Guia do Trabalho Remoto. Qual o meu papel como líder?

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A necessidade de isolamento para conter o coronavírus fez as empresas enfrentarem os desafios de utilizar em grande escala o modelo de home office. Um processo no qual as dúvidas se multiplicam para líderes e equipes. Escolha o seu lado dessa equação e encontre as respostas

Trabalhar em casa muda a rotina profissional, seja você líder ou integrante de uma equipe. É preciso criar normas para a comunicação, planejar a distribuição das tarefas e garantir que prazos sejam cumpridos. Mas não só. Ainda existe a necessidade de equilibrar questões familiares e cuidar da saúde mental, em meio a alterações excepcionais também nos direitos e deveres de empresas e colaboradores. As questões são muitas. E procuramos respondê-las para você, de acordo com as suas necessidades. Escolha o seu lado dessa equação para resolver as principais dúvidas, ler reportagens e depoimentos de quem tem experiência em trabalho remoto. Vamos começar?

Qual o meu papel como líder?

Das questões jurídicas a como manter a produtividade da equipe, passando por dicas para ser um gestor eficiente também no universo digital. Confira as principais dúvidas, reportagens e depoimentos

A pandemia da covid-19 certamente muda o jogo nas empresas, ao exigir o isolamento das equipes e um grande esforço em uma direção para a qual a maioria ainda estava caminhando: a do trabalho em casa. Para muitos, o que era um experimento passou a ser realidade inevitável, de uma hora para a outra. E certamente uma nova cultura emergirá, superado o período de coronavírus. Enquanto isso não acontece, porém, as dúvidas vão surgir – e em várias áreas. Como planejar a rotina da minha equipe e evitar queda na produtividade? Existe uma forma melhor de me comunicar com o grupo? Quais obrigações legais preciso seguir? As respostas você encontra neste guia, montado para ajudá-lo a ser um gestor eficiente também no ambiente online.


 
Em casa

1Há diferença entre home office e teletrabalho?

Sim. O home office é eventual e o teletrabalho ocorre quando a atividade é exercida preponderantemente fora da empresa – esta tem requisitos previstos em lei. Em tese, de acordo com Gisela Freire, sócia do escritório Cescon Barrieu e especialista em Direito Trabalhista, o home office não requer um aditivo contratual, diferentemente do teletrabalho, que deve ser previsto em contrato. Se a situação de home office  se estender, é necessário estabelecer as condições de teletrabalho em um aditivo contratual.

2É possível reverter o contrato trabalhista após a pandemia?

Sim. É possível fazer novo aditivo contratual para reverter o teletrabalho em trabalho presencial. A única recomendação de especialistas é que o funcionário tenha um período de adaptação ao escritório.

3Devo recomendar que os colaboradores busquem um ambiente especial para o trabalho em casa?

Sem dúvida. Peça que procurem o local que seja o mais tranquilo possível e conte com ventilação e boa iluminação.

4Tenho de me preocupar com a estrutura e as condições do home office?

Sim, explica Juliana Amarante, advogada trabalhista do escritório Souza, Mello e Torres. Nos termos da Norma Regulamentadora (NR) 17, do Ministério do Trabalho, as empresas são responsáveis por realizar a análise ergonômica de todos os empregados, inclusive aqueles que realizam teletrabalho (trabalho preponderantemente na residência) ou home office.

 

5Quais itens preciso garantir para que a equipe tenha uma estrutura razoável de trabalho?

Teoricamente, nos termos da CLT, é obrigação do empregador fornecer todos os meios necessários para os colaboradores prestarem serviços. “Desse modo, como regra geral, a empresa deveria conceder equipamentos, como notebook, celular e até cadeiras apropriadas”, afirma a advogada trabalhista Juliana Amarante. De acordo com ela, é importante, ainda, que seja combinado como se dará o trabalho e a possibilidade de reversão imediata da medida, caso se trate de uma excepcionalidade em razão da situação atual. Precisa ver acordo também sobre quem arcará com os custos extras de infraestrutura, como  luz e internet. O gestor pode fazer uma análise para identificar os colaboradores que não têm como prestar atividades remotamente, por não contarem com internet em casa, por exemplo.

6Posso exigir que o funcionário trabalhe com equipamento próprio, como o computador ou o  celular?

A lei não prevê obrigatoriedade de fornecer equipamentos nem que o funcionário os tenha. “A empresa, neste momento, não estava preparada para colocar todo o seu quadro em home office. Ela não vai ter equipamentos suficientes, seja computador ou celular, para abranger todos os funcionários”, diz Flavia Eadi de Castro, head de direito do trabalho da RGL Advogados. “Diante desta situação, o funcionário não pode fazer exigência, a não ser que ele não tenha mesmo.”

7Devo deixar disponível uma equipe ou um número de suporte de tecnologia?

Sim. Problemas técnicos afetam a produtividade de funcionários que estão em home office. É recomendável que as empresas deixem disponível algum tipo de assistência técnica para as equipes que estão trabalhando remotamente. Além de profissionais de TI que já atendem a distância, há a opção de utilizar chatbots, ferramentas que usam software para resolver dúvidas de forma automática. “A maioria dos nossos clientes de WorkPlace se preocupa com assistência técnica e muitos já adotaram esse recurso dos chatbots”, diz Adriano Marcandali, diretor latino do Workplace, rede social corporativa do Facebook.

8O que um escritório minimamente ergonômico deve ter?

O profissional não deve trabalhar sentado no sofá ou na cama. O computador deve estar posicionado de modo que a pessoa não precise levantar nem baixar a cabeça para visualizar a tela, a cadeira deve ser ergonômica e o local de trabalho, iluminado. “Essas questões precisam ser observadas para não acontecer, de repente, de o profissional chegar com dores lombares porque não tinha cadeira adequada para trabalhar”, explica Carlos Silva, diretor jurídico em São Paulo da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-SP).

9Como deve ser a iluminação do home office?

A recomendação é não trabalhar com luz voltada para os olhos nem na penumbra. “O ideal é ter um espaço com iluminação natural. À noite, ilumine o local de trabalho e, se for o caso, acrescente uma luminária”, orienta Bianca Vilela, consultora em saúde corporativa, palestrante e fisiologista do exercício pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

10Quais são os melhores aplicativos e sites para comunicações de trabalho em home office?

Para gestão de tempo e de projetos, é possível usar Notion, Asana, Trello e Jira. Se for para comunicação, Slack, Zoom, Loom, Tandem e Hangouts Meet são boas opções, além do Skype. Não use mais do que um para cada função. É melhor concentrar o trabalho. No botão Reportagens, temos material adicional sobre o assunto.

11Como montar o local de trabalho para chamadas de vídeo?

Não são necessários muitos equipamentos para participar de uma chamada de vídeo: basta ter um computador, um celular ou um tablet. Os fones de ouvidos são indicados para melhorar a qualidade do som, mas não são essenciais – geralmente, os próprios aparelhos têm microfones e alto-falantes que funcionam bem. A especialista em produtividade Tathiane Deândhela recomenda que a pessoa se posicione em um lugar reservado para o trabalho, como uma escrivaninha, e garanta que a iluminação do ambiente esteja apropriada para o vídeo.


 
Com a equipe

1Como manter uma comunicação constante com a equipe, mesmo a distância?

O mais importante, na visão do professor de Administração Fabrício César Bastos, é estabelecer quantas e quais ferramentas serão utilizadas para a comunicação. “O desafio é como trabalhar com interação e comunicação”, diz Bastos, que também é sócio-diretor da empresa de desenvolvimento humano Flowan. “É importante ter clareza sobre a ferramenta que vai ser utilizada, porque existe desde WhatsApp, e-mail e telefone até videoconferência. Definir o número ajuda a ter foco e orientação.”

2Devo estabelecer normas de comunicação?  

Sim. Definir a comunicação facilita substancialmente a condução dos trabalhos realizados remotamente. Algumas empresas já adotam protocolos para quando o assunto é urgente e requer resposta imediata ou não. Você pode criar esse código com a sua equipe.

3Como liderar reuniões a distância que sejam tão efetivas quanto as presenciais?

Em primeiro lugar, estabeleça uma pauta no convite da reunião. Assim, os participantes já iniciam o encontro preparados e fica menos complicado manter a objetividade. Por questões práticas, o ideal é fazer reuniões com grupos pequenos. Se há um diretor envolvido, ele deve marcar encontros com os gerentes. Cada gerente deve ficar encarregado de fazer reunião com seus coordenadores. E assim sucessivamente. A ideia é facilitar a comunicação e conseguir realizar encontros virtuais mais curtos e com menos interrupções. Em uma situação de isolamento como a atual, vale incluir na pauta um momento para que as pessoas compartilhem como estão se sentindo. O grupo vai ser fundamental para lidar da melhor maneira com a pandemia. Faça também uma ata para que as informações não sejam perdidas e as pessoas consigam seguir as orientações com prazos no home office. Isso vai garantir que o bom ritmo continue na sua empresa.

4Quais os principais desafios para aqueles que ainda não tinham o home office como parte da rotinas?

Geralmente, há dois perfis de profissionais: aqueles que gostam muito do home office e preferem trabalhar com mais tranquilidade em suas casas, sem interrupções, e os que precisam estar frequentemente em interação, no mesmo ambiente. Como ocorre no escritório, a produtividade de cada pessoa também é diferente no home office. Há aqueles que não saem de frente do computador, não almoçam direito e começam a fazer hora extra mesmo trabalhando de casa. E os que não acabam misturando vida profissional com vida familiar e perdendo o foco. O papel do líder é estar atento a essas diferenças para conseguir ajudar na adaptação de suas equipes. Para ambos os perfis, é necessário criar planos e rotinas de acompanhamento. Assim, nenhum dos extremos terá seu desempenho profissional prejudicado.

5Como medir a produtividade dos colaboradores?

A primeira dica é estabelecer metas e relatórios diários. Busque também ferramentas de acompanhamento online, que mostram exatamente em qual etapa está a atividade designada para o colaborador. É algo que ajuda muito a monitorar projetos mais longos. Só evite trabalhar com muitas ferramentas ao mesmo tempo.

6Se alguém da equipe constantemente não me atender, o que posso fazer?

Tathiane Deândhela, especialista em produtividade, orienta que os gestores usem plataformas digitais, como o Trello, para fazer acompanhamento das atividades de seus funcionários. “Ao identificar a falta de resposta de algum membro da equipe, o ideal é que o gestor marque uma conversa de feedback”, afirma a especialista. “De preferência em chamada de vídeo, para que o diálogo flua melhor.”

7Devo marcar reuniões virtuais ou enviar mensagens por WhatsApp no início e no fim de expediente, para verificar a jornada de trabalho?

Se o colaborador estava submetido anteriormente a cumprir uma jornada de trabalho, marcar reuniões virtuais ou mandar mensagens por WhatsApp são formas de controlar a jornada durante o período de home office. Quando as atividades no escritório voltarem ao normal, é possível incluir os horários informados no sistema de controle de jornada e obter a assinatura e o consentimento do empregado dos apontamentos feitos, segundo Juliana Amarante, advogada trabalhista do Souza, Mello e Torres.

8Como posso cobrar horários?

Legalmente, o empregador tem o poder diretivo e organizacional de sua força de trabalho, segundo Juliana Amarante, advogada trabalhista. Dessa forma, é possível que você continue cobrando o cumprimento do horário de trabalho, mesmo no home office, para os empregados submetidos a controle de jornada. Algumas opções para fazer esse controle são:  combinar o envio de e-mails ou de mensagens comunicando o início e o término das atividades, e solicitar o preenchimento de planilhas ou de programas de jornada de trabalho eletrônicos. Esse controle tem como base as informações dadas pelo colaborador e, por isso, está firmado na relação de confiança existente nas relações de trabalho.

9Como dar feedbacks precisos mesmo a distância? Qual a frequência para isso?

É necessário eliminar hierarquias e formalidades durante o processo, na opinião de Christopher Spikes, CEO da marca de roupas de corrida Authen, que opera com profissionais em home office. “Se eu sou o gestor e estou na mesa, a pessoa que responde para mim não fala ‘posso te ligar?’, ela liga. As pessoas precisam agir como se estivessem na mesma mesa.” Spikes diz que a frequência do feedback depende do grau de autonomia de cada profissional. Integrantes da diretoria, por exemplo, podem ter objetivos semanais. “Com alguém mais júnior, pode haver mais check-in sobre os objetivos, porque algumas pessoas precisam de mais ajuda e direcionamento.”


 
Etiqueta digital

1Como gestor, quais assuntos devo escrever por e-mail e quais devo abordar em videochamada?

Na visão de Tathiane Deândhela, especialista em produtividade, quando os e-mails exigem várias réplicas e tréplicas, o gestor já pode pensar em fazer uma ligação por telefone ou uma videochamada. “As chamadas em vídeo também são interessantes para fazer reuniões de alinhamento e para dividir tarefas dentro da equipe”, explica Tathiane. “Com um bom planejamento inicial, é possível, em um segundo momento, manter as conversas só por e-mail.”

2Quais os benefícios de fazer uma chamada de vídeo?

Videochamadas são aconselhadas para conversas que envolvam mais debate, trocas de opiniões e votações. “O vídeo aproxima as pessoas, traz empatia e acaba dando clareza para as conversas”, acredita Adriano Marcandali, diretor latino do Workplace, rede social corporativa do Facebook. “É, inclusive, uma ferramenta fundamental para ser usada por empresas que estão começando a adotar o home office agora e ainda se adaptando ao novo ritmo.”

3Como faço para que todos se sintam incluídos em uma chamada de vídeo?

Uma dica para aumentar o engajamento em chamadas de vídeo é pedir para os funcionários irem anotando suas ideias e opiniões ao longo da conversa. “Não tem como todo mundo falar junto, mas, com o recurso das anotações, o gestor pode ir chamando cada membro da equipe de uma vez para falar”, diz Tathiane Deândhela, especialista em produtividade.

4Qual é a duração razoável de uma chamada de vídeo?

Especialistas ouvidos pelo Estado apontam que a partir de uma hora de videochamada a conversa passa a ser improdutiva. “O ideal é fazer chamadas de 30 minutos, em média”, diz André Brik, consultor do Instituto Trabalho Portátil. “Mas isso muda de geração para geração. Os nativos digitais são ainda mais práticos nessas conversas e gostam de reuniões mais curtas.”

5Vou usar o e-mail e as mensagens com mais frequência e a chance de mal-entendidos aumenta. Como evitar?

Para evitar mal-entendidos, é importante revisar bem as mensagens e os e-mails antes de enviá-los. “Revise os textos como se estivesse enviando um artigo”, orienta Tathiane Deândhela, especialista em produtividade. Além disso, ela ressalta que é melhor optar por videochamadas quando as conversas exigirem discussões mais profundas.

6Há um limite para eu mandar mensagens de celular enquanto o funcionário trabalha em casa?

Não, mas procure limitar as mensagens de trabalho ao horário convencional de expediente. E não se esqueça de que a produtividade dele pode cair com a comunicação em excesso.


 
Família
 

1Posso pedir que os colaboradores me notifiquem sobre os horários que estarão com crianças ou no almoço?

No escritório, o funcionário costuma ter uma jornada regular e você consegue controlar esse horário. “Se a pessoa passa a realizar o trabalho na sua residência, não existe, a rigor, essa obrigatoriedade. Há liberdade”, diz  Luís Otávio Camargo Pinto, advogado trabalhista e presidente da Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades (Sobratt).

2Como consigo manter a concentração ao trabalhar de casa?

A família nunca se desconecta da gente, seja em home office ou não. A diferença é que, em casa, a presença física é maior. Quem está trabalhando em home office pode fazer “combinados” com os familiares, como definir o fim do expediente para as 18 horas e depois ver um filme juntos. Quando se constrói uma agenda com os familiares, eles sentem que fazem parte desta rotina com você.

3Como fazer ‘combinados’ com as crianças, de quando elas podem interromper o trabalho?

É interessante ter uma planilha com atividades para as crianças, com opções lúdicas e de aprendizado. Neste momento de isolamento forçado, muitos autores estão fazendo leituras de obras aos vivo, em suas redes sociais, por exemplo. Pode ser uma boa alternativa de distração para elas. Os pais, de acordo com especialistas, devem avisar que os filhos devem fazer interrupções apenas quando tiverem um problema que não conseguem resolver sozinhos.

4Como evitar barulhos, correria e eletrônicos às alturas?

Conversar é o melhor caminho, mas é preciso estabelecer uma rotina também. “Se a criança estiver solta, podendo brincar livremente sem nenhuma orientação dos pais, a chance de ela se distrair e ficar fazendo barulho aumenta”, afirma Bruna Duarte Vitorino, coordenadora do setor pedagógico do Kumon.

5Quais as dicas para montar um roteiro de atividades intelectuais e físicas para as crianças?

“Para ter um bom equilíbrio entre essas atividades e evitar o sedentarismo neste momento, tudo parte do cronograma de atividades. É difícil encontrar atividades físicas, mas os pais podem procurar no YouTube aulas de alongamento e de dança que podem ser feitas em casa. É um momento de se adaptar à realidade de estar em casa”, diz Bruna Duarte Vitorino, do Kumon.


 
Saúde

1Posso exigir que o colaborador faça um exame, mesmo se ele estiver trabalhando de casa?

A Lei 13.979/2020 e a Portaria 356/2020 do Ministério da Saúde, editadas para lidar com as questões da covid-19, preveem a exigência de exames. Em princípio, se o médico do trabalho da empresa determinar que um funcionário com sinais do coronavírus realize o teste – observadas as regras gerais de sigilo médico e de privacidade –, o colaborador não pode se recusar a fazê-lo, segundo a advogada trabalhista Juliana Amarante. Isso vale para quem está no escritório e para os que estiverem em home office. Mas é importante que a empresa faça isso da forma correta. Neste momento, as recomendações são para o indivíduo só procurar o hospital em caso de extrema necessidade. Então, a empresa que exigir o exame deve garantir uma forma segura para a realização do teste, como a coleta domiciliar.

2Com a declaração de pandemia, o trabalhador tem o direito de optar pelo home office ou fica a critério da empresa?

Quem assume o risco da atividade é o empregador, segundo Aldo Martinez, advogado trabalhista e sócio do Santos Neto Advogados. Assim, a princípio, a empresa tem o direito de escolher se o empregado prestará serviços em sistema de home office ou se vai trabalhar no escritório. Diante da pandemia, contudo, recomenda-se que o empregador opte pelo home office. Isso porque, se o funcionário se contaminar, poderá ser discutida a responsabilidade civil do empregador, que potencializou, de forma desnecessária, o risco de contaminação do colaborador e de contágio das demais pessoas.

3Um funcionário pode ser punido por não comunicar que foi contaminado?

Sim, se o colaborador tiver se submetido ao exame e o teste tiver dado positivo para a covid-19. O empregado também deverá informar a empresa se for um caso suspeito de coronavírus ou se tiver tido contato com alguém diagnosticado com a doença. Além de penalidades no âmbito da legislação trabalhista – como advertência, suspensão e até mesmo uma dispensa por justa causa, a depender do contexto concreto pelo qual a infecção não foi informada – , o indivíduo estará sujeito a outras penalidades no âmbito penal, conforme a Lei 13.979/2020 e a Portaria 356/2020 do Ministério da Saúde, de acordo com Juliana Amarante, advogada trabalhista do Souza, Mello e Torres.

4Se o caso der positivo, o colaborador deve trabalhar remotamente ou está dispensado?

A Lei nº 13.979/2020 estabelece que a pessoa que estiver infectada pelo coronavírus deve permanecer em isolamento, mas não dispõe sobre o trabalho remoto. Se o empregado estiver contaminado, mas em boas condições de saúde e tiver todas as ferramentas para trabalhar remotamente, não haveria obstáculo. Entretanto, caso o empregado infectado não esteja em boas condições de saúde, deverá ser dispensado de suas atividades, devendo ser considerada como falta justificada, nos termos do parágrafo 3º do artigo 3º da referida lei. A definição deve ser baseada em atestado médico.

5Quais são os impactos psicológicos do trabalhador que está em home office?

No momento atual, de uma crise global de saúde pública, em que o isolamento social precisa realmente acontecer, a questão comportamental muda muito e sentimento de solidão pode, de fato, aflorar. “É preciso notar que existe uma diferença entre o home office comum é o que está acontecendo agora, que é um home office forçado”, lembra o VP de Recursos Humanos da Pearson, Rafael Furtado. “Nessa situação, o líder tem de ficar  atento à saúde mental do colaborador. Temos de ter muita consciência sobre como as pessoas estão lidando e passando por esse momento.” Furtado também recomenda que os gestores prestem atenção e respeitem as particularidades dos funcionários. “Estamos falando de um prazo de quarentena que pode se estender bastante. É um momento muito especial e toda a atenção à saúde mental é importante.”

6O que fazer para evitar a sensação de isolamento de quem trabalha em casa?

Para pessoas com muita energia e necessidade de interação, o home office pode causar mais ansiedade e até desmotivação. Mas é possível reverter esse quadro se esse profissional for estimulado e perceber que está sendo reconhecido pela conclusão de suas atividades. Procure facilitar interações frequentes entre os colegas, seja por telefone ou por vídeo, para facilitar a adaptação. Outra orientação é deixar o ambiente de home office limpo e confortável.

7Devo fazer pausas ao longo do dia? O que fazer nesses momentos?

Pausas são fundamentais. “A cada uma hora ou uma hora e meia, deve-se fazer uma pausa de 15 minutos”, recomenda a psicanalista Juliana Machado. Para ela, o importante é mudar a tônica mental. “Se você estiver em uma função que requer muito raciocínio, como calcular, procure uma atividade que não necessite de nenhum esforço mental, como fazer uma contemplação, meditação, ouvir música, molhar as plantas.”


 
Na lei

1Como as empresas que não cobram o ponto remoto podem se proteger judicialmente?

É importante que a empresa não trate os colaboradores que estiverem trabalhando de casa como se estivessem à disposição em qualquer horário, exigindo disponibilidade em tempo integral. O horário de trabalho deve ser observado da mesma forma, como se estivessem na empresa.

2Como as empresas devem combinar o ponto, principalmente para funcionários que não faziam home office?

Para empregados que fazem controle de jornada, as empresas podem adotar métodos de ponto alternativos, como login e logout no sistema (se aplicável) e controle manual feito pelos empregados (anotação em papeletas). É importante evitar eventual trabalho extraordinário, mas o funcionário, embora esteja trabalhando de casa, deve estar à disposição da empresa durante o período de sua jornada de trabalho. Como se trata de questão de saúde pública, o controle de ponto feito de formas alternativas deve ser aceito pela Justiça do Trabalho, tendo em vista as recomendações da OMS e do Ministério da Saúde. Vale destacar que alguns tribunais trabalhistas e, em especial, o Tribunal Superior do Trabalho, autorizaram home office para servidores que estão no grupo de risco e para servidores que tenham realizados viagens para localidades em que o surto foi reconhecido.

3Posso pedir que um funcionário aproveite para sair de férias neste período?

Determinar férias individuais ou coletivas é uma alternativa para interromper as atividades dos empregados. O ponto central é que, segundo a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), é necessário dar o aviso prévio de 30 dias para comunicar o empregado, quando se tratar de férias individuais, e 15 dias quando for o caso  de férias coletivas. Espera-se que seja divulgada em breve alguma portaria ou determinação das autoridades e da Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério da Economia sobre liberação ou não desse prazo de aviso prévio para comunicação das férias, de acordo com Juliana Amarante, advogada trabalhista do Souza, Mello e Torres.

4Como a empresa garante que o office hour é cumprido?

Isso só é possível com a instalação de softwares ou de tecnologia adequados. Sem eles, não há uma forma clara e objetiva para se garantir que o office hour é cumprido em sua integralidade e, infelizmente, não há meios para o gestor garantir que o empregado está 100% focado em seu trabalho dentro de sua residência. As informações sobre a jornada (início/término/intervalos) passadas pelo empregado – como regra geral e inexistindo qualquer motivo que demonstre o contrário – devem ser consideradas como verídicas e servir para demonstrar o cumprimento da jornada de trabalho, na opinião de Juliana Amarante, advogada trabalhista do Souza, Mello e Torres.

5O decreto da OMS de pandemia pode alterar a legislação vigente?

Houve a promulgação da Lei nº 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas de enfrentamento do coronavírus, bem como alguns tribunais já editaram normas internas cancelando audiências, julgamentos e atendimento ao público. Se a crise se agravar, pode ser que novas normas e orientações sejam publicadas no decorrer dos próximos dias. Entretanto, a princípio, não deve haver alteração na legislação trabalhista em vigor.

6Como fica a demissão das pessoas que trabalham remotamente?

A demissão ocorre normalmente. O teletrabalho é espelho do trabalho presencial, de acordo com Gisela Freire, especialista em Direito Trabalhista. Assim, também é necessário dar aviso prévio e fazer o exame demissional, entre outros processos regulamentares.

7A lei de quarentena muda algo?

Em tese, não. Só vai mudar se o empregado estiver infectado e, neste caso, o contrato de trabalho não pode ser rescindido.

8Sobre as medidas anunciadas pelo governo federal na quarta-feira (18 de março), a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) já prevê redução de jornada com redução de salário?

Sim, mas isso depende de acordos sindicais. A exceção, de acordo com Gisela Freire, especialista em Direito Trabalhista, são os funcionários chamados de “hipersuficientes”, com nível superior e que recebem salário duas vezes o teto de benefício da Previdência Social – algo em torno de R$ 12 mil. “Essas pessoas podem negociar diretamente com o empregador”, diz.


 

REPORTAGENS

Trabalho remoto vai transformar o mercado de trabalho após a pandemia

Especialistas acreditam que experiência será capaz de afastar preconceitos sobre o home office e criar novos métodos de gestão de equipes

Renée Pereira

A necessidade de isolamento por causa do coronavírus deve acelerar o movimento de home office nas empresas brasileiras no pós-pandemia. Hoje, até companhias que eram resistentes ao processo foram obrigadas a adotar o trabalho remoto para evitar que suas atividades fossem paralisadas e para preservar seus funcionários. Na avaliação de especialistas, esse será um grande teste experimental que vai quebrar paradigmas e transformar o mercado de trabalho nos próximos anos.

Para a professora da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Rio, Nayara Cardoso, é como se fosse um ensaio, um momento de aprendizado. Hoje, diz ela, o número de ferramentas disponíveis para melhorar a comunicação e monitoramento dos colaboradores é enorme e suficiente para afastar preconceitos. Apesar do crescimento gradual nos últimos anos, em especial nas multinacionais, o home office ainda enfrenta o conservadorismo dos líderes.

Entre as dúvidas que causam mal estar no trabalho remoto, estão a dificuldade de gerenciar atividades em um ambiente externo, a perda de controle sobre os funcionários e queda na produtividade do trabalho. Por isso, o assunto precisa ser amplamente discutido e planejado dentro das empresas. “Home office não é simplesmente mandar as pessoas para casa e deixar elas se virarem sozinhas”, diz o especialista em Recursos Humanos Pedro Martins, da PM Consulting.

Ele explica que, para ser eficiente e trazer resultados, um programa de trabalho remoto precisa ter treinamento, metas semanais ou mensais estabelecidas e monitoramento. Isso porque trabalhar em casa não é uma tarefa simples. Esse é um processo que exige disciplina. “Se não houver orientação em relação aos resultados, pode haver quebras enormes de produtividade para as empresas. Dá trabalho ser simples”, afirma Martins.

Por causa do confinamento exigido pela covid-19, várias empresas solicitaram ao especialista planos internos de contingência, que inclui o trabalho remoto. Além disso, a Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-SP) convidou Martins para coordenar um grupo de trabalho com essa finalidade. “O home office veio para ficar”, diz ele.

Essa opinião é quase unânime no mercado. No pós-crise, com as empresas debilitadas, receitas em queda e custos inalterados, a modalidade de trabalho em casa pode representar uma redução dos gastos das companhias. Isso significa, por exemplo, reduzir as estruturas físicas. Antes do coronavírus, algumas empresas já vinham adotando o home office com essa finalidade. Com 2.500 profissionais no Brasil, a BRQ Digital Solutions estava prestes a ter de alugar mais um andar para acomodar todos os funcionários.

Para resolver o problema, a companhia de tecnologia implementou um programa de “revezamento”. Havia dois grupos: um com profissionais que ficavam três dias em casa e dois na empresa e outro de um dia por semana de home office. Agora com o plano de contingenciamento, todos os funcionários vão trabalhar de casa. “Se fosse dois anos atrás, jamais teríamos como estruturar isso. Hoje, estamos mais preparados”, diz a coordenadora de Endomarketing da BRQ, Ligia Marcondes. “Contamos que esse movimento continue nos próximos anos.”

 

Regras. Para muitos especialistas, o trabalho remoto traz uma série de benefícios para as empresas, como a redução de custos, seja em relação a estrutura física ou economia com o transporte de funcionários, por exemplo. Mas o advogado Raul Rossoni, da Porto Advogados, destaca que há regras a serem observadas. O home office exige um aditivo contratual, com todas as condicionantes. “Por exemplo, o computador é de quem? Quem paga a energia elétrica e a internet? Tudo isso tem de constar no aditivo.”

A diretora da empresa de recursos humanos Randstad, Maria Luiza Nascimento, diz que a estrutura tecnológica para o colaborador é uma responsabilidade da empresa. Além disso, é preciso preparar a liderança para o home office, com monitoramento e contatos diários. O lado negativo é a falta de convívio social entre os funcionários, o que acaba exigindo um trabalho pesado para aumentar o engajamento dos colaboradores.

“O que teremos é um Brasil muito diferente na forma de se comunicar e de usar tecnologias”, diz o presidente e fundador da DOT digital group, Luiz Alberto Ferlan. Um terço dos 300 funcionários da empresa já fazia home office antes da pandemia. Agora, 100% estão trabalhando em casa. “Esse movimento vai quebrar algumas resistências e teremos mais pessoas em trabalho remoto”, diz ele.

 

O professor do Insper Sergio Firpo acredita que a partir de agora as empresas vão perceber que é possível ter o trabalho remoto com produtividade. “Acredito num movimento que vai ampliar o espectro de atividades que podem ser feitas a partir de casa. As companhias vão perceber que seus arranjos (físicos) são desnecessários.”

A Ambar, empresa de soluções tecnológicas para o setor de construção, tinha pouca experiência com home office até o início da pandemia de coronavírus. Desde segunda-feira, a companhia vem implementando um programa gradual para os funcionários trabalharem de casa. No primeiro dia, foram 82 pessoas; na terça-feira, 125; e na quarta-feira, 155 pessoas.

A construtech tem 470 funcionários, mas uma parte deles trabalha na fábrica em São Carlos (SP). “Quem pode fazer o trabalho remotamente, vai para casa. Mas, para alguns funcionários da fábrica, não tem como”, diz o chefe de pessoas e cultura da Ambar,  Renan Lacheta. Ele afirma que esse processo está sendo um grande aprendizado para a empresa. “É uma tendência, um momento de grande oportunidade para esse trabalho remoto.”

O executivo afirma que a companhia quer adotar esse movimento de agora como uma prática da empresa após o fim do confinamento. “Há, de fato, uma redução de custos, como o de transportes.” Em relação à estrutura física, diz ele, ainda vamos avaliar possíveis mudanças. “Para desmobilizar um escritório tem de estar com os dados mais maduros.”

O home office faz parte do DNA da fintech Husky. Desde o primeiro dia, a empresa adota esse sistema entre seus nove colaboradores. Um dos benefícios de não ter um escritório é não ter uma barreira geográfica para contratar as pessoas, afirma Maurício Carvalho, cofundador da empresa. Quatro pessoas ficam em São Paulo, duas em Minas Gerais, uma em Goiás, uma em Alagoas e uma em Mato Grosso do Sul.

 

“A gente se vê uma vez por ano para conhecer as pessoas novas”, diz ele. Tudo é feito de forma online, desde a contratação até a entrega dos trabalhos. Por isso, diz Carvalho, a comunicação tem de ser eficiente, é um fator determinante para que o trabalho dê certo. Ele afirma que há metas individuais e da empresa como um todo. Esse resultado será avaliado, mas não ficamos monitorando o colaborador o tempo todo.

É a primeira vez que a arquiteta e urbanista Beatriz Aburad Jardim faz home office. Desde terça-feira, ela está em casa com os pais, o irmão e a avó, confinada por causa do coronavírus. Para dar conta do trabalho, tentou criar uma rotina que vai das 9 horas às 18 horas. “Fico no meu quarto. Saio para almoçar das 13 às 14 horas”, diz a profissional.

 

Por enquanto, está dando certo. “Tento ficar focada e o resultado está igual ao do escritório. A diferença é que aqui tem gato, cachorro”, brinca Beatriz. Mas ela avalia, no entanto, que trabalhar todos os dias de casa pode não ser muito interessante ao longo do tempo. “É bom discutir ideias, pegar nos materiais, nos projetos.” Isso sem contar na falta da convivência social, que ela considera bastante relevante para o crescimento profissional.


Como manter o foco de uma equipe que está em home office

Comunicação afiada e relação de confiança são chaves para manter produtividade a distância

Gilberto Amendola

Com a pandemia de coronavírus provocando uma série de restrições e mudanças no mundo do trabalho, o home office se transformou em uma realidade mesmo para aquelas empresas que ainda não vislumbravam esse formato em seu cotidiano ou no horizonte próximo. Por isso, o que muitos gestores estão se perguntando agora é: “Como manter o foco e o engajamento da minha equipe sem o ‘olho no olho’ ?”

A experiência de empresas que já fizeram do home office algo natural pode dar pistas para quem está experimentando o trabalho remoto pela primeira vez. Palavras como “comunicação”, “alinhamento” e “confiança” parecem ser as chaves para o sucesso dessa nova (para alguns) empreitada.

A SulAmérica Seguros, por exemplo, vem implementando um trabalho de home office e homeworking desde 2014. A VP de Capital Humano da empresa, Patricia Coimbra, conta que a SulAmérica tem 10% do seu efetivo já atuando em homeworking (que é o trabalho totalmente remoto) e 30% em home office (que, para a companhia, são aqueles que trabalham até duas vezes por semana de casa). “A gente aproveitou a Olimpíada de 2016 e as manifestações de 2017, que foram períodos de limitações em termos de circulação, para testar esse modelo de trabalho”, conta Patrícia. “Com esse modelo aumentamos nossa produtividade em 40%.”

Claro, os resultados do trabalho remoto não caíram do céu. O emprego de tecnologia, de ferramentas de comunicação e de compartilhamento de informações e feedback sedimentaram o caminho do sucesso. “Em um período normal, a empresa pode se preparar para ajudar na criação do ambiente de trabalho do colaborador, alinhar metas, ter coordenação e orientação adequada do aspecto legal da atividade (como revisão de contratos aditivos)”, diz Patrícia.

Mas, em plena pandemia de coronavírus, manter o engajamento e uma equipe vibrante é sensivelmente diferente. Reforçar a comunicação constante entre toda a companhia por e-mails, mensagens e, principalmente, e por videoconferência pode ajudar a diminuir a sensação de isolamento. Neste momento, um canal telefônico para tirar as dúvidas sobre questões tecnológicas, mesmo que as mais simples, também pode ajudar os não iniciados no mundo do home office (um canal para tirar dúvidas sobre sintomas do coronavírus e os procedimentos adequados também é recomendável).

“Na próxima segunda-feira, dia 23, 97% dos nossos funcionários estarão trabalhando remotamente, estamos disciplinados e temos as ferramentas para que executivos se reúnam diariamente por videoconferência, para que possamos falar com nossas equipes, alinhar ações e tomar decisões. E, principalmente, para manter vivo o contato entre as pessoas”, diz Patrícia. “O colaborador está em casa, mas não isolado.”

Manter a confiança. Para Rafael Furtado, vice-presidente de Recursos Humanos da Pearson, quem já tem uma política de home office estabelecida vai passar por esse período de forma mais tranquila. Agora, as empresas que estão dando os primeiros passos no trabalho remoto precisam criar laços de comprometimento entre o indivíduo e a organização. “As empresas precisam tornar disponível o ferramental para um home office adequado, como computador, internet, etc. Os colaboradores, por outro lado, precisam estabelecer sua produtividade, montar um escritório adequado, etc”, afirma. “Os gestores precisam ter a cabeça aberta para entender que estamos vivendo um momento diferente, que problemas vão aparecer.”

Para Furtado, o gestor precisa manter a comunicação constante com seus colaboradores para, principalmente, passar tranquilidade. “Você precisa criar uma comunicação baseada no conforto e na segurança, além de deixar claro o caminho que a companhia está seguindo. A relação precisa ir além da questão da produtividade. Manter a confiança é o grande desafio. Com ela estabelecida, a entrega ao trabalho será o mesmo.”

Já de acordo com o analista de estratégia da Pearson, Lucas Higa, uma forma de manter uma equipe engajada é demonstrar que o alinhamento e as entregas estão conectadas. “No home office tudo se conecta e a coletividade precisa falar mais alto.”

O CEO da Connekt, doutor em Psicologia Social pela USP e Ph.D com liderança e luta por reconhecimento, Celson Hupfer, pontua que a confiança dos empregadores em seus colaboradores e, principalmente, a preocupação de não transformar a vida das pessoas apenas em trabalho devem nortear esse momento. “Você pode pensar em tecnologias, procedimentos e na criação de uma nova rotina. Tudo isso será importante se houver confiança”, diz.

Segundo ele, é importante lembrar que muitos que estão fazendo home office agora, por consequência da epidemia de coronavírus, são de outra geração, pré-millennials que não estão familiarizados com as tecnologias e as ferramentas de compartilhamento de informação. “Crises no mundo do trabalho são educadoras, fornecem grandes aprendizados. O trabalho vai mudar e criar novos padrões, um novo normal.”


Plataformas digitais encurtam distância entre líderes e colaboradores

Empresas recorrem a ferramentas de comunicação e de gestão de projetos

Marina Dayrell

Teams, Zoom, Hangouts, Webex, Trello. Com o avanço do novo coronavírus no Brasil e o aumento no número de empresas que passaram a adotar o home office, quem ainda não conhece esses nomes provavelmente vai ter de se familiarizar com eles e com muitos outros. Empresas de todos os tipos e tamanhos tiveram de mudar – em muitos casos, às pressas – o modelo de trabalho. Para não diminuir a produtividade e manter as reuniões (até mesmo a conversa informal), a solução foi recorrer a plataformas digitais.

Zoom permite fazer reuniões por vídeo, gravá-las e compartilhar telasDIVULGAÇÃO

Há mais de uma semana, a Dog Hero, plataforma online que oferece serviços de hospedagem e passeio de cães, determinou que os seus 45 funcionários começassem a fazer home office.

Em casa, eles foram instruídos a usar ferramentas de comunicação e gestão de projetos. “Nós pagamos o G Suite (plataforma empresarial do Google) e usamos todos os produtos: o Google Docs para editar textos, o Drive para compartilhar arquivos e criar apresentações, o Chat e o Hangouts para comunicação e videoconferências”, conta o cofundador da empresa Fernando Gadotti.

Para que os gestores consigam visualizar o que cada funcionário está fazendo, as tarefas pendentes e as metas, a empresa adotou as plataformas de gerenciamento de trabalho Jira e Trello. “Tentamos manter a rotina, com videoconferência para ver o rosto da pessoas. Os rituais tendem a permanecer”, afirma Gadotti.

Instituir o home office não foi uma grande novidade para a Solutis, empresa de tecnologia da informação que oferece serviços de aceleração digital para negócios. Dos cerca de 800 colaboradores, 25% já faziam trabalho remoto. Agora, todos estão em casa.

“O modelo de produtividade exige ferramentas de tecnologia que são fundamentais para a colaboração, além de conexão via rede com os colaboradores e informações e dados em nuvem”, destaca o CEO, Paulo Marcelo. Para tornar a experiência de comunicação o mais próxima possível de uma reunião, eles usam a plataforma Webex, da Cisco, que permite videoconferências, além do Microsoft Teams, para o compartilhamento de documentos.

As opções de plataformas são muitas, mas para quem está começando com o regime home office é recomendado ir com calma. “No início, não é bom adotar muitas ferramentas. É melhor trabalhar a questão da disciplina e combinar quais vão usar. Tem de ter a comunicação alinhada”, aconselha Roberta Vasconcellos, CEO da BeerOrCoffee, plataforma que ajuda clientes a encontrar espaços de trabalho e que sempre funcionou 100% no esquema home office.

Por já estarem familiarizados com o regime de trabalho em casa, os funcionários da empresa usam diversas ferramentas no dia a dia. “O Slack é o nosso coração, é o escritório virtual. Já o Zoom utilizamos muito para videoconferências, ele ajuda a criar laços e a sentir que estamos juntos”, explica Roberta.

Ajuda das grandes. Para acompanhar o crescimento do home office nas últimas semanas, diversas plataformas ampliaram seus pacotes de serviços gratuitos. Os clientes do G Suite Empresarial e do G Suite for Education, ferramentas do Google, passaram a ter acesso a recursos avançados de videoconferência do Hangouts Meet – ferramenta para reuniões online da companhia.

Meet, do Google, possibilita envio de mensagens de texto, áudio e vídeo para pessoas ou gruposDIVULGAÇÃO

Com a medida, os usuários podem fazer videoconferências com até 250 participantes, gravá-las e armazená-las, além de fazer transmissão ao vivo para até 100 mil espectadores. “A demanda por mais informação sobre trabalho remoto se ampliou muito. A gente começa a ver empresas que já estavam preparadas e aquelas que se viram na emergência de se preparar”, diz Raquel Cabral, gerente do G Suite para a América Latina.

A empresa informou que, na última semana, a busca pelos termos “videoconferência” e “trabalho de casa” atingiu o recorde de interesse dos últimos cinco anos no País.

A Microsoft passou a oferecer gratuitamente o Microsoft Teams – plataforma para videoconferência. Os interessados no Webex, software de reuniões online da Cisco, podem usar a plataforma gratuitamente em todos os países nos quais a ferramenta está disponível, inclusive no Brasil.

Escritório virtual. De forma gratuita, também há opção de plataforma brasileira para trabalho remoto. A catarinense Resultados Digitais, empresa de marketing digital, criou há um ano a #matrix, um tipo de escritório virtual que simula o espaço físico da empresa, com salas para cada time ou assunto. “A ideia é distribuir as pessoas dentro do escritório virtual e é possível customizá-lo. Há a possibilidade de conversar no privado ou fazer uma reunião”, explica o cofundador da empresa Bruno Ghisi.

A Embratel lançou a sua solução também. Batizado de Conecta Home Office, o pacote oferece banda larga, segurança cibernética, plataformas de comunicação, ramal virtual, chat corporativo, sala de reuniões virtuais e armazenamento em nuvem para empresas de todos os tamanhos e segmentos.


Com home office, empresas precisam redobrar com segurança digital

Especialista dá dicas de como corporações podem proteger dados no trabalho em casa

Marina Dayrell

Ao transferir o ambiente de trabalho para a casa do funcionário, é preciso que a empresa esteja atenta em relação à segurança das informações, principalmente em tempos da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Para ajudar as corporações nesse processo, o especialista em desenvolvimento de soluções de segurança digital Marcus Garcia elencou as principais medidas que empresas e colaboradores devem tomar.

Equipamentos. O primeiro passo é entender se a empresa vai tornar disponíveis equipamentos (como notebooks e celulares) para os profissionais. Nesse caso, o ideal é que os colaboradores sigam as políticas de segurança. Para os funcionários que tiverem de usar seus equipamentos pessoais, é preciso ainda mais cuidado. “É essencial que todos os softwares usados, principalmente os sistemas operacionais, sejam atualizados para a última versão, com configurações de segurança, e é preciso instalar um antivírus com firewall. De preferência, soluções pagas, pois costumam ter atualizações constantes”, diz.

Nuvem X VPN. As empresas que já usam ferramentas digitais mais modernas, como os pacotes do Google e da Microsoft, têm acesso a e-mail e compartilhamento de arquivos na nuvem, o que, segundo Garcia, acaba sendo mais seguro pela própria estrutura das plataformas. “Você consegue acionar e identificar qualquer possível brecha de segurança, qualquer informação que esteja saindo ou entrando no seu domínio de uma forma muito mais rápida”, destaca a gerente do G Suite para a América Latina, Raquel Cabral. Já para as empresas que não têm pacotes como os citados e cujos e-mails e armazenamento de arquivos fiquem dentro da própria companhia, é preciso que os funcionários recebam acesso via VPN (rede privada virtual, em português). “É uma conexão privada, controlada via software e que, na prática, conecta dois pontos e garante a criptografia perfeita entre eles”, diz Garcia.

Compartilhamento de arquivos. Caso um arquivo ultrapasse o limite permitido pelo e-mail, plataformas de nuvem têm ferramentas de compartilhamento. Garcia defende não ser recomendável usar sites públicos de compartilhamento de arquivos, ainda que seja permitido colocar senha.

Rede Wi-Fi. Outra preocupação é a rede pela qual o funcionário vai acessar os documentos e e-mails em casa. “Se é uma rede residencial e a cabo, provavelmente você estará seguro. Mas, se é uma conexão Wi-Fi, é preciso criar uma senha forte e criptografada. Se for usar uma rede pública, como a de uma cafeteria ou de um shopping, é recomendável fazer isso por uma VPN.”

Senhas. Para tornar a navegação ainda mais segura, Garcia recomenda usar, sempre que possível, a autenticação em dois fatores. Na prática, após inserir a senha habitual, uma nova ou uma confirmação por SMS, e-mail ou telefone é solicitada. No caso de plataformas que não oferecem esse serviço, há a opção de aplicativos que geram o segundo fator, como o Authy, gratuito e recomendado por Garcia. “Ele gera um token compatível com várias ferramentas. Pode ser uma solução que a empresa exige, mas cada colaborador pode instalar no seu dispositivo.”


DICAS

Confira 18 ferramentas úteis para trabalhar em equipe

Há plataformas para fazer videoconferências, organizar tarefas e fluxos de trabalho a distância. Escolha a sua

Slack funciona como um WhatsApp corporativo, com funcionalidades adicionaisDIVULGAÇÃO

PARA A COMUNICAÇÃO:

1ZoomPermite fazer reuniões por vídeo, gravá-las e compartilhar telas. É necessário download do aplicativo e criar um login.

2SlackSe assemelha a um WhatsApp corporativo, porém com mais funcionalidades. Permite criar canais de acordo com o assunto ou as áreas da empresa. O histórico de conversa fica registrado. Tem função “reminder”: ajuda a lembrar, mais tarde, de responder mensagem.

3TandemPara conversas rápidas, como cutucar um colega de trabalho. Funciona como um “walkie-talkie”: não precisa que o interlocutor aceite a chamada para ouvir a mensagem. Quem quer falar aperta a tecla “talk” e, automaticamente, a pessoa ou a sala selecionada ouve o que ela tem a dizer.

4LoomA proposta é substituir o e-mail por um vídeo curto. Além da câmera, também grava a tela do celular e do computador. Permite edições simples no vídeo, como corte e inserção de links.

5Hangouts MeetFerramenta do Google que permite o envio de mensagens de texto, áudio e vídeo para pessoas ou grupos. As chamadas podem ser acessadas a partir de um link e ficam registradas em histórico. Faz parte do G Suite, pacote empresarial do Google.

6SkypeAinda pode ser utilizado por pessoas físicas, mas a Microsoft substituiu a versão para empresas pelo Microsoft Teams.

7Microsoft TeamsPermite videoconferência a partir de um link, sem que o receptor da chamada precise fazer login. Integração com Office 365 (pacote de programas da Microsoft) possibilita o compartilhamento de arquivos durante as chamadas. Também é possível gravar as reuniões.

8Webex. Plataforma da Cisco que permite videoconferências e ligações para telefones, com opção de compartilhamento de tela.

9GoToMeetingplataforma da LogMeIn para videoconferência que pode ser acessada por computador (Mac ou PC) e celular.

10WhatsAppjá famosa entre os brasileiros, a ferramenta também pode ser usada para conversas de trabalho, mas é preciso ficar atento para não misturar com assuntos pessoais.

PARA GESTÃO DE TEMPO E PROJETOS:

1Notiongerenciador de projetos que funciona como uma enciclopédia do trabalho, um local para registrar tudo o que é feito para que todos da empresa ou de determinada área consigam ter acesso às informações. É possível criar lista de tarefas, tabelas, calendário, inserir imagem, vídeo ou arquivo e mencionar pessoas.

2Asanagerenciador de projetos que permite planejar tarefas a serem feitas, definir prioridades e estabelecer prazos e metas.

3Trellogerenciador de projetos para organizar fluxos de trabalho, baseado em cartões com metas, que são movidos de acordo com o progresso.

4Jiragerenciador de projetos direcionado às equipes de desenvolvimento de software. Permite acompanhar todo o processo de criação e lançamento.

5WeekDonepermite definir metas, alinhar atividades, acompanhar o progresso semanal do trabalho e dar feedbacks.

6Clockwiseassistente inteligente de calendário que ajuda a organizar a agenda. Com base nas informações cedidas à plataforma, ela analisa a frequência de reuniões e as reorganiza para que o tempo da sua equipe seja otimizado. Registra quantas horas semanais o usuário gastou em reuniões.

7AirTable. gerenciador de atividades que mescla planilhas com base de dados. Bastante usada por equipes financeiras.

PARA ACESSO REMOTO:

1TeamViewerpermite o acesso remoto de computadores e servidores a partir de outro celular ou computador e por uma conexão à internet.


 

 


 

FONTES

Flavia Eadi de Castro (head de direito do trabalho da RGL Advogados), Luís Otávio Camargo Pinto (advogado trabalhista e presidente da Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades), Fabrício César Bastos (professor de Administração), Christopher Spikes (CEO da Authen), Carlos Silva (diretor jurídico da ABRH-SP), Juliana Machado (psicanalista), Lucas Oggiam (diretor da Michael Page, empresa de recrutamento), Bruna Duarte Vitorino (coordenadora do setor pedagógico do Kumon), Bianca Vilela (consultora em saúde corporativa e fisiologista do exercício), Mônica Hauck (CEO da Sólides e especialista em recursos humanos), Léia Weesling (psicóloga e consultora organizacional), Juliana Amarante (advogada trabalhista do Souza, Mello e Torres), Aldo Martinez (advogado trabalhista e sócio do Santos Neto Advogados), Gisela Freire (sócia do escritório Cescon Barrieu e especialista em Direito Trabalhista), André Brik (consultor do Instituto Trabalho Portátil), Adriano Marcandali (diretor latino do Workplace, rede social corporativa do Facebook), Tathiane Deândhela (especialista em produtividade e autora), André Miceli (coordenador do MBA de Marketing e Negócios Digitais da FGV), Vivo, Claro, Alexandre Cardoso (sócio da área trabalhista do escritório TozziniFreire Advogados) e Rafael Furtado, vice-presidente de Recursos Humanos da Pearson)


Crédito: Redação do Estadão Ana Carolina Sacoman, Ana Paula Boni, Anna Barbosa, Circe Bonatelli, Gilberto Amendola, Giovanna Wolf, Marina Dayrell, Paula Felix e Renee Pereira /  Ana Carolina Sacoman / Carla Miranda /  Fabio Sales /  Regina Elisabeth Silva / Adriano Araujo, Carlos Marin, Glauco Lara e William Marioto / Ilustrador Marcos Müller – O Estado de São Paulo – disponível na internet 23/03/2020

 

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