Grandes investidores se movimentam para disputar leilões que vão ocorrer no setor.
Setor com maior perspectiva de investimento e potencial para ajudar na retomada econômica do Brasil, o saneamento básico enfrenta seu primeiro teste desde a aprovação do novo marco regulatório, em junho. Quatro leilões de concessão e Parcerias Público-Privadas (PPP), marcados para setembro, vão medir o apetite dos investidores em negócios que levarão à universalização dos serviços de água e esgoto no País.
Hoje 100 milhões de brasileiros não têm acesso à coleta de esgoto e 35 milhões não são abastecidos com água potável – números que refletem a falta de prioridade que o setor teve nos últimos anos e explicam a proliferação de epidemias, como dengue e zika, além de doenças gastrointestinais no País. Esses indicadores colocam o País em posição pior que Iraque, Jordânia e Marrocos.
Para mudar esse cenário, o setor terá de receber entre R$ 500 bilhões e R$ 700 bilhões em novos investimentos. Pelas novas regras aprovadas pelo Congresso Nacional, a universalização dos serviços terá de ocorrer até 2033, o que significaria alcançar a meta de 99% da população com acesso à água potável e 90%, ao tratamento e coleta de esgoto. Ou seja, em 13 anos, o setor teria de receber entre R$ 38 bilhões e R$ 53 bilhões por ano de investimento.
O pontapé para mudar essa situação começará no mês que vem com a concessão dos serviços da região metropolitana de Maceió (R$ 2,6 bilhões de investimentos); PPP de Cariacica, no Espírito Santo (R$ 580 milhões); PPP Sanesul, em Mato Grosso do Sul (R$ 3,8 bilhões); e a PPP de dessalinização de Fortaleza (R$ 500 milhões). Esses projetos, na avaliação de especialistas, serão um termômetro do interesse dos investidores – que vivem hoje num cenário de grandes transformações do ponto de vista social e ambiental.
“Pelas informações que temos, há uma grande movimentação no mercado, seja pela concessão de Alagoas ou pela Cedae (RJ), que ainda não tem data para o leilão”, afirma Cleverson Aroeira da Silva, superintendente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A instituição está tendo papel fundamental na modelagem dos projetos a serem licitados. Hoje o banco tem, em carteira, R$ 50 bilhões em projetos, envolvendo oito Estados brasileiros, e está em conversas com outros três para iniciar estudos.
Com a aprovação do novo marco regulatório, empresas de outros setores começaram a estudar possibilidades em saneamento, como é o caso das companhias CCR (concessões de transporte) e Equatorial (energia elétrica) e dos fundos de investimento Vinci Partners e Pátria. Na avaliação do presidente da BF Capital, Renato Sucupira, hoje o setor é a melhor alternativa de investimento dentro da infraestrutura. “Não tenho dúvida de que haverá grande concorrência nas licitações.”
Com negócios na área de energia, transporte, logística e telecomunicações, a gestora Pátria está de olho nas oportunidades que o novo marco regulatório trará para o setor.
Nesse primeiro momento, a expectativa do mercado é que os novos investidores, sobretudo o financeiro (como fundos de investimento), façam parceria com outras empresas que já estão no setor. Isso porque algumas licitações exigem atestação técnica, afirma o diretor executivo da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), Percy Soares Neto.
Além disso, destaca ele, alguns ativos são tão grandes que exigirão uma estrutura de capital reforçada. É o caso dos serviços de água e esgoto do Rio, hoje administrados pela Cedae. O BNDES espera lançar o edital de licitação em outubro e trabalha para fazer um leilão até o fim deste ano. Pelo tamanho do investimento, de R$ 33,6 bilhões, a concessão será feita em quatro lotes. O ativo é um dos mais cobiçados no mercado, especialmente pelos fundos de investimentos.
Na avaliação de Paulo Mattos, presidente e cofundador da gestora IG4, acionista da Iguá (empresa de saneamento), o novo marco regulatório trará grandes avanços para a população e muitas oportunidades para investidores. Além disso, a pressão ambiental em curso no mundo será positivo para o setor, que terá mais abertura no mercado de capitais.
Ele cita como exemplo a emissão de debêntures que a Iguá acaba de fazer em plena pandemia da covid-19. A empresa conseguiu no mercado quase R$ 900 milhões investir na infraestrutura de saneamento em suas concessões de Cuiabá e Paranaguá, além de refinanciar a dívida. “Esse mercado para capitais financeiros vai bombar. Todos querem ter um selo de qualidade.”