Assessor do governo cobra R$ 6,4 milhões por serviço de relações públicas.

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O advogado Pedro Trengrouse ofereceu estudo a empresa de apostas enquanto trabalhava para o governo e usou nome da UFRJ em evento no exterior; ele nega

Em e-mail encaminhado a Pierre Tournier, diretor de relações institucionais da Remote Gaming Association (RGA, entidade que representa as maiores empresas de apostas online da Europa), Trengrouse reforça a proposta de contratação de um “estudo independente” sobre a regulamentação dos jogos no Brasil. “Prevemos que este projeto custará aproximadamente US$ 1,5 milhão, incluindo as atividades de relações públicas associadas no Brasil”, diz a mensagem assinada por Américo. Em seguida, Trengrouse reforça a proposta. “Vamos seguir em frente”, diz o advogado.

Pedro Trengrouse
Ex-consultor de times e estudioso do tema jogos, Pedro Trengrouse não vê conflito de interesses em sua atuação Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

Américo e Trengrouse são sócios em um escritório de advocacia no Rio e no Instituto Brasileiro de Jogos (IBJ). O e-mail é do dia 11 de março de 2019. Segundo resposta do Ministério da Economia a pedido de informações do deputado Delegado Pablo Oliva (PSL-AM), Trengrouse “prestou serviço de assessoramento técnico não remunerado” de 11 de março até 30 de novembro de 2019.

Antes de ser escolhido para ser assessor não remunerado, Trengrouse foi indicado para a Subsecretaria de Prêmios e Sorteios do Ministério da Economia. A indicação não prosperou por compromissos profissionais previamente assumidos pelo advogado, segundo pessoas que acompanharam o caso.

Na função de assessor técnico não remunerado, Trengrouse participava de discussões sobre a regulamentação de apostas esportivas, propunha soluções, analisava projetos estratégicos nas áreas de apostas esportivas, loterias e entretenimento, participava de reuniões junto ao Ministério da Economia, ao Congresso Nacional, outros órgãos governamentais, organizações da sociedade civil e organismos internacionais e de cooperação multilateral. Essas atividades, que interessam diretamente à RGA, constam de um “atestado de capacidade técnica” emitido pelo secretário de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria da Secretaria Especial da Fazenda do Ministério da Economia, Alexandre Manoel, seu padrinho no governo.

Segundo o ministério, Trengrouse nunca teve “vínculo jurídico” com o governo. Mas o próprio atestado assinado por Manoel afirma que o advogado “executou serviços de assessoramento técnico” e informa até a carga horária: 580 horas em nove meses de colaboração. “Não houve nomeação em cargo na estrutura administrativa, Trengrouse foi apenas colaborador eventual na área de loterias”, informou a pasta.

Ao Estado, Trengrouse negou que o fato de ter oferecido serviços pessoais enquanto assessorava o governo representasse conflito de interesses. “O Brasil precisa de estudos independentes para balizar a discussão sobre a regulamentação de jogos no país, que vem acontecendo de forma superficial. A finalidade dessa ideia era justamente a geração de conhecimento específico no Brasil através de um estudo independente.” 

Segundo ele, o contrato de US$ 1,5 milhão seria entre a RGA e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O IBJ assinou em 2017 um acordo de cooperação com a Fundação Coordenação de Projetos, Pesquisas e Estudos Tecnológicos (Coppetec) da UFRJ. No e-mail ao diretor da RGA, Trengrouse diz que o IBJ está “sob o guarda-chuva” da universidade.

No ano passado, Trengrouse usou o nome e o brasão da universidade no convite para um evento em Las Vegas (EUA). No convite ele se apresentava como “IBJ/UFRJ”. A notícia caiu nos ouvidos de professores, que o repreenderam pelo uso indevido do nome da UFRJ.

“Ele participou de algumas atividades aqui, mas nunca foi professor nem pesquisador da UFRJ. Pedimos a ele que não se apresentasse desta forma”, disse o diretor adjunto de Projetos e Relações Institucionais da Escola Politécnica da UFRJ, Eduardo Qualharini, responsável por entrar em contato com Trengrouse na época.

A UFRJ nega ter qualquer vínculo com Trengrouse e vai pedir investigação sobre o uso indevido de suas marcas. “Nesse caso, até o momento, a reitoria da UFRJ desconhece a aprovação do uso da marca da universidade e acionará a Procuradoria Federal para apreciação e, se for o caso, judicialização conforme a legislação vigente”, informou a UFRJ. “O IBJ nunca esteve sob o guarda-chuva da UFRJ”, disse o professor Marcos Freitas, que assinou o acordo da Coopetec com o IBJ. Segundo ele, o acordo não tem mais validade devido a uma cláusula que previa a obrigatoriedade de um plano de trabalho em até seis meses depois da assinatura, o que não ocorreu.

Trengrouse disse que a menção a “relações públicas” se tratava da divulgação do estudo. Ele disse que não fez o convite para o evento em Las Vegas como brasão da UFRJ. O advogado tem diversas especializações nas áreas de esportes e apostas no Brasil e no exterior, foi consultor dos clubes de futebol na implantação da Timemania e é vice-presidente da Comissão de Jogos Esportivos, Lotéricos e de Entretenimento da OAB.

Legalização ainda está em debate no Congresso

Desde que foram proibidos na década de 1940, os jogos de azar nunca estiveram tão perto de ser legalizados no Brasil, segundo especialistas no assunto. A potencialidade do mercado, que é medida em bilhões de dólares, tem atraído atenção dos maiores grupos internacionais nos ramos de cassinos e apostas esportivas online.

A Fundação Getúlio Vargas (FGV) estima que o mercado ilegal de apostas movimente R$ 4 bilhões por ano no Brasil. Para os especialistas, depois do fim do monopólio do petróleo, as apostas talvez sejam a última grande fronteira de abertura de mercado hoje no Brasil – só a Caixa Econômica Federal pode explorar apostas em loterias.

A regulação, no entanto, esbarra em questões políticas. As apostas esportivas online foram autorizadas pelo Congresso em dezembro de 2018 mas até hoje aguardam regulamentação por parte da Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria da Secretaria Especial da Fazenda do Ministério da Economia. 

Congresso. 

A legalização dos cassinos também está em estágio avançado no Congresso. Um projeto de lei que tramita desde 1991 está pronto para votação na Câmara e aguarda somente que o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), coloque a matéria em pauta. O Senado tem pronto para votação em plenário um projeto de regulamentação dos cassinos no Brasil, o PL 186/2014, do senador Ciro Nogueira (PP-PI).

No dia 5 de fevereiro, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), enviou aos presidentes da Câmara e do Senado um pedido de informações sobre a tramitação das matérias no Congresso. 

Fachin é relator de uma ação que questiona a constitucionalidade da lei 9.215 de 1.946 (moral e bons costumes) na qual se baseia a proibição dos jogos de azar no Brasil. O argumento dos autores é que a lei caducou com a aprovação da Constituição de 1988.

Crédito: Ricardo Galhardo, O Estado de S.Paulo – disponível na internet 17/02/2020

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