O presidente Jair Bolsonaro admitiu pela primeira vez nesta terça-feira (28/4) ter mantido diálogo com lideranças políticas de partidos do chamado centrão. Além disso, ele comentou que não vai barrar uma eventual negociação de cargos no seu governo pois, na avaliação do mandatário, existem “dezenas de milhares de cargos” na administração pública federal e ele não “tem controle em tudo o que acontece”.
“Se um ministro quiser dar um cargo pra alguém do partido, sem eu saber, você acha que isso pode acontecer? Pode. E eu posso ficar sabendo? Talvez, é muito difícil. Agora, são seres humanos que estão na ponta da linha… Em qualquer ministério pode aparecer um “A” de corrupção, pode. Até agora não apareceu”, disse Bolsonaro nesta noite, em entrevista a jornalistas na frente do Palácio da Alvorada.
Bolsonaro destacou, contudo, que até agora “nada foi publicado no Diário Oficial da União”. De todo modo, ele comentou que, à exceção de “partidos comunistas”, vai dialogar com qualquer sigla que se mostrar interessada.
“Quando converso com alguém, de partidos outros, vocês falam que estou oferecendo cargo. Me acusem, tudo bem, mas com racionalidade. Eu converso praticamente com todos os parlamentares. Quando falo com o pessoal do PP… Eu já fui mais de 10 anos do partido. Por que que eu não vou conversar com nomes do PP, já que foram meus colegas por 15 anos? Qual o problema? Eles que votam. Se eles têm algum pecado, o eleitor do estado é que deve tomar providência. Eu não estou aqui para julgar, condenar, acusar, pedir cassação de qualquer parlamentar”, afirmou Bolsonaro.
Desde o início do mês, o presidente tem conversado no Palácio do Planalto políticos como o senador e presidente nacional do PP, Ciro Nogueira (PI), e o deputado federal e presidente nacional do Republicanos, Marcos Pereira (SP). Bolsonaro ainda recebeu no seu gabinete os deputados Arthur Lira (PP-AL), Diego Andrade (PSD-MG), Jhonatan de Jesus (Republicanos-RR) e Wellington Roberto (PL-PB), que ocupam cargos de liderança dos seus respectivos partidos na Câmara.
O presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, foi mais um a comparecer ao Planalto recentemente. Bolsonaro também abriu as portas para o presidente nacional do DEM e prefeito de Salvador, ACM Neto.
Apesar de falar que não vê problemas em dialogar com o centrão, Bolsonaro contradiz o discurso que o levou à Presidência da República, o da “nova política”. Durante campanha eleitoral, disse que não faria o “toma-lá-dá-cá”, tradicional negociação de cargos entre governo e Congresso e criticada pela população.
Levou algum tempo até ele se acertar com os parlamentares e, hoje, como trabalha sem base sólida, depende dos presidentes da Câmara e do Senado para aprovar pautas do Executivo, sobretudo em meio à crise sanitária provocada pelo novo coronavírus.
Ciente dessa falta de apoio e da má relação com o Legislativo, Bolsonaro se deu conta de que precisa de suporte no parlamento para manter a sua governabilidade, especialmente porque há uma série de pedidos de impeachment contra ele já protocolados na Câmara. Por isso, o jeito que ele encontrou para administrar o momento foi se submeter à tão abominada velha política e se aproximar do centrão.
Augusto Fernandes/Correio Brazilense – disponível na internet 29/04/2020