Latam é primeira empresa no País a negociar redução permanente de salários

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Os aeronautas da Latam aceitaram que o Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA) inicie negociações com a empresa para a redução permanente dos salários da tripulação, na esteira da crise provocada pela pandemia da covid-19. A deliberação em favor das conversas saiu na sexta-feira, 2, com o fim de uma votação interna com os associados.

A redução de salários passou a ser permitida com a entrada em vigor da reforma trabalhista, em 2017, desde que intermediada pelo sindicato da categoria. Mas é uma prática ainda bem pouco comum. De acordo com o  Tribunal Superior do Trabalho (TST), apenas a Latam e o SNA negociam esse corte permanente de salários no tribunal.

A Latam e a categoria travam uma disputa há meses por causa do tema.

Enquanto Gol e Azul negociaram com seus tripulantes reduções temporárias por causa da pandemia, a Latam quer o corte definitivo. A argumentação da empresa é que, por ser a mais antiga, tem salários superiores. A categoria, entretanto, havia negado qualquer tipo de conversa nessa direção até então e, no fim de julho, a Latam anunciou a demissão de 2,7 mil tripulantes.  

O tema ganhou um novo capítulo no dia 22 do mês passado, quando a Latam informou que ainda tinha um excesso de 1,2 mil tripulantes e que sem um acordo para redução permanente de salários iria promover novas demissões. 

Também no dia 22 o SNA foi intimado pela Justiça do Trabalho a fazer um novo levantamento com a categoria sobre as propostas da Latam. A imposição saiu em um despacho do ministro do TST Luiz Philippe Vieira de Mello Filho. No documento, o ministro deu 10 dias ao sindicato para submeter a proposta da Latam para manifestação da categoria.

Em votação online realizada nos dias 1.º e 2 de outubro, os tripulantes associados da Latam Airlines Brasil deliberaram por autorizar que a diretoria do SNA negocie com a empresa mudanças permanentes no modelo de remuneração. Entre os comandantes, 65,5% foram favoráveis ao início das conversas. Entre os copilotos e comissários os porcentuais favoráveis foram de 65,4% e 55,7%, respectivamente.

“Diante deste resultado, o SNA irá apresentar a resposta da categoria para o TST (Tribunal Superior do Trabalho), mediador da negociação com a Latam, que encaminhará os próximos passos”, disse o SNA, em nota publicada no portal da categoria.

Também em nota, a empresa informou avaliou como positiva a decisão dos aeronautas. “A LATAM Airlines Brasil reconhece como positivo o resultado da votação da assembleia realizada entre 1 e 2 de outubro de 2020, e já está em contato com o SNA para iniciar as negociações para um novo modelo de remuneração dos seus tripulantes”, disse a empresa, em nota.

“O avanço deste processo é fundamental para o diálogo conjunto e em prol da competitividade das operações e da continuidade das oportunidades de emprego da companhia”, acrescentou a empresa. 

Índice alto de filiação sindical

Advogados acreditam que o caso da Latam é muito específico para gerar ondas de redução de salário sem a redução da jornada de trabalho em outras empresas, mas que o caso traz uma nova forma de avaliar o tema. Eles também afirmam que a Latam está mais segura de eventuais processos trabalhistas individuais já que houve a mediação do TST. 

“O atual entendimento majoritário do TST é de que, ainda que a possibilidade de redução salarial por meio de negociação coletiva esteja prevista na Constituição, essa redução se restringe aos casos de crise econômica, emergenciais e em que a redução não seja permanente”, disse Elias Mubarak, especialista em Direito Empresarial e membro da Comissão Especial de Estudos de Recuperação Judicial e Falências da OAB-SP. “Os próprios trabalhadores autorizaram a negociação da redução permanente. A decisão, entretanto, não é definitiva. Ainda vai ser apreciada pela Corte. Pode dar errado? Sim, mas é um avanço, pois estamos presenciando casos em que a redução salarial permanente vem sendo usada como contra forma de garantir a manutenção do emprego e da renda.”

Já a especialista em Direito do Trabalho, Janaina de Santana Ramon, sócia do Crivelli Advogados, destacou que a categoria acabou sendo obrigada a ceder diante das novas ameaças de demissões. “Eles (a Latam) entraram com pedido de negociação com o TST, que eles chamam de mediação negocial, mas não há outra proposta que não uma redução salarial”, disse. Ela acrescentou que a empresa tem janela para propor, por exemplo, a estabilidade dos empregos para justificar a redução nos direitos.

Para o advogado trabalhista Fabiano Zavanella, sócio do Rocha, Calderon e Advogados Associados, o caso da Latam é muito específico. “O que acontece no setor de aviação não serve muito de parâmetro para outro setor da economia, porque tem uma característica muito própria, muito diferente da média do mercado de trabalho. É um setor com índice de filiação sindical muito alto, chega a quase 70%, enquanto a taxa de sindicalização média no mercado brasileiro não chega a 17%. A média salarial dos trabalhadores formal é de cerca de R$ 2,5 mil, a dos pilotos e copilotos da Latam é bem maior que isso”, disse. “Aceitar uma redução salarial permanente é uma coisa complicada, mas não impõe uma dificuldade maior que a perda do emprego.” 

O grupo Latam está em recuperação judicial nos Estados Unidos (chapter 11) e conseguiu recentemente uma linha de financiamento de US$ 2,4 bilhões com credores e controladores no país. A empresa tem até o fim de janeiro para apresentar um plano de recuperação aos credores.

Em entrevista recente ao Estadão/Broadcast, o presidente da Latam no Brasil, Jerome Cadier, destacou que o tamanho futuro da empresa no País estaria diretamente ligado ao sucesso das negociações com a tripulação. A empresa tem sido mais prejudicada do que suas concorrentes no Brasil diante da sua forte presença no mercado internacional, segmento que tem reportado recuperação pífia na demanda por causa do fechamento de fronteiras e medidas de quarentena.

Crédito: Cristian Favaro e Érika Motoda, O Estado de S.Paulo – disponível na internet 06/10/2020

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