mínimo.
Desde a apresentação da primeira proposta de reforma da Previdência, a ANAFE atua em conjunto com as demais carreiras públicas, por meio do Fórum Nacional Permanente das Carreiras Típicas de Estado (FONACATE), em favor da Previdência Social e do resguardo dos direitos dos servidores públicos em geral. É necessário que a sociedade entenda a gravidade do momento pelo qual estamos passando quando, infelizmente, insistem em eleger o serviço público como vilão da crise econômica vigente.
É tempo de promover um diálogo franco, técnico e responsável, como requer a democracia, a fim de que se encontre uma alternativa justa e sustentável para o atual Sistema de Seguridade Social no Brasil. A ANAFE se dispõe a auxiliar na construção de um modelo que não ocasione retrocessos aos direitos sociais dos cidadãos brasileiros.
Crédito: Marcelino Rodrigues*/Congresso em Foco – disponível na internet 12/07/2019 *presidente da Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais (ANAFE). Procurador da Fazenda Nacional desde 2009.
Sou servidor do TJMG e no serviço público desde dez de 1986. Tb serei prejudicado demasiadamente com as mudanças.A ANAFE junta com outras associações principalmente de carreiras jurídicas já estudam questionar judicialmente eventuais inconstitucionalidade?
Paulo
A informação que circula é que haverá sim questionamentos.