Não havia e não há nenhum perigo de a oposição apoiar Lira

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A imprensa brasileira, com raras exceções, não cumpre suas funções mais básicas, que são mediar e informar, com qualidade, o público. Daí há muitas confusões feitas, talvez deliberadamente, não se sabe, que precisam ser esclarecidas. É o caso da eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, que vai ocorrer em 2 de fevereiro próximo.

Eis a comprovação clara e objetiva, que coloca fim no falso dilema, de que a oposição poderia apoiar o candidato do governo, deputado Arthur Lira (PP-AL). Leia, no final deste texto, o documento assinado, nesta sexta-feira (18), por 11 partidos — PT, PSL, MDB, PSB, PSDB, DEM, PDT, Cidadania, PV, PCdoB e Rede —, que fecha com contundente radicalidade a frente ampla contra Lira: “Certamente, Ulisses Guimarães estaria deste lado aqui e talvez repetiria em alto e bom som: eu tenho ódio e nojo das ditaduras”.

Durante semanas a imprensa explorou e especulou sobre esse falso dilema. A oposição iria apoiar a candidatura do Palácio do Planalto, representada pelo deputado Arthur Lira ou o nome que for indicado pelo do atual presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ)?1

Não havia hipótese ou perigo de a oposição — PT (54), PSB (31), PDT (28), PSol (10), PCdoB (9) e Rede (1), com 133 deputados —, apoiar o candidato do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), pois o país encontra-se em situação de graves anormalidades antidemocráticas, lideradas e patrocinadas pelo presidente da República, que atua de forma antirrepublicana, prega o ódio e ataca irracionalmente, todo o tempo, a oposição e as instituições da democracia.

Diante desses fatos objetivos seria inimaginável que a oposição, sobretudo a esquerda, sequer pensasse nessa possibilidade. Qualquer observador minimamente atento à cena política não teria dúvidas quanto a isso. A imprensa criara esse falso dilema para conturbar ainda mais o ambiente político. É o que parece.

Eis que nesta quinta-feira (18), a oposição depois de se reunir por 3 horas, bateu o martelo: “Oposição veta Lira e se aproxima de apoio a bloco de Maia na eleição da Câmara”, manchetou a Folha de S.Paulo2.

A investida da mídia era maior sobre a bancado do PT, a maior na Câmara, com 54 deputados. Dando a entender que a legenda, dependendo da agenda de Lira, poderia marchar com o deputado apoiado por Bolsonaro. Olha a confusão3. Eis que o PT também “bateu o martelo”, contra Lira, e ainda conclamou a oposição a cerrar fileiras contra o deputado “progressista” de Alagoas4.

Jogo aberto, mas agora claro para todos
Agora não há mais especulações. A oposição vai marchar com o grupo de Maia, composto por 146 deputados dos seguintes partidos: PSL (41), MDB (34), PSDB (31), DEM (28), Cidadania (8) e PV (4). O jogo ainda está aberto, mas agora está claro para todos. Isto é, em razão de defecções que cada lado pode ter, não dá para especular ou tentar antecipar o resultado.

A oposição, numa democracia combalida como a brasileira, não é um amontoado de siglas no Parlamento, com congressistas dispostos ou prontos a aderir a qualquer aceno do governo. Ainda mais diante desse, que é reacionário, que frequentemente se aproxima do neofascismo e o neonazismo e ameaça constantemente o Estado Democrático de Direito.

Assim, embora (repito) o jogo ainda esteja aberto, encerra-se as especulações e jogos de cena sobre a oposição reforçar o governo Bolsonaro apoiando seu candidato à presidência da Câmara.

Movimento do PSol
A legenda tem 10 deputados e anunciou que poderá lançar candidato. “Segundo o deputado Ivan Valente (SP), o partido deverá lançar uma candidatura própria para marca posição”5, veiculou o jornal Valor Econômico, na última quinta-feira (15).

Assim, em se mantendo essa posição da legenda (tudo indica que não muda), a candidatura do grupo de Maia poderá receber 123 votos da oposição, no 1º turno. Não é pouca coisa. E no 2º turno, toda a oposição tende a votar “fechada” contra o candidato do governo.

O movimento do PSol é, em alguma medida perigoso, pois com disputa tão acirrada qualquer dispersão pode cacifar a candidatura do líder do “Centrão”, Arthur Lira. Mas, se os demais partidos de oposição mantiverem apoio unitário e coeso ao candidato do grupo de Maia, a articulação não deverá sofrer abalos estruturais.

Como “veto” à Lira é mais que oposição política. É posicionamento ideológico, não deverá haver mudanças de rota por parte da oposição6.

Situação do PSB
O único partido de oposição, em que uma parte da bancada de 31 deputados se movimentou rumo à candidatura do governo foi o PSB7. Mas, a Direção Nacional do partido decidiu, por unanimidade, apoiar uma candidatura pela “independência da Câmara”8.

Desse modo, os deputados que votarem no candidato de Bolsonaro — mesmo o voto sendo secreto — poderão ter muito desgaste político para sustentar isso que se manifesta como profunda incoerência política, um partido de oposição, votar com o governo em matéria de cunho marcadamente político.

Sobre Rodrigo Maia
A bem da verdade, a oposição não tem do que reclamar do atual presidente da Câmara. Faz-se necessário reconhecer que Maia, à frente da Casa, neste conturbado biênio sob Bolsonaro, cumpriu rigorosamente todos os acordos firmados com os partidos de oposição. E ainda se contrapôs a todos os arreganhos autoritários e antidemocráticos do presidente da República. Qualquer balanço vai comprovar isso. Isso de um lado.

Marcos Verlaine:  Jornalista, analista político e assessor parlamentar do Diap

De outro, para aqueles que refutam o presidente da Câmara, porque ele não botou para “andar” nenhum dos quase 60 pedidos de impeachment contra Bolsonarotambém é preciso reconhecer que não há condições políticas e sociais para colocar na pauta pedido de afastamento, nessa conjuntura, como analisa o cientista político Alberto Carlos Almeida, no artigo Impeachment de Bolsonaro: uma questão recorrente10, publicado no portal revista Veja, nesta semana. Vale a pena a leitura!

Assim fechou-se esta semana útil, às vésperas do recesso parlamentar e do fechamento do ano, no computo geral desse processo em curso na Câmara, com boas e alvissareiras notícias.

Crédito: Marcos Verlaine/Agência Diap – @internet 19/12/2020

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